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O Congresso tem, a partir desta terça-feira, uma oportunidade rara de transformação da estrutura partidária brasileira e, por consequência, de práticas que conspiram contra a democracia. Inicia-se, com uma reunião de lideranças partidárias, o debate do que, sob o rótulo abrangente de reforma política, apresenta-se como uma tentativa de fechar algumas comportas da corrupção no país. O principal foco da proposta, que tem como relator o deputado gaúcho Henrique Fontana, é o financiamento público de campanhas eleitorais. Há consenso, dos políticos aos cidadãos comuns, em que os subsídios privados a candidatos e partidos constituem-se no ponto de partida para as relações promíscuas entre corruptos e corruptores.
Repetem-se os exemplos de prestadores de serviços a governos que, em algum momento, passam a ser protagonistas de desvios de conduta. É a retribuição de favores, muitos dos quais encobertos por operações de caixa 2. Os efeitos mais danosos, desde sua origem, são conhecidos. Há concentração de recursos entre os candidatos que têm mais apelos para arrecadar dinheiro, as ações políticas passam a ser pautadas pelos interesses dos patrocinadores e, no fim, quando é feito o acerto de contas entre as partes, a sociedade paga o alto custo de licitações forjadas, obras superfaturadas e outras atitudes desmoralizadoras das já desgastadas imagens do Legislativo e do Executivo.
Mesmo que a proposta do financiamento público seja apresentada como uma mudança ética, é natural que boa parcela dos eleitores e até mesmo de cientistas políticos se interrogue sobre os reais benefícios da inovação. Em tese, pelo argumento que o relator defende com ênfase, o uso apenas de verbas públicas para financiar campanhas equilibraria uma disputa que, como está, assegura êxito aos abonados com verbas fartas. Pelo princípio da equidade, virtudes que o eleitor gostaria de ver vitoriosas, mas nem sempre prosperam, poderiam finalmente prevalecer numa eleição custeada por um fundo público, como a reputação, os projetos e as ideias.
Mas será inócua uma lei que, por falta de controle, permita a manutenção de doações privadas e não contabilizadas. Prevê-se no projeto que, como punição, empresas doadoras perderão, por cinco anos, o direito de prestar serviços a governos e de ter acesso a financiamentos de bancos públicos. Não é garantia de nada. Fraudadores de licitações do Hospital Pediátrico da Universidade Federal do Rio, flagrados há um ano e investigados como criminosos confessos, mantêm contratos com a União até hoje.
Para ser completa, a reforma depende de ações moralizadoras efetivas, e o novo modelo de financiamento das campanhas é apenas uma delas. É preciso que se racionalizem as eleições, para que ocorram, em todos os níveis, a cada quatro anos, e se reduza o número de partidos, eliminando do cenário nacional as agremiações que só existem para se beneficiar do fundo partidário e comercializar tempo na propaganda obrigatória da televisão. É tarefa de todos monitorar o processo que começa hoje, para que a reforma não seja apenas mais um remendo em hábitos e leis desqualificadoras da política.
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