VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

quarta-feira, 30 de março de 2016

QUANTO VALE UM DEPUTADO?




ZERO HORA 30/03/2016 - 04h56min | 


DAVID COIMBRA

Barganha política. No Brasil, a negociação por voto é considerada normal

O Peninha definitivamente é um pândego, mas conseguiu produzir clássicos sobre o descobrimento do Brasil. Neles, fica mais ou menos claro que a Cabral não foi dado o comando da sua poderosa armada pela excelência que demonstrava como soldado ou como capitão de navio, e sim por sua fidalguia.

Cabral era casado com uma mulher riquíssima e tinha influência na corte. Competentes mesmo eram alguns de seus capitães subalternos, como os irmãos Diogo e Bartolomeu Dias.

Perceba, pois, como é antiga a rejeição à meritocracia no Brasil. Uma viagem daquelas era perigosíssima. Grande parte da tripulação não voltava para casa. Um dos navios da armada de Cabral, inclusive, desapareceu logo no início da jornada. Ninguém sabe o que ocorreu, ninguém viu. Cento e cinquenta homens e uma caravela foram simplesmente tragados pelo mar.

Mesmo assim, a escolha para o comando de um empreendimento tão caro e arriscado foi política, não técnica.

Cinco séculos depois, essa continua sendo a lógica brasileira. Ontem os peemedebistas deixaram seus cargos no governo federal. Que diferença fará para a população?

Meu Deus, estamos perdendo um grande ministro do Turismo! Oh, não, justo agora que a Aviação Civil ia tão bem...

Ninguém se importa.

Por quê?

Porque não tem importância.

A política, no Brasil, é uma política de classificados de jornal. Não passa de uma luta rasteira por melhores empregos.

Se você é empreendedor e está em dúvida sobre em que negócio investir, aí vai uma dica: funde um partido. É fácil, no Brasil há mais de 30. Fundado o partido, você já receberá algum do Estado. Se eleger um único deputado, você tirou o que meu avô chamaria de "sorte grande".

Com um só deputado, você tem mercadoria suficiente para enricar como um Cabral singrando os mares. Aquele deputado vale tempo de TV durante a propaganda eleitoral e, o melhor de tudo, vale um voto.

Imagine hoje, em que a Presidência da República está em jogo, quanto valeria o voto desse seu deputado solitário. O que não lhe ofereceriam para dizer sim ou não ao impeachment.

Em qualquer outro lugar, essa negociação seria escandalosa. Em qualquer outro lugar, um regime chamado de "presidencialismo de coalizão" significaria a formação de aliança com o objetivo de atingir um fim comum. Ou seja: uma conjugação de ideias.

Digamos que você reunisse os partidos que defendem a escola pública como base para o desenvolvimento da nação. Na hora de escolher o ministro, a pergunta a ser respondida não é "de qual partido é o ministério", mas "que pessoa é a mais indicada para tocar adequadamente nosso projeto de valorização da escola pública".

Isso em qualquer outro lugar. Não no Brasil. No Brasil, o presidente dá um ministério em troca de apoio, como se desse uma bicicleta. O partido que ganha a bicicleta, repoltreia-se nela como bem entender.

Por que um político recebe de presente determinado ministério? Pelo seu poder de angariar votos dentro daquele partido, não por seu conhecimento da pasta. E ele toma o ministério não para fazer algo de positivo naquele setor, mas para poder distribuir empregos aos seus apaniguados.

Aquela diretoria é sua, porque você me somou um milheiro de votos. Você vai ficar com uma secretaria, porque me valeu 500.

Toda a política brasileira resume-se a uma agência de empregos. Tire deles a possibilidade de dar empregos, e a política será desratizada.

O rei dom Manuel deu a Cabral o comando da armada porque tudo lhe pertencia, ele podia, ele era o rei. Nossos presidentes dão ministérios porque tudo lhes pertence, eles podem, eles são reis. Negócios particulares, coisa de secos e molhados. É assim que é. Sempre foi. Sabemos há cinco séculos.

terça-feira, 29 de março de 2016

COALIZÃO DE INTERESSES




ZERO HORA 29 de março de 2016 | N° 18485


EDITORIAIS




O prometido desembarque do PMDB da base aliada, que parte da agremiação espera formalizar nesta terça-feira, expõe a falta de consistência da coalizão formada em torno do governo Dilma Rousseff. Nesse cenário preocupante para o país, a perspectiva de o governo ficar sem o apoio de uma legenda que ocupa sete ministérios e mais de 500 cargos na máquina pública amplia ainda mais as chances de redistribuição de postos por interesses imediatistas. Nessas circunstâncias, a conta lançada para os brasileiros costuma ser ainda mais elevada, pois o fisiologismo tende a imperar em situações que favorecem um verdadeiro balcão de negócios.

Embora parte dos peemedebistas relute em abandonar o governo, as chances são de que prevaleçam as pretensões da ala interessada em se cacifar para assumir o comando do país em caso de impeachment da presidente da República. É um movimento cheio de controvérsias e que, inevitavelmente, provoca desconfianças na população, contribuindo para aumentar a descrença na política. Assim como ocorreu em governos anteriores, no atual, o PMDB foi governista durante cinco anos e, agora, retira- se por exclusivo interesse de continuar no poder, mesmo com o envolvimento de alguns de seus principais líderes na Lava-Jato.

A anunciada redistribuição de cargos para evitar que outras siglas também abandonem a base aliada reafirma a fragilidade de acordos suprapartidários no país. Potencializado em momentos de crise sem precedentes como a atual, o fato volta a chamar a atenção para a necessidade de o país contar com partidos baseados em programas bem definidos, e não em interesses imediatistas dos próprios políticos.

sexta-feira, 25 de março de 2016

ALÉM DA LISTA


ZERO HORA 25 de março de 2016 | N° 18482



EDITORIAL





Os registros de doações eleitorais apreendidos pela Polícia Federal na empreiteira Odebrecht, com os nomes de 316 políticos e 24 partidos beneficiados nas eleições de 2012 e 2014, não podem ser vistos simplesmente como prova de corrupção. Embora os valores anotados nas planilhas da empresa envolvida na Lava-Jato correspondam a quase o dobro dos declarados pelos candidatos à Justiça Eleitoral, é provável que misturem recursos relativos a doações regulares, caixa 2 ou propina. Ainda assim, o número de políticos e partidos envolvidos e a importância de muitos deles no cenário nacional chocam ao evidenciar a permissividade da legislação vigente na época e a imora-lidade de muitas campanhas, inclusive no âmbito dos municípios.

Parte dessa confusão entre o público e o privado foi corrigida com a mudança na legislação que vetou doações de empresas a partir de 2014 – e que, inacreditavelmente, políticos influentes lutam no Congresso para restabelecer. O simples fato de um político aparecer na lista, portanto, não deve se prestar para julgamentos apressados. Corporações – incluindo as grandes prestadoras de serviços ao governo, normalmente na base de valores superfaturados – estavam autorizadas até então a doar para partidos que se encarregavam de fazer os repasses a integrantes da sigla, dificultando assim a fiscalização.

Se esse modelo arriscado de financiamento de campanha estava em vigor na época, políticos incluídos na lista não podem ser prejulgados antes de esclarecimentos adicionais que a empresa sob investigação continua devendo à sociedade. Ainda assim, as tabelas de doações a políticos mostram a necessidade de mais transparência e de processos de fiscalização mais eficientes e confiáveis para fortalecer a democracia.

quarta-feira, 23 de março de 2016

ADVERTÊNCIA PERTINENTE



ZERO HORA 23 de março de 2016 | N° 18480


EDITORIAIS




De todas as críticas que o ex-governador cearense Ciro Gomes fez aos atores da intrincada realidade política brasileira, em entrevista concedida ontem à Rádio Gaúcha, uma das mais contundentes foi dirigida ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de quem ele foi ministro da Integração Nacional entre 2003 e 2006. Na opinião do pedetista, que também já disputou a Presidência da República e ainda pretende voltar a se candidatar ao cargo, Lula é o grande responsável pela crise porque de uns tempos para cá, se autorizou a brincar de Deus e está confundindo a República.

Ciro posiciona-se com firmeza contrário ao impeachment por não identificar crime de responsabilidade por parte da presidente Dilma Rousseff, mas considera “um erro imperdoável” o uso do ministério para proteger Lula na investigação da Lava-Jato. “É o maior disparate que já vi em minha vida” – critica.

E não perdoa Lula pelas alianças feitas durante sua administração. Ao criticar lideranças do PMDB que hoje articulam pela saída da presidente, ele mira novamente em Lula: “Foi a irresponsabilidade dele que colocou essa gente na linha de sucessão do país”.

Reconhecido como um político polêmico, por emitir opiniões fortes, Ciro Gomes confessa que neste momento está apreensivo com os rumos do país, que define como “marcha da insensatez”. Com sua longa experiência em gestão pública, ele diz que o governo Dilma é indefensável, mas a democracia deve ser preservada e que o caminho para se evitar que o clima de beligerância resulte em tragédia é o respeito integral à Constituição. Quanto a isso, não há do que discordar.

terça-feira, 22 de março de 2016

DILMA E O JOGO DOS SETE ERROS



ZERO HORA 22 de março de 2016 | N° 18479


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira



Ameaçada de perder o cargo em um processo de impeachment que há menos de dois meses o governo considerava liquidado, a presidente Dilma Rousseff busca, de forma errática, um caminho para salvar o mandato. Mesmo agora, diante do desastre iminente, os petistas se recusam a admitir os erros banais que empurraram Dilma para o precipício e buscam saídas fantasiosas, como a de procurar o vice-presidente Michel Temer.

De todos os erros, o principal foi achar que o ex-presidente Lula seria capaz de encantar os aliados, como no tempo em que tinha poder e benesses para distribuir. Deu no que deu.

Confira os sete principais erros de Dilma e de seus conselheiros, incluindo o marqueteiro João Santana, hoje preso em Curitiba:

1. Tentou ganhar a eleição a qualquer custo. Na campanha de 2014, Dilma vendeu uma mercadoria que, sabiam seus ministros, não tinha como entregar. A desconstrução de Marina Silva no primeiro turno queimou pontes com setores antes simpáticos ao PT e reforçou a polarização com o PSDB, resultando na vitória por uma margem tão estreita de votos, que partiu o país ao meio.

2. Não soube manejar a crise econômica. Dilma escolheu para a Fazenda um ministro que agradava ao mercado (Joaquim Levy), mas não deu autonomia a ele nem impediu que fosse fritado dia sim outro também pelos próceres do PT. A substituição de Levy por Nelson Barbosa não produziu qualquer efeito positivo. O PIB caiu em 2015 e segue ladeira abaixo neste ano.

3. Faltou autocrítica para reconhecer os erros na condução da política econômica no primeiro mandato. Ao atribuir os problemas à crise internacional, quando outros países vinham conseguindo se reerguer, só contribuiu para aumentar o descrédito.

4. Foi incapaz de perceber que não podia confiar no PMDB, muito menos desprezar a capacidade de articulação de Temer. Mesmo quando o PMDB divulgou o documento “Uma ponte para o futuro”, na prática um plano de governo pós-impeachment, o Planalto não percebeu que Temer preparava o desembarque. A carta do vice, que era um claro recado político, foi tratada com desdém.

5. Os governistas subestimaram o movimento das ruas, classificando a insatisfação expressa nos protestos como um movimento das classes média e alta. Em vez de buscar as raízes do descontentamento, preferiram culpar a mídia pelas manifestações.

6. A substituição do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, por pressão do PT, só serviu para aumentar a crise. Primeiro, Dilma escolheu um ministro legalmente impedido de ocupar o cargo. Depois, um que ameaça fazer substituições na Polícia Federal, se sentir cheiro de vazamentos, mesmo sem provas. O ministro Eugênio Aragão passou a ideia de que quer melar a Lava-Jato.

7. A escolha de Lula para a Casa Civil, que o PT imaginava ser a saída para a crise, revelou-se um desastre, pela divulgação de gravações comprometedoras, incluindo as que indicavam ser uma tentativa de driblar a Justiça e garantir o foro privilegiado.

GOL CONTRA


ZERO HORA 22 de março de 2016 | N° 18479


EDITORIAIS



Pesquisa divulgada no último sábado pelo Instituto Datafolha comprova, pela percepção popular, o equívoco da presidente Dilma Rousseff ao convidar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a chefia da Casa Civil com o indisfarçável propósito de protegê- lo das investigações da Operação Lava-Jato. Dos 2.794 brasileiros entrevistados em 171 municípios, 68% entendem que o ex-presidente ganhou o cargo para escapar da Justiça e 73% acham que a presidente errou ao convidá-lo. Depois da divulgação das gravações telefônicas entre os articuladores da trama, só mesmo os ingênuos e os fanáticos podem acreditar que Lula foi convidado para o ministério pela contribuição que pode dar ao governo e ao país.

Pelo menos três aspectos negativos para o governo ficam evidentes nesta manobra malsucedida. O primeiro deles é a afronta ao Judiciário, caracterizada pela tentativa de obstaculizar as investigações da Lava-Jato. Se o governo identifica algum tipo de arbítrio nas decisões do juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, a alternativa é recorrer aos órgãos corregedores e às instâncias superiores do Judiciário, em vez de tentar conceder um salvo-conduto na forma de foro privilegiado ao investigado. O segundo ponto é o uso de cargos públicos para o atendimento de demandas e conveniências partidárias. Para colocar Lula na Casa Civil, a presidente teve de fazer um remanejo de ministros que em nada contribui para a qualificação do primeiro escalão. Por fim, o terceiro e mais grave efeito da decisão: a desconsideração com os cidadãos. O governo debocha da inteligência das pessoas quando diz que Lula foi convidado por sua história e sua competência política, quando é evidente a manobra protecionista.

Ficou, da infeliz operação, um saldo de desgaste para a presidente da República e de insegurança jurídica para o país, pois agora caberá ao Supremo Tribunal Federal, que o próprio investigado considera “acovardado”, recolocar as coisas no seu devido lugar. O país não precisava passar por mais esta trapalhada.

segunda-feira, 21 de março de 2016

VAZIO DE LIDERANÇAS



ZERO HORA 21 de março de 2016 | N° 18478


EDITORIAL



Em meio às manifestações de rua clamando por mudanças e pelo fim da corrupção, chama atenção a carência de líderes políticos no país, capazes de canalizar as insatisfações e de acenar com alguma esperança de melhora. É o que confirma, por exemplo, a recém divulgada pesquisa Datafolha: enquanto o que restava de credibilidade do governo se desfaz de forma acelerada, a oposição não consegue firmar- se como alternativa. Cria-se assim um impasse preocupante, pois não há democracia sem partidos políticos.

Esse verdadeiro vazio de lideranças exige ainda mais atenção num momento em que o governo da presidente Dilma Rousseff tem diante de si uma série de ameaças concretas. Enquanto parcela expressiva da sociedade cobra a sua renúncia, há a possibilidade de cassação de seu mandato pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e de aprovação de impeachment pelo Congresso. São situações extremas, previstas pela Constituição, diante das quais líderes políticos deveriam demonstrar maior preparo.

O que uma crise de representação dessas dimensões indica é a falta de consistência dos partidos políticos no país, de maneira geral. O descaso com a aprovação de uma reforma política ampla fez com que a maioria das legendas atuasse hoje mais em torno de interesses específicos do que de conteúdos programáticos.

O resultado é essa pobreza de opções, em que nem o governo, nem a oposição conseguem transmitir um mínimo de segurança para o futuro imediato dos brasileiros.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA -  NÃO HÁ DEMOCRACIA SEM POLÍTICOS SÉRIOS, PROBOS E COMPROMETIDOS COM O POVO E COM A SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO. Políticos e Partidos corruptos devem ser banidos da vida pública. Se não reformarem os políticos não há reforma e nem democracia...

sábado, 19 de março de 2016

DE REVOLUÇÕES E INSTITUIÇÕES





ZERO HORA 19 de março de 2016 | N° 18477


ARTIGOS


POR PERCIVAL PUGGINA*



Fundado em 1980, o PT acolheu o maior quinhão da esquerda revolucionária que atuava ou atuara na clandestinidade. Nasceu como ente político igualmente revolucionário e passou a influenciar todos os setores da vida nacional. Com ele, imensa energia destrutiva se instalou no país. Ideias não são inócuas. Ainda hoje, graças a tais ideias, a maior parte de nossos pedagogos, por exemplo, afasta de suas atribuições proporcionar conhecimentos que permitiriam aos jovens ganhar a vida conjugando saber e trabalho. Optam por formar agentes de transformação social, militantes da causa. Tema de uma dissertação de mestrado que folheei outro dia: “Conscientizar os professores de matemática de sua tarefa como intelectuais orgânicos a serviço da construção da hegemonia dos excluídos, dos explorados em geral”. O papel revolucionário da tabuada? A radicalidade da raiz quadrada? O conservadorismo excludente da regra de três? E as potencialidades de milhões de jovens abortadas no ventre do sistema de ensino!

O caráter revolucionário do partido se reafirmou quando, junto com o PC cubano, criou o Foro de São Paulo. Era o ano de 1989, desabava o comunismo, a democracia constitucional ganhava o Leste Europeu, e uma reunião de emergência em São Paulo recolhia para a América Ibérica o lixo ideológico da época.

Foi como partido revolucionário que o PT chegou ao poder em 2003. Escaparam à compreensão de muitos as consequências daquela eleição. Organizações revolucionárias não se sentem limitadas pelos códigos vigentes nem pela ordem existente. Uma rápida espiada na memória dos “movimentos sociais” organizados no país fornece evidência suficiente do que afirmo. O espelho onde o alto comando petista se olhava após a eleição de 2002 não mostrava os vencedores de um pleito, mas os vitoriosos de uma revolução. E eram esses ventos que agitavam as bandeiras vermelhas nas festividades que se seguiram. O mesmo ânimo explicará tudo quanto se tornou conhecido a partir de 2005. O grupo governante era responsável por uma causa e assumia o Estado como coisa sua. A estrela de flores vermelhas plantada por dona Marisa Letícia no jardim do Palácio da Alvorada não foi iniciativa de uma pessoa simples. Simbolizava, isto sim, uma percepção política.

Acabo de descrever o motivo principal de tantos e tão volumosos escândalos. O caráter revolucionário turbinou o velho patrimonialismo. Por isso, Lula entregou refinarias à Bolívia, tantas dívidas foram perdoadas, tantos favores concedidos, tanto negócio de pai para filho com os parceiros do Foro de São Paulo, tanto loteamento do Estado. Por isso, um sítio em Atibaia para Lula guardar “as tralhas” dos contêineres com que saiu de Brasília. Por isso, também, a posição no ministério serve para afastá-lo do braço da Justiça. O palaciano ato de nomeação lembra papel higiênico: “Só use em caso de necessidade”, recomendou a presidente.

Tivéssemos sido menos tolerantes ante os escândalos do mensalão, não fosse tão turbadora da razão e tão endinheirada (sabemos hoje) a utopia das bandeiras vermelhas, teríamos salvado bilhões e ganho uma década. Já então se evidenciava que a nação se convertera em espólio dos vencedores.

O grande fato novo, que nos aproxima de uma Justiça inibidora e punitiva de atos de corrupção, foi o conjunto de atribuições concedidas pela Constituição ao Ministério Público. Instituições contam! A autonomia do MP faz grande bem ao Brasil. Lado inverso, a manutenção de duas funções distintas – chefia de Estado e chefia de governo – nas mesmas mãos faz grande mal à nossa política. É a causa eficiente dessa multiforme crise que já dura mais de ano com danosas e sofridas consequências.

A bola voltou para as encruadas instituições políticas. Quem sabe um acesso de sensatez leve o Congresso a separar essas duas funções já na eleição de 2018? A razão impõe que governos maus e corruptos caiam rapidamente, sem causar estragos à vida política, econômica e social das nações. E que uma autoridade superior, como guardiã da ordem, ocupe o topo do poder político. Acho bom providenciar isso logo, pois o STF já espicha os olhos para essa elevadíssima função.

*Escritor puggina@puggina.org



A IMORALIDADE DESVENDADA



ZERO HORA 19 de março de 2016 | N° 18477



EDITORIAL






Os resvalos morais de Lula não apagam a sua biografia, mas evidenciam a visão e o comportamento de um político inapto para ocupar cargos públicos na administração do país.

Talvez o juiz Sergio Moro tenha mesmo cometido algum excesso ao autorizar a divulgação de grampos telefônicos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em que aparecem outros interlocutores que não estavam sendo investigados. Caberá aos órgãos corregedores da Justiça e ao Supremo Tribunal Federal examinar o procedimento do magistrado de Curitiba e corrigir alguma eventual ilegalidade por ele praticada. Mas não há dúvida de que o conteúdo das gravações é de interesse fundamental para os brasileiros, especialmente por revelar imoralidades protagonizadas por homens públicos que detêm posições importantes no governo, na administração e na política do país, a começar pelo líder petista recém guindado à condição de ministro-chefe da Casa Civil.

Lula, utilizando-se uma linguagem do seu gosto, pisa feio na bola ao ofender outros poderes, ao desconsiderar as instituições republicanas e ao pressionar autoridades para favorecê-lo e protegê-lo das investigações. Ninguém forçou Lula a dizer o que disse. Ainda que ele alegue na carta aberta divulgada na sexta-feira que palavras ditas em particular não devem ser tratadas como ofensa pública antes de se proceder a um exame “do levantamento ilegal do sigilo de informações”, é impossível ignorar o que ele disse, com voz clara e de forma espontânea, embora não soubesse que os diálogos estavam sendo gravados e que seriam retransmitidos para todo o país.

Os resvalos morais de Lula não apagam a sua biografia, mas evidenciam a visão e o comportamento de um político inapto para ocupar cargos públicos na administração do país. Se ele cometeu as irregularidades pelas quais está sendo investigado, entre as quais a de ter se beneficiado de propina dos saqueadores da Petrobras, caberá ao Judiciário julgar, garantindo- lhe, conforme a Constituição, amplo direito de defesa. Porém, sem prejulgamentos, já se pode concluir que o ex-presidente não está em condições de exercer plenamente as atribuições que a presidente Dilma Rousseff conferiu-lhe ao empossá-lo como ministro-chefe da Casa Civil – ainda que já pareça claro que o verdadeiro motivo do seu retorno ao governo foi outro. Como poderá Lula articular com o Congresso depois de se referir tão depreciativamente aos parlamentares e aos presidentes das duas casas legislativas? Como poderá representar o governo junto a instituições que considerou acovardadas e das quais já recebeu duras respostas?

Lula, o agora contestado ministro Lula, por seus atos e palavras, transformou-se num deprimente arremedo daquilo que foi como presidente e como uma das principais lideranças políticas do país. Ainda assim, merece ser tratado com a isenção que a Justiça do país tem que dispensar a todos os brasileiros.

quarta-feira, 16 de março de 2016

O GOVERNADOR QUE FAZ A LIÇÃO DE CASA



ZERO HORA 16 de março de 2016 | N° 18474


EDITORIAIS



O governador Pedro Taques, de Mato Grosso, deixou boa impressão na sua passagem pela Capital, principalmente quando relatou as medidas que vem adotando para enxugar gastos públicos, para reduzir a máquina administrativa e para direcionar o foco do governo para as funções típicas de Estado. Ao participar de evento organizado pelo Movimento Brasil Competitivo, o ex-senador pedetista, agora governador pelo PSDB, detalhou o verdadeiro choque de gestão que promoveu em seu Estado e que pode muito bem servir de exemplo a unidades federativas endividadas como o Rio Grande do Sul.

Procurador do Ministério Público Federal antes de ingressar na política, o governador mato- grossense levou para o Executivo a disposição de enfrentar resistências para tornar a administração pública mais eficiente. Com a chancela do parlamento, fechou todas as empresas estatais que não geravam superávits financeiros, reduziu a tributação, lançou um programa de cobrança de impostos atrasados, demitiu servidores, criou programas de atração de investimentos e promoveu parcerias público-privadas em áreas que não necessitam da gestão pública. Fez, antes, a lição de casa: formou seu secretariado com técnicos e não com políticos. Fez questão de esclarecer que não tem prevenção contra políticos, pois ele mesmo está nessa condição, mas com os técnicos fica mais fácil estabelecer um plano de metas e cobrar resultados.

As dificuldades de Mato Grosso são as mesmas de outros Estados que gastam mais do que arrecadam. Também para isso, a solução apresentada por Pedro Taques merece atenção do governo gaúcho: “É preciso economizar e cortar gastos para realizar as políticas públicas voltadas para as funções típicas do Estado. Aquilo que não é típico, não é primário, o Estado passa para a iniciativa privada”.

BLINDAGEM EXPLÍCITA



ZERO HORA 16 de março de 2016 | N° 18474



EDITORIAIS





O inusitado convite para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumir um ministério, com superpoderes para atuar na articulação política e na recuperação da economia, tem significados que não podem ser dissociados de um período potencialmente explosivo para os rumos tomados pela política no país. A volta do ex-presidente ao centro do poder, numa espécie de terceiro mandato, convém antes de mais nada a ele próprio, desde que se transformou em alvo da Operação Lava-Jato, e à presidente Dilma Rousseff, às vésperas de enfrentar um processo de impeachment na Câmara. E tudo isso coincidindo com a recém-homologada delação premiada do senador Delcídio Amaral, que alega inclusive tentativas do Planalto de calá-lo, por intermédio do ministro da Educação, Aloizio Mercadante, um dos mais próximos da chefe da nação.

Nesse esforço marcado por um verdadeiro salve-se quem puder em Brasília, a ideia de conceder foro privilegiado ao ex-presidente – investigado por suspeita de ocultação de patrimônio e de recebimento de vantagens indevidas – tem aspectos que não podem ser desconsiderados. O primeiro deles é, sem dúvida, o de se tratar de um desafio ao Judiciário, pois, ao blindar o investigado, a presidente da República aposta na benevolência ou na morosidade do Supremo Tribunal Federal. O segundo reflete o desespero da presidente da República, na véspera da definição pelo próprio Supremo do rito do processo de impeachment do qual é alvo.

Ao convocar o ex-presidente para integrar seu governo, Dilma terá que se submeter à sua orientação, inclusive em relação ao seu projeto econômico, que tem sido criticado por seu antecessor no cargo. Acima de tudo, a inusitada manobra de proteção ao ex-presidente afronta a vontade de parcela expressiva da população brasileira, manifestada no histórico protesto do último domingo, que não deveria ser menosprezada.

terça-feira, 15 de março de 2016

PRECISAMOS DE POLÍTICOS DIGNOS




 ZERO HORA 15 de março de 2016 | N° 18473


EDITORIAIS



Os brasileiros deram uma grande demonstração de civilidade e democracia no último domingo, tanto no caso de manifestantes antigoverno, que foram às ruas e protestaram de forma criativa, pacífica e posicionada, quanto de apoiadores do governo, que se manifestaram timidamente ou se recolheram. Não houve provocações nem conflitos. Agora, porém, todos temos que ser consequentes: o que fazer com tanta insatisfação sem levar a política ainda a mais descrédito e sem colocar em risco a própria democracia?

Um ponto preocupante, ainda mais visível nos últimos dias, é o grau de rejeição aos políticos de maneira geral, compreensível diante do elevado número de casos de corrupção investigados hoje. Homens públicos são eleitos para defender os interesses da população, e é inadmissível que um contingente tão numeroso deles tenha se desviado para contemplar ambições pessoais mediante até mesmo o desvio de dinheiro dos contribuintes. Ainda assim, a continui- dade do processo de moralização do país, que culminou com a expressiva manifestação nas ruas, depende dos políticos e da política.

Não há solução mágica, nem adianta imaginar que o juiz Sergio Moro, responsável pelas investigações da Lava-Jato em primeiro grau e herói do momento, poderá assumir o comando do país. O importante é ratificar apoio às instituições e buscar formas de fortalecer as agremiações partidárias, começando por uma reforma política consequente.

Com ou sem impeachment, os brasileiros não podem perder de vista que a saída para o impasse é escolher políticos dignos para representá-los.

terça-feira, 8 de março de 2016

UM CASO DE POLÍCIA



ZERO HORA 08 de março de 2016 | N° 18467


ARTIGO | DENIS LERRER ROSENFIELD



A primeira experiência de esquerda no Brasil está terminando na delegacia. Quem quiser saber o que acontece hoje no Brasil, leia as páginas policiais, embora estejam ainda provisoriamente enquadradas nas editorias de política.

Nesse enredo político-policial, em que vários próceres petistas encontram-se na cadeia, outros sob inquérito, outros denunciados, outros já condenados, destacam-se figuras de proa como José Dirceu, José Genoino, André Vargas, Delúbio Soares, João Paulo Cunha, Vaccari e tantos outros. A lista está longe de ser conclusiva. O descalabro moral é gritante.

Não deixa de ser mesmo surpreendente que haja petistas que resistam a encarar a realidade. Vivem em um mundo imaginário povoado de inimigos, como a “direita”, as “elites”, o “mercado” e outras sandices do mesmo quilate.

A miopia é de tal grau, que um milionário como Lula, tendo mais de R$ 50 milhões em suas contas, é apresentado como um “trabalhador perseguido”. Alguns mais avançados na indigência intelectual o consideram um judeu perseguido.

Quem dera, entre Auschwitz e outra opção qualquer, pudessem os judeus ter escolhido o sítio de Atibaia, o triplex de Guarujá e contas tão bem abastecidas por empreiteiras filopetistas.

Quem não se lembra ainda de quando Sarney começou a ser objeto de várias denúncias e Lula logo se apressou a defendê-lo. Qual foi o seu “argumento”? Sarney não seria um cidadão como os outros! Essa é a mensagem igualitária petista? Nada como um novo membro da “elite” para proteger um exemplar da oligarquia nordestina.

Agora, a indignação! Lula teve de obedecer a um mandado de condução coercitiva para prestar um depoimento à Polícia Federal. Supremo sacrilégio! A “elite” petista sendo levada a prestar contas à Justiça!

Curioso é o caráter seletivo dessa indignação. Como muito bem salientou o Ministério Público Federal, de 117 mandados de condução coercitiva, só houve reação de advogados e militantes a um deles, o de Lula. Tais “locutores” petistas deveriam escolher: ou a lei vale para todos, ou não é lei. O que não é admissível é essa indignação seletiva, que toma um “privilegiado” como estando acima da lei. Trata-se de uma defesa hipócrita da lei.

Petistas honrados deveriam se indignar, isto sim, com a pretensão de Lula de colocar-se acima da lei, como se esta não pudesse atingi-lo. Nem mesmo consegue o ex-presidente esconder a sua arrogância.

Ou o Brasil acaba com o PT ou o PT acaba com o Brasil!

sábado, 5 de março de 2016

DESABAFO E CRÍTICA




ZERO HORA 05 de março de 2016 | N° 18465


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira





Com expressão tensa, ladeada pelos ministros José Eduardo Cardozo, Jaques Wagner e Tereza Campello, a presidente Dilma Rousseff fez o primeiro pronunciamento público sobre a 24ª fase da Operação Lava-Jato e a delação premiada do senador Delcídio Amaral na última sexta-feira.

Dilma começou repudiando o tratamento dispensado ao ex-presidente Lula:

– Em primeiro lugar, quero manifestar o meu mais absoluto inconformismo com o fato de o ex-presidente Lula, que por várias vezes compareceu de forma voluntária para prestar esclarecimentos perante as autoridades competentes, ser agora submetido a desnecessária condução coercitiva para prestar mais um outro depoimento.

Mais cedo, ela havia divulgado nota em termos semelhantes.

A maior parte do pronunciamento foi reservada à própria defesa diante do que chamou de “hipotética delação premiada” de Delcídio. Seguindo o mesmo roteiro usado no dia anterior pelo advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, Dilma contestou as acusações feitas contra ela pelo senador, fixando-se em três pontos: a compra da refinaria de Pasadena, a suposta interferência na Operação Lava-Jato e uma tentativa de esvaziar a CPI dos Bingos.

Em um dos dias mais tensos de seus cinco anos de governo, Dilma tentou manter o mínimo de normalidade. Enquanto o ex-presidente Lula era ouvido na Polícia Federal, ela se reuniu com prefeitos de todo o país, e, depois, com governadores.

O prefeito José Fortunati conta que a reunião começou em clima tenso, com um desabafo da presidente em relação à condução coercitiva de Lula. Ela entregou um documento com sua defesa sobre o caso de Pasadena.

OLÍVIO, A VOZ QUE DESTOA NO PT

Enquanto os principais líderes do Partido dos Trabalhadores trataram a investigação do ex-presidente Lula como golpe e perseguição política, o ex-governador Olívio Dutra adotou o tom crítico que pauta suas manifestações desde a época do mensalão e declarou-se triste com o que está ocorrendo.

Com outras palavras, Olívio disse que o PT chocou o ovo da serpente ao adotar uma política de alianças que visava apenas ao poder e fazer o jogo dos partidos tradicionais. E sugeriu que Lula está pagando o preço de ter abrigado, sob seu guarda-chuva, pessoas que não tinham afinidade com o projeto político do PT:

– Lula tem amigos que o ajudam apenas esperando algum benefício em troca.

Lula e Olívio são velhos companheiros do movimento sindical e chegaram a dividir apartamento funcional em Brasília, à época da Constituinte.



INIMIGOS ÍNTIMOS

O que estes três senhores têm em comum? São homens que fizeram denúncias bombásticas contra políticos de quem eram muito próximos. No caso de Pedro Collor, a origem foi uma desavença familiar. Roberto Jefferson e Delcídio Amaral viraram inimigos na trincheira.

PEDRO COLLOR, 1992

Irmão mais novo do então presidente Fernando Collor, Pedro deu uma entrevista ao jornalista Luís Costa Pinto, da revista Veja, expondo os podres do governo. Escancarou as relações com o tesoureiro PC Farias, os achaques a empresários e até detalhes da intimidade da família. Com a denúncia, forneceu combustível à CPI que investigou as entranhas do governo Collor e entrou para a História como o responsável pela queda do irmão. Morreu em 1994, de câncer no cérebro.

ROBERTO JEFFERSON, 2005

Incomodado com o flagrante de pagamento de propina a um dos seus afilhados na direção dos Correios, deu uma entrevista à jornalista Renata Lo Prete, da Folha de S.Paulo, denunciando o pagamento de uma mesada, por parte do governo Lula, para comprar apoio dos aliados e batizou de “mensalão” o esquema comandado pelo ministro José Dirceu. Foi cassado na Câmara, condenado no julgamento no STF e hoje vive em prisão domiciliar e luta contra um câncer no pâncreas.

DELCÍDIO AMARAL, 2016

Ex-líder do governo no Senado, tinha trânsito livre nos palácios do Planalto e da Alvorada até ser preso, em novembro de 2015. Em um acordo de delação premiada firmado com o Ministério Público Federal e ainda não homologado pelo Supremo Tribunal Federal, acusou a presidente Dilma Rousseff de tentar interferir na Operação Lava-Jato para liberar empresários presos. Está em licença médica no Senado, mas não é por doença grave: apenas estresse pela temporada que passou na cadeia.



PRESIDENTE MANTÉM AGENDA

Os terremotos políticos que sacudiram o país na quinta e na sexta-feira não alteraram a agenda da presidente Dilma Rousseff em Caxias do Sul na próxima segunda-feira. No momento em que os policiais federais ainda faziam buscas no apartamento do ex-presidente Lula, o Palácio do Planalto distribuía as instruções para o credenciamento dos jornalistas que cobrirão a visita.

Dilma vai entregar 320 unidades habitacionais do Minha Casa Minha Vida em Caxias e participar da teleconferência de entrega de 976 em Sobral (CE), 400 em Jundiaí (SP) e 306 em Paracatu (MG).



JUÍZES REAGEM

As críticas do ex-presidente Lula, da presidente Dilma Rousseff e de dirigentes petistas ao trabalho da força-tarefa na 24ª fase da Operação Lava-Jato foram contestadas pela Associação dos Juízes Federais (Ajufe) e pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).

A Ajufe repudia o rótulo de “espetáculo midiático” e diz que a Justiça Federal, o MP, a Receita Federal e a Polícia Federal agiram dentro da legalidade. A AMB diz que a Justiça tem demonstrado eficiência e independência diante do alcance das investigações.

NINGUÉM ESTÁ ACIMA DA LEI



ZERO HORA 05 de março de 2016 | N° 18465


EDITORIAL




Lula não é intocável. Até se pode questionar se havia necessidade de condução coercitiva para ouvi-lo, mas motivos para suspeitas existem de sobra.

Por mais chocante que seja ver um dos presidentes mais populares da história do país ser conduzido coercitivamente pela Polícia Federal para prestar esclarecimentos, a 24ª fase da Operação Lava-Jato, que teve como foco principal o depoimento do ex-presidente Lula, colocou em evidência dois pressupostos da democracia. O primeiro é o de que a verdade deve ser perseguida sempre – e não por coincidência a operação foi batizada de Aletheia, que em grego significa exatamente a busca da verdade. O segundo é o de que todos são iguais perante a lei – sem distinção de qualquer natureza, como reza o artigo 5º da Constituição Federal.

Nesse contexto, é perfeitamente natural que o Judiciário, a Receita Federal, o Ministério Público e a Polícia Federal estejam investigando todas as pessoas suspeitas de envolvimento com o monumental esquema de corrupção em torno da Petrobras, que vinha sendo saqueada há décadas por empresários gananciosos, servidores desonestos e políticos aproveitadores. Não é por outro motivo que já se encontram presos empreiteiros e diretores da estatal.

Lula não é intocável. Até se pode questionar se havia necessi- dade de condução coercitiva para ouvi-lo, pois, aparentemente, ele sempre se dispôs a colaborar com as investigações. Mas motivos para suspeitas existem de sobra: o sítio em Atibaia, o triplex no Guarujá, as relações promíscuas com empreiteiras que roubavam a Petrobras (e o povo brasileiro) e patrocinavam suas palestras, financiavam suas viagens e mobiliavam os imóveis que ele frequentava ou frequenta.

Lula continua sendo um orador notável. Ao se dirigir aos militantes do partido, depois de voltar do depoimento, manifestou sua indignação pelo envolvimento de familiares na investigação, enalteceu a própria biografia, lembrou as realizações sociais de seus governos, criticou a imprensa e apelou para a velha fórmula de se colocar como defensor dos pobres contra uma suposta elite exploradora. Não chegou ao extremo de convocar a militância para manifestações que possam degenerar em atos violentos, como irresponsavelmente fizeram algumas lideranças petistas ao longo do dia. Mas foi enfático na tese de que o seu interrogatório fará o PT levantar a cabeça e recomeçar sua luta pela recuperação.

Lula é convincente, mas não infalível nem inimputável. Mesmo que ele tenha sido o melhor presidente do país, como se considera, não está acima da lei. Ninguém está.


OS DOIS LULAS



ZERO HORA 05 de março de 2016 | N° 18465


INFORME ESPECIAL | Tulio Milman




Ex-presidentes deveriam ter grandeza e desapegar-se do protagonismo. Manter posturas discretas, transformar-se em referências superiores, em depósitos de bom senso e sabedoria. Cinco anos depois de cumprir seu ciclo no Planalto, Lula continua no centro do palco. Sintoma de uma distorção. Quem deixou o cargo concentra mais poder do que a sucessora indicada por ele.

Se Dilma Rousseff fosse conduzida a uma delegacia, a reação seria bem menor. A presidente está cada vez mais sozinha e seu governo agoniza, por falta de apoio interno e externo.

A viagem forçada de Lula à Polícia Federal é a rachadura mais profunda em um dos pilares que sustentam o quarto mandato consecutivo do PT na Presidência. Um pilar que já era bamba, como tantos outros que tombam, um após o outro.

Há muito me desapaixonei da política. Por isso, assisti à operação Aletheia sem taquicardia. Me anima ver que, finalmente, os homens mais poderosos do país não estão acima da lei, embora muitos ainda não tenham se dado conta. Me entristece perceber que, definitivamente, o Brasil perdeu mais uma oportunidade. Faz tempo, mas só agora nos damos conta do tamanho do estrago. A oportunidade se desenhou em 2003, quando a esperança em Lula venceu o medo. Me lembro do que ele disse: “Eu não posso errar”. Na época, fiquei impactado. Hoje, imagino um encontro daquele Lula com o Lula Lava-Jato. A roubalheira venceu a esperança.

No seu primeiro mandato, Lula galvanizou apoios e conquistas sem precedentes na história contemporânea do Brasil. Virou capa de revistas mundo afora, surfou com talento na onda de crescimento econômico. Milhões de brasileiros saíram da miséria, o povo descobriu o iogurte, o carro zero e a viagem de avião. Era a hora. Era a hora de mudar o sistema, de propor uma reforma política profunda. De terminar com os propinodutos, com as relações promíscuas entre Estado e empresas. Mas não. Lula optou por Sarney e por Maluf. Optou pelo sítio e pelo triplex, pelo caminho mais fácil. Lula errou. Errou feio. Os processos têm trâmites lentos. Sempre é bom lembrar que o ex-presidente, juridicamente, não foi condenado. Politicamente, sim.

Em vez de pixulecos, depoimentos e ameaças de briga na rua, o ex-presidente Lula deveria ser bombeiro nas crises e não o epicentro delas. Meu maior temor, neste momento, é a possibilidade de instabilidade institucional, nome pomposo para quebra-quebra, violência e intolerância. Quando o governo cair, um outro assumirá. A esta altura, é isso que me preocupa. Torço por uma solução legal e negociada. Nossa única obrigação, neste momento, é lembrar que existe amanhã.

sexta-feira, 4 de março de 2016

UM DEPOIMENTO EXPLOSIVO



ZERO HORA 04 de março de 2016 | N° 18464


EDITORIAL






Suposta confissão do senador Delcídio Amaral lança suspeitas sobre a presidente Dilma Rousseff e reativa as engrenagens do processo de impeachment.

O documento preliminar de colaboração atribuído ao senador Delcídio Amaral, uma espécie de minuta de delação premiada, lança uma grave suspeita sobre a presidente Dilma Rousseff, com potencial para reacender a fogueira do impeachment. De acordo com cópias divulgadas ontem pela revista IstoÉ, a presidente Dilma e o ex-presidente Lula teriam participado diretamente de ações para interferir na Operação Lava-Jato e para promover a soltura de empresários acusados de corrupção. A denúncia foi contestada com indignação por parte dos porta-vozes do governo, os ministros Jaques Wagner e José Eduardo Cardozo.

Ainda que o delator seja visto como uma pessoa “sem credibilidade”, como alega o ministro Cardozo em defesa própria, pois também foi acusado de atuar contra a Lava-Jato, não se pode ignorar que o parlamentar era até pouco tempo atrás o líder do governo no Senado e que realmente participava de reuniões importantes no Palácio do Planalto. Seriam desses encontros as informações que Delcídio repassou à Procuradoria-Geral da República para conquistar o direito de passar à prisão domiciliar depois de três meses de encarceramento, por ter sido flagrado articulando a fuga do réu Nestor Cerveró.

O que impressiona são os detalhes das articulações supostamente feitas pelo governo para boicotar uma investigação que, publicamente, reivindica como prova de seu comportamento republicano e democrático. A própria presidente Dilma Rousseff já disse várias vezes que em seu governo não há “engavetador- geral da República” e que os órgãos policiais e judiciais têm plena autonomia para investigar. Esse discurso contrasta com informação de que teria nomeado um desembargador amigo para o Superior Tribunal de Justiça com o propósito de facilitar os trâmites de habeas corpus e recursos dos réus da Lava-Jato.

Ainda que o senador Delcídio Amaral não reconheça o documento com suas declarações, não é crível que se trate de pura invenção, pois a própria Procuradoria-Geral da República denunciaria uma eventual fraude. Ficam, portanto, em débito com a verdade e com a nação todos os envolvidos nesse confuso duelo de versões, delações e suspeições.

quinta-feira, 3 de março de 2016

A FALÊNCIA DO ESTADO



ZERO HORA 03 de março de 2016 | N° 18463


LEANDRO DE LEMOS*



Não se trata de tema de um economista liberal, mas de fenômeno que deveria engajar todos os matizes da sociedade: o Estado como conhecemos nas últimas décadas não é mais viável. Sua dinâmica econômica e seu papel na economia precisam radicalmente ser reinventados.

Também não se trata apenas das finanças do Rio Grande do Sul, mas de praticamente todas as unidades do setor público em processo de crise: Estados, Distrito Federal, municípios e, sobretudo, a União e suas relações com aqueles. Todos encontram-se endividados, insolventes e falidos. Incapazes de pagar suas contas, de prestarem serviços básicos e de gerir minimamente seus últimos dias antes do colapso econômico que já é facilmente visível. E não é culpa do último gestor eleito, a crise é estrutural e sistêmica.

O cerne dos elementos que dão dinâmica às receitas e despesas públicas se mostrou insustentável. Somados aos períodos de expansão de endividamento, resultam na falência do setor público enquanto um subsistema econômico. Nem falo de seu papel como indutor da economia por meio de políticas públicas. O que se apresenta em termos práticos é sua própria incapacidade de funcionamento e manutenção

A equação da insustentabilidade do setor público foi estruturada em cima das seguintes variáveis: a universalização de direitos sem a previsão de fontes de recursos, a lei das licitações ineficaz contra os cartéis e como redutora de preços, as vinculações orçamentárias que impedem a gestão eficaz, a tributação irracional dos agentes econômicos, a guerra fiscal e os subsídios e isenções que deterioraram suas economias, o sistema de aposentadorias insustentável, o indexador da dívida e o pagamento de 13% da Receita Corrente Líquida de municípios e Estados e, por fim, as despesas públicas alocadas em ações desvinculadas de qualquer tipo de performance dos usuários das mesmas, mas vinculadas às pressões políticas de eleitores mimados por anos e anos de benefícios insustentáveis.

Se não desmontarmos esse círculo vicioso da falência, veremos multiplicarem-se negativamente os efeitos cumulativos da crise econômica brasileira. Ainda há tempo para evitarmos o pior, mas resta pouco.

*Economista, assessor da Pró-Reitoria de Administração e Finanças e professor da PUCRS

quarta-feira, 2 de março de 2016

A PARÁBOLA DO "SAQUEADOR" E O PAPEL DO ESTADO



ZERO HORA 02 de março de 2016 | N° 18462



ANTONIO DOMINGOS PADULA*




Estamos num momento propício para revisitar as relações e compromissos entre sociedade e Estado. Os sinais estão aí expostos: crescimento da criminalidade; deterioração dos serviços de saúde e do sistema educacional; inadimplência do Estado para com seus credores e a total impotência do Estado e da sociedade para enfrentar essa calamidade. O contrato social que levou a uma sociedade que “espera tudo” do Estado e um Estado que “promete tudo” se exauriu. Parece que a parábola do “saqueador” pode trazer contribuições para o desenho de um novo contrato social mais sustentável.

Imagine duas comunidades que passam pelas seguintes situações. A sociedade “A” é periodicamente saqueada de forma imprevisível e aleatória por bandos de vândalos que se apropriam de sua produção, suas esposas, filhos e filhas. A sociedade “B”, por sua vez, é invadida por um bando de saqueadores que decide se estabelecer e governar a comunidade, mas que se compromete a protegê-la contra a invasão de outros saqueadores que venham atacá-la. Este “saqueador permanente” exige 35% de toda a produção da comunidade (PIB). Diante das alternativas que se apresentam para essas comunidades, qual seria a situa- ção preferível para uma sociedade: saqueador “imprevisível” ou “permanente”?

Parece que a presença de um “saqueador permanente” e “protetor” apresenta vantagens significativas para uma sociedade. Assim, parece que está claro qual é o papel principal do Estado: garantir a segurança e a integridade das pessoas e dos bens da sociedade por ele governada.

Se o “saqueador permanente” agir de forma racional, ele terá forte interesse em incentivar seus “saqueados” a serem mais empreendedores e a aumentar sua produção e produtividade. Assim, o “saqueador” investirá nos sistemas educacional e de saúde para ter “saqueados” mais produtivos. À medida que a produção aumentar, o “saquea- dor permanente” poderá até reduzir a parte do PIB exigido por ele para garantir segurança, educação e saúde de qualidade para seus “saqueados” para 25% do PIB. Ao longo do tempo, um processo democrático se estabelece e o “saqueado” se torna “saqueador permanente”.

Nas diversas pesquisas de opinião da sociedade brasileira, mais ainda a gaúcha, há um claro clamor por segurança, educação e saúde (básicos). Governantes, não percam esta oportunidade para desenhar um novo contrato social!!!

*Professor titular na Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

terça-feira, 1 de março de 2016

O ESSENCIAL NEGLIGENCIADO



ZERO HORA 01 de março de 2016 | N° 18461


EDITORIAIS



A falência do poder público no Rio Grande do Sul já começa a afetar a vida da população. No retorno das férias de verão, os gaúchos deparam com a supressão ou a prestação insuficiente de serviços essenciais de responsabilidade do poder público. As carências se fazem sentir em todas as áreas básicas: saúde, educação, transporte e segurança.

As aulas da rede estadual recomeçaram prejudicadas pela paralisação dos professores, por escolas danificadas e por falhas no transporte escolar. O transporte público da Capital enfrenta incertezas devido ao impasse em torno do reajuste de tarifas. A segurança continua um caos, não passa fim de semana sem que dezenas de gaúchos percam a vida por conta de latrocínios e homicídios, ou que agências e postos bancários sejam saqueados, inclusive com o uso de explosivo. A violência afeta até mesmo o funcionamento de postos de saúde, como o da Vila Cruzeiro, agravando ainda mais os problemas no atendimento médico à população carente. Tudo isso em meio à maior crise financeira que o Estado já viveu, com salários do funcionalismo atrasados e sem perspectivas de melhora imediata.

Evidentemente, não se pode exigir que os governantes e os representantes políticos tenham soluções mágicas para problemas que se acumulam há décadas. Mas é decepcionante constatar a falta de propostas mais criativas, que não passem pela tentativa de sempre de aumentar a arrecadação onerando ainda mais o contribuinte.

QUEM É DE DIREITA?



ZERO HORA 01 de março de 2016 | N° 18461



DENIS LERRERROSENFIELD*




Poderíamos, ainda, dizer quem sabe administrar uma família, uma empresa e um governo, reconhecendo o significado das relações entre receita e despesa. Em quaisquer desses níveis, deve necessariamente haver um equilíbrio entre o que se ganha e o que se gasta, pois, se isto não for seguido, as consequências serão nocivas para todos.

Pense-se na situação de uma dona ou de um dono de casa. O responsável da família possui uma determinada renda mensal a partir da qual administra os seus gastos com alimentação, saúde, educação, habitação, lazer e impostos. Se fugir dos limites preestabelecidos e gastar para além de suas possibilidades, pode cair na inadimplência, arriscando tudo o que foi conquistado. Pode ter de vender o seu carro ou a sua casa.

Uma pessoa que agir responsavelmente estará seguindo, embora não o saiba, um preceito da direita!

O mesmo vale para uma empresa. O seu princípio é o do equilíbrio entre a sua receita e a sua despesa. Se contrai empréstimos, é para investir, criando condições de uma maior receita futura, o que aumenta os seus ganhos, também denominados de lucros. Se investir mal, terá de arcar com a sua decisão, não podendo transferi-la. No limite, pode ser obrigada a pedir falência.

Note-se que, em um caso como no outro, torna-se patente uma outra resposta possível à nossa pergunta. Ser de direita significaria ser responsável, assumindo os seus próprios atos.

Ora, a postura política de não calcular a relação entre receita e despesa e a de transferir para os outros a sua própria responsabilidade é a característica de nosso atual governo do PT ou de seus anteriores governos estaduais. O governo não consegue fechar o seu orçamento, gastando muito mais do que arrecada. É o chamado déficit primário.

A insensatez chega às raias do hilário, com o próprio PT ainda pedindo mais do mesmo, isto é, mais gastos e nenhuma redução das despesas. Desconhece os princípios mais elementares do cálculo. E chama isto de política “progressista”. Em nome do “progresso”, produz desemprego, inflação alta, queda da renda familiar e desesperança! E o espetáculo da corrupção!

Pior ainda, pretende transferir para as donas e donos de casa, para as empresas e para os cidadãos em geral, a sua própria irresponsabilidade, via criação de novos impostos, como a CPMF.

Segundo a esquerda, famílias e empresas deveriam se sacrificar em nome da irresponsabilidade alheia!

Professor de filosofia*