VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

TENHO MEDO DE LULA



ZERO HOA 28 de setembro de 2015 | N° 18308


DAVID COIMBRA




Sou dos que sentem medo da possibilidade de Lula voltar à Presidência. Admito. Seria horrível e, sim, pode acontecer. Coisas horríveis acontecem. Mais quatro anos andando para trás. Mais quatro anos de atraso. O Brasil vai demorar muito tempo para se recuperar desses governos petistas. Se se recuperar. O PT, com seu discurso de “Elite Branca x Pobres Pretos”, conseguiu instaurar no país um clima de animosidade irracional que não será desfeito tão facilmente. E o pior é que a disputa não é entre a Elite Branca e os Pobres Pretos. A disputa é bem mais rasa, entre governistas e antigovernistas. Não é disputa por ideologia. É por poder.

Lula gosta de se comparar a Getúlio, e ele tem razão. Ambos foram responsáveis por rompimentos do natural processo evolutivo da democracia brasileira. Getúlio deu um golpe num processo democrático regular que vinha desde Floriano Peixoto. Cada vez que escrevo isso, os getulistas modernos, que (assombrosamente) os há, gritam que na época havia fraude eleitoral e que a política “café com leite” revezava as elites paulista e mineira no poder. É verdade. Nenhuma democracia nasce pronta. Nenhuma democracia talvez nunca fique pronta. Prontas são as ditaduras. As democracias vão se aperfeiçoando com o exercício democrático, que não é só exercício do voto, é o exercício da convivência das diferenças.

É por isso que o impeachment de Dilma, se aprovado, será um golpe. Porque ainda não há provas provadas, sólidas o bastante, contra ela. Arranjem provas primeiro, para depois derrubá-la, se for o caso.

Aliás, quanto a isso, há um elogio que deve ser feito a Dilma: seu comportamento é absolutamente respeitoso com a democracia. Por mais acuada, por mais agredida, por mais ameaçada que esteja, ela nunca deu uma única declaração que arranhasse a normalidade da regra democrática, como Lula faz amiúde.

Natural. Lula está muito mais comprometido com o projeto de poder do seu grupo do que Dilma. Afinal, o grupo é DELE. Ele é o capo de tutti capi. Foi nessa condição que Lula golpeou a democracia brasileira, embora de forma muito menos contundente do que Getúlio.

O método foi quase o mesmo.

Externamente, Getúlio se associou aos ditadores da época, como Perón. Tentou até se consorciar a Hitler e Mussolini, mas foi dissuadido pelos dólares americanos. Já Lula se associou aos cubanos, à Venezuela, à Argentina.

Internamente, Getúlio fundou o peleguismo sindical. Que é um dos pontos de apoio de Lula.

Lula conseguiu chegar ao poder pelo voto, como Getúlio em 1950. Lula começou bem, com a ampliação do Bolsa Família e a manutenção da política econômica estabelecida pelo Plano Real. A impressão era de que o Brasil havia entrado num caminho de melhora sistemática e de possível solução de seus dramas históricos.

Aí se deu a traição. Nesse momento. Um presidente operário, simpático à população, com prestígio em todo o mundo, comandando um país com economia em ascensão, com uma indústria diversificada e uma agricultura poderosa, esse presidente e esse país podiam empreender as difíceis e necessárias reformas da escola pública, dos sistemas federativo, tributário, previdenciário e penal, poderiam, com muito esforço e pouco sacrifício, construir uma nação.

Mas Lula tinha o seu projeto particular. Tinha o seu grupo. Foi a eles que Lula dedicou seu empenho. E o Brasil ficou para trás. Esse tempo perdido não será recuperado sem dor. O Brasil perdeu muito por causa de Lula. E o pior nem foram as perdas na economia e na política. O pior foi a perda de esperança.

Sim, tenho medo de Lula. Não, não quero que ele volte. Nunca mais.

A CIDADE DE PORTO ALEGRE SABE PLANEJAR?




ZERO HORA 28 de setembro de 2015 | N° 18308

ITAMAR MELO

A CIDADE SABE PLANEJAR?


PRAZOS PERDIDOS, OBRAS que nunca ficam prontas, projetos com erros básicos e mudanças de rumo geram críticas à prefeitura


Porto Alegre: uma nova avenida termina em um muro, porque não se previu o que fazer com uma fábrica que estava no caminho. Uma ciclovia recém-construída por um setor da prefeitura é destruída por outro, que faz uma calçada no lugar – e os dois órgãos sustentam que não houve nenhuma falha nos planos. O serviço de parquímetros fica dois meses sem funcionar, já que a licitação que deveria ter sido feita não aconteceu.

Situações como essas, que levantam questões sobre a capacidade de organizar e planejar do município, dão-se em diferentes esferas, desde as mais prosaicas, como a escolha de um guarda- corpo para uma ciclovia, até as de grande ambição – projetos como o BRT e o metrô. Em episódio recente, Porto Alegre sofreu risco de ficar sem o BikePoa, serviço público de aluguel de bicicletas (leia nas páginas a seguir).

Prazos perdidos, obras que nunca ficam prontas, projetos com erros básicos e mudanças repentinas de rumo estão entre os problemas que geram críticas à condução dos projetos na cidade.

– Tem muito amadorismo na prefeitura. No caso das obras da Copa, que eu conheço, os projetos de mobilidade deveriam estar planejados antes, mas a prefeitura saiu a fazer tudo em um período curto. Eles trabalham em cima de verba. Arrumam dinheiro federal e saem atrás do que fazer com o recurso. Planejam na hora de construir, na corrida. Daí, sai bobagem – diz o engenheiro Paulo de Tarso Dutra, que trabalhou em alguns dos projetos que apresentaram problemas.

Para discutir se há falha no planejamento feito pelo município, ZH selecionou um conjunto de projetos recentes e encaminhou questionamentos às secretarias e órgãos municipais responsáveis. Foram enviadas as mesmas cinco perguntas: o que se fez para solucionar o problema, por que o problema aconteceu, qual o prejuízo, quem foi o responsável pela falha e se houve alguma punição pelo erro. Na maioria dos casos, os gestores públicos preferiram ignorar as questões enviadas e remeteram uma resposta genérica. Em geral, não reconheceram erros e não apontaram responsabilidades. Aparentemente, nenhum servidor público sofreu penalização. ZH também pediu, várias vezes ao longo do mês, uma entrevista sobre o tema com o prefeito José Fortunati, mas não foi atendida.

ÂNSIA DE DIVULGAR FUTURAS REALIZAÇÕES GERA EXPECTATIVAS

Os projetos abordados nesta reportagem e as correspondentes respostas da prefeitura foram submetidos ainda a especialistas em planejamento e administração pública. O engenheiro Thiago Regal, presidente no Estado do Project Management Institute (PMI), instituição especializada em gerenciamento de projetos, afirma que é difícil dar um parecer sem enfronhar-se nos detalhes, mas não tem dúvidas de que ocorreram erros:

– Os projetos claramente tiveram problemas graves, ou não chegariam ao desfecho que tiveram. Quando muitos mostram problemas, pode ser um indicativo de que tem algo consistentemente errado. Para mim, o grande problema é que não existe uma cultura de que, para fazer um projeto, tem de usar ferramentas de gestão de projetos.

Melvis Barrios Junior, presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea/RS), identificou deficiências de planejamento, gestão e fiscalização:

– Com certeza, há falhas. Às vezes, um somatório delas. Temos muito político, pessoa sem conhecimento, fazendo gestão de áreas de infraestrutura, quando deveriam existir mais profissionais nessa função. Para minorar os riscos, é preciso um planejamento eficiente.

O professor Diogo Joel Demarco, do curso de Administração Pública e Social da UFRGS, ofereceu um diagnóstico que considera válido, ao menos, para grande parte dos projetos elencados:

– Evidenciam-se problemas que afetam as dimensões básicas da administração pública: planejamento, orçamento, gestão e controle. Agregaria mais uma dimensão: a participação da sociedade organizada na formulação, implementação e controle das ações públicas.

Como antídoto, Demarco apresenta algumas recomendações. Sugere a “recuperação da capacidade estatal da prefeitura”, com o fortalecimento de quadros técnicos, e propõe a criação de mecanismos de diálogo e coordenações entre os diversos órgãos responsáveis pelo planejamento e implementação dos projetos. Além disso, defende um “cuidado maior na divulgação” pelo poder público. Na avaliação dele, os gestores, na ânsia de apresentar futuras realizações, geram “expectativas distantes de serem cumpridas, pois são oriundas de ideias ou desejos que, quando muito, estão alicerçados apenas em projetos básicos, sem os devidos estudos e projetos executivos”.



ENTREVISTA - “Fazer discussão ampliada permite evitar erros”

ALVARO GUEDES - Professor de Administração Pública na Universidade Estadual Paulista (Unesp)



Doutor em Administração Pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e autor de uma série de livros sobre o tema, o professor Alvaro Guedes avaliou os problemas ocorridos nos projetos tratados nesta reportagem e as respectivas respostas oferecidas pela prefeitura de Porto Alegre.

É possível chegar a uma conclusão a partir dos problemas elencados nos projetos?

Mesmo eu, que sou de fora, consigo visualizar bem a questão. Se você desenvolve uma ação pública sem o chamado controle social, essa ação fica vulnerável a esses erros. Quando o processo de decisão sobre como conduzir a gestão pública tem um mínimo de legitimidade, questões como essas são facilmente evitadas. Fazer uma discussão ampliada, em que atores específicos são chamados a opinar, permite evitar problemas simples, como aquele da avenida que termina no muro da Taurus (Avenida Grécia).

Como se faz esse controle social?

Depois de olhar o material, estou seguro no que vou afirmar: você não consegue conduzir a cidade sem um envolvimento maior das forças vivas do local. Todas essas ações listadas são para promover o desenvolvimento urbano. Se você tivesse uma espécie de conselho municipal de desenvolvimento urbano, onde estivesse o Exército, o Crea, a associação dos arquitetos e representantes da população, se esse atores fossem ouvidos, seguramente nenhum desses erros apontados teria sido cometido, porque são erros de viabilidade de projeto.

O que é a legitimidade de que o senhor fala?

É a legitimação das intenções. Quando uma proposta é negociada amplamente, você consegue fazê-la fluir com rapidez. Dou um exemplo. O Banco Mundial, quando está com intenção de fazer um determinado investimento, gasta muito mais tempo na formatação do projeto do que na execução. Porque você antecipa os problemas.

Em alguns casos, houve serviços interrompidos porque a prefeitura não fez a licitação a tempo. Esse não é um problema de solução simples?

É questão de se planejar. Mas vamos ver a coisa mais de fundo. É possível fazer um edital que evite dificuldades. O que é um edital que evite dificuldades? É um edital que esgote bem a intenção do que se pretende fazer. Você sempre tem problemas quando o edital é dúbio, é lacunar. Quando o edital é bem formulado, dificilmente ocorrerá algum problema.

No caso do transporte público de Porto Alegre, primeiro a grande aposta eram os Portais da Cidade. Depois, virou o BRT. Em seguida, tirou-se o BRT da Assis Brasil para dar lugar ao metrô. Agora não se sabe se vai sair o metrô e não há projeto para a Assis Brasil. O que essas idas e vindas revelam?

O que você acabou de descrever mostra que a contingência, o momento, redefine todo o processo. Se você não tem um mínimo de consenso para saber o que vai ser necessário, vira essa função errática. Qualquer uma dessas propostas, em princípio, seria viável. Mas como você tem uma indefinição, no sentido de qual seria melhor, fica pulando de um galho para o outro, conforme a contingência: vai ter a Copa e vão liberar dinheiro? Ah, então para tudo e vamos fazer outro projeto. E acaba não fazendo bem feito. Pior ainda: não faz nenhuma obra.

Falta convicção sobre aquilo que precisa ser feito?

Sim. Porque você está tomando decisão de gabinete, isolada. Quando você toma decisão isolada de gabinete, você muda de ideia com tremenda rapidez. Uma coisa é discutir como faremos e como deixaremos de fazer. Outra coisa é, a cada ano, pensar numa alternativa, todas elas mirabolantes. Por que isso acontece? Porque existe uma decisão isolada. E essa decisão é facilmente influenciável por interesses escusos, inclusive.

Outra questão recorrente é o anúncio de prazos que depois se revelam fantasiosos. O que explica esses erros?

Não se explica o inexplicável. Alguém está te vendendo gato por lebre. Não tem erro, é alguém que está te fraudando mesmo, está tentando te dizer uma coisa que não existe. E aí eu volto àquela história: o que temos no serviço público? Escassez de recurso. Então, não dá para ficar errando. As coisas têm de ser bem elaboradas. A fórmula é simples. Empresa japonesa faz reunião para ratificar uma coisa que já foi amplamente discutida. Documentos circularam na mão de um monte de gente. Quando você entra (na reunião), todo mundo está bem informado, há uma série de opiniões que são quase consensuais. Então é só bater martelo. Agora, quando você tem uma reunião para bater o martelo sem discussão prévia, a chance de erro é maior. O que aconteceu? Você não antecipou certas perspectivas. Como é que você minimiza risco? Ouvindo especialistas, ouvindo opiniões contrárias. Aí, você soma para formar o juízo.

Chama a atenção que, quando questionamos os órgão municipais, eles não reconheceram erros e não apontaram nenhuma punição pela falhas. Isso é ruim?

É um sintoma péssimo. Uma discussão que está muito forte na literatura de administração pública é a chamada accountability, que é a responsabilização. Desde os anos 1980, isso tem sido discutido. Quem foi que errou? Ele tem de ser responsabilizado pelo erro, sim. O Estado não é um ser etéreo. O Estado é composto por agentes públicos. Se ele, em nome do Estado e como agente público, age de forma indevida e causa o erro e o prejuízo, tem de ser responsabilizado. Voltando à tua reportagem: de quem é a responsabilidade pela falha? Aparece o tempo todo: não foi respondido, não foi respondido. Isso é um absurdo! Como que não foi respondido? Isso também é fácil de resolver. Quando você tem um projeto em andamento, você designa um gerente desse projeto. Ele vai responder pela execução do projeto.

domingo, 27 de setembro de 2015

FAÇANHAS DE SETEMBRO



ZERO HORA 27 de setembro de 2015 | N° 18307


FLÁVIO TAVARES*



O governador Sartori não provocou a situação de penúria e caos das finanças públicas do Rio Grande do Sul e não deve ser culpado por isto. Nossa decrepitude é antiga. Desde 31 de janeiro de 1963, fim do mandato de Leonel Brizola, deslizamos num despenhadeiro. Com os governadores nomeados da ditadura, cresceu a burocracia inútil e a pasmaceira nos dominou. Criaram dezenas de “empresas estatais” (ou “cabides de emprego”) e, até para bocejar, pedia-se licença ao Estado.

O caos surgiu num processo lento. Mas...

A culpa grave de Sartori foi ter disputado a eleição de 2014 como se jogasse na Mega Sena. “Se der, deu. Se não der, nada perco”, terá sido o raciocínio inconsciente do candidato do PMDB. Sem propostas concretas, na campanha eleitoral limitou-se a repetir “meu partido é o Rio Grande”, milhões de vezes.

Na boa-fé o eleitor acreditou, e a invencionice de 2014 virou mentira em 2015.

O candidato Sartori não buscou conhecer a situação do setor público e privado do Estado. Nos dois anos anteriores à eleição, Ana Amélia percorreu o interior mais até do que o governador Tarso Genro, indagando e debatendo. Ambos tinham, pelo menos, ideias concretas (opostas ou não) sobre o Rio Grande. Sartori falava, apenas, da gestão como prefeito de Caxias, município exemplo de tenacidade há mais de cem anos, muitos antes de que ele nascesse...

A culpa imperdoável do governador nasceu da irresponsabilidade do candidato, que nem sequer apalpou o que teria nas mãos ou o que pisaria com os pés.

Agora, a insolvência do poder público rio-grandense (entregue à manipulação de políticos demagogos) ameaça transformarse em caos. Na cúpula dos três poderes do Estado, porém, não há qualquer medida criativa para enfrentar o monstro.

Aumentar impostos é como dar uma punhalada para estancar a hemorragia. A insensatez do governador e seus auxiliares não pode ser imitada pela inércia demagógica dos deputados nem pela “neutralidade” do poder judicial. Além de renunciar a privilégios, cabe aos três poderes criar saídas para sair do labirinto que leva ao caos. E se o poder judicial (esteio das instituições do Estado) desse o exemplo, e juízes, procuradores e demais aquinhoados renunciassem ao absurdo “auxílio-moradia de R$ 4.600 e ao “auxílio-alimentar” de quase um salário mínimo? Não é este o setor melhor remunerado? É justo que, no Executivo e no Legislativo, persistam remunerações altíssimas, além do teto que manda a lei?

Crise é crise e exige renúncia àqueles nos quais o sacrifício pesará menos. Sacrificar os já sacrificados é santificar a injustiça.

Vimos pela TV, dias atrás, o absurdo de uma escola do interior que teve de suprimir papel higiênico para alunos e professores por “falta de verba”. Noutras, já não servem às crianças a merenda escolar, que nasceu entre nós e, daqui, se espalhou pelo país.

Dias atrás, os nove governadores eleitos a partir do fim da ditadura expuseram, neste jornal, suas ideias sobre a crise gaúcha. De Jair Soares (que conduziu a transição nos difíceis anos em que o poder autoritário ainda mandava em Brasília) até Sartori, todos, em maior ou menor grau, desconheceram que seus atos de ontem continuam a repercutir ainda hoje. E que, em parte, seus erros também nos governam.

Também vimos a Brigada Militar (depositária armada do espírito da República Rio-Grandense) espancar professores em plena Praça da Matriz, defronte ao Palácio Piratini, com uma ferocidade não utilizada sequer contra assaltantes que roubam idosos nas ruas. Tudo para impedir que entrassem à Assembleia Legislativa, “a casa do povo”... E tudo isto, em setembro, mês farroupilha, quando nossas façanhas deviam servir de modelo a toda terra!

Jornalista e escritor

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

DESARMANDO BOMBAS



ZERO HORA 24 de setembro de 2015 | N° 18304


EDITORIAL



Ao manter 26 dos 32 vetos da presidente Dilma a projetos que desagradam ao governo e ampliam os gastos públicos, o Congresso começa a desarmar as chamadas pautas-bomba, que fatalmente encaminhariam o país para uma crise ainda mais profunda do que a atual. Falta, ainda, votar o polêmico reajuste dos servidores do Judiciário e a extensão a todos os aposentados do índice de correção do salário mínimo. Ainda assim, ao evitar um aumento considerável de gastos, o Congresso enfraquece a defesa do Planalto para a necessidade de criação de mais impostos, incluindo a insistência na volta de um tributo inaceitável como a CPMF.

Infelizmente, mesmo o que poderia ser visto com um sinal de maturidade do Congresso e de rearticulação do Executivo acaba se prestando para escancarar a falta de coerência na política, que ajuda a explicar muito do impasse enfrentado hoje pelo país. De alguma forma, o fato de o Planalto ter conseguido evitar um impacto bilionário nos gastos só ocorreu depois do aceno de espaços generosos para políticos da base de apoio parlamentar na nova equipe ministerial. E, na oposição, parlamentares historicamente identificados com a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) insistiram na defesa de medidas incompatíveis com um país em processo de ajuste nas contas.

Como advertiu ontem o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, ampliação de despesas, na atual situação do país, significa mais impostos. Por mais que algumas das mudanças em debate sejam justas, quem acaba pagando a conta é o contribuinte. Por isso, é importante que, na votação das questões ainda pendentes, os parlamentares deixem de lado interesses menores e votem a favor da maioria dos brasileiros.

PORRES DE IRRESPONSABILIDADE

 

ZERO HORA 24 de setembro de 2015 | N° 18304



POR MARCELO RECH*




Um dos mais experientes observadores do Congresso, o ministro Eliseu Padilha diz que, nestes tempos em que lideranças não sabem com quem contar em seus partidos, “nem vaca reconhece bezerro”. Aliás, nem os eleitores, porque os parlamentos se transformaram em oceanos de irresponsabilidade assolados por vagalhões de contradições demagógicas. O bem comum foi para o brejo e deu lugar à disputa insana pelo poder. Desgastar os governos, mesmo às custas do suicídio coletivo de Estados e da União, passou a ser a palavra de ordem que move grande parte dos votos nos plenários.

Seja aumento de impostos ou contenção de despesas, linhas ideológicas que votam contra em Brasília votam a favor no Rio Grande do Sul, e vice-versa, porque identificam na presidente ou no governador um adversário a ser destruído, desmoralizado, arrasado sem piedade, mesmo que o desejo de sangue político leve a economia e o povo de roldão. Coerência zero. Com saudáveis exceções, os parlamentares desfilam para as arquibancadas neste Carnaval do populismo, distantes da maioria silenciosa que alimenta o rancor em casa e volta e meia o destampa em grandes manifestações.

Em democracias maduras, o parlamento fiscaliza e obstruí os gastos públicos. Cada proposta de despesa é esquadrinhada em comissões e espremida até ser derrubada ou finalmente seguir em frente. Os eleitores desses países valorizam quem defende seus impostos com ardor e rejeitam vendedores da ilusão de que dinheiro público jorra de uma fonte mágica. Em suma, em ambientes de responsabilidade fiscal, o Executivo tenta executar novos programas e gastar mais, enquanto os parlamentares se esforçam em travar desperdícios.

Por aqui, nem uma coisa, nem outra. Só agora, depois de exaurir as burras estatais em farras de reajustes, benesses e juros de dívidas contraí- das para pagar os reajustes, as benesses e mais dívidas, os governos federal e estaduais estão começando a acordar para a realidade do aqui se faz, aqui se paga. O porre de hoje é a ressaca de amanhã, mas os parlamentos ainda vivem embriagados pela noção de que perderão eleitorado se disserem não aos excessos. O resultado é que a classe política toda, com levianos e responsáveis misturados, acaba como alvo do rancor generalizado. Mas é preciso abrir o olho antes que seja tarde: os que aplaudem agora o extermínio de governos pela via da bancarrota não se levantarão depois para defender os parlamentos irresponsáveis.

*Jornalista do Grupo RBS marcelo.rech@gruporbs.com.br

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

OS SABOTADORES DO BRASIL



ZERO HORA 23 de setembro de 2015 | N° 18303


DAVID COIMBRA



A ideia de que as maiorias têm poder é falsa, mesmo numa democracia. As minorias mandam, Minorias articuladas, naturalmente.


As maiorias querem viver em paz, não se mobilizam, salvo casos extremos, como na Revolução Francesa. Mesmo assim, a maioria dos cidadãos franceses se cansou do Terror que se seguiu à Revolução. Tanto que, poucos anos depois, um novo monarca arrancava a coroa das mãos do papa e coroava-se a si próprio na Notre-Dame de Paris.

Para se manter no poder e oprimir as maiorias, os grandes tiranos da História sempre se valeram de minorias organizadas e, em geral, violentas. Quando não fanatizadas.

A Revolução Russa foi desencadeada por um descontentamento geral parecido com o da Revolução Francesa, mas, como na Revolução Francesa, logo deixou a população exausta e desejosa da volta à suavidade da rotina dos dias. Os russos e demais povos agregados, assim, submeteram-se tristemente a um dos maiores carniceiros da História, o ditador de aço, Stálin. Processo semelhante ocorreu na China, no meio do século 20. Controlando alguns milhares, Mao matou milhões. Quando lhe perguntaram se lamentava o morticínio, respondeu que a China tinha uma população tão grande, que suportaria o sacrifício.

O poder das minorias sólidas é imenso.

Hoje, 50 pessoas param Porto Alegre.

Hoje, 300 deputados param o Brasil.

A oposição é parte indispensável de uma democracia saudável. Mas não o tipo de oposição que se faz no país.

No Rio Grande do Sul, desde a semana passada havia uma minoria ansiando pelo confronto com a polícia, trabalhando pela promoção de cenas iguais às ocorridas no Paraná no começo do ano, quando a PM bateu nos professores. Queriam que gente saísse da Assembleia sangrando e gritando contra a truculência do governo repressor. Essa é a prática das oposições no Rio Grande do Sul, uma oposição que não se importa se o que está sendo feito é bem ou malfeito, porque para ela só importa que não seja feito.

O projeto de Sartori é bom ou ruim? Não sei. Não o analisei em profundidade para dizer. Mas posso dizer que os que foram para a Assembleia armados ou dispostos a “quebrar para entrar”, como gritavam ontem, foram, exatamente, para criar um “fato político” que expusesse o governo, o atrapalhasse e, de preferência, o paralisasse. A derrubada do projeto tornou-se quase irrelevante. Queriam desgastar o governo.

Assim em Brasília. O que os deputados federais, inclusive alguns da base governista, estão fazendo? Estão inviabilizando o país. Estão sabotando o Brasil. Chegaram a aprovar um aumento de 57% nos salários do Judiciário, um acréscimo de despesas de mais de R$ 100 bilhões em três anos, para anular a economia proposta por Levy. Que tipo de oposição é essa?

Todos os projetos de Dilma serão rejeitados. Todos. Porque são ruins? Não. Porque, para os opositores, é importante que Dilma não tenha outra saída que não a renúncia. Empresas estão falindo, trabalhadores estão sendo demitidos, os brasileiros estão sofrendo, mas isso não interessa para eles. Interessa é que Dilma se veja diante do impasse de ter de renunciar para que o país volte a funcionar. E é o que acabará acontecendo. Tudo pelo poder. Algumas minorias podres. É o que basta para apodrecer todo um país.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

O BRASIL SEMPRE FOI LIBERAL



ZERO HORA 22 de setembro de 2015 | N° 18302


DAVID COIMBRA




É verdade que você não pode comparar a gestão do Estado com a gestão de uma empresa. Uma empresa não tem de produzir bem-estar (a não ser que seja uma fábrica de cerveja!).

O Estado, sim.

Esta, aliás, é a principal função do Estado: dar aos cidadãos condições para que vivam em segurança, com justiça e com igualdade de oportunidades, para que possam alcançar o bem-estar social.

A gestão do Estado talvez deva ser comparada à de uma família. A função da família é parecida. Por isso, não se podem cobrar lucros do Estado ou da família. Até com pequenos prejuízos é possível que ambos sejam bem-sucedidos.

O problema é quando a suposta promoção do bem-estar se torna tão dispendiosa que afeta todo o funcionamento da organização gerenciada. Os provedores da família ou os governantes gastam tanto, que não lhes sobram recursos nem para o básico. A família passou as férias nas Ilhas Maldivas, gastando à grande com o dólar batendo nos R$ 4, e agora, na volta para casa, não há dinheiro nem para o supermercado.

Foi mais ou menos o que aconteceu com o Estado brasileiro. O governo gastou mais do que podia. Todo mundo sabe disso, todo mundo já sabia disso antes de 2015, isso foi algo discutido de sobejo e negado de sobejo pelo governo. Dilma é atrapalhada, tem seus defeitos, mas não é a única responsável por esta situação. Lula já vinha gastando prodigamente desde 2002. A cada ano, mais ministérios. A cada ano, mais funcionários. A cada ano, mais programas de bondades.

Então, fico pensando: que história é essa de “modelo neoliberal”? Quando é que o modelo econômico do Brasil não foi neoliberal? O modelo de Lula era igualzinho ao de Fernando Henrique, tanto que o famoso “Mercado” o elogiava por isso. Nunca os bancos ganharam tanto dinheiro. Nunca os empreiteiros ganharam tanto dinheiro. Nunca a indústria automobilística ganhou tanto dinheiro. Justamente a indústria automobilística, com a qual Lula negociava, quando sindicalista.

Brizola vivia dizendo que Lula e Fernando Henrique iriam “se acotovelar para implantar o modelo neoliberal”. E ele tinha razão. Se Brizola faria melhor, se outro modelo seria mais adequado, isso não sei. Mas sei que Lula e Fernando Henrique não foram muito diferentes, economicamente falando. O que aconteceu foi que Lula começou a gastar mais do que podia, e Dilma continuou gastando. Essa, a causa. Agora estamos vivendo as consequências.


Qual é a fórmula?

Dilma, tanto quanto Sartori, acredita que, para um Estado que gasta mais do que arrecada, a saída é gastar menos e arrecadar mais. Tem lógica.

Dilma, tanto quanto Sartori, quer aumentar impostos e cortar despesas.

Quem os critica, critica o “modelo neoliberal”.

Certo.

Mas qual é a alternativa?

Não estou fazendo uma pergunta retórica. Gostaria mesmo que me dissessem o que pode ser feito, além do que é proposto.

sexta-feira, 18 de setembro de 2015

APROVADA NOVA PREVIDÊNCIA RS



ZERO HORA 17 de setembro de 2015 | N° 18297


CARLOS ROLLSING


PLENÁRIO BLINDADO. EM SEQUÊNCIA DE VOTAÇÕES, governo Sartori conseguiu aval para pacote de ajuste fiscal, inclusive para medida que limita aposentadorias, principal foco da batalha com o funcionalismo.



Considerada pelo governador José Ivo Sartori a sua principal contribuição para o futuro, a previdência complementar no serviço público estadual foi aprovada ontem pela Assembleia Legislativa com 35 votos favoráveis e apenas cinco contrários, em dia marcado pela tranquilidade governista para alcançar seus objetivos. Na sessão, convocada de forma extraordinária, ainda foram acatadas outras sete propostas do pacote do Palácio Piratini. Nas duas últimas votações, quando percebeu que seria derrotado ao propor a extinção de duas fundações, os aliados retiraram o quórum e evitaram o revés.

A reunião ocorreu a portas fechadas, sem a presença de servidores públicos nas galerias. Do lado de fora, a Brigada Militar e dezenas de gradis isolavam o Palácio Farroupilha e impediam a aproximação de manifestantes contrários ao pacote. O vazio do plenário, o cerco à Casa e a convocação da sessão foram decisões do presidente da Assembleia, Edson Brum (PMDB), em resposta ao ato de servidores que, na terça-feira, bloquearam os acessos do Legislativo e impediram votações.

Nesse cenário, a oposição rachou. As bancadas de PT e PSOL, em protesto contra a ausência de público, optaram por se retirar do plenário. Também não haveria votos suficientes para derrotar o governo na maioria das discussões. Já PC do B e PTB decidiram ficar para fazer o contraponto.

– Vamos sair por conta dessa represália aos servidores e para não legitimar essa prática antidemocrática – anunciou o líder do PT, Luiz Fernando Mainardi.

Ele acrescentou que a Assembleia estava “sitiada” pela Brigada Militar e considerou “desnecessária” a adoção da previdência complementar. Sem o PT em plenário, a mais numerosa e experiente bancada de oposição, os governistas navegaram em águas calmas, enfileirando a aprovação de oito dos 10 projetos.

Na votação das últimas duas propostas, a extinção de fundações, a bancada do PDT, mesmo governista, informou que votaria contrariamente. A base fez as contas e percebeu que seria derrotada. Líder do governo, Alexandre Postal (PMDB) pediu verificação de quórum, e os aliados não registraram presenças, derrubando a votação e evitando a derrota. Antes disso, Juliano Roso (PC do B) chegou a telefonar à bancada do PT pedindo o retorno dos seus parlamentares. Somados ao PDT, eles poderiam garantir o quórum mínimo e rejeitar as extinções. Mas o PT não voltou. O governo admite possibilidade de retirar o regime de urgência das proposições que extinguem as fundações.



ENTENDA O REGIME COMPLEMENTAR
O que foi aprovado?
A proposta determina que os futuros funcionários públicos se aposentarão com salários limitados ao teto do regime geral da Previdência – aplicado aos trabalhadores da iniciativa privada –, hoje de R$ 4,6 mil. Para receber mais, terão de fazer contribuições extras.
Futuros funcionários de quais órgãos e poderes serão atingidos pela lei?
Executivo, Assembleia, Judiciário, Ministério Público, Tribunal de Contas e Defensoria Pública. A lei só terá efeito para aqueles que ingressarem no serviço público após a instituição da Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público (RS-Prev), o que ocorrerá no momento em que for emitida a autorização da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc).
Como ficam os funcionários atuais?
Para eles, seguem as mesmas regras. Quem ingressou no serviço público até 1998, tem garantida a aposentadoria integral, com o valor do último salário, o mais alto da carreira. Para quem se tornou servidor depois disso, o benefício é calculado de acordo com uma média de salários da carreira, conforme determinação de duas emendas constitucionais.
Que percentual será pago pelo servidor até o limite do regime geral da previdência?
Seguirá contribuindo com 13,25% previsto na legislação atual. Os trabalhadores do setor privado descontam de 8% a 11%.
Como fica a idade mínima para a aposentadoria?
As regras gerais da Previdência não mudam e valem para todos.
De quanto serão as alíquotas da previdência complementar?
Elas incidirão sobre a quantia salarial que ultrapassar o teto de R$ 4,6 mil. O servidor poderá escolher a sua alíquota e, como o regime será paritário, o Estado fará uma contribuição de igual valor. A única condição é de que a alíquota se limite a 7,5%. O que exceder esse patamar não terá contrapartida do governo.
Aposentado pode aderir ao RS-Prev?
Não. Nesses casos, a pessoa segue recebendo mensalmente sem nenhuma alteração.
Como será calculado o benefício assegurado pelo Estado?
De acordo com a Constituição Federal, a previdência complementar devolverá ao servidor os recursos recolhidos por ele e pelo Estado no RS-Prev. O valor do benefício não é previamente definido, pois dependerá dos aportes ao longo do tempo e dos rendimentos do fundo.
Quando começar o sistema de previdência complementar, os servidores novos já saberão quanto irão receber no futuro?
Não. É um plano de contribuição definida, e não de benefício definido. No final da carreira, o servidor terá direito a receber conforme o montante das suas contribuições e dos rendimentos. Como o funcionário receberá somente dentro do limite dos seus pagamentos, o Piratini acredita que o modelo não terá risco de entrar em déficit.
Haverá tempo mínimo de contribuição para a complementar?
É possível que sim, mas isso será definido apenas depois da instituição do RS-Prev e elaboração do regulamento.
Cada poder terá um fundo próprio?
A lei prevê que cada poder e órgão crie o seu próprio fundo, mas isso dependerá da viabilidade. Órgãos com menor quantidade de funcionários podem considerar desinteressante ter um fundo próprio, pois há risco de não haver fluxo suficiente de dinheiro para garantir bons rendimentos e pagamento das taxas de manutenção. A lei prevê que todos os poderes podem se agregar ao RS-Prev do Executivo.
Como será a gestão do RS-Prev?
Haverá um conselho deliberativo, integrado por até seis membros, e conselho fiscal, com até quatro membros. A participação será paritária entre representantes eleitos pelos servidores e indicados pelo Estado. A gestão dos recursos poderá ser própria ou mista, com alocação de parte dos ativos no mercado financeiro. Poderão ser oferecidas diferentes modalidades de investimento dos recursos, com divisão entre fundos conservadores e agressivos. O servidor poderá escolher.
O que acontece com o Fundoprev, criado no governo Tarso?
Continua operando normalmente. Pelo sistema, os servidores que ingressaram na carreira a partir da sua criação pagam 13,25%, contribuição que fica depositada nesse fundo, que fará pagamentos no futuro. Os servidores mais antigos continuam sendo pagos pelo Tesouro. A partir da aprovação do RS-Prev de Sartori, os novos servidores serão vinculados ao Fundoprev para receber a aposentadoria básica, até o teto de R$ 4,6 mil. Para ganhar mais, terão de pagar a previdência complementar de forma opcional.
E quem entrou depois da lei aprovada por Tarso e antes da instituição do RS-Prev de Sartori?
Seguirá as regras já existentes desse modelo. Embora tenham sido criados dois fundos, permaneceu o mesmo modelo de contribuição de 13,25% dos servidores e o Estado como garantidor dos benefícios. O servidor receberá com base na média das contribuições.

A INFÂNCIA POLÍTICA DO BRASIL


Deputados do PT e do PSOL deixaram plenário da Assembleia e foram para a Praça da Matriz
ZERO HORA 18 de setembro de 2015 | N° 18298


DAVID COIMBRA




Já houve políticos adultos no Brasil. Ou talvez o Brasil todo fosse mais adulto, não sei. Talvez a infância da nossa democracia nos tenha infantilizado. Ter de lidar com essa novidade, que é o exercício integral da cidadania, nos atrapalhou.

Hegel diria que é um processo dialético: surge uma tese e, em reação, é apresentada uma antítese. A antítese, como diz o nome, é o oposto da tese. Elas se confrontam e, desse embate, é formada uma síntese, que é o meio-termo entre as duas: mais do que a tese, menos do que a antítese. Só que essa síntese se transforma em nova tese, contra a qual aparece uma nova antítese, e da luta entre as duas nasce outra síntese, que vira mais uma tese. Dessa forma o mundo evoluiria, segundo a dialética.

O problema é que do enfrentamento nem sempre decorre a evolução. Às vezes, anda-se para trás.

Em qualquer sociedade, a involução se dá quando as regras são quebradas. Você perde o critério e, perdido o critério, não tem mais parâmetros, não tem mais rumos.

Os brasileiros decidiram que queriam viver sob uma República democrática, e assim foi do final do século 19 até o ano 30 do século 20, quando do golpe de Vargas. As tentativas de derrubar Dilma, hoje, são reflexos daquele golpe de 85 anos de idade. Porque, naquele momento, a regra democrática foi quebrada e, se é quebrada uma vez, pode ser quebrada sempre. Essa é a lógica dos seres vivos. Até os cachorros precisam de critérios. Se você os cria sem critérios, eles se confundem.

Desde o exemplo de Vargas, os brasileiros vivem tentando quebrar as regras. Quando os militares as quebraram, em 1964, o fizeram com força inédita e, assim, mantiveram-se no poder por ainda mais tempo do que Vargas. O Brasil, então, vivia a tese do autoritarismo, da repressão, da dureza da caserna. A antítese foi a Constituição de 1988, uma Constituição liberal e humanitária, ideal para uma Suécia, só que aplicada a um Brasil.

Do autoritarismo passamos à leniência. Antes, nada podia; agora, tudo pode.

E o Brasil tornou-se um país de libertários, quase anarquistas, em que ninguém se compromete com os deveres e todos estão sempre prontos a cobrar os direitos.

De quem se cobram os direitos? Do Estado. Dos governos. De quem mais?

Então, quando um partido está no governo, vê-se na pedregosa exigência de ser responsável. Só que, do outro lado, encontram-se oposições manhosas e birrentas, como se ainda estivessem esperneando contra a ditadura, quando qualquer travessura virava heroísmo.

Criou-se um padrão na política brasileira: um grupo tenta crescer ao diminuir o opositor. Não se faz nada de bom no lado de cá, apenas se mostra o que existe de ruim no lado de lá. A oposição não critica para corrigir, critica para destruir.

Se no Brasil inteiro é assim, no Rio Grande é pior. A marcha dos deputados de oposição, saindo da Assembleia durante a votação do projeto de aposentadoria, nesta semana, foi de desanimar. “Não brinco mais!”, pareciam dizer os deputados. E é isso que às vezes dá a impressão de ser: brincadeira de criança. Quando é que vamos começar a agir como adultos?

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

MANIFESTANTES BLOQUEIAM ACESSSO E IMPEDEM SESSÃO LEGISLATIVA



ZERO HORA 16 de setembro de 2015 | N° 18296


PROJETOS DO EXECUTIVO



Manifestantes bloqueiam entrada na Assembleia e sessão é cancelada. Após servidores estaduais bloquea- rem por mais de sete horas todas as entradas da Assembleia Legislativa, na Capital, e uma reunião entre sindicalistas e lideranças partidárias terminar sem acordo, deputados cancelaram a sessão da tarde de ontem. Por “falta de segurança”, os parlamentares decidiram não realizar o encontro, o que impediu a votação de projetos polêmicos apresentados pelo governo Sartori.

A mobilização para pressionar os deputados começou por volta das 6h30min, com um acampamento em frente à Casa. Por volta das 9h, o presidente da Assembleia, deputado Edson Brum (PMDB), dialogou com os manifestantes e, a pedido deles, agendou reunião entre as lideranças partidárias do Legislativo e os representantes do Movimento Unificado dos Servidores, que reúne mais de 40 entidades.

Como a reunião começaria somente às 11h30min, por volta das 10h, deputados tentaram deixar a frente da Assembleia e foram cercados por manifestantes. Houve empurra-empurra e tumulto. Para que pudessem sair do local, parte dos servidores escoltaram os parlamentares até os fundos do Palácio Piratini.

SERVIDORES AMEAÇAM CASO PLENÁRIO DEBATA PROPOSTAS

Às 11h30min, teve início a reunião em que os sindicalistas apresentaram seu descontentamento em relação aos projetos de Sartori. Na conversa, os líderes das categorias decidiram liberar o acesso à Casa, mas o acordo não foi cumprido por parte dos manifestantes. Por volta das 14h30min, o presidente Edson Brum anunciou que a sessão da tarde de ontem estava cancelada.

– Estendemos nosso diálogo ao máximo e não usamos a força exatamente para evitar qualquer tipo de conflito. Fizemos nossa parte e continuamos à disposição dos sindicatos que quiserem permanecer em diálogo – disse Brum, lamentando a obstrução da entrada da Assembleia por parte dos manifestantes.

A presidente do Cpers, Helenir Schürer, também criticou a manutenção do bloqueio à entrada da Casa, que expôs um racha entre os manifestantes, mas minimizou a situação.

– Éramos 5 mil servidores, apenas 200 divergiram na votação e continuaram bloqueando. São pessoas que têm problemas com a democracia e não a respeitam – afirmou Helenir.

Presidente da Federação Sindical dos Servidores Públicos do RS (Fessergs), Sérgio Arnoud concordou com a dirigente e foi além:

– Não consideramos esse fato (manutenção dos bloqueios) responsabilidade do movimento, pois muitos nem sequer eram funcionários, mas de organizações políticas. Os servidores que estavam lá são principalmente do magistério e transferem para o seio do movimento suas divergências internas.

A sequência das manifestações hoje ainda é incerta. As mais de 40 categorias que integram o Movimento Unificado decidiram retomar o trabalho no início do dia, mas se manterão em “estado de alerta”: caso os projetos entrem em votação na Assembleia, os servidores voltam a paralisar.



Piratini quer retomar votação


APESAR DA PRESSÃO dos movimentos sindicais, que ontem protagonizaram o segundo fechamento do Legislativo estadual em toda sua história, deputados governistas pretendem aprovar propostas polêmicas de Sartori até sexta-feira sem alterações

Dez projetos do Poder Executivo cuja votação estava prevista para ontem deverão ser analisados entre hoje e amanhã pelos deputados estaduais. Alvos de polêmica entre os servidores públicos do Estado, as propostas não chegaram ao plenário porque sindicalistas bloquearam o acesso ao prédio da Assembleia ontem (leia ao lado).

Até então, a Casa havia sido fechada só uma vez, mas nunca por mobilização. Segundo o site oficial, foi em 1937, no Estado Novo, de Getúlio Vargas. Depois, nem na ditadura as portas cerraram.

Como os 10 projetos que motivaram o bloqueio já tiveram o prazo de análise expirado, caberá ao presidente da Assembleia, Edson Brum (PMDB), definir nova data para avaliação dos deputados.

– Está tudo nas mãos do Parlamento – disse Márcio Biolchi, chefe da Casa Civil.

Há possibilidade de que a votação ocorra hoje, após sessão solene em memória à Revolução Farroupilha, ou na sessão plenária de amanhã. Brum evitou antecipar a decisão, mas afirmou que a instituição “não ficará de joelhos diante de ninguém”, dando a entender que a votação ocorrerá de qualquer maneira.

– A definição da data vai depender de como estará o clima por aqui. Não vou fazer nada sem antes falar com os líderes das bancadas – destacou o deputado.

STF NEGA LIMINAR PARA IMPEDIR BLOQUEIO DE CONTAS DO ESTADO

Nos bastidores, a preferência da cúpula do governo é por apressar o processo para evitar “congestionamento” de projetos na sessão de terça-feira – quando entrará em pauta o aumento de impostos.

Mesmo que a pressão cresça, a estratégia do Piratini não deve mudar. A proposição mais criticada pelos servidores, que cria a previdência complementar, seguirá em regime de urgência.

– Não tem chance de voltarmos atrás nisso. E, se dependesse só de mim, a votação seria amanhã (hoje) – sintetizou o líder do governo no Parlamento, Alexandre Postal (PMDB).

A preocupação com a crise financeira, causa do pacote de Sartori, ganhou novo ingrediente. A liminar que tentava impedir bloqueio das contas por atraso no pagamento da dívida com a União foi negada pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal.

Colaboraram Bruna Vargas e Vanessa Kannenberg
JULIANA BUBLITZ



POLÍTICA MAIS | Rosane de Oliveira

TUMULTO NÃO IMPEDIRÁ A VOTAÇÃO DE PROJETOS

Cedo ou tarde, a Assembleia terá de votar os projetos que não apreciou ontem porque os sindicalistas bloquearam a entrada do prédio do Legislativo e impediram a entrada dos funcionários. Aprovar leis é a essência do parlamento. Se determinada categoria é contra um projeto, tem o direito legítimo de lutar para que seja rejeitado, mas impedir a votação usando a força é antidemocrático.

Dos 10 projetos que deveriam ter sido votados ontem, apenas um é motivo de resistência feroz: o que institui a previdência complementar para quem quiser se aposentar com valor acima do teto do INSS, que hoje é de R$ 4,6 mil. Mesmo que a mudança não atinja os atuais servidores, as corporações são contra. Curiosamente, os que ganham menos estão servindo de escada para a defesa dos interesses dos que serão nomeados com os mais altos salários no Executivo, no Legislativo e no Judiciário.

Um estudo feito por técnicos da Secretaria da Fazenda mostra que, excetuando-se a área de segurança pública, dos 81.510 servidores em atividade no Executivo hoje, 69.710 estão abaixo do teto do INSS. Os que ganham acima são, principalmente, funcionários da Fazenda, da Defensoria Pública e da Procuradoria-Geral do Estado. Na Segurança, metade dos 31.856 servidores estão acima do teto do INSS. Os mais atingidos com o projeto da previdência complementar serão os futuros nomeados para o Judiciário, a Assembleia Legislativa e o Ministério Público.

O chefe da Casa Civil, Márcio Biolchi, argumenta que a previdência complementar já existe no serviço público federal e em outros Estados. Garante que o sistema criado no governo Tarso Genro, com contribuição paritária de 13,25% do servidor e do Estado, não é sustentável no longo prazo.

Com o apoio da oposição, os sindicatos querem a retirada do regime de urgência, alegando que é preciso mais tempo para discutir a previdência complementar e que, se não há impacto imediato nas contas públicas, não se justifica a votação às pressas. O governador não abre mão do regime de urgência porque sabe que, se capitular, o projeto não será votado tão cedo. E decidiu que, apesar de só trazer desgaste no curto prazo, essa será sua contribuição para o equilíbrio das contas no futuro.


terça-feira, 15 de setembro de 2015

INCOMPETÊNCIA



ZERO HORA 15 de setembro de 2015 | N° 18295



DIONE KUHN*



Incrível como um governo conseguiu ir do céu ao inferno em tão pouco tempo. Avanços sociais nunca antes vistos neste país agora são sinônimo de gastos sem controle. Um governo que se orgulhava de ter propiciado a ascensão de uma nova classe média – graças a programas como Bolsa Família, Prouni, Pronatec, Minha Casa Minha Vida – convive agora com a pecha de perdulário.

É louvável uma administração ter como principal meta o social, ainda mais em um país com desigualdades gigantescas. Isso não pressupõe, porém, abandonar o dever de casa que é o de manter o equilíbrio entre receita e despesa, de traçar planos estratégicos para reduzir rombos históricos como o da Previdência.

Principalmente depois que a agência Standard and Poor’s rebaixou o grau de investimento do país, uma pergunta é inevitável: o que a presidente Dilma Rousseff e sua equipe econômica fizeram todo esse tempo? Como deixaram chegar a esse ponto? Ou Guido Mantega, Arno Augustin e cia. viviam em um mundo de ficção, ou – o mais provável – estavam totalmente engajados em um projeto partidário e governamental, deixando de lado o que era para ser a missão número 1 deles: zelar pelo dinheiro que entra e sai dos cofres públicos.

É dever de uma equipe econômica dizer não aos gastos. Assim como é da natureza das pastas que concentram obras e investimentos buscarem recursos. Um país só cresce de forma saudável se houver equilíbrio entre esses dois lados.

Claramente, a porteira se escancarou em 2014, quando a crise já estava no horizonte e o momento exigia cautela. Mas o governo enfrentava a ameaça de não se reeleger, os sinais de desgaste do PT começavam a aparecer em todas as classes sociais. O descontrole foi total, tudo para se perpetuar no poder.

Beira a vergonha ter de ouvir uma agência dizer ponto por ponto os deveres que o Brasil não cumpriu nos últimos anos. Colocar Joaquim Levy no comando das finanças, alguém totalmente desvinculado do PT, é a capitulação, o reconhecimento da incompetência administrativa. Levy virou uma espécie de interventor, alguém colocado no cargo para tentar salvar o país do naufrágio.

A missão de Dilma e do PT já terminou. Resta ainda a de Levy. Se conseguir tirar o país da crise, os méritos serão exclusivamente dele.

*Editora de Notícias
dione.kuhn@zerohora.com.br

sábado, 12 de setembro de 2015

QUEM É O INIMIGO DE DILMA



ZERO HORA 12 de setembro de 2015 | N° 18292


RBS BRASILIA | Carolina Bahia




A velha expressão cortar na carne significa, hoje, também parar de irrigar interesses.

Na falta de uma oposição mais consistente, o maior inimigo do governo é a própria presidente Dilma e seus assessores próximos. Se o ajuste fiscal era a prioridade do governo, o corte nos gastos da máquina não passa de uma medida básica, princípio de tudo. Mas foi adiada em nome da manutenção de programas sem controle, auxílio a movimentos sociais, cargos para aliados, uma estrutura de poder alimentada na última década pelo PT e demais partidos governistas. A velha expressão cortar na carne significa, hoje, também parar de irrigar interesses. Dilma hesitou, passou nove meses driblando o óbvio. Agora, não tem jeito.

A falta de dinheiro para bandeiras de campanha já começou a ser sentida neste ano. Mas o Planalto não assumiu a falta de dinheiro, apenas deixou a confusão se instalar. Foi assim com Fies, Pronatec, financiamento de creches, repasses para a saúde, obras do PAC. Para 2016, o mais honesto é que o Executivo assuma apenas o que tem capacidade de financiar, quanto estará à disposição e qual a previsão de recuperação. A esta altura, nem a militância parece mais estar disposta a viver na ilusão.

Pelos cálculos do ministro Joaquim Levy (Fazenda), cerca de R$ 15 bilhões poderiam ser economizados com o fim de alguns programas sociais e redução nas despesas de custeio. É a metade do rombo do orçamento, que é de R$ 30,5 bilhões. Quem está com a missão de enxugar os gastos é o ministro Nelson Barbosa (Planejamento), um homem sem pressa. Barbosa serve como um antagonista de Levy. No próprio Planalto, a ideia é de que sem ele a presidente poderia perder o apoio até mesmo do PT, diante das posições ortodoxas da Fazenda. Partidos da base, porém, reclamam de que não foram procurados para negociar o que cada um vai perder nesta reforma administrativa. Pelo contrário. Uma liderança do PR, partido que comanda o Ministério dos Transportes, confidencia:

– Está todo mundo bem quieto. Só esperando que o PMDB pegue o lugar dela.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

ELES GASTAM DEMAIS E NÓS PAGAMOS A CONTA



ZERO HORA 09 Nde setembro de 2015 | N° 18289


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira




Sempre que uma autoridade falar em remédio amargo para ajustar as finanças públicas, prepare-se: é você que vai pagar o pato.No caso dos contribuintes gaúchos, são duas contas: uma do governo estadual, na forma de aumento do ICMS, e outra do governo federal, em diferentes pacotes. Em Brasília, prepara-se um aumento significativo da Cide, aquela contribuição incidente sobre os combustíveis e que deveria ser usada em obras rodoviárias. É a fonte mais fácil de obtenção de dinheiro, porque o aumento pode ser estabelecido por decreto, à revelia do Congresso.

A se confirmar a elevação da Cide, que teria um impacto de R$ 0,50 no litro da gasolina, e se for aprovado o projeto que aumenta o ICMS de 25% para 30%, andar de carro vai se tornar um luxo. Como o impacto do aumento do ICMS é estimado em R$ 0,20, o litro da gasolina passará dos R$ 4.

E isso não é tudo. Em Paris, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, admitiu a possibilidade de aumentar o Imposto de Renda da Pessoa Física. Disse que foi iniciada uma discussão, inclusive com o Congresso, para encontrar as formas mais adequadas de viabilizar “uma ponte fiscal sustentável”. Cogita-se da criação de uma alíquota de 35% para o Imposto de Renda (hoje a máxima é de 27,5%).

Mais uma vez, a conta da gastança sem controle nos últimos anos vai recair sobre a classe média. O alvo são os assalariados, que não dão trabalho ao fisco porque descontam o IRPF direto na fonte.

Se é para aumentar o Imposto de Renda, melhor seria recriar a CPMF, que pelo menos tem o mérito de atingir traficantes de drogas, sonegadores e detentores de grandes fortunas que conhecem os caminhos legais e ilegais para escapar do leão do Imposto de Renda. A CPMF pega o profissional liberal que tem um preço (mais alto) “com recibo” e outro “sem recibo”.

O governo federal acena com cortes drásticos em programas sociais, como o Pronatec e o Minha Casa Minha Vida, mas não consegue enxugar os gastos com a máquina paquidérmica dos ministérios e as emendas parlamentares. No Rio Grande do Sul, o governo tenta aprovar o aumento do ICMS e preserva elefantes brancos como o Tribunal de Justiça Militar e a Corag.



Aliás

O PT, que no Rio Grande do Sul discursa e vota contra o aumento do ICMS, terá dificuldade para defender a elevação de tributos federais. Usar dois pesos e duas medidas mina a credibilidade.



A NOTICIA



União avalia elevar IR e tributo da gasolina

PRESIDENTES DO SENADO E DA CÂMARA afirmam que governo deve cortar os próprios gastos antes de aumentar impostos. Presente em Paris para uma reunião da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou ontem que o aumento do Imposto de Renda (IR) da pessoa física é uma possibilidade em estudo dentro do governo federal. Ele disse que debate, inclusive com o Congresso, a procura de formas mais adequadas para tornar viável “uma ponte fiscal sustentável”.

O orçamento de 2016 apresentado pelo governo na semana passada prevê déficit de R$ 30,5 bilhões, o que incomodou o ministro. Alertada sobre o impacto de uma possível saída de Levy do cargo, a presidente Dilma Rousseff buscou prestigiá-lo e afirmou que buscará o superávit primário (economia feita para pagar juro) de 0,7% do Produto Interno Bruto no próximo ano. A iniciativa busca evitar o perda do grau de investimento – espécie de selo de bom pagador – do país. O ministro não detalhou a medida nem especificou quanto poderia ser arrecadado.

– (Elevar o IR) pode ser um caminho, é essa a discussão que gente está tendo agora e que acho que temos que amadurecer mais rapidamente – afirmou Levy.

Ao mesmo tempo, o ministro lembrou que propostas de aumento de imposto sobre os ricos já foram recusadas no passado.

As reações no Congresso não foram favoráveis. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB- AL), voltou a afirmar que a primeira tarefa do governo é cortar gastos em vez de aumentar impostos. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), também cobrou a redução das despesas públicas. Mas ressaltou que se o governo enviar a medida, será colocada em votação.

A oposição saiu em coro contra a possibilidade de aumento do IR. PSDB, DEM, PPS e Solidariedade disseram que a medida não passa no Congresso. Líder da bancada do PSD, o deputado Rogério Rosso (DF) também previu derrota:

– O brasileiro já trabalha quatro meses para pagar imposto, querem agora que trabalhe meio ano? Aí fica difícil defender o governo.

Diante da dificuldade no Congresso, o Planalto cogita o aumento de receita por decreto. Entre eles, o tributo sobre combustíveis (Cide), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e o Imposto sobre Operações Financeiras.

SARTORI DEFENDE RECRIAÇÃO DA CPMF

O vice-presidente Michel Temer (PMDB) disse que alta de impostos só ocorrerá em última hipótese. No entanto, ele concorda com a elevação da Cide, sugerida pelo ex- ministro Delfim Netto.

Temer se reuniu com governadores, ministros, senadores e deputados do partido ontem para tratar do tema. O governador José Ivo Sartori, ao lado de seus colegas de Rio, Alagoas e Rondônia, pregou a recriação da CPMF, proposta abandonada pelo governo após repercussão negativa de empresários e políticos no Congresso.

– Apresentei a necessidade do retorno da CPMF e o governador do Rio Grande do Sul também, mas o presidente da Câmara acha que não é o momento adequado – disse o governador de Rondônia, Confúcio Moura.

Segundo relatos de presentes, a elevação da Cide foi defendida pelo governador de Alagoas, Renan Filho, e pela ministra da Agricultura, Kátia Abreu. Dependendo da alta, pode gerar e R$ 15 bilhões à União e R$ 5 bilhões aos Estados.

terça-feira, 8 de setembro de 2015

ALGUM CONSENSO?




ZERO HORA 08 de setembro de 2015 | N° 18288


LUÍS AUGUSTO FISCHER



A coisa anda tão, mas tão confusa, na vida cotidiana dos gaúchos e dos brasileiros, que parece não haver um ponto a partir do qual reorganizar a vida. Já começam a aparecer fantasias redentoras, como o separatismo, pelo que vi esses dias no Facebook. Espero que não ganhe força outra fantasia, aquela de tomar a justiça nas próprias mãos.

Mas a ausência de Estado, de organização pública, a confusão geral como estamos enfrentando – governantes que fazem muito diferente do que prometeram, chegando ao parcelamento de salário quando havia recursos, deputados e juízes que aceitam vantagens descabidas, como o vergonhoso auxílio-moradia para quem tem casa própria, mais a corrupção por toda parte –, vai empurrando a gente contra uma parede imaginária. Até que falta o fôlego e o cara se vê na contingência de escolher: continuar respirando ou morrer asfixiado?

O senhor e eu, localizados aqui na classe média mais ou menos confortável, com sorte ainda não estamos com as costas na parede, temos algum recuo. Os de cima sempre têm rota de escape, nem falemos deles – e a elite brasileira, ao que parece mais do que outras, costuma ter endereços e fundos fora do Brasil, para quando necessário. Mas os de baixo, meu caro leitor, meu precioso leitor...

Com meu eterno otimismo, fico tentando achar um ponto, um chão firme para botar o pé e começar, timidamente que seja, a reorganizar a vida. Um ponto, um consenso. Tem? Seria qual esse começo? Os juízes declararem que não vão mais receber o auxílio-moradia quando tenham casa própria? Os deputados estaduais voltarem atrás naquele arranjo da aposentadoria especial, reinventada ano passado? A presidente encontrar um mínimo equilíbrio na articulação entre política e economia? O governador se dignar a responder a sério alguma pergunta de qualquer repórter?

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

MUDANÇA NAS RPVs RENDERÁ ECONOMIA DE R$ 300 MILHÕES




ZERO HORA 07 de setembro de 2015 | N° 18287


POLÍTICA + | Juliano Rodrigues





Não é à toa que o Piratini quer que a Assembleia vote o mais rápido possível o projeto de lei que altera as regras de enquadramento das Requisições de Pequeno Valor (RPVs): a mudança na legislação representará economia de, em média,R$ 300 milhões por anoaos cofres públicos.

A proposta do governo é de reduzir de 40 salários mínimos para sete a classificação das dívidas do poder público com pessoas físicas em RPVs. Hoje, são consideradas Requisições de Pequeno Valor aquelas que chegam a R$ 31,5 mil. Se a lei for aprovada, o valor será diminuído para R$ 5,5 mil. O que exceder esse limite será transformado em precatório e estará sujeito a pagamento por regras diferentes.

Apesar de a legislação vincular a despesa a 1,5% da Receita Corrente Líquida, o Judiciário possui autonomia para sequestrar valores diretamente das contas do governo e, assim, extrapolar o limite. Como essa regra ainda é discutida no âmbito federal, ao contrário das normativas para os precatórios, os juízes têm amparo legal para isso. A única alternativa encontrada pelo governo foi a redução para sete salários mínimos, já que, embora os sequestros possam continuar ocorrendo, serão em valores menores.

O cálculo da Secretaria da Fazenda é de que, apenas em 2015, o Estado deve pagar quase R$ 900 milhões em RPVs. O curioso, mais uma vez, é a demora do governo em agir, o que dá munição para questionamentos sobre a intenção do Piratini em criar o ambiente de crise para aprovar o aumento de impostos. Se o governo já sabia que as RPVs gerariam gastos acima do previsto e pretendia mudar as regras, por que encaminhar a proposta apenas em setembro?

Em 2013, o ex-governador Tarso Genro tentou emplacar projeto semelhante, reduzindo para 10 salários mínimos o limite. Na época, o governo acabou retirando a proposta diante de reações críticas de sindicatos de servidores públicos e da OAB-RS. As entidades que representam os funcionários do Estado reclamavam porque muitas das ações que geram RPVs têm servidores como parte.

domingo, 6 de setembro de 2015

A HORA DA AUSTERIDADE



ZERO HORA 06 de setembro de 2015 | N° 18286


EDITORIAL

O cenário de insegurança desafia governantes e cidadãos, para que o país saia da crise melhor do que entrou.


Já não há mais dúvida de que os brasileiros estão desafiados a enfrentar uma crise econômica prolongada, representada pela recessão, pela volta da inflação alta, pelo aumento do desemprego e pelos conflitos sociais decorrentes da deterioração dos serviços básicos. Os indicadores econômicos expõem uma realidade da qual ninguém, do setor público aos cidadãos, passando por todas as atividades produtivas, estará imune. Instabilidades políticas potencializam uma crise que o governo subestimou, durante pelo menos meio ano do segundo mandato, o que contribuiu para o agravamento de um cenário de paralisia de investimentos e de desconfiança generalizada com os próximos atos do Executivo.

O Brasil, e não só o governo federal, defronta-se com o que não mais pode ser negado. Austeridade deixa de ser um jargão depreciado pelos próprios governantes para se transformar em necessidade real, a começar pelos municípios brasileiros. Comunidades que durante décadas adiaram soluções administrativas, imitando o que há de pior do governo central, terão de se submeter ao arrocho e racionalizar seus orçamentos. Há dados concretos sobre o descontrole dos municípios, no contexto de uma crise que é também de gestão do setor público. Segundo estudo da Federação das Indústrias do Rio (Firjan), concluído neste ano, oito de cada 10 prefeituras estão em situação fiscal crítica ou difícil e 15% não cumprem a Lei de Responsabilidade Fiscal.

A grande maioria tem deficiências graves de gestão, e o retrato das dificuldades é o mesmo enfrentado pelos Estados. Mas a crise apenas denuncia insuficiências que vinham sendo encobertas por um longo período de prosperidade. União, Estados, municípios, instituições e também as famílias brasileiras são desafiados a adequar demandas, projetos e custos mais elementares do orçamento cotidiano a um ambiente de incertezas. Infelizmente, planos de investimentos terão de ser adiados e despesas correntes, cotidianas, serão cada vez mais adequadas a essa realidade.

É uma situação até então desconhecida pelas novas gerações, inclusive a que já ingressou ou tenta ingressar no mercado de trabalho. Revertem-se expectativas imediatas e frustram-se sonhos de médio e longo prazos dos que almejavam melhorias importantes na qualidade de vida também desses jovens. O que já se sabe, pelas experiências anteriores, é que todos receberão lições da recessão, e que o cidadão oferecerá sempre os melhores aprendizados. Sem resignação, espera-se que o país saia da crise melhor do que entrou.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O problema é que todos os propósitos de "austeridade"  atingem somente os servidores do Executivo, justamente aqueles que prestam serviços básicos à população e precisam de grande número de pessoas e capacidade técnica e estrutural para atender a demanda. Nunca esta "AUSTERIDADE" se volta para os altos cargos dos poderes, para os partidos e para os militantes que trabalharam na eleição do poder político. O resultado sempre se limita ao sacrifício dos direitos do povo, mantendo os privilégios da cortes política e judicial numa máquina inchada, perdulária, oligárquica e inoperante.

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

CRISE DO ESTADO E A MIOPIA DOS GOVERNANTES


JORNAL DO COMÉRCIO 03/09/2015



Mateus Jarros



O que mais se vê por aqui são políticos e estadistas focando apenas o curto prazo. John Maynard Keynes, economista considerado o pai do intervencionismo econômico, disse: "no longo prazo, estaremos todos mortos". Sua frase passou a ser a senha para a irresponsabilidade fiscal dos governantes que ignoram o inevitável futuro e a chegada das contas, quando nem todos estarão mortos.

No caso do estado do Rio Grande do Sul, não resta dúvida de que se peca pelo excesso de miopia. O "aqui e agora" recebe um peso desproporcionalmente grande na equação, e a prudência fica de lado. Esse é o comportamento de todos os governantes eleitos no Estado nas últimas décadas. O resultado que sentimos agora (o futuro no qual não estamos mortos) é insatisfatório e muito doloroso para a maioria.

Com grande parte da receita do Estado destinada todos os meses para pagamento de funcionalismo, resta muito pouco para se fazer frente a outros gastos. O problema se agrava quando o governador propõe o aumento do ICMS. Este projeto de lei não é um ajuste de contas visando ao futuro, mas um aumento do já gigantesco Estado. O aumento do ICMS não é um remédio, muito menos é a cura. Simplesmente busca transferir o fardo da incompetência dos burocratas para o cidadão comum.

A crise que o estado do Rio Grande do Sul vive é o exemplo claro da miopia dos governantes e da falência do estado intervencionista. A cada ano, se gasta mais e se contrata mais funcionários públicos, mas se esquece da origem da receita do Estado: são as empresas e os cidadãos que, ao produzirem e enriquecerem, aumentam a base tributária do próprio Estado! Logo, para que o Rio Grande do Sul se sustente no longo prazo, precisa deixar o caminho livre para se empreender e produzir.

Economista e associado do IEE

COMENTÁRIOS

Fernando S Junior - 03/09/2015 - 23h59 - É lógico que o Estado precisa de mais servidores públicos. Do modo que foi colocado parece que tem servidor em excesso em todas as áreas. Mas onde cortar servidores? Quais órgãos? Cortar o número de professores, profissionais da área da saúde ou policiais? É preciso informar onde, tem locais que faltam muitos servidores.

quinta-feira, 3 de setembro de 2015

SOLIDARIEDADE FISCAL



ZERO HORA 03 de setembro de 2015 | N° 18283


LUIZ CARLOS BOHN*



Nos últimos dois meses, o governo do Estado vem parcelando os salários dos funcionários do Executivo. Isso não ocorre por uma vontade deliberada do atual governo, mas por conta de um desequilíbrio fiscal histórico. Há dois aspectos a serem destacados sobre a crise financeira. O primeiro é que não cabe ao contribuinte pagar a conta, mais uma vez, com um novo aumento de ICMS. Entre 1997 e 2014, a arrecadação de ICMS cresceu 132% acima da inflação. A sociedade gaúcha já deu a sua contribuição.

Um segundo aspecto é o comportamento dos funcionários do Poder Executivo e dos líderes dos demais poderes, o Legislativo e o Judiciário, frente à crise. É claro que nenhum indivíduo quer ter o seu salário parcelado. Mas, por outro lado, esses funcionários dormem tranquilos pois sabem que, apesar da crise econômica e do aumento de desemprego, não perderão seus empregos e terão seus salários pagos. A realização de greves na educação, na saúde e na segurança ao primeiro sinal de parcelamento de salários é um ataque à sociedade gaúcha.

Pior ainda foi o que ocorreu há algumas semanas, quando, apesar de estarem com os salários em dia, houve uma “greve de advertência” por três dias. Esse comportamento é um desrespeito à sociedade, especialmente aos que dependem fortemente dos serviços públicos de educação e saúde.

A minha crítica à falta de solidariedade fiscal se estende aos líderes dos demais poderes. O dinheiro que paga os salários de um deputado ou de um juiz também sai do bolso do contribuinte gaúcho. A existência de “orçamento próprio” não é uma mágica que produz dinheiro. Se há dificuldade no pagamento de salários, essa dificuldade deveria ser compartilhada por todos os funcionários públicos, independentemente de estarem lotados no Executivo, no Legislativo ou no Judiciário.

Estamos em um momento em que precisamos de união para resgatar a saúde financeira do nosso Estado. Os contribuintes devem continuar pagando seus impostos em dia e o setor público tem que fazer os gastos caberem na receita existente.


*Presidente do Sistema Fecomércio-RS

MOBILIZAÇÃO PELO RIO GRANDE



ZERO HORA 03 de setembro de 2015 | N° 18283


EDITORIAIS


MOBILIZAÇÃO PELO ESTADO



O aprofundamento da crise nas finanças gaúchas puniu antes de mais nada os servidores do Executivo, que enfrentam as consequências do pagamento de seus salários parceladamente. Na medida em que a situação avança sem perspectiva de solução, porém, a conta vai sendo compartilhada, e de forma acelerada, com o conjunto da população. Por isso, é preciso que líderes em diferentes áreas – políticas, sindicais e empresariais, além de membros de outros poderes – se unam em busca de alternativas capazes de limitar os danos à sociedade e impedir o Estado de enfrentar uma situação ainda pior do que a atual.

Em períodos anteriores, o Rio Grande do Sul sempre se caracterizou pela articulação de forças de seus líderes em diferentes áreas, nos bons e maus momentos. Pela gravidade da situação, o mínimo que o Estado precisaria é de uma reação imediata, proporcional à crise. Ainda assim, com raras exceções, o que se constata hoje é pouca ou nenhuma mobilização de quem poderia somar esforços e ajudar a construir saídas viáveis, acima de interesses políticos e partidários.

Num Estado já às voltas com problemas crônicos como os enfrentados hoje, com dificuldade para pagar em dia os servidores e em atraso com a União e fornecedores, paralisações no setor público só agravam ainda mais a situação. Não é justo castigar os servidores, nem punir a sociedade. Paralelamente à busca de saídas adequadas, que são inadiáveis, o Rio Grande do Sul precisa lutar pela união de esforços para viabilizá-las.

A CONFIANÇA QUE FALTA



ZERO HORA 03 de setembro de 2015 | N° 18283


EDITORIAIS



São corretas as avaliações da conjuntura nacional que levam em conta a falta de confiança na capacidade de reação e de articulação do governo. É o sentimento de empresários e economistas, para os quais o Executivo deveria ser o primeiro a transmitir segurança a quem empreende e corre o risco de tomar decisões. Merece registro, como voz respeitada no contexto nacional, a advertência nesse sentido feita pelo ex-ministro Delfim Netto, que reproduziu em artigo publicado na Folha de S. Paulo o sentimento médio de que o governo, ao invés de inspirar confiança, vem passando insegurança ao setor produtivo.

Há na reflexão uma referência direta ao impasse do ajuste nas contas públicas, ao qual o economista se refere como “tragédia fiscal”. A advertência reforça a sensação de que o governo continua titubeante em relação ao ajuste, enquanto pede determinação de quem produz. É uma contradição a ser superada, sob pena de agravar ainda mais a situação do país. A presidente da República precisa buscar o convencimento da sociedade sobre as razões do ajuste fiscal, que considera indispensável, ainda que não suficiente, para – como diz Delfim – “criar as condições mínimas de credibi- lidade do governo”.

Não há como fazer a correção drástica de rumos na economia, a começar pelo equilíbrio fiscal, sem que os condutores da política oficial transmitam clareza e determinação ao setor produtivo. Se o próprio governo é incapaz de dizer a empresas e trabalhadores que acredita no que propõe, fica difícil cobrar mobilização para que o país saia da recessão. A presidente deveria abandonar a soberba e ser mais receptiva a alertas como esse, para que as mensagens governistas sejam unificadas e haja um mínimo de coerência entre o discurso e as atitudes governamentais.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

O DÉFICIT E AS REFORMAS



ZERO HORA 01 de setembro de 2015 | N° 18281


EDITORIAIS



Sem condições políticas de aprovar aumento de impostos, a presidente Dilma Rousseff optou por enviar ao Congresso uma proposta orçamentária com previsão de déficit primário, fato inédito nos últimos anos. A decisão significa, ao mesmo tempo, o reconhecimento da gravidade da crise e a disposição de não mascará-la. A admissão dos problemas e a opção pela transparência, porém, só fazem algum sentido se essa insuficiência de receitas em 2016 servir para apressar reformas estruturais que o país não tem mais como adiar.

Previsível, o rombo que o Planalto esperava cobrir com a rechaçada volta da CPMF se deve ao elevado aumento de gastos no ano passado e à acentuada queda nas receitas nos últimos meses. Ao optar por assumir o déficit, o Planalto transfere ao Congresso a tarefa de encontrar uma fórmula de equilibrar as contas. Isso só ocorrerá se os parlamentares se dispuserem a propor cortes mais profundos que os tentados pelo governo – diminuindo repasses para programas ineficientes, por exemplo –, ou a criar novas receitas.

A responsabilidade é grande. Se recorresse a recursos improváveis para fechar as contas no papel, o Planalto poderia alimentar ainda mais desconfianças. Mas, sem a garantia dos recursos necessários para os compromissos da dívida, passa um sinal negativo para os credores e põe ainda mais em risco o grau de investimento, afetando uma economia já em recessão.

Por isso, só há algum sentido num orçamento deficitário se o governo usá-lo para apressar reformas estruturais. A mais urgente delas é a da Previdência, cujo déficit se constitui numa das causas do desequilíbrio das contas.

A FACE EXPLOSIVA DA CRISE GAÚCHA



ZERO HORA 01 de setembro de 2015 | N° 18281



EDITORIAIS




O ambiente de desolação no Estado é agravado por mais um parcelamento de salários dos servidores do Executivo, um constrangimento em particular. Não há como aceitar com resignação o fato de que esses funcionários sejam os únicos castigados pela medida. Tem-se como realidade que a crise do Estado acaba por punir a população em geral pela precariedade dos serviços prestados. É um dano direto aos servidores, às suas famílias e à economia em geral, que repercute em toda a sociedade.

Previsível, o aprofundamento do problema escancara a face explosiva da crise e a coexistência de dois mundos distintos na área pública: de um lado, um Executivo falido, que não consegue nem mesmo fazer repasses obrigatórios para a merenda escolar, os hospitais e os fornecedores, além das parcelas da dívida da União, e de outro os setores praticamente imunes às dificuldades. Sabe-se que tanto o Judiciário quanto o Ministério Público e a Advocacia-Geral do Estado, não atingidos pelos parcelamentos, tentam oferecer contribuições para a solução da crise. Mas é necessário fazer mais.

A crise é uma oportunidade para que todas as instituições, e não só o Executivo, somem esforços no sentido de evitar que o Estado conviva por muito tempo com essa deformação, que o faz gastar mais do que a sua capacidade de arrecadar. A penúria enfrentada pela maioria do funcionalismo, que não consegue pagar contas e prover a família com insumos básicos, é desonrosa para todos. Apropriar-se dos depósitos judiciais e aumentar impostos, punindo toda a sociedade, são saídas apenas emergenciais que não resolverão o problema. O Rio Grande do Sul exige mais para que se supere a ameaça de viver sob estado de permanente calamidade financeira.