VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

terça-feira, 30 de abril de 2013

TIRIRICA REVELA, AFINAL, O QUE UM DEPUTADO FAZ

REVISTA EXAME, 10/03/2013 08:55


Em entrevista a EXAME.com, Tiririca faz balanço do mandato na Câmara e mostra que hoje sabe bem o que faz um deputado, embora justamente agora já não queira mais ser um


Marco Prates, de



Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr

O deputado federal Tiririca (PR-SP) com o novo visual, que tem sido comparado ao do jogador Neymar: para ele, o que os deputados mais apreciam no cargo é o poder

São Paulo – “Eu entrei para ver se poderia ajudar o povo. E estou vendo que não posso. É melhor deixar para alguém mais”.


É assim, meio desiludido, que o deputado federal Tiririca (PR-SP), famoso por ser palhaço e humorista, defende a sua já anunciada saída da vida política após o fim de seu mandato, em 2014.

Diz que sai com a sensação de dever cumprido, apesar de, realisticamente, lidar com o fato de não ter nenhum de seus projetos aprovados até lá.

A grande diferença do Tiririca de ontem - que se aventurou em 2010 a passar por uma campanha eleitoral com o slogan em que brincava com o fato de não saber o que fazia um deputado federal - é que o Tiririca de hoje sabe bem o que um parlamentar faz.

E fala tudo em entrevista a EXAME.com realizada na última quinta-feira. Na véspera, ficou na Câmara até as duas horas da manhã para votar o veto aos royalties do petróleo. “Eles trabalham pra caramba”, é como defende hoje os colegas parlamentares.

O palhaço conta ainda o que considera as conquistas no mandato e aposta no nome de outro famoso que, ao contrário dele, nunca irá largar a política, em sua avaliação. Dica: é um jogador de futebol.

EXAME.com - O senhor tem dado declarações de que não concorrerá à reeleição em 2014. Está definitivamente decidido?

Tiririca - Estou, é coisa certa e confirmadíssima. O que quero mesmo é abandonar a vida política.

EXAME.com - O senhor já falou que o sistema legislativo brasileiro não funciona. Mas, em termos práticos, o que mudaria, se pudesse?

Tiririca - Tem que mudar tudo. Estou sendo realista. O que acontece: você fica aqui só esperando um dia de votação. Passa o dia todinho, aí abre para as votações, mas uns aceitam, outros não. E tem o lance dos partidos - a oposição não quer, mas o governo quer. Ou vice-versa. Aí cai a votação. Ou seja, passou o dia todinho e nada foi votado. Às vezes, a semana toda. O sistema é assim. Quando eu estava fora, eu falava como muita gente fala: “esses caras ganham muito, dava para fazer alguma coisa e nem trabalham”. Mas é totalmente diferente. Os caras trabalham muito: seja em uma comissão, seja em outra, e quando vão aos estados têm que começar o trabalho bem cedo para se eleger na próxima. Só que o negócio é engessado.

EXAME.com - E o que o senhor diria que há de conquista nesses dois primeiros anos de mandato?
Tiririca - O que eu conquistei foi o respeito dos companheiros e o respeito da mídia nacional. Isso foi importante. Eles viram que eu não entrei na política para fazer palhaçada. E estou fazendo um trabalho legal. Nada mais que um parlamentar deve fazer. Ganho para isso. Estou apresentando projetos, não falto em comissões e votações, e voto de acordo com o que acho que é bom para o povo. Estou fazendo a coisa certa, graças a Deus. Não estou decepcionando meus eleitores. E estou dando uma porrada na crítica.

EXAME.com - Quais foram os principais projetos apresentados até agora?
Tiririca - O que gostaria que fosse aprovado - Ave Maria, se fosse, era fantástico - é o colégio para os filhos de circenses, e saúde também. É complicado: o SUS não aceita o circense por ele não ter endereço fixo. Se esse projeto fosse aprovado, era a melhor coisa da minha vida. Tem também o “Trailer, Minha Vida”, em referência ao “Minha Casa, Minha Vida”. Mas a gente sabe que é complicado. Não depende de você. São interesses diferentes. Mas estou apresentando e correndo atrás. Se só dependesse da gente, estava aprovado. Mas não é assim.

EXAME.com - O que ainda pretende conseguir neste resto de mandato?
Tiririca - Vou continuar trabalhando como venho trabalhando: não faltando às comissões e votações e votando sempre de acordo com o que acho que é bom para o povo. Mas estou sendo muito sincero com os eleitores que votaram em mim. Não quero vir mais porque não dá para fazer muita coisa. Você veja: são 513 deputados, mas só sete nunca faltaram. E eu sou um desses sete. Eu pretendo nesses dois não ter falta nenhuma, sempre batalhando para ver o que vai dar. Mas a gente sabe que não rola. Então não quero mentir para o povo.

EXAME.com - Você acredita que sairá daqui dois anos sem ter aprovado nada?

Tiririca - Tem colegas deputados que estão no 6º mandato e não aprovaram projetos, para você ver como a coisa é difícil. Se eu sair nesses dois anos que faltam já fazendo o que fiz nesses dois que passaram, é uma vitória para mim.

EXAME.com - A música de trabalho do seu novo CD se chama “Estou no poder” e fala da sua eleição. Mas não há piadas com os deputados. Não vai ter?

Tiririca - É como se fosse um desabafo, bem light, mas é um desabafo. Foi o que sofri. Mas piada não vou fazer porque acho um desrespeito. Estou dentro e sei que os caras trabalham, só que mecânica é desse jeito. No plenário funciona dessa forma. Ontem foi uma loucura (votação do veto aos royalties do petróleo). Saí quase duas horas da manhã. Aquele impasse - uns queriam, outros não, uns abandonaram. É complicado, mas é assim que funciona. Eu já caí na real que funciona assim e não adianta forçar a barra. Eu quero, se Deus quiser, segurar esses dois anos aí com vida e saúde e fazer o que venho fazendo.

EXAME.com - O senhor reconhece que a sua imagem pública melhorou?

Tiririca - Melhorou em termos do preconceito. É a realidade, existe um preconceito grande com um cara que lançou “Florentina”, que foi aquele estouro e sucesso. O povão se identifica pra caramba, o povão torce, me coloca aqui, acredita em mim, compra CD. O povo gosta de ver um cara como a gente e pensar “eu também vou conseguir”. Eu cheguei aqui e tem parlamentares que me conhecem desde a época em que eu fazia shows nas barracas de praia de Fortaleza e não admitiam. Mas hoje eles falam “sou seu fã”. O que acrescentou foi esse lance: onde eu não entrava, estou entrando. Sou até internacional! (Financial Times e Reuters, entre outros, já publicaram entrevistas no exterior) Quer dizer, o que a “Florentina” - e Deus - não tinha me dado era só isso aí.

EXAME.com - Muitos afirmam nas redes sociais que o senhor entrou na política pelo dinheiro. Como é o senhor responde a isso?

Tiririca - Para ter uma ideia, o dinheiro que ganho aqui por mês tiro em um show que faço por noite. Num final de semana, faço dois shows, por baixo. Ou seja, o fim de semana é equivalente a dois meses de trabalho. Não é pelo dinheiro. E acredito que a maioria das pessoas aqui também não. Tanto é que gente de origem humilde, mas humilde mesmo, aqui, só conheço eu. O restante é empresário, médico, advogado, pessoas estudadas.

EXAME.com - Mas pode haver várias outras razões para eles entrarem aí.

Tiririca - Poder. Só o poder. Para eles, é tudo. Tem cara dono de empresa que não está nem aí para a grana. O lance aqui é o poder e também as coisas boas que tem: o lance de prisão, já que não é qualquer um que pode te prender, além da justiça ser totalmente diferente. É o poder. Mas isso para mim não quer dizer nada. Eu entrei para ver se poderia ajudar o povo. E estou vendo que não posso.

EXAME.com - Podemos supor que você sabe hoje o que um deputado faz?

Tiririca - Sei: trabalha muito e produz pouco. Trabalha pra caramba. E no caso, eu, como artista popular, até trabalho mais porque tenho que tirar fotos e recebo as pessoas. No nosso gabinete, nesse momento em que estamos falando aqui, tem mais de 150 pessoas do lado de fora. Hoje eu recebo a galera toda porque não está rolando nada (sem votações no plenário - a entrevista foi feita na última quinta-feira à tarde). Toda semana eu tiro duas horas para receber gente do Brasil inteiro. É muito massa: é foto, pessoas trazendo projetos, gente agradecendo e aconselhando, é muito gostoso.

EXAME.com - O senhor acha que foi um pouco ingênuo em pensar que poderia fazer muita coisa no Congresso?

Tiririca - Não. Eu pensei que poderia fazer mais do que faço no meio artístico. Tanto foi que quando recebi o convite um ano antes das eleições, falei com minha mãe. “Ó, o partido me chamou, o que a senhora acha?”. Ela falou, “acho legal, se você for eleito vai ajudar muita gente”. Ela também tinha essa visão. Aí fui eleito com aquela votação linda (1,3 milhão de votos). “Caramba, vou chegar e aprovar projetos”. Mas quando você está dentro, vê que não é assim.

EXAME.com - E atuando no Executivo, como prefeito, por exemplo, que é um cargo mais prático, não seria melhor?

Tiririca - É mais complicado porque a cobrança é maior. O povo não entende, quer de tudo. Nem penso nisso. Penso realmente em sair e curtir a minha vida, minha filhinha de 3 aninhos. Estou vendo ela aprender a andar, estudar, é a coisa mais linda do mundo. Quero mesmo é levar alegria para o povo. Se puder ajudar, vou ajudar, meto a mão no bolso e vou ajudar uma instituição, com um show, por exemplo, junto com uns colegas. É mais fácil fazer, porque é você que dita.

EXAME.com - Mas a experiência foi boa?

Tiririca - A experiência foi muito boa, a gente cresce com isso, a gente passa a ter outra visão da politica. Está sendo um aprendizado fantástico para minha vida que vou levar para sempre. O respeito que os caras têm por mim aqui é maravilhoso.

EXAME.com - Você sente que outros famosos na Câmara poderiam ter essa vontade de voltar à carreira original e deixar a política?

Tiririca - Eu posso estar falando bobeira, mas acredito que Romário vai ser difícil sair. Ele está entusiasmado, gostando da coisa, correndo atrás e botando a boca no trombone. É o jeito dele e é ideal para ele. É um bom politico, sabe fazer a jogada. É o lance do poder. Ele não vai sair mais. Mas para mim, não é minha praia. Não estou vendo retorno para o povo nem podendo fazer muita coisa, então é melhor deixar para alguém mais.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Sem comentário. Só recomendo a leitura pausada, análise do que ele disse e muita, muita reflexão para começar a votar com mais interesse e em escolhas mais acertadas.



domingo, 28 de abril de 2013

UM SENADO PARA RIR E CHORAR

REVISTA ÉPOCA,  23/04/2013

RUTH DE AQUINO


Como deve se sentir
um senador que finge falar
para uma multidão, diante
de cadeiras vazias?

Nenhum programa de humor me provocou mais risos na semana passada que a história protagonizada por um senador e um garçom, ambos de Tocantins. O senador João Costa, do Partido da Pátria Livre (PPL), preparou um discurso de 14 páginas sobre o aborto. Ao chegar à tribuna, uma surpresa: o plenário estava vazio. Que fazer? Como falar para cadeiras, ainda mais em sessão transmitida pela TV Senado? Em vez de cancelar o discurso, ele decidiu sentar-se no lugar do presidente e recriou a realidade, encenando uma sessão patética.

O senador João chamou o garçom Johnson Alves Moreira para fazer figuração. Não sabemos se Johnson posou de senador falso por pena ou se ganhou uma gratificação de João. Deveria. Johnson ficou em pé por meia hora, mexendo a cabeça em tom de aprovação, com a câmera focando em sua calvície e suas costas, numa tentativa de dar credibilidade às palavras do senador. João abriu o discurso assim: “Senhor presidente, senhores senadores, senhoras senadoras, senhores e senhoras presentes, e aqueles que acompanham esta sessão pela rádio e TV Senado...”. Na plateia, só Johnson.

A história foi relatada em detalhe pela repórter Maria Lima, do jornal O Globo. A foto também é assinada por ela. Um pequeno texto primoroso, por expor o ridículo de uma Casa que paga regiamente senadores para não fazer nada ou quase nada, além de queimar nosso dinheiro na fogueira das vaidades. Segundo o relato, o “garçom-senador virou motivo de piadinhas dos seguranças, que sugeriram que ele fizesse um aparte”. Johnson disse ter gostado da “experiência”.

O senador João encerrou seu discurso sobre “os direitos do nascituro” com outra simulação, como se houvesse uma fila de senadores para falar: “Considerando a exiguidade do tempo e o número de oradores, solicito que as peças do pronunciamento sejam dadas como lidas. Obrigado pela atenção”. Só faltou a claque.

As dúvidas são: para seus colegas senadores, João Costa não passa de um João ninguém e, por isso, não interessa sua posição sobre o aborto? Ou há outros dias de gazeta institucionalizada no Senado, além de segunda e sexta-feira? Como se sente um senador que finge falar para uma multidão, diante de cadeiras vazias? A sessão João & Johnson ficará nos anais do Senado como o “dia do garçom”.

***
Nenhum tema político me causou mais asco na semana passada que a aposentadoria de Roseana Sarney como servidora do Senado. Ela entrou para o Senado em 1974, aos 21 anos de idade, sem prestar concurso público, num “trem da alegria”, chamado por sua assessoria de “processo seletivo”. Ela só trabalhou como servidora durante três anos, entre 1982 e 1985, quando o pai, José Sarney, já era senador. O Senado informa que contratou Roseana em novembro de 1984 e que, agora, a aposentou do cargo de “Analista Legislativo”. É de chorar.


Em 1985, Roseana pediu licença do Senado para acompanhar o pai na Presidência da República, até 1990. Voltou como senadora e saiu depois como governadora. Continuou a contribuir para o RPPS, a previdência dos servidores. Isso é que é visão de futuro... Agora, pediu aposentadoria integral e ganhou. Roseana, em nota, afirmou que a “aposentadoria ocorre 38 anos depois” de ter começado a “trabalhar” para o Senado. Simples assim. E legal, ainda por cima.

Roseana receberá por mês, de aposentadoria, R$ 23.859,34. Como governadora do Maranhão, ganha R$ 15.409,95. O Maranhão, capitania dos Sarneys, é o Estado com o segundo pior IDH do Brasil – perdeu a primazia para o Estado de Renan Calheiros, Alagoas. Se Roseana quisesse, poderia acumular três aposentadorias quando deixasse o cargo atual: como ex-governadora, ex-senadora e ex-servidora. Porque são fontes diferentes. É o motivo oficial. No país do rombo na Previdência, calcula-se que 67% dos aposentados pelo INSS recebam o equivalente ao salário mínimo: R$ 678. Um sistema de castas duro de engolir, impossível de explicar.

Roseana teve escola particular de enriquecimento com o pai, que acumulou todas as fontes de renda possíveis – como o auxílio-moradia embolsado irregularmente. Há dois anos, o site Congresso em Foco divulgou que José Sarney recebia um supersalário de R$ 62 mil por mês: a soma do subsídio de quase R$ 27 mil do Senado aos R$ 35 mil de duas aposentadorias, no governo no Maranhão e no Tribunal de Justiça estadual.

Ao contrário do pai, Roseana prometeu “devolver aos cofres públicos” a parte dos rendimentos que ultrapassar o teto do funcionalismo, R$ 28 mil. Não sabemos como fará isso. Para o Senado, ela não pode devolver nada. Depositará na conta do Tesouro? Fará um requerimento abrindo mão de quase um terço de sua remuneração mensal de R$ 39 mil? Doará para a Fundação Sarney? Vamos esperar para ver. Prometo divulgar seu ato de generosidade, Roseana.




RUTH DE AQUINO é colunista de ÉPOCA raquino@edglobo.com.br (Foto: ÉPOCA) 

sábado, 27 de abril de 2013

A MENTIRA NA MOLDURA

ZERO HORA 28 de abril de 2013 | N° 17416 ARTIGOS


Flávio Tavares*


O personagem-símbolo (e mais significativo) do que seja, hoje, a política e o parlamento no Brasil, é um garçom do Senado, de nome Johnson Alves Moreira. O que fez ele, além de servir cafezinho e água mineral aos senadores?? Nada, absolutamente nada! Seu grande feito foi vestir fatiota, camisa e gravata e ser obrigado a sentar-se no plenário, para que a TV Senado transmitisse para o país inteiro, no dia 18 de abril, uma colossal mentira: o discurso de 14 páginas lido pelo senador João Costa (de um tal PPL de Tocantins) e assistido apenas pelo garçom, que simulava ser senador. Além de um “presidente” da sessão, não havia mais ninguém. Absolutamente ninguém! Nenhum outro parlamentar ali estava, a não ser o garçom Johnson, de traje escuro como um pomposo senador.

Também o longo discurso escrito foi uma farsa. Com as câmeras da TV focadas nele, o senador João leu algumas frases, gesticulou chamando a atenção dos “demais nobres senadores presentes” para as advertências que fazia! No plenário, o garçom assentia, movendo a cabeça de cima para baixo, em simulada adesão. Nada entendia da barafunda de leis, artigos, incisos e parágrafos citados a granel, mas simulava concordar. Lá pelas tantas, o senador cortou a leitura pelo meio e concluiu:

– Considerando a exiguidade do tempo, solicito que meu pronunciamento seja dado como lido. Obrigado aos senadores e senadoras pela atenção.

Outra mentira: não havia ninguém para lhe dar atenção!

Agora, quando se descobre que até o programa Minha Casa, Minha Vida virou organizado ninho para acobertar ladrões, talvez essas piruetas de circo sejam coisa menor. Mas, mesmo se for só um ventinho leve em meio ao vendaval, a farsa oficializada pelo Senado acaba matando a República, pois transforma em simulacro o que deveria ser a expressão do livre debate da democracia. Corre-se o risco de o parlamento virar tolo brinquedo de adultos ou mera exposição de vaidade e títulos cerimoniosos para obter popularidade. E, por este caminho, ter imunidade para usufruir vantagens.

Longe está o tempo em que o Senado era a expressão mais ilustre da política. Para citar só alguns gaúchos, lá estiveram Pinheiro Machado, mais tarde Getúlio Vargas, Alberto Pasqualini, Luiz Carlos Prestes, Mem de Sá e Daniel Krieger. Ou, entre os vivos, Paulo Brossard.

Agora, nosso senador Paulo Paim acaba de criar a “desaposentadoria”, que multiplicará a burocracia e provocará um caos sobre o significado do que seja aposentar-se. O aposentado poderá “desaposentar-se”, mostrando, assim, que não devia ter-se aposentado ou que a aposentadoria foi uma fraude...

Meses atrás, nosso mais antigo senador, Pedro Simon, defendeu acaloradamente o colega Demóstenes Torres, ligado à rede de corrupção do mafioso Carlinhos Cachoeira, em Goiás. Demóstenes terminou perdendo o mandato, pois foi impossível esconder suas falcatruas.

Por sorte, nossa terceira senadora, Ana Amélia Lemos, está há pouco por lá e ainda não foi contaminada pelo vírus do absurdo e da tolice. Oxalá resista ao assédio desse outro mundo perigosamente cômico e infantil em que transformaram o parlamento e a política partidária no Brasil.

E assim, perplexos, vemos a mentira propagar-se oficialmente como “razão de Estado”. Impotentes ante a avalanche, rimos em desaprovação e tudo segue igual.

Resta a tristeza e fica a pergunta: por que colocam a mentira numa moldura e fazem da farsa a coisa mais importante da vida pública e da política?

P.S. – Pergunto também: iremos permitir que a tragédia de Santa Maria desemboque na impunidade? Vamos permitir que, também aí, ponham a mentira numa moldura, como se o crime fosse obra de arte?

*JORNALISTA E ESCRITOR



REVISTA VEJA - 19/04/2013 às 17:50 \ O País quer Saber

Coluna do Augusto Nunes

Garçom faz ponta para que suplente não discurse para ninguém

PUBLICADO NO GLOBO DESTA SEXTA-FEIRA


MARIA LIMA

De garçom do Senado a dublê de Senador por meia hora. A pedido do Senador João Costa (PPL-TO), o garçom Johnson Alves Moreira fez uma ponta de Senador para que Costa não discursasse no plenário vazio. Como presidente da sessão, já que não havia parlamentares para ocupar cadeiras enquanto estivesse na tribuna, o Senador do Partido da Pátria Livre fez um discurso de 14 páginas sobre aborto e “direitos do nascituro à luz do sistema do Direito romano e do ordenamento jurídico brasileiro”.

Com a TV Senado focada só em sua imagem, Costa encenou para uma plateia inexistente e gesticulou para o Senador falso, que retribuía com gestos afirmativos de cabeça.

- Senhor presidente, senhores Senadores, senhoras Senadoras, senhores e senhoras presentes, e aqueles que acompanham esta sessão pela rádio e TV Senado – começou Costa, para ninguém.

O “garçom-Senador” virou motivo de piadinhas dos seguranças, que sugeriram que ele fizesse um aparte. Indiferente, o Senador de verdade – suplente – discursava. Para encerrar, outra mentirinha, como se o plenário estivesse concorrido:

- Considerando a exiguidade do tempo e o número de oradores, solicito que as peças do pronunciamento sejam dadas como lidas. Obrigado pela atenção! – disse, saudando o plenário, mas tendo à frente só o garçom, também tocantinense.

- Gostei da experiência – disse Johnson.

CÂMARA TERÁ QUE EXPLICAR PEC QUE TIRA PODER DO SUPREMO

ZERO HORA 27 de abril de 2013 | N° 17415

PRAZO DE 72 HORAS. Motivado por PPS e PSDB, Dias Toffoli determinou que Legislativo esclareça a proposta aprovada


A guerra de declarações e ações judiciais entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso arrefeceu – mas a tensão está longe de se dissipar. Reiterando o que fizera na quinta-feira, o presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), sinalizou a intenção de pôr fim no conflito. Um pedido da oposição ao Planalto, porém, pode levar o STF a mais uma intromissão no Legislativo.

Basicamente, o que opõe parlamentares e magistrados são duas Propostas de Emenda à Constituição (PEC). Uma delas propõe que o Congresso tenha a última palavra em relação a decisões que hoje cabem ao Judiciário (veja quadro abaixo). Outra, patrocinada pelo Planalto, limita o acesso de futuras legendas ao tempo de TV e ao Fundo Partidário. Esta última, apontada como casuística por potencialmente prejudicar a ex-senadora Marina Silva, que tenta organizar a nova sigla Rede, teve sua tramitação sustada por liminar do ministro do STF Gilmar Mendes – o que foi visto como uma intromissão indevida de um poder em outro.

A primeira, que tolhe o Supremo de parte de seu poder, provocou os protestos mais estridentes no Judiciário após ser aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que conta com a presença de José Genoino (PT-SP) e João Paulo Cunha (PT-SP), condenados no mensalão.

Provocado por PSDB e PPS, legendas de oposição à presidente Dilma Rousseff, o STF teve ontem a oportunidade de se manifestar sobre a PEC que limita seu poder de ação. O ministro Dias Toffoli abriu prazo de 72h para que a Câmara preste informações sobre a proposta. Além da Mesa Diretora da Câmara, Toffoli solicitará à Advocacia-Geral da União, órgão do Executivo, que se manifeste em relação à PEC – que sequer teve seu mérito avaliado pelos deputados. A proposta foi duramente criticada pelos ministros do STF na quinta-feira. Gilmar Mendes chegou a dizer que “é melhor fechar o Supremo” se o texto for aprovado pela Casa.

Henrique Alves afirmou ontem que ele e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), se encontrarão na segunda-feira com Gilmar Mendes.

– Vamos conversar respeitosamente como os Poderes exigem – disse Alves.

Ele confirmou ainda que telefonou para Mendes para marcar o encontro.

BRASÍLIA


Mendes culpa Planalto por crise no Congresso

Para o ministro Gilmar Mendes, os problemas do Congresso advêm do Palácio do Planalto. Ao negar que haja interferência do Supremo no Legislativo, afirmou:

– Não é o tribunal que está usurpando competência do Congresso. Se há de fato hoje déficit na atuação do Congresso, isso deve-se ao próprio Congresso e à eventual usurpação que é cometida pelo Executivo – disse.

Segundo Mendes, é o “abuso de medidas provisórias e não o tribunal” que pode ameaçar o Legislativo. Ele afirmou, no entanto, que a ameaça “não se deve ao Executivo ter invadido” competências.

– É uma postura que se instaurou, é isso que tem que ser discutido – afirmou.

Para ministro, projeto tem a ver com vários assuntos

Para Mendes, é “difícil dizer” se a aprovação da proposta é uma retaliação às decisões do STF no caso do mensalão, em que quatro deputados federais foram condenados:

– É uma mistura. Tem a ver com várias decisões do Supremo sobre esses vários assuntos, mas pode ter a ver com essa questão também.


PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA

Crítica aos ministros

Autor da PEC 33, que submete as decisões do STF ao Congresso Nacional, o deputado Nazareno Fonteles (PT-PI) esteve ontem em Porto Alegre a convite da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa. O parlamentar rebateu, em entrevista ao Gaúcha Atualidade, as críticas dos ministros do Supremo à sua proposta e classificou de “desonestidade intelectual” a postura de Marco Aurélio Mello, que, na quinta-feira, afirmou que a PEC poderia ser uma retaliação pelo julgamento do mensalão.

Repercussão deformada

Irritado, Fonteles pediu respeito aos ministros e condenou a repercussão da sua proposta, que, segundo ele, “está sendo deformada”.

– Se o Congresso tivesse a devida altivez, já teria anulado todas as decisões do Supremo em matéria legislativa. Há 60 milhões de processos no Judiciário, segundo o CNJ, acumulados sem decisão. Ou seja, não cumprem o dever de casa e querem se meter na casa alheia? É preciso ter mais respeito entre os poderes – enfatizou.



COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O Poder Judiciário precisa sim de uma profunda reforma estrutural e processual, mas não assim na forma de retaliação. A PEC em si não tem nada de abuso, mas é propícia para uma profunda reflexão do papel e dos limites das cortes supremas. Há duas questões que é preciso enfrentar urgentemente, alterando dispositivos constitucionais:

- a descentralização do transitado em julgado passando a maioria dos casos para o trâmite final nos tribunais federais regionais e para os tribunais de justiça dos Estados. Não é possível que tudo seja decidido pelas mãos de poucos Ministros nas cortes supremas. É irracional e sobrecarrega o poder máximo do judiciário com picuinhassem relevância nacional e internacional.

- as decisões oriundas das cortes supremas deveria ser sempre através de colegiado de no mínimo três magistrados. As ordens e liminares expedidas por apenas um Ministro não deveriam ser legais, já que podem encorpar interesses particulares.

- Toda lei antes de sancionada deveria passar pelo crivo do STF e dos Tribunais de Justiça dos Estados para garantir a eficácia jurídica. Exemplos negativos temos na lei seca, lei dos crimes hediondos, lei de acesso, etc...





FARRA DOS JATINHOS OFICIAIS

REVISTA VEJA 17/04/2013 às 17:54

Tribunal de Contas deve agir contra a espantosa FARRA DOS JATINHOS OFICIAIS — 5,8 mil voos em 14 meses de governo Dilma!

Coluna do Ricardo Setti



Esta foto de divulgação da Embraer mostra vários tipos de aeronaves, não necessariamente correspondentes aos 18 jatos executivos da FAB usados para viagens de figurões do governo. Uso a foto para ilustrar a "farra dos jatinhos" -- uma vez que, até por estarem a todo momento levando alguém para algum lugar, é inviável fotografar os aparelhos da FAB estacionados no mesmo aeroporto

Até que enfim alguém faz alguma coisa.

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União deve pedir aos ministros a realização de uma auditoria sobre o uso de jatinhos da Força Aérea Brasileira (FAB) por parte de ministros e outros funcionários graúdos do governo Dilma.

A iniciativa é do procurador Marinus de Vries Marsico, que analisa o caso que relato abaixo antes de tomar providências.

Enquanto a FAB, com infinita paciência, espera há mais de uma década a atualização de sua obsoleta frota mais avançada de defesa aérea do país, objeto de uma interminável concorrência que já rola há quatro mandatos presidenciais, figurões do governo se refestelam espantosamente em viagens a torto e a direito, ocupando nessas mordomias recursos e oficiais aviadores.

Durante o governo Dilma — que inclui 2011 e, em 2012, os meses de janeiro e fevereiro — oficiais aviadores da FAB tiveram que realizar, em 18 diferentes aeronaves, 5,8 MIL VOOS levando ministros e figurões do governo! O equivalente a 630 VOLTAS AO REDOR DA TERRA ou 10 VIAGENS DE IDA E VOLTA À LUA.

O jornal O Estado de S. Paulo solicitou ao Departamento de Engenharia Aeronáutica da USP em São Carlos e publicou um levantamento histórico com esses e outros dados, num louvável serviço público prestado ao país, mostrando dados absolutamente estarrecedores sobre os abusos praticados às custas da gloriosa FAB.

Isso num governo que, quando seus quadros estavam na oposição, criou um escândalo em torno de uma única viagem de um ministro do presidente Fernando Henrique Cardoso e que não cessou de criticar o “excesso de viagens” internacionais do próprio FHC — algo que, como se sabe, o lulalato superou em mais de 200%.

E — vejam bem! — depois que, no começo de seu mandato, Dilma recomendou “parcimônia” no uso de jatinhos. A “parcimônia” resultou num aumento de 5% na farra dos jatinhos já no primeiro ano de seu governo em relação ao ano anterior, e o tempo de voo a bordo das aeronaves da FAB cresceu 10%.

Não perca esse extraordinário levantamento do Estadão.

sexta-feira, 26 de abril de 2013

CONFLITO ANUNCIADO

FOLHA.COM 26/04/2013 - 03h30


Editorial



Presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) agiu bem ao suspender, até segunda ordem, um projeto que poderia transformar a tensão entre o Legislativo e o Judiciário em efetiva crise institucional, com graves prejuízos para o país.

O atrito entre membros do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não diminuiu --ao contrário, aumentou.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara acabara de aprovar (com a presença de apenas 21 de seus 68 integrantes) uma proposta de emenda constitucional que tenderia a limitar inexplicavelmente as atribuições do Supremo.

O projeto, do deputado Nazareno Fonteles (PT-PI), tirava do STF o poder de dar a última palavra quanto à constitucionalidade das leis aprovadas pelo Congresso. Tal papel, a mais básica função de uma corte constitucional, é uma garantia indeclinável para o bom andamento de uma democracia.

Ao decidir se uma norma aprovada pelo Congresso concorda ou não com a Constituição, o STF aplica um dos freios e contrapesos que, em conjunto, garantem o equilíbrio entre os Poderes da República.

Aos membros da CCJ pareceu chegado o momento de enfraquecer essa prerrogativa. Caso o Supremo suspendesse alguma lei, por julgá-la inconstitucional, caberia ao Legislativo endossar ou desautorizar a decisão --reduzindo o STF, na prática, a uma espécie de consultoria jurídica de luxo.

Aprovado pela CCJ com o apoio de dois réus do mensalão (os petistas José Genoino e João Paulo Cunha), o projeto carregava evidente potencial deletério. Teria ainda de passar, é certo, pelo crivo do plenário e, depois, pelo Senado.

Com isso, o clima entre o Legislativo e o Supremo já estava bastante anuviado. Logo depois, o ministro Gilmar Mendes enxergou sinais de casuísmo --e tem razão-- no projeto da Câmara que dificulta a criação de novos partidos para concorrer nas eleições de 2014.

Sem análise pormenorizada do mérito, mas já adiantando sua opinião, Mendes interrompeu a tramitação da manobra antes de seu exame pelo Senado. A liminar, que não deixa de ser estranha em vista de a lei ainda estar em tramitação, será avaliada pelo plenário do STF.

Embora o primeiro golpe contra a autonomia de outro Poder, desta feita, tenha partido da Câmara, Henrique Alves e Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, reagiram duramente à decisão de Mendes. Afirmaram, com certo exagero, que o STF se intromete nos assuntos do Legislativo.

Menos mal que Alves tenha se comprometido a congelar a tramitação da PEC desequilibrada. Se é ruim assistir a essa disputa retórica, seria péssimo vê-la afetar seriamente os pilares da República.

UMA PROPOSTA ALOPRADA


Brincando de desmontar a ordem institucional. Uma proposta “aloprada” da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara deixa à mostra a leviandade com que certos projetos são arquitetados


EDITORIAL
O GLOBO
Atualizado:26/04/13 - 0h00



Não nasceu sob um signo favorável a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que pretende limitar os poderes do Supremo Tribunal Federal. Segundo o líder do PT na Câmara, José Guimarães, a proposta “não é assunto do partido, e a matéria não foi discutida na bancada”. O presidente da Casa, deputado Henrique Alves , declarou que a decisão da Comissão de Constituição e Justiça foi “inusitada”, e que não instalará a comissão especial encarregada do assunto enquanto não tiver “uma definição muito clara do que é o respeito e a harmonia dos poderes”. Sábias palavras, ecoadas pelo vice-presidente da República, Michel Temer, para quem “houve uma demasia. A palavra última há de ser sempre a do Poder Judiciário, especialmente em matéria de constitucionalidade”.

Entraram, assim, em ação os bombeiros, o que é consolador, mas sem que se desfaça totalmente o clima criado pela proposta “inusitada” da CCJ da Câmara. De um dia para a noite, sem discussão, tira-se da cartola uma armação destinada a tolher as ações do Supremo. Qual sua origem? Uma comissão da Câmara de que fazem parte dois “mensaleiros” e um político que, se sair do Brasil, será preso pela Interpol.

A PEC aprovada por unanimidade pela CCJ estabelece que, quando o STF declarar a inconstitucionalidade de emendas à Constituição aprovadas pelo Congresso, isso não produzirá efeito imediato. A decisão da Corte será submetida à apreciação do Congresso. Se deputados e senadores votarem contra a decisão do STF, recorre-se à consulta popular.

Assim, com uma penada, revoga-se o ordenamento jurídico do país, baseado na separação dos poderes, e entra-se no terreno da “democracia popular” tão estimada por esquemas como o chavismo e o kirchnerismo (que acaba de enfiar goela abaixo do seu Congresso uma proposta nesses moldes).

Não é preciso muito esforço (bastando examinar a composição da CCJ) para ver nessa proposta, que parece natimorta, mais um dos movimentos de reação ao julgamento do “mensalão”. Quer-se, de todos os modos, castigar o Supremo por ter cumprido o seu papel.

Um dos argumentos para isso é dizer que o Supremo vai além das suas atribuições. Uma das peculiaridades do nosso sistema institucional é uma Constituição detalhista, carregada de regulações que poderiam caber perfeitamente em leis ordinárias. Enquanto essa situação perdurar, o STF estará mesmo um pouco por toda parte, sobrecarregado de atribuições. Mas isso não lhe retira o papel de fiel da balança no jogo dos três poderes.

Basta examinar com cuidado o julgamento do “mensalão” para verificar que ali existiram, em doses generosas, o trabalho sério e o discernimento que parecem estar longe do alcance da CCJ da Câmara.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

GARÇONS DE LUXO: SITUAÇÃO É REGULAR, DIZ SENADO


Situação de garçons com altos salários é regular, diz Senado. Nomeados por ato secreto, eles chegam a ganhar até R$ 14,6 mil

VINICIUS SASSINE 
O GLOBO
Atualizado:25/04/13 - 8h54


Café caro: um dos garçons serve o senador Paulo Paim (PT-RS) 
Ailton de Freitas/22-4-2013


BRASÍLIA — O Senado considera “regularizada” a situação dos sete garçons que ganharam cargos de confiança graças a um ato secreto, recebem remunerações de até R$ 14,6 mil e tiveram os salários aumentados por meio de promoções ao longo de 12 anos servindo o cafezinho dos senadores em plenário. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), disse nesta quarta-feira que levantaria os dados sobre a situação dos servidores para informar até o fim do dia o que poderia ser feito. No fim da tarde, a Secretaria de Comunicação Social do Senado divulgou nota em que nega a existência hoje de atos secretos. “Todos os atos estão devidamente regularizados e publicados, inclusive os citados na reportagem”, diz a nota.

Desde a chegada à presidência do Senado, em fevereiro, Renan vem anunciando medidas de cortes de gastos, uma forma de melhorar a imagem da Casa e do próprio senador, denunciado pela Procuradoria Geral da República por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso num suposto esquema de notas frias. Renan foi perguntado se poderia adotar uma medida em relação aos garçons. Ele já decidiu encaminhar 20 médicos e outros profissionais de saúde concursados do Senado para a rede pública no Distrito Federal.

— Vou levantar as relações trabalhistas (dos garçons em atuação no plenário e no cafezinho contíguo) e depois a gente se fala — disse Renan.

O GLOBO mostrou na quarta-feira que sete garçons (três com atuação exclusiva no plenário e quatro na copa por onde circulam os parlamentares) recebem remunerações entre R$ 7,3 mil e R$ 14,6 mil. Eles ocupam cargos comissionados, de assistentes parlamentares, e chegaram à função de uma só vez, em 17 e 18 de outubro de 2001. A nomeação ocorreu por ato secreto assinado pelo então diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, hoje deputado distrital. O ato é de 20 de setembro de 2001, dois dias após o senador Jader Barbalho (PMDB-PA) renunciar à presidência da Casa.

Todos estão vinculados à Secretaria Geral da Mesa e conseguiram mais do que dobrar as remunerações, com a conquista de cargos de confiança mais bem remunerados na hierarquia de salários. A maior remuneração bruta em março foi de José Antonio Paiva Torres, o Zezinho. Dos R$ 14,6 mil que constam no contracheque do garçom, R$ 5,2 mil se referem a horas extras. Outro servidor com atuação exclusiva no plenário, Jonson Alves Moreira recebeu R$ 7,3 mil para servir cafezinho.

O Senado sustenta que as “atividades de apoio” prestadas pelos assistentes parlamentares estão previstas no regulamento administrativo. O ato de Agaciel Maia deu cargos comissionados a 13 pessoas, boa parte delas terceirizadas. “Eles estão em exercício na Secretaria Geral da Mesa, Presidência, 1ª Secretaria e residência oficial”, diz a nota. “Remunerações acima dos valores disponíveis no Portal da Transparência tem caráter eventual e representam o pagamento por exercício de atividade extraordinária”, alega o Senado, em relação às horas extras.

Na Câmara, um acordo de cooperação com o Senac em vigor desde 2008 garante os serviços de atendimento aos deputados, sem custos para a Casa, segundo a assessoria de imprensa. Garçons servem apenas os deputados que ficam na Mesa do plenário. No restaurante contíguo, café, água e comida são servidos aos parlamentares, assessores e visitantes.

ABSURDO EM FORMA DE PROJETO


ZERO HORA 25 de abril de 2013 | N° 17413

PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA


Que o deputado Nazareno Fonteles(PT-PI) tenha apresentado uma proposta de emenda constitucional para esvaziar os poderes do Supremo Tribunal Federal, até se entende: projeto absurdo é o que não falta no Congresso. O problema é a Comissão de Constituição e Justiça ter aprovado a admissibilidade da PEC 33, que dá ao Congresso a última palavra para dizer se uma lei é constitucional ou não.

A proposta afronta cláusulas pétreas da Constituição e tira do Supremo sua principal tarefa, que é a de interpretar a Constituição. A PEC 33 estabelece que o Congresso terá que aprovar as chamadas súmulas vinculantes do STF, mecanismo que determina que as decisões da Corte devam ser seguidas pelas demais instâncias, e a inconstitucionalidade de emendas à Constituição.

Na justificativa da emenda, Nazareno condena o “ativismo judiciário”, ignorando que, na maioria das vezes, o Supremo decide no vácuo do Congresso, que se omite em questões cruciais para a sociedade para fugir do desgaste de votá-las. São incontáveis os casos em que deputados e senadores fogem de temas polêmicos e o Supremo se vê obrigado a decidir. Nessa longa lista, estão o casamento gay, o aborto de anencéfalos e o uso de células-tronco embrionárias. Foram temas como esses que fizeram a bancada evangélica agarrar-se à proposta de Fonteles como tábua de salvação para sua estratégia de transformar o Brasil numa teocracia. Na mira estão, também, decisões que afetam diretamente os políticos, como número de vereadores e pontos da Constituição que o Congresso nunca se preocupou em regular.

Há um tom de revanche na proposta e na sua aprovação pela comissão, em sessão com a presença de dois petistas condenados pelo STF no julgamento do mensalão – João Paulo Cunha e José Genoino. A prosperar a emenda, o Supremo deixará de ser o guardião da Constituição, que ficará à mercê dos interesses de quem for capaz de formar uma maioria. Como disse o ministro Marco Aurélio Mello, seria uma virada de mesa que ameaçaria a harmonia entre os poderes.

PROMESSAS REPETIDAS

ZERO HORA 25 de abril de 2013 | N° 17413

EDITORIAIS




Entre promessas renovadas e algumas mais recentes que, se não forem tocadas logo, também correm o risco de voltar no futuro sob nova roupagem, o Rio Grande do Sul tem uma série de em- preendimentos pela frente, envolvendo governos federal, estadual e municipais, com potencial para assegurar um salto de qualidade no cotidiano dos gaúchos. Daí a importância de que a sociedade, a começar pela parcela mais favorecida diretamente, se mostre o mais atenta possível aos projetos e pressione para transformá-los em realidade. Tanto pelo elevado custo, no caso de quase R$ 7 bilhões, quanto pela sua complexidade, as obras previstas para o Estado tendem a se arrastar indefinidamente se não forem cobradas de forma permanente.

O projeto de custo mais elevado, de no mínimo R$ 2,4 bilhões, é o do metrô da Capital, hoje cercado de indefinições. O de maior viabilidade neste momento é o do aeroporto Salgado Filho. Se a mais recente estimativa oficial for finalmente cumprida, haverá menos transtornos nos embarques e desembarques em dias de nevoeiro, típicos do outono gaúcho. Essa, porém, é uma promessa que já foi renovada pelo menos sete vezes, sem nunca ter sido cumprida.

Tanto a segunda ponte do Guaíba, hoje na fase do projeto de engenharia, quanto a ERS-010, a nova rodovia entre Sapiranga e Porto Alegre, quanto o prolongamento da BR-448 de Sapucaia do Sul até Estância Velha e as recém-anunciadas melhorias da BR-116 são alternativas essenciais para desafogar o tráfego em importantes centros urbanos. A esses projetos, soma-se a construção de novo trecho da BR-392, aguardado com expectativa pelo seu potencial de facilitar o escoamento da produção primária.

Diante dos prejuízos enfrentados pelo Estado devido à precariedade de sua infraestrutura, todos esses são investimentos que não deveriam mais sofrer qualquer atraso no cronograma. Os gaúchos podem contribuir para mantê-los em dia, procurando ficar permanentemente informados sobre o seu andamento e cobrando o máximo de eficiência do setor público.

desembarques em dias de nevoeiro, típicos do outono gaúcho. Essa, porém, é uma promessa que já foi renovada pelo menos sete vezes, sem nunca ter sido cumprida.

Tanto a segunda ponte do Guaíba, hoje na fase do projeto de engenharia, quanto a ERS-010, a nova rodovia entre Sapiranga e Porto Alegre, quanto o prolongamento da BR-448 de Sapucaia do Sul até Estância Velha e as recém-anunciadas melhorias da BR-116 são alternativas essenciais para desafogar o tráfego em importantes centros urbanos. A esses projetos, soma-se a construção de novo trecho da BR-392, aguardado com expectativa pelo seu potencial de facilitar o escoamento da produção primária.

Diante dos prejuízos enfrentados pelo Estado devido à precariedade de sua infraestrutura, todos esses são investimentos que não deveriam mais sofrer qualquer atraso no cronograma. Os gaúchos podem contribuir para mantê-los em dia, procurando ficar permanentemente informados sobre o seu andamento e cobrando o máximo de eficiência do setor público.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

GARÇOM DE LUXO VIRA DUBLE DE SENADOR


Garçom vira dublê de senador para parlamentar não discursar sozinho. João Costa encerra a fala como se o plenário do Senado estivesse muito concorrido. Garçom ganha cópia do discurso de presente para levar para casa

MARIA LIMA
O GLOBO
Atualizado:19/04/13 - 9h35


João Costa, sem nenhum senador no plenário Maria Lima / Agência O Globo


BRASÍLIA - De garçom do plenário do Senado a dublê de senador por meia hora. A pedido do senador João Costa (PPL-TO), por meio de um bilhetinho, o garçom Jonhson Alves Moreira abandonou seus afazeres na copa e fez uma ponta de senador para que ele não discursasse para o plenário vazio. Como presidente da sessão, já que não tinha nenhum parlamentar para ocupar a cadeira enquanto estivesse na tribuna, o senador do Partido da Pátria Livre (PPL) fez um longo discurso, de 14 páginas, uma reflexão sobre aborto e “direitos do nascituro à luz do sistema do direito romano atual e do ordenamento jurídico brasileiro”.

Com a TV Senado focada somente em sua imagem, muito empolgado João Costa encenou para uma plateia inexistente e gesticulou para o “senador fake”, que retribuía com gestos aprovativos de cabeça.

- Senhor presidente, senhores senadores, senhoras senadoras, senhores e senhoras presentes, e aqueles que acompanham esta sessão pela rádio e TV Senado - começou João Costa, sendo que o presidente era ele mesmo e , no plenário, só o garçom plantado estrategicamente à sua frente.

Perto da tribuna, conversando com os jornalistas, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) estranhou a cena:

- Mas ele não tinha que me chamar para ficar na presidência enquanto discursava na tribuna?

Com taquígrafos a postos, o garçom senador virou motivo de piadinhas dos seguranças, que tiraram fotos e brincavam sugerindo que Jonhson Moreira fizesse um aparte. Outros pediam que os outros garçons servissem a ele um cafezinho.

Indiferente à situação inusitada, o senador de verdade - um suplente de senador - continuava seu discurso, contando uma estória sobre um casal de alemães de olhos azuis, com 1,95 metro de altura e várias doenças genéticas, que transferiu um embrião para o útero de uma anã, de 1,20 metro de altura e sem nenhuma doença genética.

- Indaga-se, nove meses depois, após o nascimento, como será a criança? Inegavelmente ela terá as características físicas e genéticas dos pais alemães - discursou o senador João Costa.

Para encerrar, João Costa protagonizou outra mentirinha para os telespectadores. Encerrou como se o plenário estivesse muito concorrido.

- Considerando a exiguidade do tempo, e o número de oradores inscritos, senhor presidente, solicito que as demais peças do meu pronunciamento sejam dadas como lidas. Muito obrigada pela atenção e gentileza! - disse, saudando o plenário, mas tendo a sua frente apenas o garçom, que retribuiu com um aceno de mão.

Tocantinense como João Costa, o garçom disse que ele lhe pediu para ficar bem no centro do plenário, em pé, para o senador não perder o foco durante o discurso.

- Ele pediu para eu ficar lá para ele não perder o foco. Mas eu gostei muito da experiência de senador - disse Jonhson ao final.

- O meu senador já está treinado . Fica lá para eu balizar meu discurso - agradeceu João Costa, ao descer da mesa e abraçar o conterrâneo.

Para compensar o trabalho do garçom, João Costa o presenteou com a cópia do discurso, todo rabiscado de caneta marca texto.

- Toma de presente! Mais um para você levar para casa.

GARÇONS DE LUXO


Nomeados por atos secretos, sete garçons recebem remuneração de até R$ 15 mil no Senado. Todos contratados de uma só vez, em 2001, pelo então diretor-geral do Senado, Agaciel Maia

VINICIUS SASSINE
O GLOBO
Atualizado: 24/04/13 - 11h05


O garçom do Senado Federal, José Antonio,(Zezinho) durante seu trabalho servindo água mineral e cafezinho para os senadores O Globo / Ailton de Freitas


BRASÍLIA - O cafezinho dos senadores tem um custo alto, menos pelo produto servido, mais pelos garçons que servem os parlamentares no plenário e na área contígua. O Senado tem uma equipe de garçons com salários até 20 vezes maiores do que o piso da categoria em Brasília. Para servir os senadores, sete garçons recebem remuneração entre R$ 7,3 mil e R$ 14,6 mil — três deles atuam exclusivamente no plenário, e quatro ficam no cafezinho aos fundos, onde circulam parlamentares, assessores e jornalistas. O grupo ocupa cargo comissionado na Secretaria Geral da Mesa com título de assistente parlamentar. Todos nomeados de uma só vez, num dos atos secretos editados em 2001 pelo então diretor-geral do Senado, Agaciel Maia.

Nestes 12 anos, os garçons (ou assistentes parlamentares) foram promovidos a cargos comissionados superiores ao mencionado no ato secreto: saíram do AP-5, que tem remuneração básica de R$ 3,3 mil, para o AP-4 e até mesmo o AP-2, com vencimentos básicos de R$ 6,7 mil e R$ 8,5 mil, respectivamente. Em março, o maior salário pago foi a José Antonio Paiva Torres, o Zezinho, que serve exclusivamente os senadores no plenário. Ele recebeu R$ 5,2 mil somente em horas extras. A remuneração bruta chegou a R$ 14,6 mil.

Outros dois garçons também têm a obrigação de cuidar do cafezinho dos senadores no plenário. Um deles é Jonson Alves Moreira, que virou notícia na última sexta-feira, quando O GLOBO mostrou Jonson fazendo as vezes de um dublê de senador, num plenário vazio, a pedido do único orador que fazia uso da palavra naquele momento, João Costa (PPL-TO). Enquanto João Costa falava, Jonson concordava com a cabeça. O salário pago a ele em março foi de R$ 7,3 mil.

Na copa, ficam os outros quatro garçons. Todos eles são amigos de longa data. O grupo assumiu os cargos de uma só vez, em 17 e 18 de outubro de 2001, menos de um mês depois da edição do ato secreto por Agaciel Maia, hoje deputado distrital. Boa parte era vinculada a empresas terceirizadas. A nomeação a um cargo comissionado ocorreu num momento de vazio da gestão do Senado. O ato secreto é de 20 de setembro de 2001, dois dias depois da renúncia do senador Jader Barbalho (PMDB-PA) ao mandato e à presidência do Senado, e no dia em que Ramez Tebet assumiu o comando da Casa.

— Aqui todo mundo se conhece há um tempo, a gente viu muitos senadores passarem por aqui. O serviço é bem tranquilo — diz um dos garçons do Senado.

Os assistentes parlamentares estão vinculados à Secretaria Geral da Mesa. A secretaria, aliás, tem um garçom do grupo — que diz apenas distribuir papéis atualmente — à sua disposição. Em resposta ao GLOBO, a assessoria de imprensa do Senado afirma que os servidores realizam atividades de apoio previstas no Regulamento Administrativo da Casa.

sábado, 20 de abril de 2013

NAS ASAS DA FAB


O Estado de S.Paulo
20 de abril de 2013 | 2h 08


OPINIÃO


Os cada vez mais numerosos ministros da presidente Dilma Rousseff estão transformando a Força Aérea Brasileira (FAB) em empresa de táxi aéreo. A prerrogativa do uso de jatinhos da FAB para transporte de autoridades, instituída prioritariamente para casos excepcionais, parece que se tornou regra, e a um custo bastante pesado para os cofres públicos. Em muitos casos, conforme noticiou o Estado (15/4), a agenda dos ministros é maquiada para se enquadrar nas exigências legais e, ao mesmo tempo, encobrir atividades privadas ou eventos partidários.

A regulamentação do uso de jatinhos da FAB pelos ministros, conforme o decreto presidencial 4.244, de maio de 2002, prevê que as aeronaves da FAB devem ser solicitadas, em primeiro lugar, "por motivo de segurança e emergência médica". Pela ordem de prioridade, só depois é que aparecem "viagens a serviço" e "deslocamentos para o local de residência permanente".

Além disso, o artigo 2.º diz que, "sempre que possível, a aeronave deverá ser compartilhada por mais de uma das autoridades", e o artigo 4.º autoriza os ministros a "optar por transporte comercial" nos casos de emergência e de deslocamento para a residência, com despesas pagas pelos Ministérios.

Em resumo, o decreto trata de situações que deveriam ser incomuns. No entanto, as 5,8 mil viagens dos ministros de Dilma, em pouco mais de dois anos de governo, mostram que o uso dos jatinhos da FAB está incorporado ao cotidiano da Esplanada dos Ministérios. A situação é tão constrangedora que, em janeiro de 2011, a presidente pediu a seus ministros que recorressem menos aos serviços da FAB e que usassem, sempre que possível, as companhias aéreas. Não se trata somente de pôr termo a um abuso rotineiro, mas de reduzir os gastos públicos, pois viajar em avião de carreira é muito mais barato. O apelo de Dilma, porém, caiu em ouvidos moucos: o número de voos com os jatinhos da FAB subiu 5% entre 2011 e 2012.

O ministro-chefe da Advocacia-Geral da União, Luís Inácio Adams, por exemplo, requisitou um Embraer ERJ 145, com capacidade para 36 passageiros, para uma viagem a São Paulo em agosto de 2011, ocasião em que visitou o ex-presidente Lula. Em valores atualizados, estima-se que esse voo tenha custado R$ 6,6 mil. Se Adams optasse por um voo de carreira, a despesa teria sido de R$ 700. Está entre as atribuições do advogado-geral cuidar de casos de ex-presidentes, mas a agenda de Adams não registrou o encontro com Lula - logo, ele não estava oficialmente "a serviço".

Em janeiro passado, o vice-presidente Michel Temer usou um jatinho da FAB para ir a São Paulo, onde passou o dia em encontros de seu partido, o PMDB. De acordo com sua agenda, naquele dia ele não teve nenhum compromisso como vice. Em outubro de 2012, Temer se encontrou com Fernando Haddad, também em São Paulo, para conversar com o petista sobre o apoio do PMDB na disputa pela Prefeitura. Do mesmo modo, a agenda de Temer não registrou atividades relativas a seu cargo no governo naquela data.

Casos como esses são comuns. Em grande parte deles, os ministros marcam compromissos irrelevantes às sextas e às segundas-feiras nas cidades onde moram, para ter o conforto dos jatinhos no fim de semana. Quando informam qual serviço precisam prestar, os ministros descrevem situações genéricas. A agenda do ministro da Fazenda, Guido Mantega, assíduo cliente da Aeronáutica, justificou uma recente viagem a São Paulo, numa sexta-feira, dizendo que ele tinha "reuniões internas" no Banco do Brasil.

É evidente que os ministros não querem se juntar aos brasileiros comuns que se apinham nos balcões de check-in dos aeroportos, preferindo a mordomia oferecida pela FAB. Ao explicar o privilégio, porém, os ministros alegam que sua atitude nada tem de ilegal ou de imoral. O ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, chegou a dizer que, ao usar os jatinhos da FAB, estava colaborando para a manutenção das aeronaves, pois elas "necessitam voar determinadas horas". Talvez Cardozo ache que, em vez de criticá-lo, devíamos lhe ser gratos.

FORA DO CONTEXTO

ZERO HORA 20 de abril de 2013 | N° 17408

EDITORIAIS


É compreensível que o governo do Estado se preocupe em utilizar pesquisas de opinião para auscultar angústias e prioridades da população e até para descobrir como os cidadãos percebem o seu desempenho. Neste sentido, a pesquisa contratada pelo Palácio Piratini ao Instituto Foco Opinião e Mercado, que só veio à tona pela iniciativa da Rádio Gaúcha graças à Lei da Transparência, pode ser um instrumento importante para a avaliação e até mesmo para a revisão de políticas públicas. O que causa estranhamento é a inclusão no levantamento de uma questão específica sobre a imparcialidade de Zero Hora, como se fosse o único jornal existente num Estado que possui mais de 300 veículos impressos ou como se a aferição tivesse outro propósito que não o de subsidiar o governo de informações úteis para seu relacionamento com a população.

A secretária de Comunicação Vera Spolidoro, argumenta que a pergunta tem sentido porque, preocupado em “democratizar a comunicação”, o governo tratou de investigar o que a população pensa do jornal mais lido do Rio Grande do Sul. Em primeiro lugar, não é tarefa de um governo intrometer-se numa atividade privada, que já é fiscalizada pelos cidadãos por meio da livre escolha. Só nos regimes autoritários é que os governantes se julgam no direito de tentar interferir no que o público deve ler ou ouvir. Em segundo, a inclusão da pergunta específica sobre ZH desrespeita e desconsidera centenas de outros jornais que circulam no RS.

Numa democracia, veículos privados de comunicação têm amplo direito de fazer suas escolhas editoriais sem qualquer intromissão de governos ou partidos, o que inclui também a opção pela imparcialidade. Este é o caso de Zero Hora, cuja imparcialidade foi referendada pela própria pesquisa. Mas um governo investir recursos públicos para avaliar uma suposta inclinação de um veículo privado – e só um – configura um gesto nada republicano, para usarmos uma palavra tão ao gosto do governador Tarso Genro.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

FORRÓ PROMOVIDO COM DINHEIRO PÚBLICO

REVISTA ÉPOCA 12/04/2013 22h01

O forró promovido pelo senador Ciro Nogueira com dinheiro público no Piauí. Em 2010, quando ainda era deputado, Ciro e alguns de seus colegas de bancada destinaram emendas parlamentares a promover no Estado as festas da banda Xenhenhém e assemelhadas

LEANDRO LOYOLA


SÓ SUCESSOS
A banda Xenhenhém. Ela recebeu R$ 24 mil de cachê para cantar “Peruca de corno”, “Bebe pra dormir” e “Toque retal” (Foto: SECOM-Prefeitura Municipal Luzilândia)

Eu tenho dinheiro e faço tudo que quiser/eu gosto da bagaceira, forró, cachaça e mulher. A letra é cantada em ritmo de forró pelo sanfoneiro Leo, de chapéu e botas de vaqueiro. Leo lidera a banda Xenhenhém, uma máquina de produzir shows e vender produtos. Bebe pra dormir/acorda pra beber/o futuro desses caras/é ver a galha crescer. Enquanto Leo canta, Pônei toca triângulo e dança fantasiado de boneca. Seu Madruga toca zabumba com uma cesta de palha na cabeça. No fundo do palco, mais discretos, o baixista Shrek balança as orelhas de ogro, e o baterista “3 em 1” veste um elmo viking. Com letras que falam de bebida, mulheres, dinheiro e – acredite – exames proctológicos, as apresentações da Xenhenhém fazem sucesso no interior do Piauí. Um de seus ofícios é tocar em festivais bancados por prefeituras. O público adora. Os políticos também. O senador Ciro Nogueira, do PP do Piauí, eleito na semana passada presidente nacional do partido, é um dos mais entusiasmados fãs da Xenhenhém.
A Controladoria-Geral da União suspeita de irregularidades
em sete prefeituras

Recentemente, a Controladoria-Geral da União descobriu que políticos como ele se acabam no xote antes mesmo de sair a primeira nota da sanfona de Leo. Dançam agarradinhos ao dinheiro público. A festa começa, como a plateia sempre espera, no Congresso. Em 2010, quando ainda era deputado, Ciro e alguns de seus colegas de bancada do Piauí destinaram suas emendas parlamentares a promover no Estado as festas da Xenhenhém e assemelhadas. Emendas são um instrumento de que os parlamentares dispõem para atender às mais urgentes necessidades de seus constituintes – normalmente por meio de obras, como construção de escolas e hospitais. Ciro e sua turma resolveram gastar esse dinheiro de outro modo. Apresentaram suas emendas ao Ministério do Turismo. A Pasta repassou o dinheiro das emendas a prefeituras piauienses. No papel, o repasse foi feito para “promoção de eventos para divulgação do turismo interno”. O que o “turismo interno” tem a ver com o batuque de Seu Madruga é um mistério que nem Pônei consegue explicar. A CGU detectou todo tipo de irregularidade nas festanças: ausência de licitação, conluio entre empresas, superfaturamento na contratação das bandas – e, por fim, ausência de comprovação de que alguns dos “eventos” de fato existiram.


SEM CONHECIMENTO
O senador Ciro Nogueira, eleito na semana
passada presidente nacional do PP. “Eu não
sabia” (Foto: Igo Estrela/ÉPOCA)

Dezoito prefeituras receberam dinheiro das emendas de Ciro e seus colegas. Ao todo, R$ 2,8 milhões. Segundo a CGU, o dinheiro não apenas saiu das emendas de Ciro, como foi parar nas contas de empresas ligadas a ele, todas envolvidas nas fraudes descobertas pelos auditores. O elo entre Ciro e as irregularidades chama-se Júlio Arcoverde, amigo de Ciro e, até fevereiro, por indicação dele, diretor do Departamento Nacional de Trânsito, o Denatran, órgão responsável por definir políticas de trânsito para o país. Arcoverde e Ciro são tão próximos que já foram sócios em três empresas. No caso Xenhenhém, quatro empresas de Arcoverde ganharam dinheiro: elas aparecem em 18 dos 19 contratos considerados suspeitos pela CGU. Receberam para contratar as bandas e montar a infraestrutura das festas. A CGU suspeita que as empresas de Arcoverde foram escolhidas graças a um arrasta-pé político. Certamente, ganharam mais que o razoável. Numa festa no município de Regeneração, a Xenhenhém recebeu R$ 24 mil para tocar por três horas sucessos como “Peruca de corno”, “Toque retal” e “Bebe pra dormir”. Um mês depois, para tocar em Amarante, a Xenhenhém pediu apenas R$ 6 mil por duas horas e meia de show. Também em Regeneração, outra banda, a Reprise, recebeu R$ 43.700 pelo show. Mas pediu apenas R$ 12 mil para tocar em Amarante. Somente no festival de Regeneração, a CGU estima os desvios em R$ 65 mil.

Na hora do bate-coxa com dinheiro público, Ciro sempre puxa Arcoverde juntinho. Entre janeiro de 2011, quando assumiu o mandato de senador, e janeiro deste ano, o gabinete de Ciro pagou R$ 163 mil à Trevo Locadora de Veículos, em Teresina, por “serviços de aluguel de carros”. A Trevo pertence à mulher de Arcoverde. No telefone atribuído à Trevo Locadora, a secretária atende com a frase: “Júlio Arcoverde Corretora de Seguros, boa tarde!”. A outra sócia da Trevo chama-se Lilian Ruth Martins. Lilian aparece como sócia em outra empresa, a Shopping do Automóvel, do próprio Ciro.

“Não sabia (que as empresas de arcoverde foram contratadas com dinheiro das emendas dele). O serviço foi prestado (pela Trevo)”, disse Ciro, dentro do elevador privativo do Senado. Assim que a porta se abriu, Ciro abandonou ÉPOCA no salão. Saiu rapidamente e entrou num carro – oficial, do Senado, não da Trevo Locadora. Em nota enviada depois, Ciro afirma que “não há, nem jamais houve, qualquer questionamento legal sobre os referidos serviços (da locadora de carros Trevo)”. “Sou correligionário de Ciro”, diz Arcoverde. Ele acaba de assumir o comando do PP no Piauí, para preparar a campanha de Ciro ao governo do Estado, no ano que vem. “Ciro não tem nada a ver com isso, viu? A Trevo presta serviço há 15 anos (a Ciro).” O vocalista Leo diz não saber da investigação da CGU nem por que é acusado de ter recebido das prefeituras um cachê gordo demais: “O valor (do cachê) é subjetivo. Prestei os serviços”. Leo e a turma da Xenhenhém sabem apenas que o forró do Ciro vai continuar: No toque da sanfona/o forrozão vai truar/Vem balançar/Remexe o bumbum/lentin, lentin/bote o corpo pra acelerar/pra lá e pra cá.Como o próprio Leo diria: “Arre, égua!”.

CASUÍSMO PREOCUPANTE

ZERO HORA 19 de abril de 2013 | N° 17407


EDITORIAIS


Uma semana depois de acabar com a possibilidade de uma ampla reforma política, a Câmara aprovou na noite da última quarta-feira projeto de lei que inibe a criação de novos partidos. Num país em que as siglas se multiplicam às dezenas, na maioria das vezes por conveniência escancarada e não por motivações programáticas, a decisão deveria ser saudada como salutar. Mais do que em qualquer outra época, a democracia brasileira precisa de um freio ao leilão de parlamentares por parte de novas legendas, que em muitos momentos se revelam de aluguel. A particularidade de a mudança ter sido orquestrada por partidos da base parlamentar de apoio ao governo, porém, às vésperas de um ano de campanha eleitoral, faz com que a decisão seja totalmente casuística e, por isso, inaceitável.

Não é a primeira vez que se consolida uma tentativa de mudar as regras do jogo praticamente durante a partida, e na história recente há uma série de exemplos nos quais alterações de última hora, convenientes para quem está no poder, não se limitaram ao plano das intenções. Felizmente, a mudança mais recente ainda precisará passar pelo Senado e a própria Câmara aprovou apenas o texto básico. Ainda há tempo, portanto, de conter os exageros. Um primeiro passo importante seria fazer com que, no exame dos destaques, previsto para a próxima semana, as novas regras tenham validade apenas a partir de 2015. Uma decisão desse tipo reduziria as margens para acusações de que, nos termos atuais, o projeto atende mais aos interesses de quem está no poder e de sua base aliada.

Basicamente, a proposta estabelece que novos partidos sem deputados federais eleitos têm direito apenas à divisão das parcelas mínimas do fundo partidário e do tempo no rádio e na TV. E esses são pressupostos para o funcionamento financeiro e eleitoral das siglas. Sob essas regras, sairiam claramente prejudicados partidos em formação, como a Rede, de Marina Silva, que na disputa presidencial anterior contribuiu para levar a disputa para o segundo turno, e o Solidariedade, de Paulo Pereira da Silva, da Força Sindical. Perdem também os partidos que optarem por fusões. E a maior beneficiada, obviamente, seria a presidente Dilma Rousseff, se concorrer à reeleição, ou o candidato que vier a contar com seu apoio, pois a pulverização de votos, no primeiro turno, seria menor.

Não é saudável para a democracia que, depois da rejeição ao debate sobre a reforma política, o governo federal tenha usado sua maioria parlamentar para aprovar uma medida eleitoreira em causa própria. Ainda bem que há tempo de o Legislativo, pelo menos, atenuar os excessos.

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - É mais uma prova que o Brasil vem sendo governado por uma oligarquia que não respeita os dispositivos pétreos da constituição do país como o pluralismo político. Se a justiça aplicasse e o poder político executasse aquela norma abandonada que estabelecia um certo quociente eleitoral para determinar a concessão de subsídios, fundo partidário e outros direitos como o acesso gratuito ao rádio e à televisão, poderiam existir quantos partidos políticos quisessem. 

quinta-feira, 18 de abril de 2013

A IMPROBIDADE E SEUS DEFENSORES

O ESTADO DE S.PAULO
17 de abril de 2013 | 2h 10


Aloísio de Toledo César *


Nada pior para a democracia do que uma instituição não merecedora de crédito, sobretudo quando composta pelos representantes do povo. É o caso do Congresso Nacional, que começou o ano elegendo para a presidência do Senado Federal e da Câmara dos Deputados dois políticos ao estilo velha raposa, de biografia ruim.

Ficou bem claro nestes primeiros meses do ano que não há nenhum interesse em fazer os brasileiros terem orgulho daquela Casa de leis. Tanto assim que, logo após a combatida eleição dos presidentes do Senado e da Câmara, dois deputados federais condenados pelo mensalão, que tiveram seus direitos políticos cassados, acabaram autorizados a assumir seus cargos - como se fosse possível duas pessoas sem os direitos políticos atuarem na elaboração de leis (é sempre bom perguntar que validade terão as leis por eles aprovadas).

Mas não ficou somente nisso: estando já no plano inclinado, a referida Casa de leis afundou-se ainda mais quando elegeu para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara um deputado radical, embora evangélico, que faz lembrar por sua conduta os grupos fundamentalistas islâmicos. Ele parece estar gostando muito da notoriedade e dos ódios públicos demonstrados contra a sua pessoa.

Não foi tudo: agora, como coroamento dessa escalada rumo à indesejável desmoralização, outro parlamentar de reputação igualmente ruim apresentou projeto que despedaça a Lei da Improbidade Administrativa, instrumento de extrema valia no cerco aos agentes políticos que fazem uso do cargo para enriquecer, avançando no dinheiro público. Pretende-se mutilar essa lei, chamada também lei do colarinho branco.

Acusado de estar agindo em causa própria, o senador Ivo Cassol (PP-RO), na maior caradura, apresentou projeto de lei que sufoca a eficácia da Lei da Improbidade Administrativa. Ele pretende introduzir modificações que reduzem a liberdade dos promotores de Justiça de ajuizar ações que envolvam pessoas suspeitas de avanço no dinheiro público.

Por equívoco ou desconhecimento, esse parlamentar se voltou contra a lei, que é boa, e não contra a conduta dos que se conduzem de forma equivocada na sua aplicação. Realmente, observam-se em muitas comarcas iniciativas de promotores de Justiça que causam a impressão de estarem vinculados a interesses políticos ou inimizades pessoais. Isso não deveria ocorrer.

A política partidária nos municípios é sempre muito explosiva e tende a dividir as opiniões. Não é desejável que isso aconteça, mas muitas vezes o promotor público causa a impressão de estar mesmo envolvido com um dos grupos e por isso as ações de improbidade administrativa por ele propostas parecem ser de encomenda, desmerecendo o sentido da lei.

Também os juízes nem sempre adotam o comportamento adequado no sentido de evitar o uso da lei para atendimento de interesses contrariados. De fato, a Lei de Improbidade Administrativa exige que após a propositura da ação o requerido seja intimado para oferecer explicações no prazo de dez dias. Após essa resposta, em juízo de admissibilidade da ação, o magistrado decide se a recebe ou não. Muitas vezes essas ações têm a clara feição de fruto de interesses políticos contrariados, mas mesmo assim são recebidas e processadas pelos juízes, sendo posteriormente julgadas improcedentes.

Essa conduta, que não é a melhor, faz com que realmente cerca de 80% das ações por improbidade administrativa resultem em nada - e nisso se apega o senador Ivo Cassol para tentar desfigurar a lei. Ele pretende que os promotores públicos, quando ingressarem com ações equivocadas, sejam condenados ao pagamento das despesas forçadas sofridas pelos acusados.

Não há nenhuma virtude em lutar para modificar uma lei que traduz princípios adotados desde a nossa primeira Carta Magna. Realmente, já na Constituição do Império de 1824, que dispunha sobre o caráter sagrado e inviolável do imperador, se previu claramente no artigo 133 a responsabilização dos ministros "por peita, suborno ou concussão" e "pela falta de observância da Lei".

A responsabilização dos ministros, admitida desde aquela época, foi repetida nas Constituições posteriores e dá sentido às disposições da Lei de Improbidade Administrativa atual, que disciplina os casos de improbidade e busca impedir condutas que levem a auferir vantagem patrimonial indevida em razão do exercício do cargo, mandato, função, emprego ou atividades administrativas.

A Constituição de 1988, a propósito, em seu artigo 14, parágrafo 9.º, reservou para lei complementar, a ser aprovada pelo Congresso Nacional, as normas disciplinando as ações em casos de improbidade administrativa. Isso veio a ser feito em 1992 e desde então a lei vem sendo aplicada com êxito e, em muitíssimos casos, impede que agentes públicos desonestos permaneçam em cargos públicos, além de serem condenados à devolução dos dinheiros que acumularam ilicitamente.

A exigência de moralidade para o exercício do cargo, a legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direita ou indireta são valores de extrema relevância que a Lei de Improbidade procura resguardar. Seria um absurdo esquartejar a lei por falhas na sua aplicação, decorrentes de condutas inadequadas, e não de disposições nela contidas.

O projeto do senador Cassol - já acusado, repita-se, de estar agindo em causa própria - merece aguardar sem pressa nas gavetas do Congresso Nacional por muitos e muitos anos. Seria uma violência contra o País convertê-lo em nova lei de improbidade, que teria, talvez, a cara de quem mereceria estar punido por ela.




* Aloísio de Toledo César é desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo. E-mail: aloisio.parana@gmail.com.

O NEGÓCIO DA PETROBRÁS


ZERO HORA 14 de abril de 2013 | N° 17402

Graça Foster

“Meu negócio é vender combustível”



ENTREVISTA - O Brasil ainda tem muito petróleo a ser descoberto


Da mesma forma que brinca com um esmalte estragado de suas unhas, em seguida fala do plano bilionário de investimentos (US$ 236,7 bilhões até 2017) da maior companhia brasileira e ainda encontra tempo para ironias, como “acho lindo um engarrafamento”, em alusão ao seu negócio: vender combustível. A primeira mulher a comandar uma companhia petrolífera no mundo e já eleita pelo jornal Financial Times como uma das principais executivas em ascensão no universo dos negócios construiu fama como eficaz, durona, cobradora de metas e resultados. Mas Maria das Graças Silva Foster, ou simplesmente Graça Foster, intrigada com os dois gravadores de ZH na entrevista exclusiva, na semana passada na Capital, encontrou tempo para contar histórias engraçadas de uma jornalista que teve de fazer a mesma entrevista três vezes por problemas com gravador que não funcionou, com assalto que levaram o gravador e por aí vai e termina rindo:

– Hoje, não tem entrevista alguma.

Em um minuto, a engenheira química mineira, ex-catadora de papel, garrafas e latas que vendia para ajudar sua família e comprar material escolar na favela onde morava no Rio, responde sobre sua altura – 1,78 m, que sempre aumenta, pois gosta “de saltos”. Logo, logo volta aos megaplanos da estatal que comanda. Investimentos neste ano de R$ 97,7 bilhões e 85 mil funcionários espalhados do alto mar, nas ricas plataformas de petróleo, às inúmeras operações em terra que garantem ao país posto invejável entre as maiores companhias do mundo do rentável mercado do petróleo. Às vésperas de completar 60 anos, Graça se entusiasma muito ao falar das novas plataformas que entrarão em operação no pré-sal e dos planos de autossuficiência – produção hoje é de 2,31 milhões de barris equivalentes/dia. E, claro, do compromisso em aumentar o parque gerador de energia neste momento complicado do abastecimento nacional.

Nada muito surpreendente para ela que já declarou sua paixão pela Petrobras, onde passa mais de 12 horas por dia e que ainda leva trabalho para casa, onde com o marido e dois filhos fala também de sua religiosidade e do amor pelo Carnaval. A mesma família que aprendeu a conviver com sua extremada dedicação à estatal, onde entrou como estagiá- ria há 32 anos e fez toda a carreira, que culminou com a presidência no ano passado. Indicação da amiga Dilma Rousseff, com quem se identifica pelo perfil rigoroso aliado a um conhecimento econômico e técnico, características que levaram The Wall Street Journal a descrevê-la como uma “respeitada tecnocrata”.

A mais poderosa executiva brasileira, que não foge à regra em roupas, os terninhos, das mulheres que ocupam essas posições, evitou poucas questões na conversa de 20 minutos, marcados religiosamente, que ganharam uma sobrevida de mais 13. Uma delas, claro, a possibilidade de novos aumentos na gasolina, que preferiu despistar. É o que você lerá a seguir.

Zero Hora – A Petrobras anunciou estratégia de desinvestimento, a venda de US$ 9,9 bilhões de alguns de seus ativos. Termelétricas como a Sepé Tiaraju, de Canoas, poderão ser negociadas? A empresa deixaria a parte de geração de energia?

Graça Foster – Olha, temos 18 termelétricas no país todo e uma responsabilidade gigante com o setor elétrico. Em outubro passado, fornecemos combustível, independentemente se a térmica é nossa ou não, para geração de 10 mil megawatts (MW) de energia elétrica, algo muito grande, e temos contratos de gás para 8,2 mil MW, além de nossas térmicas que dão mais 7 mil MW. Não existe, hoje, nenhum estudo na Petrobras que trate da venda de termelétricas.

ZH – Como está o estudo da Petrobras, governo do Estado, Samsung e Hyundai sobre a construção de um terminal de regaseificação de gás natural liquefeito e de uma fábrica de fertilizantes em Rio Grande?

Graça – É um projeto interessante, temos um termo de compromisso que vai até agosto. É um terminal de GNL, uma térmica, uma planta de fertilizantes e gás para a indústria. Paralelo a ele, temos um outro: a colocação de vários loops (instrumento pelo qual se amplia a capacidade de transporte) no gasoduto Brasil-Bolívia para entregar ao Rio Grande do Sul mais de 1 milhão de metros cúbicos por dia. Ambos estão em estudo. A Petrobras tem 27 milhões de metros cúbicos por dia de GNL, e o gás está caríssimo.

ZH – Ou seja, inviabiliza o projeto daqui?

Graça – Não estou dizendo que inviabiliza, mas é uma equação muito mais difícil porque este gás não é produzido no Brasil, nem na Bolívia e Argentina, bem próximos, mas no Catar, em Trinidad Tobago, em vários lugares.

ZH – Pode perder um, mas ganhou outro. O que significa a construção de outra plataforma, a P-74, no Estado?

Graça – É mais um contrato de uma unidade de produção para Franco 1, cessão onerosa do pré-sal, extremamente importante. Ficamos satisfeitos de saber que aqui no Rio Grande do Sul houve organização de empresas que ganharam esta licitação. O Rio Grande do Sul se coloca claramente como polo naval com experiência. Quando se tem uma operação isolada, a capacidade de se recuperar de eventuais atrasos é mais difícil. Quando você tem em Rio Grande a P-55, a construção de oito cascos, três sondas de perfuração e a P-58 e a P-62, Charqueadas e, agora, a EBR, você tem um cluster de conhecimento e capacidade de efetivamente cumprir prazos.

ZH – A senhora falou sobre a demanda de óleo, a meta da autossuficiência ficou para quando? Ainda é perseguida pela companhia?

Graça – Temos a área de exploração, produção, tratamento do óleo, refino e venda de derivados, ou seja, de ponta a ponta. E a gente também faz petroquímica, plástico. Em 2006, a produção de petróleo era pouco menos de 1,8 milhão de barris/dia e o consumo de derivados também era nessa faixa. Então, naquele quadro da economia do Brasil, você fotografa e diz que o Brasil era autossuficiente.

ZH – Com carros vendidos em até cem meses, os brasileiros foram às compras. E os engarrafamentos mostram bem isso.

Graça – Então, que maravilha! Acho lindo engarrafamento! Meu negócio é vender combustível. Só entendo que deveríamos ter sempre planos diretores para orientar o fluxo de carros a favor da sociedade. Acho lindo carro na rua, estou faturando... De 2006 até agora a demanda cresceu 4,9%, enquanto a produção de petróleo, 3,8%, gerando uma defasagem. Por isso, as plataformas são tão importantes – mais 15, além das de 2013 e 2014, vão entrar em operação até 2020. Em 2014, a curva de produção será puxada novamente. No próximo ano, o Brasil terá, através da produção da Petrobras e de seus parceiros, um volume de óleo igual ao de derivados.

ZH – Ou seja, volta a autossuficiência e, com isso, acabarão as importações?

Graça – Só vamos parar de importar diesel em 2018, quanto entrarem todas as refinarias e, em 2020, teremos capacidade de refino de 3,6 milhões de barris de petróleo por dia, mas a produção será de 4,2 milhões. Aí exportaremos petróleo.

ZH – A viabilidade do pré-sal foi questionada, e as ações da Petrobras tiveram grande baixa. Temos ou não muito petróleo a descobrir no Brasil?

Graça – O pré-sal é uma realidade. Os projetos são de longa maturação, levam até 10 anos para produzir o primeiro óleo. Nos últimos 14 meses tivemos mais de 50 descobertas. Dessas, 15 são no pré-sal, oito pioneiras. Ou seja, mostram para nós que o potencial é maior ainda. O grau de sucesso chega a 82% na perfuração. Perfura e acha. Se você considerar pré-sal, pós-sal e campos de terra no Brasil inteiro, nas bacias sedimentares, a taxa de sucesso é 64%. Uma excelente taxa mundial é 30%. Neste ano, voltaram as licitações para concessão de blocos pela Agência Nacional do Petróleo. Outras empresas virão. O Brasil tem característica interessante na área de energia: a estabilidade do marco regulatório e o respeito aos contratos. É algo importante.

ZH – Até para dar mais segurança ao investidor externo.

Graça – Não só para o externo. Na indústria do petróleo não deve haver dúvida sobre a estabilidade regulatória. É o caso das grandes empresas vindo para cá, já que trabalhar offshore, no mar, não é para empresa pequena.

ZH – Então, não adianta começar uma empresa agora...

Graça – (risos)... Mas a Petrobras é sua...

ZH – Por falar nos parceiros, sairá o socorro da Petrobras ao grupo de Eike Batista?

Graça – Desde setembro, temos discussões de oportunidades de negócios. Está em construção um superestaleiro, no porto de Açu (RJ). O grupo X tem uma infraestrutura muito grande e estamos trabalhando projeto a projeto com eles. O grupo tem, junto com a Mendes Júnior, outros dois contratos para plataformas. Tem navios que ganharam licitações e outros assuntos que estamos discutindo. Mas tudo será alvo de licitação.

ZH – Até porque existe a exigência do conteúdo nacional. Cogita-se a possibilidade de elevar o índice para 65%?

Graça – No momento, esse índice está de bom tamanho. O conteúdo local traz vantagens à Petrobras. Uma coisa é você sair daqui para ir à Coreia, ao Japão, a Cingapura. A outra é pegar um helicóptero na Petrobras e, em 40 minutos, estar em Angra, em São Paulo e no Rio Grande do Sul. Se a produção é em outro país, ainda terá questões de alfândega para entrar.

ZH – Há atrasos nos projetos da Petrobras, como plataformas? A estatal já foi, inclusive, atrás de novos fornecedores no Exterior.

Graça – Neste ano, sete plataformas entrarão em operação. É a primeira vez que contamos com tantas unidades entrando em operação. Temos grandes descobertas e precisamos destas unidades para produzir o óleo. O que houve foi uma interpretação equivocada (referência à notícia sobre atraso de 60% das 10 plataformas previstas pra entrega neste ano e em 2014) do que significavam os atrasos. A gente coloca, por exemplo, que devia estar 80% pronta em janeiro e o índice era de 70%. Mas a data que aparece já considera o atraso de um, dois meses.

ZH – E a gasolina, vai aumentar ainda mais neste ano?

Graça – Foram quatro aumentos do diesel, 21,4%, mais 14,9% em dois reajustes na gasolina na refinaria. Este é o meu preço para as distribuidoras. Na bomba, a gasolina só subiu uma vez porque antes tinha Cide e, depois, não mais. Olhando hoje para o quadro do Brent e para a taxa de apreciação do real, para o câmbio, não há previsão de aumento de combustível.

ZH – Até quando decisões políticas vão prevalecer como o caso que levou o terminal de regaseificação à Bahia em vez de instalá-lo no Sul, como a senhora havia dito?

Graça – Não há questão política. O terminal foi para a Bahia porque a gente teve – e eventualmente ainda tem – problemas de fornecimento de gás no Nordeste. Então, para dar mais firmeza ao suprimento de gás, fazia mais sentido colocar no Nordeste. Mas não está descartado o GNL no Rio Grande do Sul. O projeto está vivo.

MARIA ISABEL HAMMES | COLUNISTA DE ECONOMIA

COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Se o negócio da Petrobrás é "vender combustível", que necessidade ela tem de ser estatal? 

sexta-feira, 12 de abril de 2013

PROJETO ESVAZIA LEI DA IMPROBIDADE

O ESTADO DE S.PAULO, 12/04/2013

Projeto esvazia Lei da Improbidade e prevê punição a promotor que ofender réu

Após PEC que tira poderes de investigação criminal do Ministério Público, parlamentares analisam texto do senador Ivo Cassol que propõe abrandar série de punições em casos de corrupção

Fausto Macedo, de O Estado de S.Paulo



Acuado pela PEC 37 - a emenda constitucional que alija os promotores e procuradores de investigações criminais -, o Ministério Público teme agora perder seu mais poderoso instrumento no combate à corrupção. Projeto do senador Ivo Cassol (PP-RO) impõe drástica mudança na Lei da Improbidade Administrativa (8.429/92), com alterações em 12 artigos. O projeto chegou à Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

A Lei da Improbidade está em vigor há 21 anos e propiciou a punição em todo o País de milhares de políticos e administradores públicos, que se tornaram inelegíveis e foram afastados de suas funções, além de condenados a ressarcir danos ao Tesouro.

O próprio Cassol - ex-governador de Rondônia por duas vezes - é alvo de frequentes investigações e ações do Ministério Público, inclusive no plano eleitoral. Em janeiro, a Justiça cassou seus direitos políticos por cinco anos. Segundo procuradores federais, em 2006 foi descoberto caso de compra de votos que beneficiaria Cassol. Ele recorreu. Hoje responde a cinco ações judiciais, segundo sua assessoria.

Na avaliação de procuradores, a medida quebra a espinha dorsal das Promotorias de Defesa do Patrimônio Público e fulmina os pontos vitais da norma que freia atos ímprobos e faz valer os princípios do artigo 37 da Constituição - moralidade, honestidade e impessoalidade. Consideram que o projeto atinge o coração da instituição, que exerce o papel de guardiã da democracia e fiscal da lei.

O projeto causa enorme inquietação nas promotorias porque invade a própria Lei Orgânica Nacional do MP (Lei 8.625/93) com previsão de responsabilização criminal - pena de detenção de seis meses a dois anos, sem prejuízo de ação civil - do membro da instituição que fizer declarações públicas imputando a réu ou indiciado em investigação ou processo criminal fato ofensivo à sua reputação, à sua condição jurídica de inocente ou ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro.

Para os promotores, essa parte do projeto quer submetê-los à Lei da Mordaça.

Sobre a fatia do texto relativa à improbidade eles alertam para a exclusão da responsabilidade do agente público negligente e imprudente que causa lesão ao patrimônio público. Além disso, "em detrimento do interesse público maior", ficam excluídos de indisponibilidade os bens de família do servidor acusado. Destacam que a legislação firma que "o caráter de bem de família não tem a força de obstar a determinação de sua indisponibilidade nos autos de ação civil pública, pois tal medida não implica expropriação daquele bem".

"Querem tornar inócua a Lei de Improbidade", adverte o procurador-geral de Justiça de São Paulo, Márcio Fernando Elias Rosa. "De forma indireta pretendem revogar essa norma tão importante provocando um consequente esvaziamento da Lei da Ficha Limpa."

Elias Rosa pondera que no bojo da crise que se instalou em torno do Ministério Público e sua atuação "surge toda semana uma proposta oportunista".

Promotores alertam que o projeto torna taxativo o rol de hipóteses do artigo 10, que hoje é exemplificativo, afastando a possibilidade de o agente cometer ato de improbidade mediante conduta culposa, pois passa a exigir "culpa grave".

O texto reduz a multa ao servidor condenado - hoje de até duas vezes o valor do dano. Afasta a possibilidade da perda da função, prevendo suspensão de 120 dias do cargo, e diminui o prazo de suspensão dos direitos políticos. Segundo o Ministério Público, o projeto impõe que tudo esteja provado antes mesmo do ingresso da ação - na prática, trava a ação.

Contas. Nilo Spínola, experiente procurador do Ministério Público paulista, pondera que o projeto frustra a Lei de Inelegibilidades (Lei Complementar 64/90) e afronta a Constituição ao impor que a aprovação das contas do gestor público, pelo Tribunal de Contas, impede a aplicação de sanções - salvo multa, perda da função e suspensão dos direitos políticos.

Ele aponta inconstitucionalidades do texto ao prever que as ações destinadas a promover as sanções podem ser propostas até cinco anos após o término do exercício de mandato e até dez anos após a data da efetiva ocorrência do dano ao erário. O artigo 37 da Constituição impõe que a ação de ressarcimento do patrimônio público é imprescritível.

Em sua justificativa, Ivo Cassol argumenta. "Deixar aberta a possibilidade de ação configura-se agressão à garantia da paz social. Agredir esse valor seria farpear a própria ordem pública."

ROSEANA SARNEY: APOSENTADORIA CUSTARÁ R$ 20 MIL MENSAIS AO SENADO

O ESTADO DE S.PAULO, 11/04/2013

Roseana Sarney receberá aposentadoria de R$ 20 mil do Senado. Atual governadora do Maranhão, ela assumiu o cargo de analista legislativa em 1984, quando celetistas foram incorporados aos serviço público


DÉBORA ÁLVARES - Agência Estado


BRASÍLIA - A governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), que já foi senadora, pediu a aposentadoria ao Senado. A medida foi publicada nesta quinta-feira no Boletim Administrativo da Casa e vai lhe render um benefício de R$ 20.900,13, valor que se somará aos R$ 15,4 mil que ela já recebe para comandar o Estado. Segundo sua assessoria, Roseana não pretende abrir mão do salário atual por conta do novo rendimento.

Com o acúmulo dos dois vencimentos, ela terá um salário de, pelo menos, R$ 36,3 mil, superior ao salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), hoje em R$ 28.059,29, que é o teto do funcionalismo público. A filha do ex-presidente do senado José Sarney (PMDB-AP) aposentou-se como servidora da Casa. Ela assumiu o cargo de analista legislativa em 1984, quando celetistas foram incorporados aos serviço público em vários órgãos.

Em dezembro de 2014, Roseana encerra seu mandato à frente do governo do Maranhão. Segundo sua assessoria, porém, ela já abriu mão de receber a aposentadoria automática paga aos ex-governadores maranhenses, justamente por já contar com o auxílio que agora vai receber do Senado.

O acúmulo de aposentadorias é comum na família Sarney. O pai de Roseana, além do salário de senador, de R$ 26,6 mil, tem agregado ao orçamento a aposentadoria de ex-governador do Maranhão, estado cujo Executivo chefiou em 1965, e de servidor do Tribunal de Justiça do Estado. A assessoria, contudo, se negou a informar o valor total dos vencimentos acumulados do senador. Corre contra Sarney uma ação na Justiça proposta pelo Ministério Público Federal que pede que Sarney devolva aos cofres públicos os valores acima do teto recebidos nos últimos cinco anos. O processo está na 21ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal e ainda não teve decisão.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

SUPERÁVIT DISTORCIDO

O Estado de S.Paulo 08 de abril de 2013 | 2h 07

OPINIÃO

Já turvada por espertas práticas contábeis que corroeram sua credibilidade, a política fiscal do governo Dilma Rousseff está ficando ainda mais nebulosa. A sanção, pela presidente da República, da lei que aumenta em R$ 20 bilhões o valor que o governo poderá descontar da meta de superávit primário definida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para este ano torna ainda mais frouxa uma política fiscal cuja execução vem se tornando uma das principais fontes de preocupação dos investidores.

Demonstrando desprezo cada vez maior pelas metas fiscais e insistindo - como tem feito com contundência a própria presidente - em que o combate à inflação não poderá ser feito à custa do crescimento, como se existisse conflito entre uma coisa e outra, o governo do PT vai desarranjando ainda mais uma economia que tem nítidas dificuldades para crescer e vai gerando o ambiente para a pior das situações - estagnação com inflação em alta e contas públicas desarranjadas. A correção desses erros poderá ser custosa.

O mais recente Relatório de Inflação, publicação trimestral do Banco Central (BC), reconheceu, como já o faziam há tempos economistas do setor privado, que a inflação de 2013 poderá alcançar 5,7%, bem acima do centro da meta, de 4,5%, mas ainda dentro da margem de tolerância definida pelo Conselho Monetário Nacional. Para que essa meta seja alcançada sem a necessidade de novas altas dos juros, que tanto parecem assustar a presidente da República, o BC considera necessário, entre outras coisas, que seja cumprida a meta de superávit primário cheio definida na LDO, de R$ 155,9 bilhões, ou 3,1% do PIB. Poucos acreditam, no entanto, que isso ocorrerá.

As frequentes autorizações para o governo descontar valores da meta do superávit primário geraram desconfiança entre os economistas do setor privado e os investidores. A própria LDO já permitia ao governo descontar do superávit cheio até R$ 45,2 bilhões com os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A autorização para o novo aumento da parcela que pode ser deduzida foi incorporada, a pedido do governo, ao projeto que estendia até 31 de dezembro de 2012 o prazo para a inclusão na LDO das projeções de despesas decorrentes dos reajustes negociados com diversas carreiras do serviço público.

Com a lei agora sancionada, o desconto pode chegar a R$ 65,2 bilhões. O aumento é justificado como necessário para compensar as desonerações tributárias já concedidas ou que vierem a ser decididas durante o ano. Desse modo, o governo poderá alcançar um superávit bem menor do que o projetado inicialmente para 2013, de R$ 90,7 bilhões, ou 1,9% do PIB (ou 1,2 ponto porcentual menor), tudo de acordo com a lei. Apesar de tudo, o Ministério da Fazenda segue afirmando que continuará a perseguir a meta cheia, como se alguém ainda acreditasse nela.

O relaxamento da política fiscal nas proporções já autorizadas, por si só, poderia ter um impacto inflacionário de mais de 0,3 ponto porcentual em 2013, segundo cálculos de consultorias privadas. Para evitar esse efeito, seria necessário adotar uma política monetária mais rigorosa.

A meta cheia do superávit agora não passa de simples referência. As projeções dominantes entre os economistas privados vão convergindo para um superávit primário de cerca de 2% do PIB.

Está em curso um grave retrocesso na política fiscal, que, no governo Lula, foi executada com o rigor necessário para assegurar sua credibilidade e, desse modo, dar tranquilidade para o setor privado atuar. Além dos abatimentos permitidos da meta do superávit, o governo tem lançado mão antecipadamente de dividendos de empresas estatais contabilizados de maneira não convencional, além da não contabilização de determinadas despesas. São formas muito criativas de tratar o dinheiro público, que geram desconfianças crescentes quanto à sustentabilidade dessas práticas contábeis.

Do jeito como o governo vem conduzindo a política fiscal, não há expectativa de melhora antes da próxima eleição presidencial, que muitos políticos parecem considerar iminente, mas que só ocorrerá em 2014.