VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

sábado, 23 de janeiro de 2016

DESPERDÍCIO COM O EXCESSO DE CCs





ZERO HORA 23 de janeiro de 2016 | N° 18423


EDITORIAIS



O governo José Ivo Sartori reduziu em um quarto o número dos chamados cargos de confiança (CCs) em relação à administração anterior. É um dado a ser considerado, no contexto das medidas adotadas em nome da redução de despesas. Mesmo assim, permanecem no Executivo 1.941 pessoas sem concurso, recrutadas como quadros temporários, para funções que o governador e seus assessores consideram de confiança de seus superiores. O que o Estado precisa fazer, além de medidas pontuais, é aprofundar um debate que sucessivos governos se negam a levar adiante, sob os mais variados argumentos, em especial na área federal. O principal deles é o de que nomear CCs passou a ser prática consagrada, em todas as esferas de poder, e que se gasta pouco com esses servidores.

É uma desculpa que não se sustenta. Também não é razoável que governos argumentem que somente podem funcionar se mantiverem CCs, quando deveriam dispor de ocupantes do já inchado quadro de pessoal de carreira. A ocupação de áreas dos governos por CCs é, em muitos casos, apenas o preenchimento de espaços em atividades públicas, para que sejam contemplados os interesses de aliados. É sabido que governos – na União, nos Estados e nos municípios – têm sido loteados por afilhados de políticos.

De qualquer forma, a redução no número de funcionários, obtida até aqui, é um sinal de que a racionalização poderia se viabilizar sem muito esforço, pois o corte de 25% ocorreu no primeiro ano da gestão de Sartori. A sociedade, que sustenta todos os ocupantes de cargos públicos, tem o direito de cobrar a continuidade desse esforço, para que o Estado identifique os CCs que desempenham funções relevantes. Antes mesmo, é preciso saber se ocupantes desses cargos têm habilitação para desempenhar as atividades para as quais foram convidados. É o mínimo que se espera de uma gestão que, deve- se admitir, já deu alguns sinais de redução de despesas em busca do equilíbrio nas contas públicas.

SINTOMAS DA FALÊNCIA DOS PARTIDOS



ZERO HORA 23 de janeiro de 2016 | N° 18423


POLÍTICA + | Rosane de Oliveira




O que se viu ontem no PDT está longe de ser inédito: o partido reuniu-se em convenção para reafirmar o apoio à presidente Dilma Rousseff, fechar questão contra o impeachment e lançar Ciro Gomes como candidato ao Planalto em 2018, mas parte dos seus líderes boicotou o encontro por discordar das decisões. A acusação dos dissidentes é de que o presidente Carlos Lupi manobrou para aprovar o apoio ao governo, sem dar ouvidos às vozes discordantes.

Entre os descontentes está o senador Lasier Martins, que defende exatamente o contrário do que o partido anunciou. Lasier prega a saída do governo, defende o impeachment e não simpatiza com a ideia de ter Ciro como candidato a presidente. Lasier diz que o governo Dilma é sinônimo de “recessão, inflação e corrupção”, mas seus companheiros discordam. Com mais sete anos de mandato pela frente, Lasier diz que não passa pela sua cabeça deixar o PDT. Vai continuar votando com a oposição, mesmo correndo o risco de sanções por parte do comando nacional.

No bloco dos descontentes, destaca-se, entre outros, o senador Cristovam Buarque (DF), que está com os dois pés fora do PDT por discordar das posições de Lupi e da entrada de Ciro. Cristovam queria ser candidato a presidente, mas foi desbancado por Ciro.

A divisão não é privilégio do PDT. Até o partido de Dilma, o PT, está dividido entre os que apoiam as políticas do governo e os que exigem uma guinada radical à esquerda.

Um abismo separa o PMDB que defende a continuidade do apoio a Dilma e o PMDB que trabalha para derrubar a presidente.

Movidos por interesses, deputados e senadores tratam de salvar a pele ou os cargos, quando os têm. No momento em que a disputa torna-se insustentável, migram para outro partido ou criam um para chamar de seu.

Longe de atestar a saúde da democracia, a proliferação de novos partidos é sintoma da falência do sistema partidário. Como é bom negócio fundar um partido, em vez de tentar a conciliação ou de ganhar uma disputa pelo convencimento, os descontentes correm para criar uma agremiação, como quem cria uma microempresa da qual será presidente e mandachuva.

O problema atinge até quem não está no poder e tem remotas perspectivas de chegar lá. A ex-prefeita de São Paulo Luzia Erundina trabalha para criar um novo partido, batizado de Raiz Movimento Cidadanista. Erundina era do PT, brigou para ser ministra de Itamar Franco, foi para o PSB, migrou para a Rede e se desencantou quando Marina Silva declarou apoio a Aécio Neves (PSDB).

O Brasil tem 35 partidos registrados e outros tantos tentando se viabilizar. Raros são os que têm propostas claras ou que se diferenciam pelas ideias. A última aberração atende pelo nome de Partido da Mulher Brasileira – como se em política fizesse algum sentido separar homens de um lado e mulheres do outro. A maioria não passa de arranjos para satisfazer o ego dos seus líderes, que se eternizam candidatos, como Levy Fidelix (PRTB), José Maria Eymael (PSDC).

CORPORAÇÕES REAGEM A LEI

Aprovada na convocação extraordinária, a Lei de Responsabilidade Fiscal Estadual está ameaçada de se tornar letra morta. Entidades que representam juízes, promotores e auditores do Tribunal de Contas pediram formalmente ao procurador-geral de Justiça, Marcelo Dornelles, que entre com ação direta de inconstitucionalidade contra a lei que limita gastos.

As entidades alegam que a nova lei afronta o princípio da independência dos poderes.



NA SEGUNDA-FEIRA, QUANDO RETORNAR DAS FÉRIAS, MARCELO DORNELLES TERÁ REUNIÃO COM DIRIGENTES DAS ENTIDADES PARA OUVIR OS ARGUMENTOS CONTRA A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL ESTADUAL.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

DEMOCRACIA COM FALHAS



ZERO HORA 22 de janeiro de 2016 | N° 18422


EDITORIAL

Dificuldades do governo em lidar com questões como a recessão e a ameaça de impeachment já repercutem em avaliações internacionais sobre a situação do país: uma delas é a queda da 44ª para a 51ª posição num ranking de países mais democráticos do mundo, realizado pela Economist Intelligence Unit, ligada à publicação The Economist. O Brasil é destaque no relatório por conta dos esforços realizados para combater a corrupção. Ainda assim, teve sua nota rebaixada de 7,38 em 2014 para 6,96 no ano passado. O argumento dos responsáveis pelo estudo é de que o país não consegue fazer com que os avanços democráticos se traduzam em qualificação da própria democracia.

O descompasso de fato existe, ou conquistas reconhecidas internacionalmente, como a capacidade de realizar eleições com urnas eletrônicas em todo o território, não estariam em desacordo com uma série de atrasos. O consolo é que o país tem realizado esforços para combater a corrupção e outros delitos na atividade pública. Como advertem os organizadores do estudo, é preciso tentar igualar “avanços extraordinários na democracia eleitoral” com a efetividade da política e da cultura política, ou o país será um bom realizador de pleitos, sem que isso repercuta no aperfeiçoamento das formas de representação e na vida de seus cidadãos.

É falsa, no entanto, a expectativa dos que almejam uma democracia sem imperfeições. Tal ideal não existe, na prática, nem mesmo nos mais avançados países democráticos do mundo. Mas é preciso ficar alerta para a classificação do Brasil como uma “democracia com falhas”, exatamente porque, apesar do pluralismo, o país tem avaliação baixa em participação política. Como lembra o estudo, democracias não sobrevivem apenas de suas formalidades institucionais, mas da ativa e permanente interação dos eleitores com seus representantes. O Brasil deve ainda pôr à prova, em meio a uma crise econômica e política, a capacidade de fortalecer, e não de questionar os valores da democracia.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

IMORAL E INADMISSÍVEL



ZERO HORA 21 de janeiro de 2016 | N° 18421


EDITORIAL




Rechaçada pela sociedade e questionada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a aposentadoria especial criada pela Assembleia para os deputados estaduais gaúchos foi bem definida pelo procurador-geral da República. É imoral e inadmissível, afirmou o senhor Rodrigo Janot. A maioria da população pensa o mesmo. A questão jurídica a ser considerada no caso, a partir da Ação Direta de Inconstitucionalidade da OAB, não pode ignorar o aspecto ético de um privilégio sustentado por todos. É o que enfatiza o procurador em seu parecer.

A aposentadoria especial é, na verdade, um eufemismo para uma previdência a ser sustentada, em sua maior parte, com recursos públicos. Pela decisão tomada no ano passado em plenário, a maioria dos parlamentares decidiu que merece receber vencimentos integrais ou parciais, dependendo do tempo de permanência no Legislativo. Com um detalhe revelador da distorção: a contribuição para o fundo, paga pela Assembleia, ou seja, pelos cofres do Estado, é o dobro da atribuída aos próprios políticos. O povo foi convocado a sustentar um tratamento diferenciado que o procurador classifica apropriadamente de imoral.

O que os deputados precisam fazer, se pretendem receber mais do que o previsto no regime geral da previdência, válido para todos os cidadãos, é formar um fundo complementar, como está previsto para os novos servidores públicos federais, desde 2012, e como farão, a partir de lei aprovada no ano passado pela própria Assembleia, os novos integrantes dos quadros do Estado. O fundo complementar precisa, é óbvio, ser bancado pelos beneficiários.

Como observa Rodrigo Janot, não há argumento capaz de sustentar a previdência especial, tal como se apresenta, pois seu único propósito é privilegiar poucos indivíduos. Outro aspecto positivo da decisão do procurador, que depende agora de julgamento do Supremo, é que Câmaras de Vereadores, que poderiam copiar a decisão da Assembleia, são agora desestimuladas a cometer o mesmo erro.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

A DELAÇÃO DO CIDADÃO DO BEM



JORNAL DO COMÉRCIO 20/01/2016



Sergio Kaminski



Nossos partidos políticos nada mais são do que grupos de pseudolíderes cujo norte de ação é manutenção e ampliação de vantagens pessoais e acumulo de poder. Na essência da grave crise política que vivemos estão as péssimas escolhas dos filiados dos quadros partidários. Filiações ridículas e estapafúrdias. Inocentes úteis, que somam votos na legenda para manter os "lideres" no comando, preservando os privilégios deles e dos seus, ignorando a arte pura e altruísta do ser político.

A oposição, desprovida de conteúdo e agenda de ações, negocia favores tratando de manter sua banca de "negócios" em benefício de dividendos políticos e financeiros. A legislação, proposta e aprovada pela classe política, serve para proteger e abrigar a impunidade, priorizando os direitos sem a devida contrapartida de deveres.

O Estado, inchado com parasitas e descompromissados com o servir, é operado por verdadeiros saqueadores dos impostos gerados com o suor do trabalhador. A corrupção é parte integrante do nosso cotidiano. A saúde e segurança andam longe do cidadão comum, desgarradas dos governos, a quem caberia priorizar tais áreas.

Corporações públicas e privadas atuam com o fim precípuo de atingir seus interesses, ignorando que o bem comum trata do bem de todos naquilo que todos têm em comum. A educação retroage e amplia o exército de ignorantes e preguiçosos mentais, pessoas sem a capacidade mínima para serem empreendedores da sua própria vontade.

A superação somente poderá ocorrer se nos mobilizarmos para enfrentar um sistema eleitoral viciado e sujo, que facilita a manutenção do que está aí, sistema mal cheiroso que contempla negociatas de favores nos chiqueiros fétidos dos poderes. Somos réus de políticos promíscuos e danosos para nossa sociedade. Entretanto, para que tal mudança ocorra, há que se descobrir líderes do bem em todos os campos da vida brasileira. Onde estarão eles?

Se você conhece algum, "denuncie-o". Levante a voz e indique-o para todos nós. Seremos premiados com um Brasil melhor para todos os brasileiros que fazem por merecer. E eles são a maioria.

Precisamos através do voto fazer uma varredura ampla e irrestrita dos nossos quadros políticos. Faça a "denuncia"! Seu prêmio, e de todos brasileiros, será um País mais justo e digno para quem faz por merecer.


Engenheiro

UMA APOSENTADORIA IMORAL



ZERO HORA 20 de janeiro de 2016 | N° 18420


DÉBORA CADEMARTORI

Uma aposentadoria “imoral”, diz Janot


PREVIDÊNCIA ESPECIAL para deputados estaduais do RS, alvo de ação no STF, é considerada ilegal pelo procurador-geral



A aposentadoria especial criada pela Assembleia Legislativa para os deputados estaduais do Rio Grande do Sul tem um novo adversário, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. A legalidade do sistema, que poderá garantir salários integrais (hoje em R$ 25,3 mil) aos futuros beneficiários, será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Na opinião de Janot, que será levada em conta pelos 11 membros da Corte, o plano é “imoral” e “inadmissível”.

Em parecer encaminhado nesta semana ao STF, o procurador-geral definiu como “anti-isonômica” a lei aprovada na Assembleia no final de 2014. No ano passado, mais de 20 parlamentares já contribuíam para o sistema. Polêmico, o benefício foi questionado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Supremo.

No documento em que dá aval à ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela entidade, Janot explica que cabe à União editar normas gerais no que diz respeito à previdência social e que não há regra prevendo um regime de aposentadoria distinto a deputados federais e senadores.

Para sustentar a ilegalidade da lei do RS, o procurador avalia que há contrariedade aos artigos 41 e 201 da Constituição, trechos que regulamentam o regime-geral de previdência social.

BREIER RESSALTA AÇÃO EM NOME DO CIDADÃO

Citando os princípios republicano e da igualdade, Janot explica que é “inadmissível a elaboração de leis imorais e anti-isonômicas, cujo único propósito seja privilegiar poucos indivíduos, locupletando-os à custa do Estado, com regras especiais, sem razão consistente”. O procurador conclui que, ao final do mandato, os ex-deputados devem ser tratados como os demais cidadãos, “sem que haja razão para benefícios decorrentes de situação pretérita”.

A lei proposta pela Mesa Diretora da Assembleia, liderada pelo então presidente Gilmar Sossella (PDT), foi aprovada em novembro de 2014 por 29 votos a 14. Para suspender os efeitos da regra, o conselho federal da OAB ingressou, em abril de 2015, com a ação no STF. O caso será relatado pelo ministro Dias Toffoli, e não há data para o julgamento.

Para o presidente da OAB-RS, Ricardo Breier, os pareceres de três comissões internas da entidade foram unânimes sobre a inconstitucionalidade da lei, que ainda está em vigor.

– Janot acatou na íntegra nosso relatório por entender que política é composta de cargos temporários. Não podemos admitir que a carreira política seja tratada como profissão – afirma ele.

O presidente da OAB-RS avalia que o julgamento será rápido. Antes de Toffoli apresentar seu relatório, membros da entidade pretendem se reunir com o ministro para conversar sobre o tema. De acordo com Breier, ao questionar a lei a OAB está atuando em benefício da cidadania.


BENEFÍCIO PARLAMENTAR
COMO ERA
Os deputados estaduais gaúchos se aposentavam pelo INSS. Para isso, pagavam 11% do teto do regime-geral (R$ 5,2 mil em 2016). A Assembleia pagava 20% sobre o subsídio parlamentar, o que equivale a R$ 5.064 por cada um. Na prática, a Casa contribuía sobre o salário integral, mas a aposentadoria era limitada ao teto da Previdência.
COMO FUNCIONA AGORA
Os deputados que aderiram ao sistema descontam 13,25% do salário, o equivalente a R$ 3.355 mil. O Legislativo paga 26,5% por cada parlamentar (R$ 6.710,39).
Um deputado precisa de 35 anos de mandato e 60 anos de idade para se aposentar com o salário integral. Sem isso, ganhará proporcional.
O parlamentar pode acrescentar no cálculo mandatos em outros legislativos, mas tem de recolher retroativamente as contribuições. A Assembleia parcela os valores devidos.
O teto da aposentadoria dos deputados é o subsídio, hoje R$ 25,3 mil. Do contribuinte comum, é o da Previdência.
OUTRAS PENSÕES POLÊMICAS FILHAS DE SERVIDORES
No passado, o RS tinha lei que previa pagamento de pensão vitalícia para filhas solteiras de servidores. A lei foi revogada na década de 1970, mas quem já recebia manteve a vantagem. Para driblar a lei, muitas mulheres se casam na prática, morando com marido e filhos, mas não registram oficialmente.
Esse tipo de benefício é pago em outros Estados e na União. As pensões custam R$ 4,5 bilhões por ano, a maior parte para filhas de militares.
EX-GOVERNADORES
Criada em 1979, uma lei autorizou o pagamento de uma pensão a ex-governadores do RS, hoje em R$ 30,4 mil. A intenção era garantir uma vida digna a ex-gestores e amparar suas viúvas, mas criou um benefício vitalício pago por quatro anos de mandato.
No ano passado, a Assembleia mudou a lei, limitando o pagamento a quatro anos após o governador deixar o Piratini. A regra só valerá para os próximos.

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

PARLAMENTARISMO CONQUISTA ADEPTOS NO CONGRESSO



JORNAL DO COMÉRCIO 18/01 às 20h25min
 


EDITORIAL


Ultrapassamos 2015, o ano que ninguém quer lembrar, mas o momento continua delicado, tanto político quanto economicamente. O risco de um mergulho profundo no retrocesso é real, e o momento exige decisões, porque os brasileiros não merecem esse pesadelo indefinidamente. Somente um grande pacto das lideranças pode viabilizar reformas estruturais, tornando possível vislumbrar alguma luz no fim do túnel.

Com as dificuldades de governar da presidente Dilma Rousseff (PT), os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB), decidiram retomar a discussão em torno da mudança do sistema de governo para o parlamentarismo. Renan encomendou estudo à consultoria legislativa sobre o tema, e Cunha afirma que, se houver consenso, vai pautar a proposta ainda neste ano.

A área técnica do Senado avaliou os sistemas na Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica e Canadá. A medida é uma resposta a vários pedidos para dar andamento a essa discussão na Casa, caso a crise no governo Dilma se agravasse. Uma das alternativas, nesse cenário, seria convencer a presidente a passar o poder ao Parlamento e se transformar em chefe de Estado.

No Senado, a proposta mais avançada é do senador Antonio Carlos Valadares (PSB), que conta com o apoio de 40 senadores. O texto prevê um referendo em 2017, caso o Congresso aprove, e a entrada em vigor do parlamentarismo em 2019, com o novo governo. Valadares destaca que o presidencialismo é gerador de crises, e o parlamentarismo é gerador de soluções.

Na Câmara, Eduardo Cunha afirma que, se houver unanimidade, o tema entrará na agenda ainda neste ano. Ele acredita que, se estivéssemos num regime parlamentarista, a atual crise estaria resolvida. "No presidencialismo, não tem essa previsão de dissolução do Parlamento e novas eleições. Não tem recall", afirma. Para o presidente da Câmara, contudo, qualquer mudança na Constituição só deve valer para depois do término do mandato da presidente Dilma. "Senão é golpe", diz , esquecendo que tramita na Casa vários pedidos de impeachment contra a petista.

Atualmente, 216 deputados e 11 senadores integram frentes a favor do parlamentarismo. No PT também há defensores da proposta. Pelo menos dois interlocutores do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avaliam, de forma reservada, ser inevitável a discussão e que, se vigorasse o parlamentarismo, a situação do País seria outra. Para o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), o decano da Câmara, a melhor alternativa para tratar das reformas política e tributária e da organização dos Poderes é a convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva.

Duas foram as experiências brasileiras com o parlamentarismo. Entre 1847 e 1889, o Executivo era chefiado pelo presidente do Conselho de Ministros ou primeiro-ministro. Mas era o imperador Dom Pedro II quem determinava qual dos dois partidos da época chefiaria o governo. O modelo acabou com a proclamação da República.

Em 1961, após a renúncia do presidente Jânio Quadros, diante da resistência militar à entrega do poder ao vice João Goulart, a solução foi o regime parlamentarista. A Constituição foi reformada para a criação de um Conselho de Ministros, chefiado por Tancredo Neves e formado por representantes dos partidos PSD, PTB, UDN e PDC. Em 1963, um plebiscito trouxe o presidencialismo de volta.

Em 1993, o tema voltou à agenda política com o plebiscito para decidir a forma e o sistema de governo. O presidencialismo venceu com 55% dos votos, e o parlamentarismo obteve 25%.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

INVESTIR E SERVIR



ZERO HORA 18 de janeiro de 2016 | N° 18418


CLÁUDIO BRITO*



Estou pronto a receber uma enxurrada de tuitadas e comentários lá no Face, abrindo ou ampliando com os estimados leitores de nossa Zero Hora um debate que já ocorreu com os queridos ouvintes da Gaúcha. Pois falei de investimentos públicos e serviços públicos, confrontando-os, o que resultou em discussão entre defensores de modelos e tamanhos distintos de Estado.

Quando surgem lamentos do tipo “não sobra nada para investimentos, tudo se gasta com os servidores”, pergunto-me: mas o Estado, quando gasta com o serviço público, não está fazendo aquele que deve ser o seu principal investimento?

Os governos devem induzir investimentos, mas as empresas privadas é que devem realizá- los. O serviço é o dever estatal, que, uma vez cumprido, estará ensejando aos empreendedores o ambiente e todas as condições para a plenitude de suas atividades lucrativas. O Estado não tem nada a ver com lucro. Seus ganhos são muitas vezes intangíveis, embora mensuráveis. A satisfação do povo, sua segurança, sua saúde e seus níveis de educação servem de parâmetros para uma conta imaterial. A realização das finalidades do Estado não se confere nos saldos do Tesouro, mas no bem-estar da cidadania. Para isso, serviços essenciais e de excelência, desempenhados por profissionais competentes, arregimentados pelo concurso de provas e títulos, com garantias e prerrogativas compatíveis com suas responsabilidades, adequadamente remunerados e que não sejam seduzíveis pelas vicissitudes do mercado, podendo assim atuar com independência, movidos pela ideia de construção do bem comum.

Investir é servir, quando se fala em Estado. O que se destina à prestação de serviço é que representa o verdadeiro investimento público, seja em tecnologia, equipamentos, instalações e outros implementos materiais, ou seja em pagamento de um funcionalismo competente e engajado. Assim, chamar concursados para os órgãos de segurança, por exemplo. Nomeá-los, aperfeiçoá-los e manter inalterados os melhores padrões de eficiência são os verdadeiros investimentos da alçada do Estado. É o que se espera.

Jornalista*

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

CARGOS COMO MOEDA DE TROCA


ZERO HORA 13 de janeiro de 2016 | N° 18413


EDITORIAL




A crise política amplia um dos piores defeitos dos chamados governos de coalizão, que abrigam políticos e partidos sem nenhuma coerência programática e sem compromissos com a ética. Um exemplo é o que acontece agora com as tentativas do Palácio do Planalto de afastar o risco de dissidências de apoiadores. A tática é a distribuição de cargos e favores que contemplem os esforços para conter o ímpeto de eventuais defensores do impeachment. O caso mais recente e emblemático dessa troca de favores é o que envolve o oferecimento de um ministério à bancada mineira do PMDB, com a intenção de fazer com que o partido mantenha em sua liderança o deputado Leonardo Picciani, aliado do Planalto.

Também se noticia, a partir de informações dos próprios envolvidos, que o Executivo vem mapeando os cargos do primeiro ao terceiro escalão, para saber quem são seus ocupantes e se de fato têm compromisso com a defesa do governo. Quem não se adequar às demandas e às expectativas governistas poderá ser expurgado, para que políticos fiéis ocupem seus lugares. Repete-se o que o setor público tem de pior e que se manifesta com maior intensidade em momentos de tensão, como o que o país vive atualmente.

Fecha-se o cerco em torno de padrinhos e afilhados, para que, depois do fim do recesso, o governo esteja fortalecido para enfrentar a ameaça de afastamento da presidente da República. São as mesmas práticas flagradas pela Operação Lava-Jato. Muitos dos responsáveis por desmandos na Petrobras, alguns transformados em delatores, ascenderam a cargos elevados por conta da insistência dos governantes em ignorar princípios como o da impessoa- lidade na admissão por concurso e o de mérito nas promoções. O resultado é sempre uma conta elevada para os brasileiros. A Petrobras é o exemplo mais visível de deformações que o clima criado pelo impeachment apenas ressuscita com outros personagens.

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

PARLAMENTARISMO E EQUILÍBRIO DEMOCRÁTICO



JORNAL DO COMERCIO 12/01/2016



Antônio Augusto Mayer dos Santos



Uma causa histórica do limbo presidencialista está na concentração da chefia de governo com a de Estado agravada por promessas de campanha não realizadas. O caráter nocivo de tantos e quase ilimitados poderes constitucionais pelo chefe do Executivo confrontado à frustração popular pelas expectativas eleitorais revela o óbvio: na atualidade, mostra-se pouco lógico que uma pessoa satisfaça eficazmente os partidos que lhe dão sustentação, supervisione setores complexos da administração pública, decida os rumos econômicos e concilie as crises entre os poderes, correligionários e outros interesses.

É impossível desconsiderar que a subordinação partidária do presidente compromete a magistratura, que deve pairar acima das disputas para garantir a unidade nacional. Ao contrário disso, o sistema parlamentarista está mais próximo da realidade. Reúne maiores chances de acerto perante os obstáculos. Reveste a democracia de mais qualidade. Absorve as crises de funcionamento do governo sem comprometer o desempenho e a legitimidade do regime e de suas instituições. Viabiliza a participação igualitária de homens e mulheres no poder. Permite uma intervenção concreta do parlamento no processo governamental.

Quando os seus adversários mais passionais argumentam que a queda do gabinete leva à convocação de novas eleições e que isso é sinônimo de crise, negligenciam: trata-se exatamente do contrário. A destituição do gabinete é que vai evitá-la ou prolongá-la. Queda de gabinete não é trauma, é solução. É troca sem estagnação. A par disso, é incorreto e contrário à ciência política negar virtudes ao presidencialismo. Ocorre que o modelo brasileiro, mal copiado do norte-americano, caracteriza-se por instigar a rivalidade entre Poderes.

Tudo indica que a introdução do sistema parlamentarista teria largo alcance. Seria uma transformação institucional na base democrática do País. Um alento para a renovação de conceitos. Em suma: um impulso para a estabilidade e para o progresso.



Advogado e consultor

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

FUNDO PARTIDÁRIO SEGUE INTOCÁVEL



ZERO HORA 11 de janeiro de 2016 | N° 18411


POLÍTICA + | Juliano Rodrigues



FUNDO PARTIDÁRIO SEGUE INTOCÁVEL MESMO NA CRISE

A conta do ajuste fiscal vai passar longe dos partidos políticos em 2016. Em meio à série de cortes no orçamento da União, que retirou dinheiro de áreas como saúde e educação, o fundo partidário, alimentado com recursos públicos e criado para bancar gastos de partidos com propaganda e campanha eleitoral, ficou livre da faca do Ministério da Fazenda. Mesmo diante de uma crise profunda no país, com inflação alta e desemprego crescente, neste ano, os repasses para as 35 siglas existentes no Brasil poderão chegar aR$ 819 milhões, R$ 8 milhões a mais do que os valores gastos com essa despesa em 2015.

O aumento dos recursos do fundo partidário é mais uma demonstração de que quem paga a conta pela corrupção e pelos malfeitos no Brasil invariavelmente acaba sendo o contribuinte. Antes da Operação Lava-Jato, em 2014, o orçamento da União repassou R$ 371,9 milhões aos partidos. Após a devassa promovida pela Polícia Federal nas relações promíscuas entre várias das siglas e empresas, líderes de algumas legendas passaram a defender a elevação do fundo como forma de compensar os diretórios pela redução nas doações empresariais. Com isso, os partidos se uniram e pressionaram o governo a elevar os repasses.

Pela proposta inicial do governo para 2016, o valor destinado ao fundo partidário neste ano seria de R$ 311,9 milhões, mas os líderes das siglas no Congresso editaram uma emenda aumentando o repasse. O acordo não foi difícil, já que o interesse de receber mais dinheiro em um ano de eleições uniu até aqueles partidos que não costumam concordar em quase nada.

Em 2015, a divisão do fundo entre as 35 siglas existentes no Brasil contemplou o PT com a maior fatia: R$ 108,7 milhões. Em seguida, aparecem PSDB, com R$ 89 milhões, e PMDB, com R$ 86,8 milhões. Se o PT mantiver o mesmo percentual no cálculo de divisão dos recursos, em 2016 receberá R$ 66,9 milhões a menos.

Até mesmo os recém-criados Novo, Rede e Partido da Mulher Brasileira (PMB) receberam, juntos, mais de R$ 1 milhão em menos de três meses. Parece pouco diante do manancial de dinheiro distribuído entre as legendas, mas não custa lembrar que os três partidos tiveram registro homologado apenas no fim do ano e ainda estão em fase de estruturação.



DINHEIRO DAS FÉRIAS ATRASADO

Desde que a crise financeira se agravou no Rio Grande do Sul, o Estado passou a pagar o adicional de férias dos servidores públicos apenas no fim do mês, e não antes de os funcionários iniciarem o período de descanso. Como o volume de pessoas saindo em férias aumentou com a virada do ano, multiplicaram-se as reclamações de servidores contra a prática adotada pelo governo.

A Secretaria da Fazenda informou que o pagamento será feito junto com o salário de janeiro. A regra vale para todos os servidores: recebem o adicional na volta.




PROPOSTA PARA O PISO REGIONAL


A indexação do salário mínimo regional será o tema de duas emendas à Constituição apresentadas à Assembleia em fevereiro, na volta do recesso. O deputado Vinicius Ribeiro (PDT) vai protocolar texto que cria critérios para definição do valor, deixando para o Executivo a escolha anual de qual indexador usar.

Já a deputada Any Ortiz (PPS) é mais direta em sua proposta, mas também não estabelece indexador fixo. A emenda propõe que o salário mínimo deve ser uma média entre os valores decididos em acordos coletivos.

Por incrível que pareça, ao contrário da lei federal, a norma que estabelece o mínimo regional não prevê critérios para definição de um valor. Hoje, a quantia é definida pelo governador sem a obrigatoriedade de ser calculada de uma maneira padronizada.

VIVA A INTOLERÂNCIA



ZERO HORA 11 de janeiro de 2016 | N° 18411


DAVID COIMBRA




Passei um pacote de dias no Brasil. Pouco, mas o suficiente para comprovar como certas pessoas estão preocupadas com a intolerância. “Mais tolerância”, pedem. “Ai, quanta intolerância”. É bonito clamar por tolerância. É como clamar pela bondade ou pela paz.

Já eu estou orgulhoso dessa intolerância do Brasil. Finalmente! Aqui, nos Estados Unidos, o sistema funciona devido à intolerância. Quem infringe a lei é punido. Ponto. Está estabelecida a igualdade.

No Brasil, a tolerância histórica estabelece a desigualdade histórica. Há sempre justificativa para a tolerância. Ou o sujeito é coitadinho demais ou poderoso demais para ser punido. Ou se tem pena ou medo dele.

O longo braço da lei, no Brasil, não é tão longo. Só alcança aquela que esperneia entre os coitadinhos e os poderosos – a classe média, tão odiada pelos governistas. Os poderosos, como o ministro corrupto ou o nababo assassino, esses estão muito acima do braço da lei (ou estavam), porque têm recursos para se defender. Os coitadinhos, como o punguista da Praça XV ou o menor que apunhala o médico, esses estão muito abaixo da lei. Não ficam na cadeia, são quase inimputáveis.

Sente medo da lei apenas quem tem algo a perder com as penas da lei. Só os infelizes assalariados, tristes contribuintes que, além de financiar com seus impostos um governo ineficiente, ouvem desse mesmo governo que são a pérfida elite branca. E que são intolerantes, quando reclamam.

Os governistas, tão intolerantes com a classe média e com a oposição, agora precisam desesperadamente da tolerância para existir. Seja tolerante, recomendam. Tolere um governo que:

1. Soma 21 ministros denunciados, investigados ou presos por corrupção. Vinte e um ministros! Deve ser algum tipo de recorde.

2. Leva, com sua presidente, 900 pessoas em comitiva para um evento em Paris. Novecentas! Deve ser outro recorde.

3. Causou um rombo de R$ 120 bilhões nas finanças públicas.

4. Mentiu na campanha eleitoral. O que foi admitido pelo próprio Pai Lula.

5. Inchou a folha do Estado com a contratação de 235 mil funcionários, isso só os concursados.

6. Corroeu de corrupção a maior empresa da América Latina, a Petrobras.

7. É suspeito de ter promovido corrupção nos Correios e Telégrafos, na Eletrobras e nos fundos de pensão.

8. É suspeito de praticar corrupção ao captar recursos para campanhas.

9. Fez acordos com as ditaduras mais espúrias do mundo.

10. Usou o BNDES para financiar empresários amigos, como Eike e Odebrecht.

11. Gastou bilhões de dólares para construir quatro estádios onde praticamente não há futebol.

12. Está investindo outros bilhões para patrocinar uma Olimpíada numa cidade em que os hospitais estão falidos.

13. Falhou no controle sanitário e permitiu epidemias.

14. Tem o seu líder no Senado preso.

15. Tem dois tesoureiros do seu principal partido presos.

16. Tem o ex-presidente do seu principal partido preso.

17. Faz uma proposta ideológica de mudança no currículo escolar, acabando com o estudo da história antiga e medieval, e eliminando o estudo dos clássicos da literatura ocidental.

18. Conduz a economia de maneira que a inflação chegue a dois dígitos, que o dólar estoure os R$ 4, que mais de 1 milhão de pessoas percam seus empregos e que empresas comecem a demitir e a falir.

Um governo com tal desempenho precisa, sim, e muito, de tolerância.

Seus bajuladores precisam de tolerância.

Nenhum outro povo toleraria. Só os tolerantes brasileiros.

Sejam, pois, intolerantes, brasileiros! Não deem trégua a eles! Não acreditem nessa conversa de que todos são iguais na desonestidade! Não acreditem que o prejuízo de vocês é o benefício dos pobres! Não acreditem que, saindo um ruim, entrará outro pior! Chega, basta e fora! Viva a nova intolerância brasileira!

sábado, 9 de janeiro de 2016

O DEVER DA INDIGNAÇÃO



No Brasil de 2016, a verdade incômoda, que muitos gostariam que esquecêssemos, é que a miséria campeia

DIEGO ESCOSTEGUY 


REVISTA ÉPOCA 09/01/2016 - 11h01
 


Em 4 de janeiro de 1960, um acidente de carro interrompia, aos 47 anos, a vida do franco-argelino Albert Camus, um dos escritores mais lúcidos do século XX. A obra de Camus é uma breve mas solar jornada rumo ao cume da montanha moral de nosso tempo. Como um Sísifo moderno, Camus rolou morro acima, em romances, peças e ensaios, a pedra de seu pensamento acerca do que define a condição humana num mundo sem Deus, no qual matanças em nome de ideologias são atos autorizados pela razão. Como o herói do mito grego, Camus, sempre que acreditava estar perto do topo, percebia-se condenado a reiniciar a jornada, por não encontrar o que buscava – um sentido para a devassidão moral do século XX. A imagem de Sísifo, consagrada pelo próprio Camus, definia a situação do homem moderno, vergado pelo absurdo da distância entre si mesmo e o mundo. O que mais poderia captar a essência da violência sem limites, a essência da fogueira política em que ardiam, sem cessar, a liberdade, a vida e a verdade, senão a noção do absurdo?

Cinquenta e seis anos após a derradeira queda de Camus, pouco poderia sobreviver do que ele escreveu, não tivesse o mundo – e os homens – permanecido o que sempre foi. Sem dúvida que, em muitos aspectos, o mundo de 2016 é melhor do que aquele que Camus deixou em 1960. Mas há algo de essencialmente igual nos problemas do homem e do mundo, apesar de todas as nuances políticas, sociais, tecnológicas, econômicas e culturais. A lista de misérias da humanidade é extensa e complexa. Guerras, tragédias, fome, atentados terroristas, assaltos, doenças, governos ineptos, governos liberticidas, governos corruptos – injustiças de toda sorte, enfim. Basta consultar o noticiário. Os infortúnios do homem estão sempre lá, dos maiores aos menores. O passar do tempo alterna somente os nomes das desgraças.

No Brasil de 2016, a verdade incômoda, que muitos gostariam que esquecêssemos, é que a miséria campeia. Além do autoritarismo e da violência que definem o país há décadas, converge-se neste momento, no absurdo da razão brasileira, para o ápice da supercrise política, criminal e econômica, que acomete o Brasil desde, ao menos, o início de 2015. Esse avançar aparentemente inexorável da crise rumo ao topo de si mesma ainda pode encontrar pelo caminho as ruas, ponto no qual os quatro pilares do desassossego brasileiro – político, econômico, criminal e social – esbarrariam perigosamente, com consequências sombrias para o país.

Enquanto esse momento não chega, se é que chegará, o transcorrer dos dias e dos duros fatos da crise acostuma-nos com o que não é normal, mas assim começa a nos parecer. Não é normal que o líder do governo no Senado esteja preso, assim como os principais chefes do partido que comanda o país. Não é normal que deputados, senadores e ministros sejam acusados de corrupção e continuem tranquilamente em seus cargos. Não é normal que a inflação bata recorde, os empregos sumam e a renda despenque. Não é normal que os políticos não consigam resolver politicamente, sem a supervisão da Suprema Corte, os problemas políticos que eles mesmos criaram. Muita coisa é normal; essas não são. Essas são absurdas.

E o que fazer diante do absurdo político? Para Camus, é preciso se revoltar. Essa revolta não significa pegar em armas – pelo contrário. Nem, necessariamente, ir às ruas. Significa, primeiro, “recusar-se a mentir sobre o que se sabe”, o que é mais difícil do que dizer a verdade. É um ato de rebeldia lúcida e sensata, que suprime o ceticismo confortável e o cinismo estúpido . Significa assumir o dever da indignação íntima com o que não pode, jamais, ser considerado normal. Significa aceitar, como Sísifo, rolar a pedra montanha acima, quantas vezes forem necessárias, mesmo que o normal permaneça no topo.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

A IMPORTÂNCIA DO VOTO AO LEGISLATIVO NAS ELEIÇÕES





JORNAL DO COMÉRCIO 08/01/2016. Alterada em 07/01 às 21h20min


EDITORIAL



Em sua jovem democracia, que recém ultrapassou os 30 anos, o Brasil optou, através do voto, por um regime presidencialista. Desta forma, é natural que a responsabilidade do chefe do Executivo, seja na esfera municipal, estadual ou federal, ganhe mais relevância do que a de um líder de governo em um sistema parlamentarista. O poder de decisão para tirar as medidas do papel é maior, sem dúvida.

Não por acaso, as eleições mais comentadas no Brasil são as para prefeito, governador e presidente da República. Ao longo da campanha, e até antes dela, os candidatos ao Executivo se tornam conhecidos do grande público, ao passo que não é raro alguém dizer que não faz ideia de quem será o seu candidato para o Legislativo inclusive na véspera ou no dia de uma eleição; pior ainda, nem lembra em quem votou poucos dias depois do pleito.

Entramos na segunda semana de 2016, um ano eleitoral. A votação ocorrerá em outubro, são nove meses até lá, tempo mais do que suficiente para se informar de forma razoável sobre nomes confiáveis para compor o Legislativo. Neste ano, a escolha é para prefeito e vereadores, cargos mais próximos, já que, antes de pertencer a um país ou estado, as pessoas vivem nas cidades.

É evidente que o prefeito é de vital importância para a administração do município, mas a Câmara de Vereadores também tem papel fundamental, com poder para tomar decisões relevantes, mesmo que o chefe do Executivo não concorde. Por exemplo, se um projeto de lei é aprovado pelos vereadores e o prefeito veta, o Legislativo pode derrubar a decisão do chefe do Executivo.

E a legislação que passa pela Câmara pode mudar uma cidade. O orçamento do município, que estipula o valor que deve ser destinado para saúde, educação, habitação e outros setores, passa pelos vereadores, que também são os responsáveis por fiscalizar as leis.

Em Porto Alegre, por exemplo, em 2015, a Câmara vetou o serviço de táxi pelo Uber; aprovou a volta da zona rural, a criação de novos bairros, mudanças no Plano Diretor que permitem construções maiores em parte da Capital e o feriado do Dia da Consciência Negra. Não é preciso mais argumentos para ficar demonstrado o poder de um vereador e a importância de um voto consciente.

Nos últimos anos, o descrédito da população em relação a partidos e políticos cresceu muito. E é salutar que haja uma cobrança para que os eleitos sejam, de fato, representantes da vontade da população. Entretanto, a generalização e a repetição de frases feitas contra a classe política também podem ser prejudiciais.

Ao igualar todos com o que há de pior na vida pública, nada mais se está fazendo do que beneficiar os maus políticos e prejudicar os bons. Sim, existem quadros respeitáveis, em todas as tendências ideológicas. Se os partidos políticos, que são muitos no Brasil, perderam essa clareza e se restringiram a disputas de situação e oposição, é preciso identificar os bons nomes, que existem em diversas legendas.

Assim como a população cobra menos corrupção e mais realizações de parlamentares e executivos, é necessário que ela faça sua parte, cobrando, fiscalizando e exercendo seu direito de votar, escolhendo bem seus representantes.

Há quem diga que, nos últimos tempos, a cada eleição, há uma depuração nos Legislativos: a minoria de bons parlamentares fica menor, e a maioria, menos qualificada, aumenta. Como todas as visões, essa não pode ser generalizada, mas, sem dúvida, é necessária a qualificação das Câmaras Municipais.

A mudança deste quadro depende do eleitor. A começar pela eleição para vereador.

A PENÚRIA DOS ESTADOS




ZERO HORA 08 de janeiro de 2016 | N° 18408

EDITORIAL

A particularidade de até mesmo Minas Gerais, Estado há algum tempo citado como paradigma de gestão pública, não estar conseguindo pagar em dia a folha do funcionalismo é ilustrativa da gravidade da situação das finanças do setor público no país. Assim como ocorreu com Minas, que ficou sem dinheiro em caixa e também precisou recorrer a alternativas impopulares como o aumento de impostos, outras unidades da federação enfrentam uma situação similar à conhecida também dos gaúchos. Os exemplos de dificuldades devem servir de alerta aos demais Estados, para que possam se adiantar nas providências, sem esperar a situação atingir proporções de caos para só então começar a agir.

Em todos os casos malsucedidos, as dificuldades registradas hoje estão associadas à ineficiência gerencial. A situação de penúria, normalmente, é decorrência de práticas que destoam das expectativas relacionadas a princípios elementares de boa gestão pública. Entre os vícios mais comuns de maus gestores, estão o excesso de nomeações de “cargos de confiança”, para contemplar apadrinhados, e a falta de atenção a cuidados mínimos com a expansão dos gastos. O resultado mais visível é o gigantismo descontrolado da máquina do Estado.

Quem mais perde com o mau gerenciamento das finanças públicas são os contribuintes. Por isso, a atuação de gestores estaduais precisa ser acompanhada cada vez mais de perto.

É inadmissível que Estados importantes da federação não consigam sequer pagar os servidores em dia, muito menos enfrentar o caos em áreas como saúde e segurança pública. Tanto governadores já em dificuldade quanto os que ainda dispõem de alguma folga no caixa precisam agir logo para assegurar um mínimo de estabilidade pela frente.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

O RISCO VENEZUELA

O risco Venezuela Eduardo Oliveira/ARTE/ZH

ZERO HORA 06 de janeiro de 2016 | N° 18406



EDITORIAL



Interessa também à América Latina, e não só aos venezuelanos, o ambiente de radicalização do autoritarismo governista diante da ameaça concreta de perda de poder com a formação da nova Assembleia Nacional. A legislatura que se iniciou ontem expôs ainda mais os receios do presidente Nicolás Maduro e seus seguidores diante das novas possibilidades criadas pela eleição de 6 de dezembro. A truculência foi a resposta à ampla maioria conquistada pela oposição. Os parceiros de Mercosul não podem ignorar as várias iniciativas do governo no sentido de tentar esvaziar o poder do novo parlamento.

A tentativa de impugnar a posse de três deputados através de recurso na Suprema Corte, o decreto que retira da Assembleia a prerrogativa de rejeitar nomes indicados para o Banco Central e a possibilidade de Maduro emitir moeda sem qualquer fiscalização do parlamento são alguns dos gestos de desespero dos herdeiros do bolivarianismo. O que o governo tenta atingir não é apenas a oposição, mas os valores da democracia. Por isso, o cenário na Venezuela deve inquietar os vizinhos do Mercosul, em especial o Brasil, que vinha reagindo timidamente aos movimentos do presidente que perde sustentação política e não consegue impedir a deterioração da economia.

Vacilante, a presidente Dilma Rousseff, que cobra respeito ao resultado das urnas no Brasil, demorou para exigir o mesmo do colega Maduro. Ontem, finalmente, o Itamaraty emitiu uma nota pedindo que seja acatada a vontade soberana do povo e se respeitem as prerrogativas constitucionais da nova Assembleia. Cabe aos venezuelanos a vigilância interna, para que se cumpra o que as urnas determinaram em dezembro. E também é atribuição das nações do continente o acompanhamento crítico do comportamento do governo em relação ao novo cenário do país. É preciso denunciar e conter os retrocessos ensaiados pelo chavismo, para o bem da Venezuela e da América Latina.

PARLAMENTARISMO: GOVERNO E DEMOCRACIA




ZERO HORA 06 de janeiro de 2016 | N° 18406


ANTÔNIO AUGUSTO MAYER DOS SANTOS*



Uma causa histórica do limbo presidencialista é a concentração da chefia de governo com a de Estado, agravada por promessas de campanha não realizadas. O caráter nocivo de tantos e quase ilimitados poderes constitucionais pelo chefe do Executivo confrontado com a frustração popular pelas expectativas eleitorais revela o óbvio: na atualidade, mostra- se pouco lógico que uma pessoa satisfaça eficazmente os partidos que lhe dão sustentação, supervisione setores complexos da administração pública, decida os rumos econômicos e concilie as crises entre os poderes, correligionários e outros interesses.

É impossível desconsiderar que a subordinação partidária do presidente compromete a magistratura, que deve pairar acima das disputas para garantir a unidade nacional. Ao contrário disso, o sistema parlamentarista está mais próximo da realidade. Reúne maiores chances de acerto perante os obstáculos. Reveste a democracia de mais qualidade. Absorve as crises de funcionamento do governo sem comprometer o desempenho e a legitimidade do regime e de suas instituições. Viabiliza a participação igualitária de homens e mulheres no poder. Permite uma intervenção concreta do parlamento no processo governamental.

Quando os seus adversários mais passionais argumentam que a queda do gabinete leva à convocação de novas eleições e que isso é sinônimo de crise, negligenciam no quesito elementar: trata-se exatamente do contrário. A destituição do gabinete é que vai evitá-la ou então prolongá-la. Queda de gabinete não é trauma, é solução. É troca sem estagnação. A par disso, é incorreto e contrário à ciência política negar virtudes ao presidencialismo. Ocorre que o modelo brasileiro, mal copiado do norte-americano, caracteriza-se por instigar a rivalidade entre poderes.

Tudo indica que a introdução do sistema parlamentarista teria largo alcance. Seria uma transformação institucional na base democrática do país. Um alento para a renovação de vários conceitos. Uma possibilidade de catapultar o Brasil de democracia eleitoral a social. Em suma: um impulso para a estabilidade e para o progresso.


*Advogado e consultor

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

RELAÇÕES PROMÍSCUAS


ZERO HORA 05 de janeiro de 2016 | N° 18405



EDITORIAIS






É evidente que a denúncia de favorecimento a um dos doadores da campanha do vice-presidente Michel Temer faz parte do jogo de desconstituir rivais políticos. Ameaçado pelo processo de impeachment, o governo e seus defensores estrategicamente colocados no aparelho estatal não param de gerar más notícias e suspeitas sobre aqueles que os ameaçam, especialmente o complicado presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e o primeiro nome da sucessão, o vice Michel Temer. Isso não significa, porém, que essas raposas da política não tenham culpa em cartório.

A suspeita de uso de medida provisória para beneficiar um grupo econômico, doador da campanha eleitoral do vice, apenas evidencia as relações promíscuas entre os ocupantes do poder e grupos que se valem das famigeradas doações de campanha para garantir vantagens junto à administração pública. A troca de denúncias entre os que, dependendo do ponto de vista, são acusadores ou acusados tem pelo menos um aspecto positivo. Tornam-se públicas, além das táticas usadas contra os adversários, algumas informações que poderiam ficar protegidas por sigilo. O eleitor saberá julgar as posturas de uns e outros, num ambiente cada vez mais propício à guerra de desqualificação entre inimigos.

São atos de um recesso parlamentar que, pela amostragem disponível até agora, talvez venha a ser marcado pela belicosidade. As expectativas do país são outras. Seria bom para a política e para a economia que o período de descanso fosse aproveitado também para o estudo das grandes questões que o Congresso e o governo precisam enfrentar no início de 2016. O país torce ao mesmo tempo para que as instituições, em especial a Polícia Federal, o Ministério Público e o Judiciário, aperfeiçoem os esforços moralizadores que renderam bons resultados em 2015.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

500 MILHÕES DE EMENDAS PARLAMENTARES EM TROCA DE APOIO CONTRA IMPEACHMENT



ZERO HORA 02 de janeiro de 2016 | N° 18402


POLÍTICA


Mais R$ 500 milhões para emendas parlamentares. APESAR DA CRISE FISCAL ,Planalto aumentou verba destinada a repasses de congressistas em troca de apoio contra o pedido de impeachment



Em ano de crises política e econômica, o governo federal ampliou o volume de verbas destinas a emendas parlamentares. Com o orçamento impositivo, aprovado pelo Congresso no início do ano passado para obrigar o Executivo a liberar os repasses indicados por deputados e senadores, e a necessidade de obter apoio político no Legislativo para barra o impeachment, o Palácio do Planalto elevou em R$ 500 milhões – de R$ 6,7 bilhões em 2014 (em valores atualizados) para cerca de R$ 7,2 bilhões em 2015 – o total para esse tipo de despesa. O montante não considera restos a pagar (compromissos pendentes de anos anteriores).

Embora tenha contingenciado em R$ 3 bilhões a verba originalmente reservada no orçamento para as emendas parlamentares, este total foi elevado em dezembro pelo Planalto. No começo do mês passado, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), aceitou um pedido de impeachment de Dilma Rousseff, encampado pela oposição e posteriormente apoiado até por deputados da base aliada. Com isso, o Planalto liberou quase todas as emendas previstas após o contingenciamento e elevou a verba destinada aos repasses.

Na última semana do ano, em pleno recesso parlamentar, deputados ainda foram vistos em peregrinação por ministérios na tentativa de liberar o restante dos recursos para irrigar suas bases eleitorais. Parlamentares se dizem pressionados por prefeitos que, com cofres vazios por causa da crise econômica, estão preocupados com as eleições municipais de outubro.

PREFEITOS PRESSIONAM DEPUTADOS POR RECURSOS

Em seu primeiro ano como deputado, Carlos Marun (PMDB-MS) foi aos ministérios da Saúde, da Ciência e Tecnologia e das Cidades, mas saiu de lá sem perspectiva.

– Me empenhei nestes dias por esta liberação. Por ser oposição, as coisas se dificultam um pouco – disse o deputado, que integra a ala do PMDB contrária à presidente.

Até parlamentares da base governista saíram sem perspectiva de ver mais recursos irrigando suas bases eleitorais. O deputado João Carlos Bacelar (PR-BA) disse ter feito “esse beija-mão de fim de ano” para atender a prefeitos que “ficam ávidos por recursos”.

– O governo quer se salvar, mas não pode se salvar matando os municípios – reclamou Bacelar.

As emendas parlamentares individuais são dotações inseridas no orçamento da União que abastecem os redutos eleitorais dos congressistas com recursos para obras e ações em saúde e educação, entre outras.

Historicamente, o Planalto liberava essa verba seguindo o cronograma de deliberações importantes no Congresso, para pressionar parlamentares a votar com o governo. Mas, com a aprovação do chamado orçamento impositivo, o pagamento passou a ser obrigatório. As emendas dos deputados de primeiro mandato não são impositivas, mas o governo fez acordo com esses parlamentares para que também fossem contemplados.

O ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, esteve com o colega Ricardo Berzoini, titular da Secretaria de Governo da Presidência, para tratar do assunto, mas tampouco obteve qualquer perspectiva.

– Até agora, o Ministério do Turismo não recebeu nenhuma comunicação de nenhuma liberação – afirmou Alves, ministro de uma das pastas mais procuradas pelos deputados.

AS INSTITUIÇÕES ESTÃO FUNCIONANDO!



ZERO HORA 03 de janeiro de 2016 | N° 18403



PERCIVAL PUGGINA*



A frase vem sendo pronunciada por muita boca bem-falante e malpensante: “Está tudo sob controle, a democracia consolidada e as instituições funcionando”. Sim, sim, claro. E eu quero saber onde caiu a minha chupeta, que está na hora de nanar.

Não somos crianças. Falem sério! Está tudo sob controle de quem? Como ousam chamar de democracia o ambiente onde agem essas pessoas que se acumpliciaram para dirigir a República? A única ideia correta na citação acima é a que se refere às instituições. Elas estão funcionando, mesmo. O Brasil que temos, vemos e padecemos é produto legítimo e acabado do seu funcionamento. Acionadas, produzem isso aí. Sem tirar nem pôr.

Eis o motivo pelo qual os figurões do governo frequentemente sacam de sua sacola de argumentos a afirmação de que as coisas sempre foram assim. De fato, embora não no grau superlativo alcançado nos últimos 13 anos, o modelo institucional republicano tornou crônicos os mesmos males. Em palestras, refiro-me a isso mediante uma analogia. Instituições, digo, são como sementes. Uma vez plantadas, germinam, ou seja, funcionam e produzem conforme determinado pela natureza da semente. É o nosso caso. À medida que a urbanização nos tornou sociedade de massa e o Estado empalmou o poder (vejam só!) de definir os valores, a verdade e o bem, decaiu o padrão cultural e moral médio, inclusive, claro, dos membros dos poderes de Estado. Eu assisti a isso. Mas a sedução do modelo aos piores vícios, a destreza com que gera crises e a inaptidão para resolvê- las é exatamente a mesma ao longo do período republicano.

A ordem juspolítica engasgada pretende, agora, obrigar- nos a arrastar por mais três anos esse peso governamental insepulto como se fosse honorabilíssimo dever cívico. Graças a ele, o ministro Toffoli proclama que o STF, cada vez mais, se afirma como Poder Moderador. Credo, ministro! O topo do Poder Judiciário, sem voto e sem legitimidade, pretende usurpar vaga no topo do Poder Político? Bem, foi isso que se viu na deliberação sobre o rito do impeachment.

Precisamos, sim, de um Poder Moderador, que não se legitima com mero querer de um grupo bem suspeito de pessoas, mas com a separação consolidada na quase totalidade das democracias estáveis: o chefe de Estado (Poder Moderador) é uma pessoa e o chefe de governo é outra (que cai por mera perda de confiança). O impeachment, lembrava Brossard, nasceu na Inglaterra medieval e sumiu, substituído pelo voto de desconfiança dado pelo parlamento. Mas nós gostamos, mesmo, é de pagar caro por esse sistema travado e encrenqueiro que aí está.



Escritor*
zhora.co/PercivalPuggina