ZERO HORA 05 de março de 2016 | N° 18465
INFORME ESPECIAL | Tulio Milman
Ex-presidentes deveriam ter grandeza e desapegar-se do protagonismo. Manter posturas discretas, transformar-se em referências superiores, em depósitos de bom senso e sabedoria. Cinco anos depois de cumprir seu ciclo no Planalto, Lula continua no centro do palco. Sintoma de uma distorção. Quem deixou o cargo concentra mais poder do que a sucessora indicada por ele.
Se Dilma Rousseff fosse conduzida a uma delegacia, a reação seria bem menor. A presidente está cada vez mais sozinha e seu governo agoniza, por falta de apoio interno e externo.
A viagem forçada de Lula à Polícia Federal é a rachadura mais profunda em um dos pilares que sustentam o quarto mandato consecutivo do PT na Presidência. Um pilar que já era bamba, como tantos outros que tombam, um após o outro.
Há muito me desapaixonei da política. Por isso, assisti à operação Aletheia sem taquicardia. Me anima ver que, finalmente, os homens mais poderosos do país não estão acima da lei, embora muitos ainda não tenham se dado conta. Me entristece perceber que, definitivamente, o Brasil perdeu mais uma oportunidade. Faz tempo, mas só agora nos damos conta do tamanho do estrago. A oportunidade se desenhou em 2003, quando a esperança em Lula venceu o medo. Me lembro do que ele disse: “Eu não posso errar”. Na época, fiquei impactado. Hoje, imagino um encontro daquele Lula com o Lula Lava-Jato. A roubalheira venceu a esperança.
No seu primeiro mandato, Lula galvanizou apoios e conquistas sem precedentes na história contemporânea do Brasil. Virou capa de revistas mundo afora, surfou com talento na onda de crescimento econômico. Milhões de brasileiros saíram da miséria, o povo descobriu o iogurte, o carro zero e a viagem de avião. Era a hora. Era a hora de mudar o sistema, de propor uma reforma política profunda. De terminar com os propinodutos, com as relações promíscuas entre Estado e empresas. Mas não. Lula optou por Sarney e por Maluf. Optou pelo sítio e pelo triplex, pelo caminho mais fácil. Lula errou. Errou feio. Os processos têm trâmites lentos. Sempre é bom lembrar que o ex-presidente, juridicamente, não foi condenado. Politicamente, sim.
Em vez de pixulecos, depoimentos e ameaças de briga na rua, o ex-presidente Lula deveria ser bombeiro nas crises e não o epicentro delas. Meu maior temor, neste momento, é a possibilidade de instabilidade institucional, nome pomposo para quebra-quebra, violência e intolerância. Quando o governo cair, um outro assumirá. A esta altura, é isso que me preocupa. Torço por uma solução legal e negociada. Nossa única obrigação, neste momento, é lembrar que existe amanhã.
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