Carlos Alberto Di Franco
Saga do ex-presidente passou por uma imprensa que abriu espaços a um jovem sindicalista
Documento elaborado pelo presidente do PT, Rui Falcão, sobre a campanha eleitoral deste ano classifica a imprensa como “mídia monopolizada, que funciona como verdadeiro partido de oposição”. Segundo o texto, “a disputa eleitoral” vem sendo marcada “por um pesado ataque ao nosso projeto, ao governo e ao PT da parte dos conservadores, de setores da elite e da mídia monopolizada”. O ex-presidente Lula, único maestro da orquestra ideológica petista, já tinha dado o tom ao afirmar que a imprensa é o maior “partido de oposição” do país. É a música de sempre: eles e nós.
Choca, e muito, o autoritarismo e o cinismo que transparecem nas declarações que acabo de citar. O próprio Lula é o resultado direto de uma sociedade livre e democrática. Sua saga pessoal, extraordinária, passou por uma imprensa que abriu amplos espaços para um jovem sindicalista que, então, transmitia uma mensagem renovadora.
Luiz Inácio Lula da Silva, sobretudo no seu primeiro mandato, teve méritos indiscutíveis. Basta pensar nas políticas sociais adotadas por seu governo. O Bolsa Família, pilotado com competência e seriedade pelo ex-ministro Patrus Ananias, foi uma importante ferramenta de inclusão.
A última fase do governo Lula, marcada por constantes e crescentes episódios de corrupção, fizeram com que a imprensa apenas cumprisse o seu dever: informar, apurar, denunciar.
Irrita-se Lula porque a imprensa não se cala diante do seu exibicionismo de contradições e desfaçatez. Em recente entrevista à TV portuguesa, chegou ao ponto de interromper a entrevistadora que queria saber o grau de suas relações com José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares. “Não se trata de gente de minha confiança”. Fantástico!
As denúncias da imprensa sobre os desmandos na Petrobras, consistentes e sólidas como uma rocha, não provocam no ex-presidente a autocrítica que se espera de um estadista. Ao contrário. Sua ordem é “ir para cima” de quem represente um risco para o projeto de perpetuação do PT no poder.
Incomoda-se Lula porque os jornais desnudam suas aparentes contradições que, no fundo, são o resultado lógico da praxis marxista: o fim justifica os meios. O compromisso com a verdade é absolutamente desimportante. O que importa é o poder. Em agosto de 2006, quando o escândalo do mensalão estourou, Lula falava: “Quero dizer, com franqueza, que me sinto traído. Não tenho vergonha de dizer ao povo brasileiro que nós temos que pedir desculpas”. Agora, na alucinante entrevista à TV portuguesa, Lula afirma rigorosamente o contrário: “O mensalão teve praticamente 80% de decisão política e 20% de decisão jurídica”. É um ex-presidente da República, responsável pela nomeação de oito dos 11 integrantes do Supremo Tribunal Federal, acusando a Corte de cumplicidade na “maior armação já feita contra o governo”.
Assiste-se, de fato, a um processo articulado de matriz autoritária. E o ex-presidente da República é um dos líderes, talvez o mais expressivo, dessa progressiva estratégia de estrangulamento das liberdades públicas.
Carlos Alberto Di Franco é diretor do Departamento de Comunicação do Instituto Internacional de Ciências Sociais
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