REVISTA ISTO É N° Edição: 2321 | 16.Mai.14 - 20:50
Itamaraty em guerra. Às vésperas da Copa do Mundo, enquanto embaixadas são alvo de vandalismo, funcionários de consulados do Brasil no Exterior, numa ação oportunista, paralisam atividades e expõem inabilidade do Itamaraty para resolver suas questões administrativas
Izabelle Torres
Às vésperas da Copa do Mundo no Brasil, o Itamaraty, que deveria zelar pela imagem e diplomacia do País que está sob os holofotes do mundo, entrou em pé de guerra. De um lado, as embaixadas vivem dias tensos, sob ameaças de ataques de vandalismo e depredações. Em Berlim, vândalos jogaram pedras na representação brasileira em sinal de protesto contra o evento mundial. Outras embaixadas pelo mundo, especialmente na Europa, reforçaram a segurança. De outro lado, o desentendimento do Itamaraty com seus próprios funcionários expôs problemas internos do órgão e uma total inabilidade diplomática para negociar. Quem precisou de passaportes ou vistos em 13 representações diplomáticas, incluindo Nova York e Paris, se deparou com uma paralisação de 48 horas dos funcionários que possuem contratos terceirizados. Ao chegar a esses consulados, turistas que pretendem assistir à Copa no Brasil foram informados sobre a greve em sinal de protesto contra a precariedade dos direitos trabalhistas de brasileiros que atuam nesses postos sem vínculos efetivos.
ATAQUES
A embaixada brasileira em Berlim foi apedrejada por um grupo de vândalos
na madrugada da segunda-feira 12. Vidraças foram quebradas
A greve, ocorrida justamente quando a demanda por documentos para a entrada no Brasil triplicou por conta da Copa, ao mesmo tempo que se revelou oportunista, lançou luz sobre as dificuldades administrativas do Itamaraty e sua inépcia para tratar com os próprios funcionários. Não há uma norma internacional que regule os contratos entre servidores terceirizados e as embaixadas. O Itamaraty afirma que esses contratos são regidos pela lei do país onde estão instalados, como determinam a Lei 11.440/06 e o Decreto 1.570/95, e que é impossível fazer uma negociação global, visto a diferença de mercado e legislação de cada local. Apesar disso, os funcionários terceirizados reivindicam direitos previstos na lei brasileira, como, por exemplo, 13º salário, férias acrescidas de um terço e licença-maternidade. O movimento é organizado pela Associação dos Funcionários Locais do Ministério das Relações Exteriores no Mundo (Aflex), organização que não inclui servidores de carreira que também atuam nas missões brasileiras no Exterior, como diplomatas e oficiais de chancelaria. O Ministério de Relações Exteriores diz que os auxiliares locais “têm todo direito de levar à Justiça local eventuais reclamações trabalhistas ou de cerceamento de direitos”, mas que até o momento não há registro de que qualquer contratado local tenha impetrado ação trabalhista no Exterior.
As reclamações remontam ao ano de 2010, mas, como esses servidores são demissíveis, os protestos vinham sendo feitos de forma acanhada. O Itamaraty, em vez de encontrar uma solução para o problema e debelar a crise lá atrás, deixou para negociar na última hora. Por isso, teve de enfrentar a situação em momento complicado. De maneira oportunista, esses funcionários aproveitaram a proximidade com a Copa para intensificar as reivindicações. O resultado foi a paralisação de serviços essenciais, prejudicando quem recorresse às embaixadas e consulados no Exterior. “Não queríamos promover paralisações. Só que chegamos ao nosso limite”, diz Claudia Rajecki, presidente da Aflex. “Estamos sós e fomos abandonados pelo nosso governo.” No Congresso, o grupo é ajudado pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que tenta aprovar um projeto de lei no Senado para tornar obrigatório que representações diplomáticas do Brasil no exterior contratem funcionários terceirizados com base na CLT.
Durante os protestos registrados na última semana, foram afetados os consulados de Nova York, Atlanta, Los Angeles, Hartford, São Francisco e Houston, nos Estados Unidos; de Londres, Montreal, Frankfurt e Bruxelas, além do consulado e da embaixada em Paris e em Berna. Houve também manifestações nas embaixadas de Roma e Milão (Itália), Boston e Miami (EUA), Genebra (Suíça) e Roterdã (Holanda). As representações diplomáticas brasileiras nos Estados Unidos, país estrangeiro com mais compradores de ingressos para a Copa, têm aproximadamente 340 funcionários locais, responsáveis por atividades como emissão de vistos e passaportes. Só em Nova York, o consulado brasileiro dispõe de 55 servidores terceirizados. Desses, 28 trabalham no setor consular e atendem uma média de 350 a 400 pessoas por dia. No ano passado, segundo informações oficiais, o consulado em Nova York emitiu 81.767 vistos brasileiros para estrangeiros e 14.013 passaportes brasileiros.
Ao mesmo tempo que tenta reduzir os prejuízos gerados pelas paralisações, o Itamaraty trabalha para que suas representações que foram alvo de vandalismo nos últimos dias voltem à normalidade. Assustados, funcionários da embaixada em Berlim, na Alemanha, fecharam as portas. Alguns servidores se recusaram a trabalhar nos dias posteriores aos ataques. As depredações em Berlim foram organizadas por um grupo de dez pessoas vestidas de preto. Elas lançaram cerca de 80 pedras e destruíram grande parte dos vidros do primeiro andar do prédio. No período noturno, a embaixada conta somente com um segurança da empresa Securitas na portaria. Em nota divulgada em seu portal, a polícia disse que, além do porteiro, um policial estaria de plantão em frente ao edifício durante os ataques. O site Indymedia publicou a carta de um grupo anônimo que avoca para si a autoria do ataque. “Para chamar a atenção para o que a Copa do Mundo significa e derrubar a Fifa, fizemos uma ação com as armas mais simples do povo, as pedras. Com as mesmas pedras usadas para sua defesa contra o batalhão de choque, nós demolimos a fachada da embaixada brasileira.” O manifesto encerra com a expressão “Nao (sem o til) vai ter Copa”. A embaixada brasileira em Berlim fica situada na rua Wall, no centro da capital alemã, numa área nobre, com hotéis, museus e representações diplomáticas de outros países.
Foto: Divulgação Aflex; REYNALDO PAGANELLI/FUTURA PRESS
Às vésperas da Copa do Mundo no Brasil, o Itamaraty, que deveria zelar pela imagem e diplomacia do País que está sob os holofotes do mundo, entrou em pé de guerra. De um lado, as embaixadas vivem dias tensos, sob ameaças de ataques de vandalismo e depredações. Em Berlim, vândalos jogaram pedras na representação brasileira em sinal de protesto contra o evento mundial. Outras embaixadas pelo mundo, especialmente na Europa, reforçaram a segurança. De outro lado, o desentendimento do Itamaraty com seus próprios funcionários expôs problemas internos do órgão e uma total inabilidade diplomática para negociar. Quem precisou de passaportes ou vistos em 13 representações diplomáticas, incluindo Nova York e Paris, se deparou com uma paralisação de 48 horas dos funcionários que possuem contratos terceirizados. Ao chegar a esses consulados, turistas que pretendem assistir à Copa no Brasil foram informados sobre a greve em sinal de protesto contra a precariedade dos direitos trabalhistas de brasileiros que atuam nesses postos sem vínculos efetivos.
ATAQUES
A embaixada brasileira em Berlim foi apedrejada por um grupo de vândalos
na madrugada da segunda-feira 12. Vidraças foram quebradas
A greve, ocorrida justamente quando a demanda por documentos para a entrada no Brasil triplicou por conta da Copa, ao mesmo tempo que se revelou oportunista, lançou luz sobre as dificuldades administrativas do Itamaraty e sua inépcia para tratar com os próprios funcionários. Não há uma norma internacional que regule os contratos entre servidores terceirizados e as embaixadas. O Itamaraty afirma que esses contratos são regidos pela lei do país onde estão instalados, como determinam a Lei 11.440/06 e o Decreto 1.570/95, e que é impossível fazer uma negociação global, visto a diferença de mercado e legislação de cada local. Apesar disso, os funcionários terceirizados reivindicam direitos previstos na lei brasileira, como, por exemplo, 13º salário, férias acrescidas de um terço e licença-maternidade. O movimento é organizado pela Associação dos Funcionários Locais do Ministério das Relações Exteriores no Mundo (Aflex), organização que não inclui servidores de carreira que também atuam nas missões brasileiras no Exterior, como diplomatas e oficiais de chancelaria. O Ministério de Relações Exteriores diz que os auxiliares locais “têm todo direito de levar à Justiça local eventuais reclamações trabalhistas ou de cerceamento de direitos”, mas que até o momento não há registro de que qualquer contratado local tenha impetrado ação trabalhista no Exterior.
As reclamações remontam ao ano de 2010, mas, como esses servidores são demissíveis, os protestos vinham sendo feitos de forma acanhada. O Itamaraty, em vez de encontrar uma solução para o problema e debelar a crise lá atrás, deixou para negociar na última hora. Por isso, teve de enfrentar a situação em momento complicado. De maneira oportunista, esses funcionários aproveitaram a proximidade com a Copa para intensificar as reivindicações. O resultado foi a paralisação de serviços essenciais, prejudicando quem recorresse às embaixadas e consulados no Exterior. “Não queríamos promover paralisações. Só que chegamos ao nosso limite”, diz Claudia Rajecki, presidente da Aflex. “Estamos sós e fomos abandonados pelo nosso governo.” No Congresso, o grupo é ajudado pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que tenta aprovar um projeto de lei no Senado para tornar obrigatório que representações diplomáticas do Brasil no exterior contratem funcionários terceirizados com base na CLT.
Durante os protestos registrados na última semana, foram afetados os consulados de Nova York, Atlanta, Los Angeles, Hartford, São Francisco e Houston, nos Estados Unidos; de Londres, Montreal, Frankfurt e Bruxelas, além do consulado e da embaixada em Paris e em Berna. Houve também manifestações nas embaixadas de Roma e Milão (Itália), Boston e Miami (EUA), Genebra (Suíça) e Roterdã (Holanda). As representações diplomáticas brasileiras nos Estados Unidos, país estrangeiro com mais compradores de ingressos para a Copa, têm aproximadamente 340 funcionários locais, responsáveis por atividades como emissão de vistos e passaportes. Só em Nova York, o consulado brasileiro dispõe de 55 servidores terceirizados. Desses, 28 trabalham no setor consular e atendem uma média de 350 a 400 pessoas por dia. No ano passado, segundo informações oficiais, o consulado em Nova York emitiu 81.767 vistos brasileiros para estrangeiros e 14.013 passaportes brasileiros.
Ao mesmo tempo que tenta reduzir os prejuízos gerados pelas paralisações, o Itamaraty trabalha para que suas representações que foram alvo de vandalismo nos últimos dias voltem à normalidade. Assustados, funcionários da embaixada em Berlim, na Alemanha, fecharam as portas. Alguns servidores se recusaram a trabalhar nos dias posteriores aos ataques. As depredações em Berlim foram organizadas por um grupo de dez pessoas vestidas de preto. Elas lançaram cerca de 80 pedras e destruíram grande parte dos vidros do primeiro andar do prédio. No período noturno, a embaixada conta somente com um segurança da empresa Securitas na portaria. Em nota divulgada em seu portal, a polícia disse que, além do porteiro, um policial estaria de plantão em frente ao edifício durante os ataques. O site Indymedia publicou a carta de um grupo anônimo que avoca para si a autoria do ataque. “Para chamar a atenção para o que a Copa do Mundo significa e derrubar a Fifa, fizemos uma ação com as armas mais simples do povo, as pedras. Com as mesmas pedras usadas para sua defesa contra o batalhão de choque, nós demolimos a fachada da embaixada brasileira.” O manifesto encerra com a expressão “Nao (sem o til) vai ter Copa”. A embaixada brasileira em Berlim fica situada na rua Wall, no centro da capital alemã, numa área nobre, com hotéis, museus e representações diplomáticas de outros países.
Foto: Divulgação Aflex; REYNALDO PAGANELLI/FUTURA PRESS
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