VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

A MÁFIA DO ROJÃO


O ataque da máfia do rojão. Nada de hospitais, escolas ou estradas. Os parlamentares estão destinando verbas milionárias do Orçamento para a realização de festas promovidas pelo Ministério do Turismo. Por que será? - Rodrigo Rangel e Daniel Pereira - Revista Veja, 13/12/2010


Todo fim de ano, prefeitos e entidades não governamentais promovem uma romaria aos gabinetes dos deputados e senadores de olho na cota do Orçamento a que cada parlamentar tem direito para enviar à sua base eleitoral — para construir uma ponte, comprar um ônibus escolar ou ampliar um hospital. É por meio dessa interação — secular e que remonta, inclusive, à ideia de criação dos parlamentos — que suas excelências têm a oportunidade de aperfeiçoar a aplicação dos recursos públicos, direcionando-os para atender às necessidades mais urgentes da população. O problema é quando esse nobre poder se une à moral torta de alguns e à negligência do estado. O resultado é sempre o mesmo: fraudes, desvios e, claro, escândalos. Foi assim em 1993, quando surgiram os anões do Orçamento — deputados que mandavam dinheiro para amigos e familiares. Foi assim em 2006, quando foi revelada a atuação dos parlamentares sanguessugas — uma turma que recebia propina por emenda apresentada para a compra de ambulâncias. Infelizmente, continua sendo assim em 2010. Com o apoio dos parlamentares, descobriu-se que existe uma nova máfia atuando no governo, especialmente no Ministério do Turismo.

Há três semanas, VEJA revelou a história de um instituto que, de um lado, recebia verbas de emendas parlamentares do senador Gim Argello (PTB-DF) e, de outro, repassava dinheiro para uma rádio do filho do parlamentar. Nas mãos de Argello estava a poderosa relatoria do Orçamento de 2011, o primeiro do governo Dilma Rousseff. Caberia a ele definir e submeter a seus pares do Congresso o projeto de lei que diz onde e como o Poder Executivo deve aplicar nosso dinheiro no ano que está prestes a começar. Na última terça-feira, Argello se viu obrigado a deixar o posto de relator-geral do Orçamento após surgirem outras evidências sobre a inidoneidade das entidades para as quais ele enviou dinheiro de emendas: institutos-fantasma, que repassavam o dinheiro para uma empresa de fachada registrada em nome de laranjas. O dinheiro, obviamente, sumia. O caso de Argello não é isolado. É a ponta de mais um mecanismo grandioso de desvio de verbas públicas.

A prática de destinar emendas para entidades privadas (oficialmente, elas são registradas como institutos sem fins lucrativos) realizarem festas pelo país afora se transformou numa febre entre os parlamentares, especialmente a partir de 2008. Nos últimos tempos, parte significativa da verba que senadores e deputados têm direito a encaminhar por meio das chamadas emendas individuais ao Orçamento da União começou a ser destinada ao Ministério do Turismo. A onda teve início após os parlamentares descobrirem ser esse um caminho praticamente livre de fiscalização. A engrenagem funciona assim: a partir do momento em que a emenda é aprovada, o que cabe ao próprio Congresso, o dinheiro é alocado no Turismo. Depois, o parlamentar se encarrega de indicar ao ministério a festa e, inclusive, a entidade que deve receber a verba para executá-la. A liberação do recurso é rápida, sem burocracia. Entre outros motivos, porque não é necessária uma aprovação prévia do projeto pela Caixa Econômica Federal, como nos casos de emendas para obras de infraestrutura.

Além da celeridade, não há fiscalização sobre eventos turísticos. E, quando ela ocorre, esbarra em critérios subjetivos. O poder público é capaz de definir uma tabela média de preços para tijolos e cimento, mas não tem como fixar o cachê de um cantor ou o custo da festa da uva num determinado município. “Obra é investigável, festa não. Por isso, os eventos são facilitadores dos desvios”, diz um consultor de Orçamento do Congresso. Esse terreno fértil abriu caminho para o surgimento de dezenas de institutos de fachada que já nasceram especializados no novo “negócio”. E transformou o Ministério do Turismo na “namoradinha” dos parlamentares, como eles próprios gostam de repetir. Ao votarem o projeto de Orçamento para 2009, por exemplo, deputados e senadores reduziram em 1 bilhão de reais a cifra destinada à educação. Mas ampliaram de 553,7 milhões de reais para 3 bilhões de reais o caixa à disposição do Turismo. Para 2010, o salto foi de 857,15 milhões de reais para 4,13 bilhões de reais. No caso do Orçamento da União de 2011, que está em tramitação, 383 dos 594 parlamentares apresentaram emendas individuais para festas e shows. Juntas, elas somam 763 milhões de reais.

O deputado Charles Lucena (PTB-PE), por exemplo, assumiu uma cadeira no Congresso em abril de 2009. Para o Orçamento de 2010, encaminhou 8,6 milhões de reais em emendas para as tais festas, dos 12,5 milhões a que tinha direito. Médico por formação, o parlamentar explica o zelo com os eventos culturais: “Se eu pudesse, colocaria 100% para o turismo, mas a saúde também é importante”. Lucena teve sua candidatura às eleições deste ano impugnada por abuso de poder econômico. Como no caso do deputado pernambucano, o turismo se transformou em prioridade número um para muitos. O notório Gim Argello destinou 3,1 milhões de reais nos últimos dois anos para eventos. Desse valor, 2,1 milhões de reais foram parar nas contas de três entidades de fachada cujos responsáveis, invariavelmente, são laranjas escolhidos para esconder os verdadeiros donos do negócio. Uma delas, a Recriar, tem como responsável uma velha conhecida da polícia, Idalby Cristine Ramos, investigada em casos de lavagem de dinheiro. Foi o Instituto Recriar que, logo após receber dinheiro das emendas de Argello, transferiu 550 000 reais à Rádio Nativa FM, cujo dono é o filho mais velho do senador, Jorge Afonso Argello Júnior. O dinheiro tinha como origem o Ministério do Turismo.

Só em 2009 e 2010, quatro das entidades controladas pela patota da famosa Idalby receberam 18,6 milhões em emendas parlamentares alocadas para festas do Ministério do Turismo. VEJA consultou prestações de conta de convênios firmados pelo instituto com o governo federal com dinheiro das emendas parlamentares. Embora seja Idalby a encarregada de cuidar de toda a burocracia dos convênios, quem assina os papéis como presidente do instituto é a cabeleireira Ana Paula Quevedo, 22 anos. As prestações de conta revelam que as entidades apresentam notas frias para justificar despesas, o que sugere que o dinheiro foi desviado. As irregularidades no Turismo, aliás, já eram conhecidas pelo governo havia algum tempo. Em 2008, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, foi alertado para o fato de que o deputado Marcos Antônio, conhecido como “Negão Abençoado”, destinara 1 milhão de reais para uma festa em Quipapá, em Pernambuco. O ministro enxergou ali uma evidência de que o dinheiro poderia estar escorrendo para bolsos privados. A Controladoria-Geral da União também já havia descoberto que alguns institutos que recebiam verba para organizar as festas pertenciam, em muitos casos, a pessoas ou grupos ligados aos parlamentares. O dinheiroduto, porém, continuou aberto até a semana passada.

“Emendas para festas e shows não fazem sentido. Recurso público é para melhorar as condições de vida da população como um todo, e não para satisfazer um grupo de ONGs e empresários”, diz a senadora petista Serys Slhessarenko. Ela assumirá a relatoria do Orçamento no lugar de Gim Argello, e já terá um problemão pela frente. O deputado Jilmar Tatto, seu companheiro de partido, destinou 1 milhão de reais para uma entidade de Brasília, cuja presidente é Liane Muhlenberg. E quem é Liane Muhlenberg? Assessora da própria Serys Slhessarenko. A senadora disse que pretende demitir a funcionária. Parece mesmo coisa de máfia.

FANTASMAS - Há casos em que as entidades promotoras das festas ou não existem (acima) ou são dirigidas por figuras exóticas, como a cabeleireira Ana Paula Quevedo

Nenhum comentário: