por Amanda Previdelli, revista Exame
Para o governo, famílias com renda per capita entre R$ 291 e R$ 1.019 são de classe média, o que deixa 53% dos brasileiros no grupo. Mas o critério oficial não é consenso
São Paulo – A Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República lançou hoje uma pesquisa em que afirma que 53% da população do Brasil é integrante da chamada classe média. Isso representa uma inserção de 35 milhões de pessoas à faixa nos últimos dez anos.
O governo comemorou, mas os festejos esbarram no próprio conceito de classe média. Afinal, quanto se precisa ganhar para fazer parte do grupo?
A pesquisa usa apenas o critério de renda, definido pelo governo no começo do ano: classe média é quem vive em famílias com renda per capita de R$ 291 a R$ 1.019.
Dentro dessa faixa, a classe média “baixa” tem renda de R$ 291 a R$ 441 por cada membro da família, a média de R$ 441 a R$ 641 e a classe média alta teria renda superior a R$ 641 e inferior a R$ 1.019. Outro critério é a “vulnerabilidade econômica”, ou seja, a probabilidade de retorno à condição de pobreza.
Só que não há consenso sobre o conceito e, dependendo de onde se olha, o tamanho da classe média pode variar bastante no país.
As pesquisas do professor José Afonso Mazzon, da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, apontam 40 milhões de domíclios de classe média no Brasil. Embora não seja possível comparar com os dados do governo, os parâmetros utilizados são bem mais abrangentes.
“Nossa pesquisa se baseia em cerca de 38 critérios diferentes, que vão desde o tipo de residência da pessoa, acesso à água, esgoto, grau de instrução, tipo de trabalho a quantos contribuem para a renda da casa. Nosso critério de renda também é diferente. O governo usa renda corrente (salário) declarada e as pessoas mentem. Nós usamos renda permanente, que envolve bens, patrimônio e investimentos”, explica.
Por isso, Mazzon critica o conceito oficial, que considera vantajoso para os governantes. “Esse critério é baseado só em renda e corrigido apenas pelo INPC, enquanto que o salário é corrigido pelo INPC e um índice de produtividade que cada sindicato negocia. Isso significa que é uma questão puramente matemática: a renda vai subir e superar esse corte arbitrário que fizeram. Em poucos anos, não vai mais ter pobres no Brasil, segundo esse critério”, defende.
Para o professor Rogério Sobreira, economista da Escola Brasileira de Administração Pública e Economia (EBAPE) da FGV-Rio, “qualquer definição de classe média vai ser sempre passível de ser criticada", acredita. "Definir o que é uma classe média é complicado, tem um grande impacto ideológico”.
Sobreira defende que um modo mais justo de se definir quem é a classe média no país é avaliando um padrão de consumo: “Algo do tipo ‘ser classe média significa você consumir essa cesta de bens aqui’”, explica.
“O critério do governo é mais fácil porque sugere que a partir da faixa de renda (que é bem abrangente) a pessoa teria acesso a um padrão de consumo típico. Mas falta explicitar de maneira mais transparente o que é esse padrão e aí você tem diferentes dimensões: acesso à educação, à saúde, à cultura, viagens. O ideal seria criar uma espécie de IDH da classe média”, diz Sobreira.
Nos Estados Unidos, também não há consenso para definir classe média – embora se use a definição “padrão” de renda. Segundo o instituto de pesquisa Pew Research Center, a renda da classe média vai de 39 a 118 mil dólares anuais por família, o que seria equivalente a R$ 6.580 a R$ 19.908 mensais.
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