JULIANA BUBLITZ
DA FAMA ÀS URNAS
Eles são ex-big brothers, craques aposentados (ou prestes a pendurar as chuteiras), cantores, atores e celebridades em geral – em alguns casos, nem tão “célebres” assim. Não importa. Para os partidos, artistas e atletas tornam-se objeto de assédio porque incorporam uma particularidade, decorrente da fama: são “puxadores de voto”.
Não por acaso, em outubro, quando terminou o prazo para a filiação de potenciais candidatos às eleições de 2014, as siglas engrossaram suas fileiras com uma constelação de famosos.
A lista inclui nomes que vão desde Robert Rey (o Dr. Hollywood, da Rede TV!) até Narcisa Tamborindeguy (socialite do programa Mulheres Ricas, da Band). Embora a campanha ainda esteja longe de começar, é impossível não associar as filiações ao fenômeno Tiririca, o palhaço que se elegeu com 1,3 milhão de votos em 2010.
A partir de bordões humorísticos como “vote no Tiririca, pior que tá não fica”, o artista conquistou a simpatia do eleitorado – inclusive dos adeptos do voto de protesto – e conseguiu uma cadeira na Câmara. De quebra, deu carona a outros candidatos do PR e ajudou a dobrar a bancada federal da legenda, à revelia de seus eleitores.
O efeito Tiririca é sonho de consumo da maioria das legendas – e parece se intensificar. Muito desse frisson, na avaliação do sociólogo José Luiz Bica de Melo, da Unisinos, é embasado na personalização do poder:
– As pessoas votam em nomes, não em siglas. Para maximizar o seu capital, os partidos perceberam que ter candidatos com visibilidade midiática abreviaria degraus. É por isso que todos querem um Tiririca.
E não são poucos os casos de eleitores seduzidos pelos rostos que conhecem da TV ou das revistas de fofoca. E a maioria não se preocupa com bandeiras, propostas ou posições ideológicas. Na era das celebridades, que pautam moda e ditam hábitos de consumo, um ator conhecido pode inspirar mais confiança do que qualquer outro candidato.
– O risco da banalização é tornar a discussão política rasa, porque qualquer famoso acha que pode ser candidato e se eleger. Muitos são bem intencionados, mas em geral tentam se aproveitar da fama para capitalizar votos, e são levados a isso pelos próprios partidos. O resultado é que a maioria acaba entrando sem sequer apresentar um projeto consistente – alerta a publicitária Gil Castilho, diretora das Associações Latino-americana e Brasileira de Consultores Políticos.
Querem poder, diz especialista
Votar em um famoso não significa necessariamente ser despolitizado. Há casos de afamados como os do ex-atacante Romário (PSB-RJ) – que conquistou o respeito dos colegas deputados na Câmara e de eleitores por não ter papas na língua – e do ex-BBB Jean Wyllys (PSOL-RJ) – referência na causa gay – que parecem ter dado certo, pelo menos por enquanto.
– É por essas e outras que não podemos subestimar a população – diz Melo, que leciona teorias políticas.
Mas o que leva tantas estrelas a entrarem na política? O psicanalista Abrão Slavutzky avalia:
– O que todos querem é poder. É sedutor e, tanto quanto a fama, viciante. Quem experimentou esse gostinho um dia, não consegue mais viver sem.
Não por acaso, muitos dos recém-filiados já viveram o ápice da fama e estão em decadência. São os ex: ex-BBB, ex-campeão, ex-cantor de sucesso.
– Ser um ex é uma ferida narcisista, e a forma de superar isso é voltar a ter visibilidade. Neste caso, pela política – conclui Slavutzky.
ENTREVISTA - “Os partidos buscam puxadores de voto”
Especialista em teoria política contemporânea e comportamento político, o professor Marcus Figueiredo, da Universidade do Estado do Rio (Uerj), vê com naturalidade o desejo das celebridades de tentar a sorte nas urnas. Segundo ele, “faz parte do jogo”. A seguir, confira trechos da entrevista.
Zero Hora – Como o senhor avalia esse casamento entre o mundo das celebridades e o da política?
Marcus Figueiredo – Faz parte do jogo. Os partidos buscam puxadores de votos. Temos vários exemplos na história.
ZH – E qual é o resultado?
Figueiredo – A maioria não dá certo, mas uma minoria dá, e muitos se tornam políticos importantes. Isso não é nenhum demérito. É claro que temos exemplos como o da Cicciolina (ex-atriz pornô eleita para o parlamento italiano nos anos 1980), que fez sucesso e depois desapareceu, e exemplos como o de Arnold Schwarzenegger (ator eleito governador da Califórnia em 2003) e o de Ronald Reagan (ator eleito presidente dos EUA nos anos 1980). Reagan era um ator de segunda categoria. Entrou na política, começou como deputado, virou governador e depois presidente.
ZH – Por que tantos famosos decidem tentar a sorte nas urnas?
Figueiredo – O cara adora um holofote, é convidado a se filiar, se entusiasma e entra. Mas, em geral, não faz nada e desaparece. É assim. Aqui temos o Tiririca. O que vai acontecer com ele? Provavelmente, não vai sobreviver. Mas também temos o Romário e outros que acabaram se tornando personagens importantes.
ZH – Mas o fato de virarem puxadores de voto não contribui para a crise de representatividade?
Figueiredo – É um dos principais fatores. Mas deve-se ponderar que, da mesma forma que Tiririca puxa voto e carrega com ele gente que não devia se eleger, José Dirceu também puxa voto e leva candidatos na carona. A questão é como o partido constrói sua nominata. E, geralmente, faz isso de forma deplorável. Se vamos demonizar alguém, é o partido.
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