EDITORIAIS
É desolador, para quem esperava a reavaliação das posturas do Congresso, o quadro que se configurou ontem com a eleição do deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) para a presidência da Câmara. A escolha de Alves completa o cenário inaugurado na semana passada, quando Renan Calheiros, também peemedebista, foi indicado por seus colegas para presidir o Senado. Ambos têm currículos que conspiram contra qualquer esforço pela moralização da política. Calheiros foi denunciado recentemente pelo procurador-geral da República por peculato, falsidade ideológica e por fraudar documentos. Seu histórico é conhecido, por envolvimento em irregularidades que forçaram sua renúncia à presidência do Senado em 2007. A situação de Alves é semelhante e foi exposta em detalhes pela imprensa quando do anúncio da sua candidatura.
O novo comandante da Câmara e segundo na sucessão presidencial, no caso de impedimento do vice-presidente, responde a processo no Rio Grande do Norte, referente ao período em que foi secretário do governo estadual, por usar recursos públicos para se promover. A Câmara elegeu um líder acusado, entre outros delitos, de utilizar o suspeito recurso da emenda parlamentar para obter verbas federais que foram parar nos cofres da empresa de um assessor. Por tais circunstâncias, o país vê as eleições de Alves e de Calheiros como um deboche. São homens públicos em desacordo com tudo o que o Judiciário, ao julgar desmandos, e os próprios políticos comprometidos com o decoro vêm fazendo pela mudança de perfil da atividade parlamentar.
Alves chegou à presidência da Câmara por um acordo que prevê rodízio entre PT e PMDB no comando da Casa. Mas é enganoso concluir que essa seja a principal causa da escolha. Na verdade, o deputado teve o apoio de 20 dos 24 partidos com representação no Congresso, inclusive da oposição. Está provado mais uma vez que há, na Câmara e no Senado, o entendimento de que o importante é preservar, a qualquer custo, o espírito de corpo. Por isso, não prospera a menor preocupação em fazer escolhas que levem à melhor representação para as demandas da sociedade. Não por acaso, os dois presidentes têm igualmente em comum o fato de que contam com o apoio do Planalto, que se submete assim, com a desculpa da governabilidade, à hegemonia do que existe de pior no Congresso.
Logo após a eleição, ontem à tarde, Alves fez um pronunciamento no qual se disse saudoso do tempo em que o Congresso se impunha como poder e merecia o respeito do país por suas posições firmes em defesa de suas prerrogativas e da democracia. O novo comandante parecia estar fazendo ironia com a própria indicação para o cargo. Anunciar-se, com o seu currículo e nessas circunstâncias, como redentor dos áureos tempos do Congresso é subestimar demais a capacidade de discernimento da população. Infelizmente, tudo o que não se pode esperar de Alves e Calheiros, como líderes, é o resgate da dignidade do parlamento.
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