Contradição parlamentar
Não chega a causar surpresa o fato de que a maior parte dos senadores tenha decidido embolsar o dinheiro do 14º e 15º salários que o Congresso paga aos parlamentares, mesmo após o Senado ter aprovado unanimidade-- o fim desse benefício extraordinário.
Os adicionais, que somam R$ 53,4 mil ao ano, ainda são pagos porque os deputados não aprovaram sua extinção e ainda são recebidos porque os senadores não parecem ver nisso uma contradição.
Criados na década de 1940, os salários extras justificavam-se como ajuda para que os parlamentares voltassem a seus Estados de origem. Hoje, porém, o Legislativo já paga as passagens aéreas. Até os próprios senadores reconhecem o absurdo dessa vantagem.
Quando a existência dessas ajudas de custo foi colocada em votação, em maio, nenhum senador apoiou a manutenção do benefício, e alguns até ousaram fazer discursos inflamados contra ele.
Nada obstante, chegada a hora de passar das palavras aos atos, ou da tribuna ao bolso, apenas 13 dos 81 senadores julgaram oportuno devolver o dinheiro recebido.
Entre eles, representantes de diversos partidos, como Cristovam Buarque (PDT-DF), João Capiberibe (PSB-AP), Pedro Taques (PDT-MT), Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Lindbergh Farias (PT-RJ).
Alguns baluartes da ética escorregaram no episódio. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP), por exemplo, só decidiu devolver o adicional após a publicação de reportagem desta Folha. Outros arautos dos bons costumes, contudo, permanecem em silêncio, mas a assessoria do Senado informa que ainda há tempo para que todos possam devolver o pagamento.
Seria bom que o fizessem logo, não só por razões éticas, mas para evitar a reedição do imbróglio acerca da cobrança do Imposto de Renda sobre os adicionais.
Como a Mesa Diretora do Senado sustentava o curioso entendimento de que esses rendimentos não eram tributáveis, o desconto não era feito. A Receita Federal, contudo, cobrou os valores devidos. O presidente do Senado, José Sarney, reconheceu o erro e disse que cada senador pagaria a sua dívida. Alguns assim procederam, mas muitos protestaram.
O Senado, então, decidiu usar dinheiro público (R$ 5 milhões) para quitar as dívidas de senadores e ex-senadores desde 2007. Débitos, vale lembrar, originados por benefícios que nem deveriam existir.
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