Renan, o indestrutível
Seis anos depois de deixar a presidência do Senado acossado por denúncias de corrupção, Renan Calheiros manobra nos bastidores e se torna favorito para comandar o Congresso
Josie Jeronimo
SEMPRE NO TOPO
Só uma catástrofe pode tirar a vitória de Renan
Há seis anos, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) deixou a presidência do Senado pela porta dos fundos. Acusado de ter despesas pessoais pagas por uma empreiteira, Renan teve suas contas devassadas, perdeu musculatura política e não lhe restou outra saída senão renunciar ao posto. Conseguiu, porém, evitar a cassação do mandato em plenário e, agora, é considerado nome certo para comandar o Congresso até 2014, ano da corrida presidencial. Convencido do seu amplo favoritismo, Renan procurou fugir dos holofotes nos últimos dias. Só uma catástrofe tira a sua vitória. Como maior bancada do Senado, o PMDB tem a prerrogativa de indicar o novo presidente. Além de não possuir adversários em condições de derrotá-lo no interior do partido, Renan conta com a simpatia de legendas da oposição, como o PSDB, partido que ajudou a fundar na década de 1980. No apagar das luzes de 2012, senadores da chamada ala rebelde do PMDB até ensaiaram lançar uma candidatura alternativa. Foram cogitados os nomes dos senadores Luiz Henrique (SC) e Waldemir Moka (MS), mas
eles recuaram, cientes da falta de votos para superar Renan. “Só entro na disputa se tiver a certeza da vitória”, blefou Luiz Henrique, praticamente jogando a toalha.
A recuperação de Renan e sua volta ao comando do Senado, seis anos depois de ser defenestrado da principal cadeira do Congresso, confirmam a máxima de que a Casa é uma espécie de associação entre amigos. O político disposto a atender aos anseios do “clube” se credencia politicamente até ser alçado ao poder. Na lógica desse modelo, só pode alcançar o posto máximo do Senado quem for capaz de conciliar os interesses – muitas vezes escusos e nem sempre salutares para a democracia – de todos. Conhecedor dos meandros e subterrâneos do Legislativo, Renan soube trilhar esse caminho com desenvoltura. Com a eleição de José Sarney (PMDB-AP) para a presidência da Casa, ele se rearticulou e voltou a ter o comando do PMDB e de partidos da base aliada. A retomada da força política de Renan ficou clara durante a CPI de Carlinhos Cachoeira, quando o governo precisou de seu partido e ele atuou para evitar maiores transtornos para aliados do Planalto durante as investigações. Teve êxito na iniciativa.
PODER
Com a eleição de Sarney para a presidência do Senado,
Renan voltou a ter o comando do PMDB
Embora torçam o nariz para sua eleição, porque sabem que terão de negociar cada votação importante numa mesa de cacife muito alto, integrantes do governo chegaram à conclusão de que Renan é um mal necessário. Concluíram também que o Planalto não tem como atropelar uma bancada experiente como a do PMDB no Senado para fazer valer sua vontade. O Palácio do Planalto até tentou emplacar Eduardo Braga (PMDB-AM) na cadeira de presidente, nomeando-o líder do governo. Não deu certo. O outro plano era trabalhar nos bastidores pelo nome do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. Mas Lobão não quis deixar a Esplanada. “Ele quer ficar no ministério. Renan e Lobão já conversaram sobre o assunto e meu pai declinou da candidatura em favor do Renan”, conta o senador Lobão Filho (PMDB-MA). A saída do Executivo foi deixar o jogo correr sozinho. Bom para o indestrutível Renan, acostumado a altos e baixos em sua trajetória.
O gráfico do poder político de Renan sempre se moveu em ritmo de montanha-russa, desde que ele saiu da Assembleia Legislativa de Alagoas para o topo no Congresso. Quando foi eleito presidente do Senado, em 2005, o peemedebista estava longe de ser uma figura de currículo ilibado. Pesava em suas costas o passado de braço direito e líder de governo na curta gestão Fernando Collor, em 1990. Durante o impeachment do ex-presidente alagoano, Renan traiu Collor e ajudou a alimentar as denúncias contra o ex-tesoureiro Paulo César Farias. A estratégia de desvinculação da imagem funcionou. Em 1998, Renan saiu das páginas dos escândalos e deu a volta por cima ao ser nomeado ministro da Justiça no fim do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso. Sua passagem pelo ministério, porém, durou pouco mais de um ano. A saída foi precipitada por conflitos com a cúpula da Polícia Federal.
Em 2003, Renan conseguiu se livrar dos antigos estigmas políticos e ganhou espaço no governo Luiz Inácio Lula da Silva, amparado pelo PMDB. Com a bancada do partido nas mãos, tornou-se líder natural e o principal interlocutor do PMDB no Congresso junto ao governo. Assim, pavimentou o caminho que o levou até o comando do Legislativo, em 2005. O tiro que derrubou Renan da presidência do Senado, em 2007, partiu do campo pessoal e ricocheteou nas relações da vida pública. Ele foi acusado de pagar pensão alimentícia a sua ex-amante Mônica Veloso, com quem teve uma filha, com recursos da empreiteira Mendes Júnior – empresa ativa no mercado de licitações de grandes obras governamentais. A denúncia de uso do cargo público para favorecimento próprio foi desdobrada em outras. Ao Conselho de Ética do Senado, ele teve que se explicar sobre a utilização de laranjas na compra de empresas de comunicação em Alagoas. Precisou justificar também o fato de sua família ter vendido a peso de ouro uma fábrica de refrigerantes para uma firma que, meses depois, obteve uma série de benefícios fiscais do governo. As apurações foram arquivadas na Casa, depois de sua absolvição em plenário, mas se transformaram em dois inquéritos contra o senador. Graças à ajuda de habilidosos advogados, os processos tramitam lentamente no Supremo Tribunal Federal (STF).
Para se esquivar das denúncias que pesam contra ele e ainda carecem de explicação, Renan repete um mantra. Diz ter sido vítima de uma campanha de adversários que usaram “problemas pessoais” para atingi-lo. Por isso, hoje ele prefere manter a discrição. A atuação legislativa é planejada no sentido de evitar estardalhaços. Renan ajuda a acompanhar projetos de relevância ou de grande importância para o governo, mas evita relatorias de temas de apelo midiático que o obriguem a ter contato frequente com veículos de comunicação. Tomou horror a jornalistas. Atende todos que o procuram, mas usa a habilidade com as palavras para conversar durante muito tempo sem dizer nada. “Renan mente em off” tornou-se um bordão nos corredores do Congresso para resumir a rejeição do parlamentar ao contato com a imprensa. Aos mais próximos, Renan tem repetido que está “preparado emocionalmente” para ver ressuscitado seu histórico de escândalos. Para o político alagoano, tudo vale a pena quando a recompensa é a volta ao poder.
SEMPRE NO TOPO
Só uma catástrofe pode tirar a vitória de Renan
Há seis anos, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) deixou a presidência do Senado pela porta dos fundos. Acusado de ter despesas pessoais pagas por uma empreiteira, Renan teve suas contas devassadas, perdeu musculatura política e não lhe restou outra saída senão renunciar ao posto. Conseguiu, porém, evitar a cassação do mandato em plenário e, agora, é considerado nome certo para comandar o Congresso até 2014, ano da corrida presidencial. Convencido do seu amplo favoritismo, Renan procurou fugir dos holofotes nos últimos dias. Só uma catástrofe tira a sua vitória. Como maior bancada do Senado, o PMDB tem a prerrogativa de indicar o novo presidente. Além de não possuir adversários em condições de derrotá-lo no interior do partido, Renan conta com a simpatia de legendas da oposição, como o PSDB, partido que ajudou a fundar na década de 1980. No apagar das luzes de 2012, senadores da chamada ala rebelde do PMDB até ensaiaram lançar uma candidatura alternativa. Foram cogitados os nomes dos senadores Luiz Henrique (SC) e Waldemir Moka (MS), mas
eles recuaram, cientes da falta de votos para superar Renan. “Só entro na disputa se tiver a certeza da vitória”, blefou Luiz Henrique, praticamente jogando a toalha.
A recuperação de Renan e sua volta ao comando do Senado, seis anos depois de ser defenestrado da principal cadeira do Congresso, confirmam a máxima de que a Casa é uma espécie de associação entre amigos. O político disposto a atender aos anseios do “clube” se credencia politicamente até ser alçado ao poder. Na lógica desse modelo, só pode alcançar o posto máximo do Senado quem for capaz de conciliar os interesses – muitas vezes escusos e nem sempre salutares para a democracia – de todos. Conhecedor dos meandros e subterrâneos do Legislativo, Renan soube trilhar esse caminho com desenvoltura. Com a eleição de José Sarney (PMDB-AP) para a presidência da Casa, ele se rearticulou e voltou a ter o comando do PMDB e de partidos da base aliada. A retomada da força política de Renan ficou clara durante a CPI de Carlinhos Cachoeira, quando o governo precisou de seu partido e ele atuou para evitar maiores transtornos para aliados do Planalto durante as investigações. Teve êxito na iniciativa.
PODER
Com a eleição de Sarney para a presidência do Senado,
Renan voltou a ter o comando do PMDB
Embora torçam o nariz para sua eleição, porque sabem que terão de negociar cada votação importante numa mesa de cacife muito alto, integrantes do governo chegaram à conclusão de que Renan é um mal necessário. Concluíram também que o Planalto não tem como atropelar uma bancada experiente como a do PMDB no Senado para fazer valer sua vontade. O Palácio do Planalto até tentou emplacar Eduardo Braga (PMDB-AM) na cadeira de presidente, nomeando-o líder do governo. Não deu certo. O outro plano era trabalhar nos bastidores pelo nome do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. Mas Lobão não quis deixar a Esplanada. “Ele quer ficar no ministério. Renan e Lobão já conversaram sobre o assunto e meu pai declinou da candidatura em favor do Renan”, conta o senador Lobão Filho (PMDB-MA). A saída do Executivo foi deixar o jogo correr sozinho. Bom para o indestrutível Renan, acostumado a altos e baixos em sua trajetória.
O gráfico do poder político de Renan sempre se moveu em ritmo de montanha-russa, desde que ele saiu da Assembleia Legislativa de Alagoas para o topo no Congresso. Quando foi eleito presidente do Senado, em 2005, o peemedebista estava longe de ser uma figura de currículo ilibado. Pesava em suas costas o passado de braço direito e líder de governo na curta gestão Fernando Collor, em 1990. Durante o impeachment do ex-presidente alagoano, Renan traiu Collor e ajudou a alimentar as denúncias contra o ex-tesoureiro Paulo César Farias. A estratégia de desvinculação da imagem funcionou. Em 1998, Renan saiu das páginas dos escândalos e deu a volta por cima ao ser nomeado ministro da Justiça no fim do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso. Sua passagem pelo ministério, porém, durou pouco mais de um ano. A saída foi precipitada por conflitos com a cúpula da Polícia Federal.
Em 2003, Renan conseguiu se livrar dos antigos estigmas políticos e ganhou espaço no governo Luiz Inácio Lula da Silva, amparado pelo PMDB. Com a bancada do partido nas mãos, tornou-se líder natural e o principal interlocutor do PMDB no Congresso junto ao governo. Assim, pavimentou o caminho que o levou até o comando do Legislativo, em 2005. O tiro que derrubou Renan da presidência do Senado, em 2007, partiu do campo pessoal e ricocheteou nas relações da vida pública. Ele foi acusado de pagar pensão alimentícia a sua ex-amante Mônica Veloso, com quem teve uma filha, com recursos da empreiteira Mendes Júnior – empresa ativa no mercado de licitações de grandes obras governamentais. A denúncia de uso do cargo público para favorecimento próprio foi desdobrada em outras. Ao Conselho de Ética do Senado, ele teve que se explicar sobre a utilização de laranjas na compra de empresas de comunicação em Alagoas. Precisou justificar também o fato de sua família ter vendido a peso de ouro uma fábrica de refrigerantes para uma firma que, meses depois, obteve uma série de benefícios fiscais do governo. As apurações foram arquivadas na Casa, depois de sua absolvição em plenário, mas se transformaram em dois inquéritos contra o senador. Graças à ajuda de habilidosos advogados, os processos tramitam lentamente no Supremo Tribunal Federal (STF).
Para se esquivar das denúncias que pesam contra ele e ainda carecem de explicação, Renan repete um mantra. Diz ter sido vítima de uma campanha de adversários que usaram “problemas pessoais” para atingi-lo. Por isso, hoje ele prefere manter a discrição. A atuação legislativa é planejada no sentido de evitar estardalhaços. Renan ajuda a acompanhar projetos de relevância ou de grande importância para o governo, mas evita relatorias de temas de apelo midiático que o obriguem a ter contato frequente com veículos de comunicação. Tomou horror a jornalistas. Atende todos que o procuram, mas usa a habilidade com as palavras para conversar durante muito tempo sem dizer nada. “Renan mente em off” tornou-se um bordão nos corredores do Congresso para resumir a rejeição do parlamentar ao contato com a imprensa. Aos mais próximos, Renan tem repetido que está “preparado emocionalmente” para ver ressuscitado seu histórico de escândalos. Para o político alagoano, tudo vale a pena quando a recompensa é a volta ao poder.
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