REVISTA ISTO É N° Edição: 2272 | 30.Mai.13
A derrapagem da Caixa
Banco se enrola em contradições sobre as falhas técnicas no programa Bolsa Família, enquanto o governo investiga o que provocou a corrida desenfreada para sacar o benefício
A derrapagem da Caixa
Banco se enrola em contradições sobre as falhas técnicas no programa Bolsa Família, enquanto o governo investiga o que provocou a corrida desenfreada para sacar o benefício
Izabelle Torres e Josie Jeronimo
LAMBANÇA
Dilma admitiu a necessidade da revisão de processos e o
presidente da Caixa, Jorge Hereda, teve de pedir desculpas
Duas semanas depois que meio milhão de pessoas fizeram fila em terminais bancários para limpar as contas-benefício do Bolsa Família, os dirigentes da Caixa Econômica Federal ainda não conseguiram oferecer explicações consistentes sobre o que aconteceu. No plano técnico, o banco foi capaz de apresentar três versões contraditórias em apenas 72 horas. No plano político, autoridades do governo também ajudaram a aumentar a confusão, denunciando – ainda sem comprovação – uma conspiração para desmoralizar o programa Bolsa Família. A ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos, chegou a identificar uma ação da oposição.
A presidenta Dilma Rousseff reconheceu que houve falhas e se comprometeu a corrigi-las. Por envolver aspectos técnicos, que deveriam ser amplamente conhecidos por seus dirigentes, as falhas de procedimento que envolveram os saques são particularmente constrangedoras. Primeiro, a Caixa tentou negar que tivesse ocorrido qualquer anormalidade. Depois, disse que liberou dinheiro para evitar tumultos. Por fim, atribuiu à atualização de segurança no sistema a liberação de saques fora do prazo oficial. A contradição foi logo descoberta e o presidente da Caixa, Jorge Hereda, teve de pedir desculpas públicas em nome da instituição. O banco responde pelo mais ambicioso programa social brasileiro, assegurando um conforto mínimo a 13,4 milhões de famílias que residem no mais baixo patamar da distribuição de renda. A direção da Caixa ainda deve respostas a duas perguntas elementares. Qual foi a falha técnica que liberou R$ 152 milhões em saques fora do calendário padrão? Houve influência política no episódio?
Entre as poucas certezas disponíveis, sabe-se que o banco estava empenhado em realizar uma varredura para detectar fraude de duplicidade de pagamento em 700 mil registros. O método de verificação pode ter deixado o sistema vulnerável. “Eu sou bancário, sei como funciona. Quando tem uma varredura geral é criada uma trava que pode afetar todo sistema. Mas acho que só boatos boca a boca não teriam chegado a essa dimensão”, afirma o senador Wellington Dias (PT-PI), funcionário de carreira da Caixa.
O mais curioso é que o episódio encerrou-se sem que nenhum beneficiário do programa Bolsa Família fosse financeiramente prejudicado. Nenhum cliente deixou de ser atendido e, cedo ou tarde, os cidadãos que, na confusão, receberam benefícios que não deveriam terão de ressarcir a instituição. Sem a mesma grandeza, episódios comparáveis já ocorreram no passado. Em 2010, o banco repassou indevidamente nada menos do que R$ 153 milhões para a conta de 82.595 famílias beneficiárias do programa Bolsa Família. Todas foram localizadas e iniciaram um programa de reembolso, dividido em 27 parcelas que começaram a ser pagas a partir de março de 2011.
O principal prejuízo da operação mais recente envolve a credibilidade da instituição, que será afetada não só pelo episódio em si, mas pelo acúmulo de explicações sem cabimento. Semanas antes das cenas de batalha em suas agências, a cúpula da Caixa se reuniu para discutir planos de modernização do banco, com enxugamento de gastos com pessoal, política de agilidade no atendimento e mudanças nos postos de chefia intermediária e no primeiro escalão. Como sempre acontece nessas horas, o vazamento das novas medidas gerou insegurança entre funcionários, acompanhada de rumores a respeito de uma disputa de poder entre o vice presidente, José Urbano Duarte, responsável pelos principais programas da Caixa, o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, e o presidente, Jorge Hereda. Conforme Antônio Abdan Teixeira, funcionário da Caixa e dirigente do Sindicato dos Bancários, o episódio “mostrou no mínimo uma falta de sintonia.”
A pergunta principal do episódio consiste em saber se houve manipulação de uma falha técnica – feita por quem e a serviço de quem. O governo está convencido de que é possível dividir o caso em duas partes: antes e depois das 13 horas do sábado 20 de maio. Na primeira metade, ocorreram saques de vulto, mas nem tão grandes assim. Chegaram a R$ 650 mil naquele dia, contra R$ 850 mil no mês anterior. Depois das 13 horas, teve início um salto vertiginoso nos saques, acima de qualquer movimentação razoável. Convencido de que apenas uma mobilização política pode explicar essa parte do problema, o governo determinou que a Polícia Federal fizesse uma apuração cuidadosa e profunda nos indícios e suspeitas que encontrou. Convencido de que é prudente evitar opiniões sem base e acusações sem prova, a Polícia foi avisada de que só será autorizada a falar quando todas as provas estiverem à mão. Até lá, a orientação é manter silêncio absoluto.
Fotos: Ueslei Marcelino / Reuters e Givaldo Barbosa / Agência O Globo
LAMBANÇA
Dilma admitiu a necessidade da revisão de processos e o
presidente da Caixa, Jorge Hereda, teve de pedir desculpas
Duas semanas depois que meio milhão de pessoas fizeram fila em terminais bancários para limpar as contas-benefício do Bolsa Família, os dirigentes da Caixa Econômica Federal ainda não conseguiram oferecer explicações consistentes sobre o que aconteceu. No plano técnico, o banco foi capaz de apresentar três versões contraditórias em apenas 72 horas. No plano político, autoridades do governo também ajudaram a aumentar a confusão, denunciando – ainda sem comprovação – uma conspiração para desmoralizar o programa Bolsa Família. A ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos, chegou a identificar uma ação da oposição.
A presidenta Dilma Rousseff reconheceu que houve falhas e se comprometeu a corrigi-las. Por envolver aspectos técnicos, que deveriam ser amplamente conhecidos por seus dirigentes, as falhas de procedimento que envolveram os saques são particularmente constrangedoras. Primeiro, a Caixa tentou negar que tivesse ocorrido qualquer anormalidade. Depois, disse que liberou dinheiro para evitar tumultos. Por fim, atribuiu à atualização de segurança no sistema a liberação de saques fora do prazo oficial. A contradição foi logo descoberta e o presidente da Caixa, Jorge Hereda, teve de pedir desculpas públicas em nome da instituição. O banco responde pelo mais ambicioso programa social brasileiro, assegurando um conforto mínimo a 13,4 milhões de famílias que residem no mais baixo patamar da distribuição de renda. A direção da Caixa ainda deve respostas a duas perguntas elementares. Qual foi a falha técnica que liberou R$ 152 milhões em saques fora do calendário padrão? Houve influência política no episódio?
Entre as poucas certezas disponíveis, sabe-se que o banco estava empenhado em realizar uma varredura para detectar fraude de duplicidade de pagamento em 700 mil registros. O método de verificação pode ter deixado o sistema vulnerável. “Eu sou bancário, sei como funciona. Quando tem uma varredura geral é criada uma trava que pode afetar todo sistema. Mas acho que só boatos boca a boca não teriam chegado a essa dimensão”, afirma o senador Wellington Dias (PT-PI), funcionário de carreira da Caixa.
O mais curioso é que o episódio encerrou-se sem que nenhum beneficiário do programa Bolsa Família fosse financeiramente prejudicado. Nenhum cliente deixou de ser atendido e, cedo ou tarde, os cidadãos que, na confusão, receberam benefícios que não deveriam terão de ressarcir a instituição. Sem a mesma grandeza, episódios comparáveis já ocorreram no passado. Em 2010, o banco repassou indevidamente nada menos do que R$ 153 milhões para a conta de 82.595 famílias beneficiárias do programa Bolsa Família. Todas foram localizadas e iniciaram um programa de reembolso, dividido em 27 parcelas que começaram a ser pagas a partir de março de 2011.
O principal prejuízo da operação mais recente envolve a credibilidade da instituição, que será afetada não só pelo episódio em si, mas pelo acúmulo de explicações sem cabimento. Semanas antes das cenas de batalha em suas agências, a cúpula da Caixa se reuniu para discutir planos de modernização do banco, com enxugamento de gastos com pessoal, política de agilidade no atendimento e mudanças nos postos de chefia intermediária e no primeiro escalão. Como sempre acontece nessas horas, o vazamento das novas medidas gerou insegurança entre funcionários, acompanhada de rumores a respeito de uma disputa de poder entre o vice presidente, José Urbano Duarte, responsável pelos principais programas da Caixa, o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida, e o presidente, Jorge Hereda. Conforme Antônio Abdan Teixeira, funcionário da Caixa e dirigente do Sindicato dos Bancários, o episódio “mostrou no mínimo uma falta de sintonia.”
A pergunta principal do episódio consiste em saber se houve manipulação de uma falha técnica – feita por quem e a serviço de quem. O governo está convencido de que é possível dividir o caso em duas partes: antes e depois das 13 horas do sábado 20 de maio. Na primeira metade, ocorreram saques de vulto, mas nem tão grandes assim. Chegaram a R$ 650 mil naquele dia, contra R$ 850 mil no mês anterior. Depois das 13 horas, teve início um salto vertiginoso nos saques, acima de qualquer movimentação razoável. Convencido de que apenas uma mobilização política pode explicar essa parte do problema, o governo determinou que a Polícia Federal fizesse uma apuração cuidadosa e profunda nos indícios e suspeitas que encontrou. Convencido de que é prudente evitar opiniões sem base e acusações sem prova, a Polícia foi avisada de que só será autorizada a falar quando todas as provas estiverem à mão. Até lá, a orientação é manter silêncio absoluto.
Fotos: Ueslei Marcelino / Reuters e Givaldo Barbosa / Agência O Globo
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