EDITORIAIS
Quase uma semana depois, continua causando repercussão o discurso proferido pelo escritor Luiz Ruffato na abertura da 65ª edição da prestigiada Feira do Livro de Frankfurt, que neste ano decidiu homenagear o Brasil. O autor mineiro aproveitou o palco da maior feira do livro do mundo para traçar um panorama sombrio da história e da realidade brasileiras, chamando a atenção para fatos como o de o país ter se estruturado sob a égide do genocídio, de a democracia racial ter sido feita na base de estupros e de conviver, ainda hoje, apesar dos avanços, com a impunidade e a intolerância. A manifestação provocou aplausos mas também desconforto por parte de um público mais habituado a discursos formais e visões idealizadas. Seria importante que, fora dos limites do evento, pudesse gerar também um debate oportuno sobre questões que dizem respeito a entraves e avanços no cotidiano dos brasileiros, decisivos para a imagem interna e externa do país.
Mesmo quando visto sob óticas como a do representante dos escritores na Alemanha, o país tem problemas históricos que ajudam a explicar muitas das mazelas que até hoje ainda não puderam ser enfrentadas. Entre essas, estão as desigualdades de renda, em parte explicadas por chagas como a colonização e a escravatura. Persistem também problemas como os relacionados às áreas da saúde pública, do acesso à educação de qualidade, à moradia digna, a saneamento básico, a transporte. E, em meio a tudo isso, há o excesso de violência, que amedronta a todos, mas particularmente aos jovens e aos negros, além da corrupção e da impunidade. Faltou o escritor se referir a outras questões, como o excesso de burocracia e de intervenção do poder público, entre tantas outras, que ainda hoje entravam o crescimento, dificultando a geração de emprego e renda nos níveis necessários.
O país precisa atacar as causas que impedem avanços e uma redução dos abismos sociais, sem deixar de reconhecer as conquistas obtidas até agora. E há muitas a serem comemoradas. O convívio com a democracia nas últimas décadas, o fortalecimento gradativo das instituições, a estabilidade econômica, as perspectivas propiciadas para a mobilidade social, os avanços legais assegurando mais direitos às crianças, às mulheres, aos homos- sexuais, entre tantos outros, são aspectos positivos dos quais os brasileiros podem se valer para contrapor aos problemas.
Entre todos os desafios, certamente nenhum deles supera os da área educacional, que estão na origem dos demais e reforçam as angústias do escritor mineiro diante de uma população acostumada a ler menos do que deveria. Só os ganhos em educação podem assegurar uma maior consciência do país que os brasileiros desejam compartilhar.
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