ZERO HORA 11 de fevereiro de 2015 | N° 18070
DAVID COIMBRA
A estratégia do PT para se defender das denúncias de corrupção que apodreceram o partido pode criar precedente jurídico. Os petistas não negam que tenha havido roubo nos governos Dilma e Lula. Não. Eles se contentam em provar que houve roubo também no governo Fernando Henrique. Já estou vendo os advogados do país se valendo da jurisprudência:
– É verdade, meritíssimo, o meu cliente é traficante de drogas. Mas o Elias Maluco também é!
– Sim, senhores do júri, o meu cliente matou, mas 92% dos assassinatos no Brasil não são resolvidos. Por que querem resolver justamente este? A quem interessa condenar o meu cliente?
Compreensível o esforço dos petistas. O PT surgiu como uma bela ideia de que seria possível fazer política ética. Lembro de uma entrevista do Cazuza para o Jô Soares no final dos anos 80, em que ele falava com simpatia da “pureza” dos petistas, que não aceitavam negociatas. Tal era o espírito do PT, ao ser fundado num fevereiro como este, 35 anos atrás. Era essa pureza.
O PT ganhou o poder e perdeu a pureza. “De que adianta ganhar o mundo inteiro, se você perder a própria alma?”, escreveu Marcos, citando Jesus. O PT perdeu a própria alma. Seria melhor não ter conquistado a Presidência, melhor não ganhar o mundo inteiro. Ainda teríamos a ilusão da ideia fundadora do PT: de que fazer política decente é possível.
Quando o PT se apresenta como um novo Adhemar de Barros, um rouba mas faz do século 21, quando o PT se apresenta como um Robin Hood caboclo, que tira dos ricos para dar aos pobres, quando o PT se justifica argumentando que rouba porque todos roubam, só torna tudo mais triste e sombrio. Porque parece não ser possível.
Antes os petistas dignos reconhecessem que as coisas deram errado, que não saíram como eles queriam, e tentassem de novo, de outra forma, não mais pelo PT. Porque o PT acabou. O PT tomou o rumo de outras legendas históricas do Brasil. O velho PCB de Prestes se liquefez com as contradições da União Soviética, o PTB de Brizola hoje é um balcão de fisiologismos, o MDB de Simon virou uma geleia disforme, o PDS se orgulhava de ser “o maior partido do Ocidente”, mas era sucedâneo da Arena e hoje não existe mais nem como sigla, o PSDB surgiu como um seguidor da moderna social-democracia europeia e se mostrou um servidor da plutocracia paulista, e o PFL... Bem, o PFL sempre foi o PFL.
Hoje, o Brasil não precisa da ladainha supostamente ideológica dos defensores do governo. Ninguém mais acredita nessa conversa de que há uma luta entre os representantes das elites versus os representantes dos pobres. Todos sabemos que só há uma luta, no Brasil: a luta pelo poder.
Hoje, o Brasil não precisa de um bom governo, não precisa nem de um governo competente. Só precisa de um governo honesto. Porque o brasileiro não é um povo de corruptos, como querem fazer crer os interessados na relativização da roubalheira. Corrupto é o governo do PT. Corruptos foram governos passados. Porém, há petistas honestos. Há muita gente dos outros governos que é honesta. A maioria das pessoas que conheço é honesta. O povo brasileiro é tão honesto quanto qualquer povo do mundo.
O PT errou. Muitos outros erraram. Mas a indignação do brasileiro com esses erros já basta para mostrar que isso se tornou intolerável. Que nós iremos em frente. Que é possível. Sim, é possível.
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