EDITORIAL
O país tem pela frente o compromisso de mostrar que dispõe de instrumentos adequados para barrar candidatos em desacordo com uma lei moralizadora surgida em consequência da pressão popular.
Considerada um marco entre as leis resultantes de iniciativa popular no país, a chamada Ficha Limpa já esbarra em entraves preocupantes na primeira vez em que passa a valer para eleições gerais. As razões, mais uma vez, são as dificuldades enfrentadas num país como o Brasil para pôr em prática qualquer restrição envolvendo políticos, aos quais cabe a última palavra sobre a elaboração de leis. O caso mais recente e mais ilustrativo desse tipo de dificuldade é o do ex-governador José Roberto Arruda (PR), no Distrito Federal. Impugnado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE), o primeiro governador preso no país, que chegou a ser filmado com dinheiro vivo mal havido, continuará em campanha até o julgamento do recurso em última instância. E, o que é ainda mais preocupante, lidera as pesquisas de intenção de voto numa região do país na qual prosperam favores políticos como distribuição de cargos em comissão.
Políticos condenados por improbidade administrativa, por doações eleitorais ilegais ou por abuso de poder econômico, entre outras razões, vêm conseguindo escapar do rigor da nova lei na maioria das vezes devido a uma mera questão de tempo. A deputada federal e candidata à reeleição Jaqueline Roriz, do PMN, também do Distrito Federal, encontra-se na mesma situação: assim como o ex-governador, foi condenada por envolvimento no chamado mensalão do DEM, mas pode recorrer e seguir pedindo votos. Isso ocorre porque a Justiça acaba se manifestando, em muitos casos, somente depois de os políticos terem registrado suas novas candidaturas. E o entendimento nos tribunais tem sido de que, para produzir efeitos neste ano, a decisão precisaria ter sido proferida antes das inscrições na Justiça Eleitoral.
A situação chegou a tal ponto que, poucos dias antes de sua candidatura ter sido barrada pelo TRE, o ex-governador do Distrito Federal ousou zombar do rigor legal. O político afirmou ser “do tempo em que se ganhava no voto, sem leizinhas feitas pra pegar esse ou aquele”.
O país tem pela frente o compromisso de mostrar que dispõe de instrumentos adequados para barrar candidatos em desacordo com uma lei moralizadora surgida em consequência da pressão popular. Por isso, precisa de eleitores mais conscientes e de instituições mais preparadas para impedir que os furos dessa peneira legal continuem tão amplos.
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