NOVA POLÍTICA
Discutida há mais de 15 anos, a reforma política ganha uma nova tentativa de aperfeiçoar a democracia brasileira. O conjunto de propostas chega ao plenário da Câmara nos dias 9 e 10 de abril sem a menor certeza de aprovação e de quais mudanças será capaz de imprimir. A atual revisão está calcada no financiamento público das campanhas, no fim das coligações proporcionais (vereadores e deputados) e em eleições simultâneas.
P restes a ser votada na Câmara, a reforma política tem metas ousadas: combater o caixa 2 e a influência de grandes corporações, dificultar as coalizões de conveniência e extinguir as siglas de aluguel. Apesar da consciência da necessidade de mudanças no sistema atual, nos corredores do Congresso anda mais fácil prever os resultados da loteria do que o desfecho da reestruturação.
A discussão se converteu em um cabo de guerra, só que com múltiplas pontas. Interesses partidários, regionais e, muitas vezes pessoais, dificultam qualquer acordo.
– A votação vai depender do clima na Casa – admite o relator, Henrique Fontana (PT-RS).
Alguns temas gozam do apoio público das bancadas. O principal, alvo de ressalvas nos bastidores, é o financiamento das campanhas com recursos do Tesouro Nacional. Apesar de a medida reforçar o peso da biografia do candidato e diminuir o da máquina de propaganda, parlamentares com grande capacidade de arrecadar fundos tentam derrubar a proposta.
– As campanhas são caras e permitem a influência do poder econômico na política, origem dos escândalos que presenciamos – diz a deputada Manuela D’Ávila (RS), líder do PC do B.
Unificar as eleições no mesmo ano, do vereador ao presidente da República, também recebe elogios. Para o deputado Alceu Moreira (PMDB-RS), membro da comissão que debate a reforma, a alteração criará alianças partidárias nacionais, sem os rachas vistos em Estados e municípios:
– Vai reforçar a ideologia dentro dos partidos, que terão de fazer projetos que comecem nas cidades e terminem no plano federal.
Já o fim das coligações nas eleições proporcionais concentra a discórdia. Hoje, duas ou mais siglas se aliam para somar votos na busca por cadeiras no parlamento, o que será proibido. Líderes de legendas de grande porte, como o PMDB, articulam pela restrição da reforma a apenas esse ponto, o que irrita partidos em ascensão e pequenos, temerosos por seu futuro.
– Sem a coligação proporcional, os grandes ficarão ainda maiores. Pelo visto, tem gente querendo a volta do bipartidarismo – critica o deputado Beto Albuquerque (RS), líder do PSB.
O cientista político Murillo de Aragão acha pouco provável um consenso capaz de gerar mudanças amplas, como deseja Fontana. E usa como exemplo a adoção do voto em lista fechada de candidatos, ordenada pelas siglas:
– O voto em lista beneficiaria o PT, que possui cerca de um terço do eleitorado cativo, porém encontraria resistências nas demais legendas.
Referendo terá de avalizar mudanças
Já o cientista político Francisco Fonseca, professor da FGV-São Paulo, destaca que o atual sistema eleitoral, criado na transição do regime militar para democracia, fortalece os caciques das siglas. São esses líderes que, pelo poder de influência, apontarão o desfecho da reforma – que ainda terá de sobreviver ao Senado, à sanção presidencial e a um referendo popular. Por sinal, nos últimos dias, tais conchavos já tornaram a própria votação na Câmara incerta.
– Toda reforma tentada no Brasil não prospera porque muda as regras do jogo, o que gera incerteza para os jogadores – alerta Fonseca.
Em 10 dias, será possível conhecer as regras do jogo que o parlamento pretende jogar.
GUILHERME MAZUI | BRASÍLIA
O que ficou de fora. A reforma em debate não abrange outras propostas importantes
VOTO FACULTATIVO - O voto deixa de ser obrigatório, levando às urnas apenas o eleitor disposto a influenciar naquela eleição. Os defensores da ideia alegam que ajuda a reduzir os custos das campanhas e incentiva a formação de um eleitor mais sofisticado, que precisa ser convencido a votar.
VOTO DISTRITAL - Estados e municípios são divididos em diversos distritos, sendo eleito apenas o candidato mais votado. A proposta do distritão transforma cidades e Estados em distritos únicos. No caso gaúcho para a Câmara, seriam eleitos os 31 deputados mais votados, sem divisão proporcional de cadeiras. A proposta ainda pode aparecer na atual reforma política.
PARLAMENTARISMO - Adotar um sistema similar ao de países como a Alemanha, onde o presidente tem papel representativo, com as decisões de governo na mão do primeiro-ministro, não está na agenda nacional. Em 1993, um plebiscito derrubou a ideia no Brasil.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Se não colocarem o voto facultativo e o voto distrital na reforma política, os congressistas perderão uma grande oportunidade de consolidar a democracia no Brasil. Não podem desprezar justamente as duas propostas que consolidam o Brasil como uma república verdadeiramente democrática na política. Só regimes totalitários obrigam a cabresto da justiça ou da polícia o povo a votar, assim como só os regimes ditatoriais impedem que o povo se interesse pelos seus próprios problemas e direcione seu voto para representantes das suas comunidades.
Sou favorável ao financiamento público das campanhas, fim das coligações proporcionais (inclusive para Presidente e Governador) e em eleições simultâneas, já que estas propostas podem minimizar as relações escusas com o poder corruptor, terminar com as alianças de interesses, reduzir o custo do dinheiro público gasto em eleições a cada dois anos, e ainda guiar os governantes aos seus deveres no mandato, ao invés de focarem seus esforços em políticas eleitoreiras.
O voto em lista seria importante se conjugado com o voto distrital, pois estabelece a importância do partido em relação ao candidato. No Brasil, colocamos nossas esperanças num certo candidato esquecendo que é o partido que vai guiar o comportamento dele no parlamento e que é a bancada vai impor seus interesses em TODAS as questões.
O voto em lista seria importante se conjugado com o voto distrital, pois estabelece a importância do partido em relação ao candidato. No Brasil, colocamos nossas esperanças num certo candidato esquecendo que é o partido que vai guiar o comportamento dele no parlamento e que é a bancada vai impor seus interesses em TODAS as questões.
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