PÁGINA 10 | ROSANE DE OLIVEIRA
Missão (quase) impossível
Vender geladeira para esquimó ou lareira no Caribe não é mais difícil do que a tarefa do deputado Henrique Fontana (PT-RS) de convencer a população a apoiar o financiamento público de campanhas eleitorais. Não que faltem argumentos ao relator da comissão especial da reforma política. O que falta é confiança dos eleitores nos políticos e no sistema judicial para acreditar que, aprovado o financiamento público exclusivo, ninguém achará um jeitinho de continuar recebendo dinheiro de empresas privadas para defender seus interesses.
Fontana tem razão quando diz que o sistema atual, pelo qual empresas e pessoas físicas fazem doações a candidatos, custa mais caro para o contribuinte do que o financiamento público. Difícil é provar isso para eleitores, que temem ver as verbas da saúde, da educação e da segurança migrarem para as campanhas eleitorais ou têm pesadelos com a possibilidade de aumento de impostos para financiar mais esse gasto.
É verdade que o financiamento privado custa caro para o país. Com raríssimas exceções, as empresas que fazem doações repassam os custos para os produtos ou serviços que oferecem. Pior do que isso, a maioria não o faz por apreço à democracia. Doa para conquistar a simpatia de quem decide os destinos do país no Executivo ou no Legislativo. O crime organizado financia campanhas para garantir proteção, em geral usando empresas de fachada que, aos olhos da Justiça Eleitoral, parecem imaculadas.
Aí está o bicheiro Carlinhos Cachoeira para provar o quanto o sistema eleitoral é terreno fértil para a cooptação de políticos sem escrúpulos. Que o diga seu ex-embaixador Demóstenes Torres. O mensalão, que misturou compra de apoio político, caixa 2 e corrupção, também é filho desse sistema.
Em seu relatório, Fontana incluiu vacinas para impedir as doações. As principais são o rigor nas punições para quem doar e para quem receber contribuições de campanha, a transparência nas prestações de contas dos partidos e a maior facilidade de fiscalização pela Justiça Eleitoral, pela imprensa e pelos adversários.
O financiamento público é um dos itens da proposta de reforma política. Não é simpático, mas pode abrir caminho para a qualificação da representação no Congresso. Hoje, está provado que quem tem mais chances de se eleger não é o melhor, mas o que faz a campanha mais cara.
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