Escravidão sem fim
Enquanto os deputados se recusam a votar a lei que pune o trabalho escravo, novos casos de abuso se repetem no País. O último envolve a rede Gregory de moda feminina
Natália MartinoFLAGRA
Fiscais fecham uma das oficinas terceirizadas da
Gregory: situação de trabalho degradante
GRIFE
Roupas da rede feminina espalhadas pelo barracão: R$ 3 por peça
De acordo com Andrea Duca, diretora de marketing da rede fundada em 1981, que possui 80 lojas em 21 Estados brasileiros, a empresa não tinha conhecimento prévio sobre a situação e não possui o controle sobre o que acontece dentro das oficinas dos seus fornecedores, que são terceirizadas. “A fiscalização fez uma associação indevida do nosso nome ao problema”, afirma. O relatório, porém, é incisivo ao afirmar que a empresa “é inteiramente responsável pela situação encontrada”. De acordo com o documento, as notas fiscais das oficinas eram emitidas em nome de um CNPJ artificial como estratégia para eximir a Gregory de responsabilidades pela forma como a produção era conduzida. Essa não é a primeira vez que a grife se vê envolvida em denúncias. Em 2011, durante investigação que flagrou trabalho escravo a serviço da Zara, também foram encontradas etiquetas da Gregory nas oficinas fechadas pela fiscalização.
AÇÃO
Artistas e líderes de movimentos sociais entregam manifesto
em Brasília a favor da PEC do trabalho escravo
Os trabalhadores resgatados já receberam as verbas trabalhistas devidas, quase R$ 55 mil, mas ainda resta a incerteza sobre o futuro. “O Brasil tem que avançar muito no pós-resgate. Se a situação de vulnerabilidade não acaba, o trabalhador é aliciado de novo”, diz Luiz Machado, coordenador do projeto de combate ao trabalho forçado no Brasil da Organização Internacional do Trabalho (OIT). “Temos que lembrar que o fato de a vida dessas pessoas ser precária não é argumento para que o trabalho seja uma continuidade dessa condição”, afirma Leonardo Sakamoto, coordenador-geral da Repórter Brasil, ONG que atua no combate ao trabalho escravo.
Das áreas rurais, onde as denúncias costumam envolver tortura física e falta de acesso a água potável, vem as maiores críticas em relação à PEC. O adiamento da votação é encabeçado pela bancada ruralista no Legislativo. De acordo com o deputado Moreira Mendes (PSD- RO), um dos integrantes dessa bancada, falta uma definição do que é escravidão. “As denúncias costumam ser um exagero absoluto”, afirma o deputado. Atualmente, os fiscais seguem as normas do Ministério do Trabalho e Emprego e o artigo 149 do Código Penal, que criminaliza o cerceamento de liberdade, trabalho degradante e as jornadas exaustivas. “Trabalho escravo é aquele que coisifica a pessoa e tira dela a dignidade. Não é irregularidade trabalhista, é afronta aos direitos humanos”, diz Luiz Camargo, procurador-geral do trabalho. Foram esses argumentos que tomaram conta da Câmara dos Deputados no dia 8 de maio, quando a PEC deveria ser votada. A data havia sido escolhida por se tratar da semana de 13 de maio, data em que a Lei Áurea foi assinada há mais de um século. A PEC seria uma nova abolição da escravatura no Brasil. Mas não foi desta vez. Agora os deputados afirmam que voltarão a falar sobre o assunto na terça-feira 22.
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