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terça-feira, 15 de maio de 2012

UM FICHA-SUJA NA EMBAIXADA

REVISTA ISTO É, N° Edição:  2218, 15.Mai.12 - 17:46

Ministério Público quer anular a nomeação de Ângelo Gióia para o cargo de adido policial na embaixada brasileira em Roma. Delegado da PF, ele é suspeito de favorecer o tráfico no Rio de Janeiro

Flávio Costa


Por um longo tempo, a indicação para o cargo de adido policial em uma embaixada brasileira soava apenas como um prêmio ao nomeado, que trabalhava pouco e ainda curtia as benesses que apenas uma representação diplomática pode oferecer. Hoje, o posto continua bem remunerado – pode chegar perto dos R$ 40 mil mensais, a depender da cotação do dólar e do lugar de atuação –, mas suas atribuições e importância cresceram na medida em que o crime organizado avançou como um bilionário negócio. Promover intercâmbios e troca de informações entre órgãos policiais, elaborar atividades de inteligência e acompanhar inquéritos criminais que possam ter repercussão no Brasil estão entre as missões a serem desempenhadas pelos 13 delegados federais que ocupam a função por todo mundo. Eles devem ter uma longa carreira de serviços prestados à Polícia Federal e uma ficha impecável. Para o Ministério Público Federal este não é o caso do ex-superintendente da PF no Rio de Janeiro Ângelo Fernandes Gióia. Há um ano, ele trabalha no belíssimo Palazzo Pamphilj, sede da embaixada brasileira em Roma, como chefe da adidância policial. Mas o procurador da República no Distrito Federal, Peterson Paula Pereira, quer que a Justiça anule a nomeação de Gióia e o mande de volta ao Brasil para responder a uma ação penal pelos crimes de denunciação caluniosa, abuso de autoridade e coação. Gióia também é alvo de uma outra ação por improbidade administrativa.

Para o procurador, a PF desrespeitou suas próprias regras internas ao indicar Gióia para o posto de adido policial em Roma. O artigo 7º da Instrução Normativa da corporação prevê que o nomeado para o cargo “não pode estar respondendo a processo criminal, administrativo-disciplinar ou inquérito policial, que por sua natureza crie dificuldade à administração e que impeça o seu afastamento do país”. Por essa razão, na avaliação de Peterson Pereira, o decreto assinado pelo então ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto seria ilegal e feriria o princípio da moralidade administrativa. “O Brasil não está bem representado neste momento e a ausência do delegado pode prejudicar o andamento da ação penal que ele responde”, completa Pereira.

A ação penal a que responde Gióia tramita na 8ª Vara Federal do Rio de Janeiro e tem origem em uma série de irregularidades identificadas por procuradores da República na Superintendência da PF daquele Estado.
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IRREGULAR
Para a Procuradoria da República do DF, a indicação de Ângelo Gióia para a embaixada
do Brasil em Roma contrariou os princípios da moralidade administrativa
Em investigação aberta em novembro de 2009, os procuradores concluíram que houve uma subutilização dos recursos da Polícia Federal no Rio, provocando uma queda substancial na prisão de traficantes e apreensão de cocaína. Entre as dezenas de depoimentos colhidos durante o inquérito, chamou a atenção o do delegado Leonardo de Sousa Tavares. Ele afirmou que a superintendência do Rio, comandada pelo delegado Ângelo Fernandes Gióa, estava promovendo um “desmonte enviesado e progressivo da estrutura policial no Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim (Galeão) para dar guarida a um suposto esquema de contrabando e descaminho com a participação de servidores da Receita Federal e a conivência de delegados da PF”. O depoente denunciou ainda um outro esquema de admissão de estrangeiros que queriam atuar profissionalmente no País, mesmo sem possuírem vistos de trabalho. As irregularidades no embarque de estrangeiros no Rio foram confirmadas pelo MP e resultaram em uma ação penal contra o então chefe da delegacia da PF no aeroporto Alcyr Vidal – subordinado direto de Gióia. Ele teria permitido a entrada de uma passageira russa no País ferindo a Lei dos Estrangeiros, que determina que o ingresso para prestação de serviço no país deve ser feito com visto próprio — o Visto Temporário VITM V, o popularmente conhecido visto de trabalho. No passaporte da passageira russa constava o Visto Temporário VITM II, destinado a quem vem ao país fazer negócios. Ela mesma confessou que prestaria serviços em uma fábrica de sapatos em Novo Hamburgo (RS).

Como, em vez de investigar as denúncias feitas por Sousa Tavares, Gióia abriu uma sindicância interna contra ele, o MP resolveu ajuizar a ação penal e de improbidade. “O delegado não poderia ser denunciado apenas por cumprir o seu dever”, afirma o procurador da República no RJ, Fábio Seghese, um dos autores na ação. Gióia nega que tenha cometido qualquer tipo de irregularidade ou perseguição a funcionários quando esteve à frente da PF no Rio de Janeiro. Seus documentos de defesa, aos quais ISTOÉ teve acesso, alegam a suspeição dos três procuradores que atuam na ação penal e contra quem Gióia abriu representações na Justiça Federal. Sobre o eventual pedido de anulação de sua transferência para Roma, Gióia pouco comenta. “Não sou réu. Na condição de funcionário público compete-me cumprir, como sempre cumpri com probidade e correção, todas as determinações do diretor-geral do Departamento de Polícia Federal”, afirmou, por e-mail, à ISTOÉ. Também procurada, a direção da PF afirma que a natureza dos processos contra o adido não impedia a sua nomeação.
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