OPINIÃO
Contempladas pelo programa Minha Casa, Minha Vida, cerca de 400 famílias de Pacatuba, na região metropolitana de Fortaleza, esperam há um mês pelas chaves de suas casas, que já estão prontas. O motivo do atraso, como mostrou reportagem do Estado, retrata bem o lado eleitoreiro do programa: de acordo com as autoridades locais, será preciso aguardar a inauguração oficial do empreendimento, que será realizada pela presidente Dilma Rousseff - mas só quando ela encontrar um tempinho em sua agenda.
Uma das beneficiárias do programa no Ceará disse que está contando "as horas, os minutos e os segundos" para finalmente receber as chaves. "Vou lá todo dia só para ficar olhando minha casa novinha. Fico olhando do lado de fora um tempão", disse ela, revelando o absurdo da situação.
O prefeito de Pacatuba, José Alexandre Alencar (PROS), disse que "a agenda da nossa chefe maior é uma loucura", porque Dilma "tem muita coisa para fazer no Brasil e no mundo", razão pela qual "está difícil conciliar" (a agenda) com a inauguração de um conjunto habitacional na Grande Fortaleza. Alencar, cujo partido é da base aliada da presidente, disse que até já foi a Brasília pedir que a inauguração fosse antecipada, mas a previsão é que a "festa", como disse o prefeito, só aconteça no mês que vem.
Outra beneficiária do programa sugeriu que os moradores recebessem logo as chaves, deixando a inauguração para quando a presidente estivesse disponível. "Ela poderia deixar a gente entrar na casa e depois, quando desse, viria nos visitar", disse a moradora. "A gente teria o prazer de receber a presidente dentro de casa, com tudo arrumadinho, com os móveis no lugar." A singeleza dessa mãe de três filhos pequenos deveria bastar para que a presidente deixasse de pensar apenas em sua reeleição e autorizasse logo a entrega das chaves, sem a necessidade da fanfarra palanqueira.
Se Dilma fizesse isso, no entanto, não seria Dilma, pois cada ato de seu governo, cada segundo de sua agenda de compromissos, cada palavra destrambelhada que ela pronuncia são milimetricamente ajustados para caber no esforço da campanha eleitoral. Enquanto isso, a prefeitura de Pacatuba se desdobra para explicar às famílias beneficiadas que a responsabilidade pelo atraso na entrega das casas é do governo federal.
"Precisamos entregar essas casas, todo mundo está cobrando e tem gente que acha até que o nome foi retirado da lista de beneficiados", disse Elisangela Campos, secretária de Assistência Social do município. "Se ela (Dilma) puder vir, vai ser uma honra; caso contrário, ela poderia mandar um representante." Mas a presidente, que usa essas inaugurações para tirar fotos com eleitores e fazer discursos de campanha, certamente não delegará essa tarefa a terceiros.
O Minha Casa, Minha Vida tornou-se o retrato perfeito de um governo que promete o paraíso e entrega, no máximo, o purgatório. Principal vitrine eleitoral de Dilma, o programa há tempos coleciona denúncias de irregularidades e problemas de infraestrutura nos imóveis.
Há casos comprovados de aparelhamento pelo PT, num esquema em que quase todos os projetos aprovados na cidade de São Paulo foram apresentados por entidades dirigidas por filiados ao partido, que privilegiam petistas na seleção de candidatos ao financiamento. Além disso, o Tribunal de Contas da União já verificou sinais de fraudes na inscrição de milhares de beneficiários, que teriam apresentado um perfil de renda inferior ao real para se adequarem ao programa. E há o problema da qualidade das casas. Abundam reclamações de moradores, Brasil afora, sobre rachaduras, vazamentos e infiltrações - em muitos casos, os problemas aparecem apenas alguns meses depois que Dilma entrega as chaves.
Não se questiona a importância dos programas de habitação e de urbanização. Ao contrário: o investimento ainda é tímido ante as necessidades do País. É por isso mesmo que esse tema deveria ser tratado com muito mais responsabilidade, e não como mero ativo eleitoral, como tem feito a presidente.
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