ZERO HORA 01/12/2014 | 05h31
Pesquisa revela o perfil de adolescentes da capital gaúcha. Mais de 400 jovens entre 13 e 18 anos responderam um questionario encomendado pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre
por Jaqueline Sordi
Fazer compras e ficar conectada com o celular fazem parte da rotina da jovem Larissa, de 14 anos Foto: Diego Vara / Agencia RBS
Eles vivem conectados, mas não se interessam por política. Se autodenominam preguiçosos, mas sonham em viajar e construir uma carreira. E, quando o tema é sexualidade, se mostram abertos a diferentes tipos de relacionamento, mas muitos ainda conservam o sonho de casar e estabelecer uma relação de fidelidade.
Assim são os jovens porto-alegrenses: ao mesmo tempo em que têm acesso a um mundo virtual (quase) sem limites, tendem a se proteger na casa dos pais. Essas e outras características que compõem a personalidade e o perfil de consumo de 400 moradores de 13 a 18 anos da Capital foram traçadas em uma pesquisa encomendada pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL) e executada pelo Instituto Vitamina.
Divulgado hoje, o estudo com adolescentes das classes A, B, C e D reflete novos conceitos, tipos de relações e desejos de uma geração que parece mais interessada em aproveitar a vida do que mudar o mundo. Para eles, a popularidade é medida pelos “likes” que recebem no Facebook, tempo livre significa imergir nas redes sociais e, para começar a namorar, vale até pedido pelo WhatsApp.
– Existem várias frentes que fazem parte da adolescência e que, pelos dados do estudo, estão sendo deixadas de lado. Uma é a vida social, o contato físico com o outro. A outra é a familiar e também os momentos para ficar só. Os jovens estão muito dentro de casa, mas socializando o tempo todo pelas redes. Estão extremamente conectados com o virtual, mas investindo menos na vida real – comenta a psicanalista Katia Radke, membro da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA).
Os jovens, entretanto, não parecem sentir falta da presença física dos demais, já que, mesmo virtualmente, as conversas e o compartilhamento de informações não param nem quando estão realizando outras atividades. Mais de 80% deles afirmam estar online ao mesmo tempo em que assistem à TV. Para a psicóloga Aline Restano, do Grupo de Estudos em Adições Tecnológicas (Geat), as relações virtuais nem sempre devem ser encaradas como problemáticas pelos pais:
– É bem importante termos em mente que conversas e declarações feitas via internet, ou mesmo pedidos de namoro, são sim vivenciadas como reais para quem está inserido nela. Enquanto as redes sociais tiverem como fim a comunicação, a troca de opiniões, o compartilhamento de gostos, e não impedirem o relacionamento real, está bem – explica Aline.
Meu celular, meu mundo
Txai já fez cursos de inglês e espanhol pela internet
Foto: Omar Freitas
Celular é a palavra de ordem. Ou melhor, de identificação. Quando questionados sobre o objeto que melhor lhes representa, mais da metade dos adolescentes deixou de lado livros, roupas esportivas e até o computador para eleger o dispositivo móvel. O estudante Txai Melo, 16 anos, comenta que o resultado não surpreende:
– Já nascemos neste mundo que é predominantemente virtual. Meu dia se resume em estar no celular, no computador ou na escola. E, mesmo quando estou na aula, às vezes também uso o celular.
Assim como ele, 78% dos entrevistados confessaram usar frequentemente ou já terem mexido no aparelho durante o período escolar. Estudante do 2º ano do Ensino Médio, Txai vive em um pequeno apartamento ao lado da mãe, a advogada Patrícia Mello, 51 anos, e admite que utiliza as redes sociais para falar com ela até mesmo quando ambos estão em casa.
Realizar muitas atividades ao mesmo tempo, em um processo chamado de multitarefa, é característico dessa geração. O resultado, entretanto, nem sempre é satisfatório, explica o psiquiatra Vitor Breda, do Grupo de Estudos sobre Adições Tecnológicas:
– Apesar de uma aparente otimização do tempo, e de alguns indivíduos conseguirem desempenhar tarefas simultâneas de forma eficiente, na prática, o que ocorre com a maioria é a realização ineficiente dessas diversas atividades.
Minhas compras, meus excessos
Fazer compras é uma das atividades preferidas de Larissa
Foto: Diego Vara
Viagens e compras fazem parte dos desejos dos adolescentes, que não abrem mão das mordomias familiares. Despreocupados, se dizem “serenos” quando o assunto é comportamento financeiro. Consequentemente, não parecem pensar muito no tema, explica Gustavo Schifino, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL). Para o especialista, diferentemente das gerações anteriores, eles não se preocupam mais em economizar, e por isso elevam o padrão de consumo a um novo patamar.
– Nunca parei pra pensar em quanto eu gasto. No final de semana, vou ao shopping e faço a festa – relata a jovem Larissa da Silva Gonçalves, 14 anos.
Para a adolescente, que vive na casa dos pais junto com o irmão de três anos, fazer compras é uma de suas atividades preferidas. Em uma viagem recente à Disney, teve de encarar, pela primeira vez, a difícil tarefa de economizar dinheiro:
– Fui com uma quantia limitada, e tinha que escolher entre as coisas que queria comprar. Foi difícil, mas me fez pensar que tudo que eu adquiri valeu muito a pena. Foram decisões sábias.
Ainda que relatem estar conectados o tempo todo, quando o assunto é ir às compras, a internet fica em segundo plano: o local preferido é o shopping center. Mas, mesmo assim, as redes sociais participam do processo de compra.
– Quando vou comprar uma roupa mais importante, para alguma ocasião especial, costumo tirar foto de dentro do provador e mandar para minhas amigas, pedindo a opinião delas – conta Larissa.
Schifino explica que a pesquisa revela um comportamento bem característico dos atuais jovens consumidores: eles compram pelo benefício, muito mais do que pela necessidade. Larissa, em outras palavras, resume:
– Tenho tudo que preciso, mas não tudo que quero.
Minhas relações, minha decisão
Gabriel não pensa em namorar por enquanto
Foto: Omar Freitas
Menus tabu e mais conversa. Eles se mostram mais abertos a experimentar diferentes tipos de relações, e os pais, mais dispostos a falar sobre essas experiências.
– Não estou em uma relação séria com ninguém, mas ficando com algumas meninas. Acho que, neste momento, tenho mais que aproveitar – conta o estudante Gabriel Magnus, 17 anos.
Quando o assunto é relacionamentos entre o mesmo sexo, 20% dizem ficar com meninos e meninas, e 12% afirmam ficar só com pessoas do mesmo sexo:
– Este comportamento é característico da adolescência, já que a consolidação da identidade passa por conflitos ligados a questões sexuais. Como hoje há menos repressão, eles dão mais vazão aos desejos, diferentemente de outras gerações – explica a psicanalista Katia Radke.
A aceitação de relacionamentos homoafetivos, entretanto, não é vista da mesma forma por meninos e meninas. Gabriel conta que, entre seus amigos, casais de meninas são mais comuns e melhor aceitos. Já dois meninos juntos causam estranheza entre eles.
– Aqui no Rio Grande do Sul, o preconceito é muito forte. Ainda bem que eu fui criado de forma livre para tomar minhas próprias decisões – diz o estudante.
Minha família, meu porto seguro
Manuela vive com a mãe e os avós desde os oito anos
Foto: Omar Freitas
Sair de casa e conquistar a independência era uma ânsia dos jovens. Hoje, o tema parece não chamar muito a atenção. Vivendo em núcleos familiares cada vez mais diversos, os adolescentes sentem-
se confortáveis sob a proteção e o cuidado dos provedores, sejam os pais, tios, padrastos ou avós. Manuela Rodrigues, 14 anos, divide o mesmo teto com a mãe e os avós maternos desde os oito anos, quando os pais se separaram.
– No início foi difícil, mas logo amadureci e vi que era mais normal do que imaginava. Hoje, das minhas quatro grandes amigas, somente uma vive com o pai e com a mãe – conta a jovem.
Dispondo de conforto e acolhimento em casa, eles não parecem querer sair nem para fazer festas. Manuela conta que, entre as amigas (e mais de 60% dos entrevistados), uma das principais diversões é se reunir... dentro de casa!
A jovem, que afirma não ter planos de se mudar antes de terminar a faculdade, diz que pretende seguir a carreira de advocacia, como a mãe. A tendência de encontrar referências na família aparece na pesquisa: 60% disse se inspirar em um familiar e 26%, em um artista.
O dado surpreendeu a psicanalista Katia Radke. Ela diz que uma das tarefas da adolescência é buscar autonomia e uma identidade própria em modelos externos.
Pesquisa revela o perfil de adolescentes da capital gaúcha. Mais de 400 jovens entre 13 e 18 anos responderam um questionario encomendado pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre
por Jaqueline Sordi
Fazer compras e ficar conectada com o celular fazem parte da rotina da jovem Larissa, de 14 anos Foto: Diego Vara / Agencia RBS
Eles vivem conectados, mas não se interessam por política. Se autodenominam preguiçosos, mas sonham em viajar e construir uma carreira. E, quando o tema é sexualidade, se mostram abertos a diferentes tipos de relacionamento, mas muitos ainda conservam o sonho de casar e estabelecer uma relação de fidelidade.
Assim são os jovens porto-alegrenses: ao mesmo tempo em que têm acesso a um mundo virtual (quase) sem limites, tendem a se proteger na casa dos pais. Essas e outras características que compõem a personalidade e o perfil de consumo de 400 moradores de 13 a 18 anos da Capital foram traçadas em uma pesquisa encomendada pela Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL) e executada pelo Instituto Vitamina.
Divulgado hoje, o estudo com adolescentes das classes A, B, C e D reflete novos conceitos, tipos de relações e desejos de uma geração que parece mais interessada em aproveitar a vida do que mudar o mundo. Para eles, a popularidade é medida pelos “likes” que recebem no Facebook, tempo livre significa imergir nas redes sociais e, para começar a namorar, vale até pedido pelo WhatsApp.
– Existem várias frentes que fazem parte da adolescência e que, pelos dados do estudo, estão sendo deixadas de lado. Uma é a vida social, o contato físico com o outro. A outra é a familiar e também os momentos para ficar só. Os jovens estão muito dentro de casa, mas socializando o tempo todo pelas redes. Estão extremamente conectados com o virtual, mas investindo menos na vida real – comenta a psicanalista Katia Radke, membro da Sociedade Psicanalítica de Porto Alegre (SPPA).
Os jovens, entretanto, não parecem sentir falta da presença física dos demais, já que, mesmo virtualmente, as conversas e o compartilhamento de informações não param nem quando estão realizando outras atividades. Mais de 80% deles afirmam estar online ao mesmo tempo em que assistem à TV. Para a psicóloga Aline Restano, do Grupo de Estudos em Adições Tecnológicas (Geat), as relações virtuais nem sempre devem ser encaradas como problemáticas pelos pais:
– É bem importante termos em mente que conversas e declarações feitas via internet, ou mesmo pedidos de namoro, são sim vivenciadas como reais para quem está inserido nela. Enquanto as redes sociais tiverem como fim a comunicação, a troca de opiniões, o compartilhamento de gostos, e não impedirem o relacionamento real, está bem – explica Aline.
Meu celular, meu mundo
Txai já fez cursos de inglês e espanhol pela internet
Foto: Omar Freitas
Celular é a palavra de ordem. Ou melhor, de identificação. Quando questionados sobre o objeto que melhor lhes representa, mais da metade dos adolescentes deixou de lado livros, roupas esportivas e até o computador para eleger o dispositivo móvel. O estudante Txai Melo, 16 anos, comenta que o resultado não surpreende:
– Já nascemos neste mundo que é predominantemente virtual. Meu dia se resume em estar no celular, no computador ou na escola. E, mesmo quando estou na aula, às vezes também uso o celular.
Assim como ele, 78% dos entrevistados confessaram usar frequentemente ou já terem mexido no aparelho durante o período escolar. Estudante do 2º ano do Ensino Médio, Txai vive em um pequeno apartamento ao lado da mãe, a advogada Patrícia Mello, 51 anos, e admite que utiliza as redes sociais para falar com ela até mesmo quando ambos estão em casa.
Realizar muitas atividades ao mesmo tempo, em um processo chamado de multitarefa, é característico dessa geração. O resultado, entretanto, nem sempre é satisfatório, explica o psiquiatra Vitor Breda, do Grupo de Estudos sobre Adições Tecnológicas:
– Apesar de uma aparente otimização do tempo, e de alguns indivíduos conseguirem desempenhar tarefas simultâneas de forma eficiente, na prática, o que ocorre com a maioria é a realização ineficiente dessas diversas atividades.
Minhas compras, meus excessos
Fazer compras é uma das atividades preferidas de Larissa
Foto: Diego Vara
Viagens e compras fazem parte dos desejos dos adolescentes, que não abrem mão das mordomias familiares. Despreocupados, se dizem “serenos” quando o assunto é comportamento financeiro. Consequentemente, não parecem pensar muito no tema, explica Gustavo Schifino, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL). Para o especialista, diferentemente das gerações anteriores, eles não se preocupam mais em economizar, e por isso elevam o padrão de consumo a um novo patamar.
– Nunca parei pra pensar em quanto eu gasto. No final de semana, vou ao shopping e faço a festa – relata a jovem Larissa da Silva Gonçalves, 14 anos.
Para a adolescente, que vive na casa dos pais junto com o irmão de três anos, fazer compras é uma de suas atividades preferidas. Em uma viagem recente à Disney, teve de encarar, pela primeira vez, a difícil tarefa de economizar dinheiro:
– Fui com uma quantia limitada, e tinha que escolher entre as coisas que queria comprar. Foi difícil, mas me fez pensar que tudo que eu adquiri valeu muito a pena. Foram decisões sábias.
Ainda que relatem estar conectados o tempo todo, quando o assunto é ir às compras, a internet fica em segundo plano: o local preferido é o shopping center. Mas, mesmo assim, as redes sociais participam do processo de compra.
– Quando vou comprar uma roupa mais importante, para alguma ocasião especial, costumo tirar foto de dentro do provador e mandar para minhas amigas, pedindo a opinião delas – conta Larissa.
Schifino explica que a pesquisa revela um comportamento bem característico dos atuais jovens consumidores: eles compram pelo benefício, muito mais do que pela necessidade. Larissa, em outras palavras, resume:
– Tenho tudo que preciso, mas não tudo que quero.
Minhas relações, minha decisão
Gabriel não pensa em namorar por enquanto
Foto: Omar Freitas
Menus tabu e mais conversa. Eles se mostram mais abertos a experimentar diferentes tipos de relações, e os pais, mais dispostos a falar sobre essas experiências.
– Não estou em uma relação séria com ninguém, mas ficando com algumas meninas. Acho que, neste momento, tenho mais que aproveitar – conta o estudante Gabriel Magnus, 17 anos.
Quando o assunto é relacionamentos entre o mesmo sexo, 20% dizem ficar com meninos e meninas, e 12% afirmam ficar só com pessoas do mesmo sexo:
– Este comportamento é característico da adolescência, já que a consolidação da identidade passa por conflitos ligados a questões sexuais. Como hoje há menos repressão, eles dão mais vazão aos desejos, diferentemente de outras gerações – explica a psicanalista Katia Radke.
A aceitação de relacionamentos homoafetivos, entretanto, não é vista da mesma forma por meninos e meninas. Gabriel conta que, entre seus amigos, casais de meninas são mais comuns e melhor aceitos. Já dois meninos juntos causam estranheza entre eles.
– Aqui no Rio Grande do Sul, o preconceito é muito forte. Ainda bem que eu fui criado de forma livre para tomar minhas próprias decisões – diz o estudante.
Minha família, meu porto seguro
Manuela vive com a mãe e os avós desde os oito anos
Foto: Omar Freitas
Sair de casa e conquistar a independência era uma ânsia dos jovens. Hoje, o tema parece não chamar muito a atenção. Vivendo em núcleos familiares cada vez mais diversos, os adolescentes sentem-
se confortáveis sob a proteção e o cuidado dos provedores, sejam os pais, tios, padrastos ou avós. Manuela Rodrigues, 14 anos, divide o mesmo teto com a mãe e os avós maternos desde os oito anos, quando os pais se separaram.
– No início foi difícil, mas logo amadureci e vi que era mais normal do que imaginava. Hoje, das minhas quatro grandes amigas, somente uma vive com o pai e com a mãe – conta a jovem.
Dispondo de conforto e acolhimento em casa, eles não parecem querer sair nem para fazer festas. Manuela conta que, entre as amigas (e mais de 60% dos entrevistados), uma das principais diversões é se reunir... dentro de casa!
A jovem, que afirma não ter planos de se mudar antes de terminar a faculdade, diz que pretende seguir a carreira de advocacia, como a mãe. A tendência de encontrar referências na família aparece na pesquisa: 60% disse se inspirar em um familiar e 26%, em um artista.
O dado surpreendeu a psicanalista Katia Radke. Ela diz que uma das tarefas da adolescência é buscar autonomia e uma identidade própria em modelos externos.
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