REVISTA ISTO É N° Edição: 2353 | 26.Dez.14
Novo governo nasce com cara de velho. A repetição de vícios do passado pode afastá-lo ainda mais dos anseios da sociedade
Josie Jeronimo
Durante a campanha eleitoral, a presidente Dilma Rousseff recheou o discurso com muitas promessas. Estabeleceu um eixo de 26 temas prioritários, garantindo ampliação de investimentos e pulso firme na administração pública para coibir a utilização política da máquina.
OUVIDOS MOUCOS
Dilma ignora o recado das urnas insistindo em erros
cometidos no governo anterior
As denúncias que atingiram a cúpula dos principais partidos que compõem a base do governo e o descontrole das contas públicas – que carregavam o peso de quatro anos de demãos de maquiagem – indicavam que a presidente teria que remontar sua equipe priorizando a qualidade técnica em detrimento ao loteamento político. A poucos dias de inaugurar o segundo mandato, no entanto, Dilma demonstra ignorar as opções para reabilitar o governo e acena para a continuidade de vícios que comprometeram seriamente o funcionamento do País nos primeiros quatro anos de sua administração. Na prática, fica a impressão de que, em 2015, teremos um governo novo com feição de velho.
O primeiro gesto de desalento se deu com o empenho do governo em obrigar o Congresso a alterar a meta de superávit de 2014 e reformar a Lei de Diretrizes Orçamentárias por meio de um projeto de lei. Em vez de apertar os cintos e imprimir responsabilidade aos gastos, o Parlamento acatou a orientação do Planalto e aprovou a mudança. Para aprovar essa flexibilização, o Planalto destinou R$ 748 mil de emendas para cada parlamentar. Nada mais evidente de que, em seu segundo mandato, Dilma continuará abraçada à velha estratégia do toma lá dá cá. Essa relação pouco republicana com o Legislativo tende a ficar ainda mais promíscua nos próximos meses com o avanço das investigações da Operação Lava Jato, que vai atingir em cheio a base aliada. Nesse cenário, a dependência mútua entre governo e os partidos que o apoiam vai aumentar, o que deve significar a ampliação das concessões aos parlamentares da base governista.
CARTADA NADA NOVA
Composição do novo ministério de Dilma segue orientada pelo fisiologismo.
Miguel Rosseto e o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante,
permanecem como homens de confiança da presidente
Um problema extra vai atormentar a presidente no próximo ano. Diferentemente do que aconteceu nas últimas eleições para presidente da Câmara, desta vez o candidato favorito, Eduardo Cunha (PMDB), não tem a simpatia do Planalto. Com isso, Dilma terá mais dificuldade de negociar com o Congresso, o que pode criar mais percalços para a governabilidade. Essa mudança na correlação de forças diminuiu o poder do PT no Parlamento e no governo, apesar de o partido manter o apetite por cargos.
A presidente Dilma também passou a campanha afirmando que, se fosse reeleita, o segundo mandato teria mais a sua cara, denunciando o excesso de interferência do PT e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos primeiros quatro anos de sua administração. O desejo de mais autonomia, porém, parece uma realidade distante de ser atingida. Apesar de publicamente Lula afirmar que o governo é de Dilma, o ex-presidente se movimenta para assumir o papel de articulador no Congresso. Nessa direção, Lula convocou parlamentares da bancada do PT na Câmara e no Senado para traçar estratégia de neutralização da oposição. Anseia ainda montar uma espécie de gabinete de crise.
Outra promessa de campanha foi a ampliação de mecanismos de transparência sobre as contas públicas. Na realidade, o governo se esforça para resguardar áreas sensíveis que despertam questionamentos da sociedade e da oposição. Assim como fez durante anos com a Petrobras, o Planalto trabalha para blindar as contas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do escrutínio público. O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) afirma que já esgotou as vias formais de solicitação de dados sobre financiamentos concedidos pelo BNDES a empreendimentos no exterior e defende a formação de uma comissão parlamentar de inquérito para analisar a aplicação dos recursos geridos pelo banco antes de o País se deparar com um novo escândalo da proporção do descoberto pela Operação Lava Jato. Pelas contas do senador tucano, o Tesouro repassou mais de R$ 400 bilhões para o caixa do BNDES para o financiamento de obras em vários países por intermédio de empreiteiras brasileiras. Também nesse tópico, os fatos demonstram que se deve ter pouca expectativa positiva em relação ao futuro.
Montagem sobre fotos de REUTERS/Ueslei Marcelino e Adriano Machado/Ag. Istoé
Novo governo nasce com cara de velho. A repetição de vícios do passado pode afastá-lo ainda mais dos anseios da sociedade
Josie Jeronimo
Durante a campanha eleitoral, a presidente Dilma Rousseff recheou o discurso com muitas promessas. Estabeleceu um eixo de 26 temas prioritários, garantindo ampliação de investimentos e pulso firme na administração pública para coibir a utilização política da máquina.
OUVIDOS MOUCOS
Dilma ignora o recado das urnas insistindo em erros
cometidos no governo anterior
As denúncias que atingiram a cúpula dos principais partidos que compõem a base do governo e o descontrole das contas públicas – que carregavam o peso de quatro anos de demãos de maquiagem – indicavam que a presidente teria que remontar sua equipe priorizando a qualidade técnica em detrimento ao loteamento político. A poucos dias de inaugurar o segundo mandato, no entanto, Dilma demonstra ignorar as opções para reabilitar o governo e acena para a continuidade de vícios que comprometeram seriamente o funcionamento do País nos primeiros quatro anos de sua administração. Na prática, fica a impressão de que, em 2015, teremos um governo novo com feição de velho.
O primeiro gesto de desalento se deu com o empenho do governo em obrigar o Congresso a alterar a meta de superávit de 2014 e reformar a Lei de Diretrizes Orçamentárias por meio de um projeto de lei. Em vez de apertar os cintos e imprimir responsabilidade aos gastos, o Parlamento acatou a orientação do Planalto e aprovou a mudança. Para aprovar essa flexibilização, o Planalto destinou R$ 748 mil de emendas para cada parlamentar. Nada mais evidente de que, em seu segundo mandato, Dilma continuará abraçada à velha estratégia do toma lá dá cá. Essa relação pouco republicana com o Legislativo tende a ficar ainda mais promíscua nos próximos meses com o avanço das investigações da Operação Lava Jato, que vai atingir em cheio a base aliada. Nesse cenário, a dependência mútua entre governo e os partidos que o apoiam vai aumentar, o que deve significar a ampliação das concessões aos parlamentares da base governista.
CARTADA NADA NOVA
Composição do novo ministério de Dilma segue orientada pelo fisiologismo.
Miguel Rosseto e o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante,
permanecem como homens de confiança da presidente
Um problema extra vai atormentar a presidente no próximo ano. Diferentemente do que aconteceu nas últimas eleições para presidente da Câmara, desta vez o candidato favorito, Eduardo Cunha (PMDB), não tem a simpatia do Planalto. Com isso, Dilma terá mais dificuldade de negociar com o Congresso, o que pode criar mais percalços para a governabilidade. Essa mudança na correlação de forças diminuiu o poder do PT no Parlamento e no governo, apesar de o partido manter o apetite por cargos.
A presidente Dilma também passou a campanha afirmando que, se fosse reeleita, o segundo mandato teria mais a sua cara, denunciando o excesso de interferência do PT e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos primeiros quatro anos de sua administração. O desejo de mais autonomia, porém, parece uma realidade distante de ser atingida. Apesar de publicamente Lula afirmar que o governo é de Dilma, o ex-presidente se movimenta para assumir o papel de articulador no Congresso. Nessa direção, Lula convocou parlamentares da bancada do PT na Câmara e no Senado para traçar estratégia de neutralização da oposição. Anseia ainda montar uma espécie de gabinete de crise.
Outra promessa de campanha foi a ampliação de mecanismos de transparência sobre as contas públicas. Na realidade, o governo se esforça para resguardar áreas sensíveis que despertam questionamentos da sociedade e da oposição. Assim como fez durante anos com a Petrobras, o Planalto trabalha para blindar as contas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do escrutínio público. O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) afirma que já esgotou as vias formais de solicitação de dados sobre financiamentos concedidos pelo BNDES a empreendimentos no exterior e defende a formação de uma comissão parlamentar de inquérito para analisar a aplicação dos recursos geridos pelo banco antes de o País se deparar com um novo escândalo da proporção do descoberto pela Operação Lava Jato. Pelas contas do senador tucano, o Tesouro repassou mais de R$ 400 bilhões para o caixa do BNDES para o financiamento de obras em vários países por intermédio de empreiteiras brasileiras. Também nesse tópico, os fatos demonstram que se deve ter pouca expectativa positiva em relação ao futuro.
Montagem sobre fotos de REUTERS/Ueslei Marcelino e Adriano Machado/Ag. Istoé
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