ZH 26 de outubro de 2014 | N° 17964
FLÁVIO TAVARES
A urna eletrônica é ágil e rápida – basta apertar o botão e o futuro aparece nos números dos nossos candidatos. O telefone celular e o computador nos deram tanta intimidade com as teclas, que a nova urna se tornou tão fácil quanto o cartão de crédito ou o caixa eletrônico dos bancos – tudo são números. Alguns candidatos exibem, até, seu número ao peito quando vão à TV, como se aquilo mostrasse o que são, substituindo as definições. Ou como se os algarismos interpretassem o passado ou garantissem as ações futuras. Ou como se a eleição virasse mapa astral que, com data e hora do nascimento, descobre o que somos, se seremos felizes e se teremos longa vida.
Mas a urna eletrônica tem um defeito: deveria falar e não fala! Deveria falar diretamente ao candidato escolhido, para dizer-lhe o que esperamos dele, já que ele próprio escondeu-se de nós durante a campanha eleitoral. Quase sempre, quem se mostrou foi o “marqueteiro” de aluguel, contratado por milhões, assoprando-lhe coisas, fazendo decorar como criança em jardim de infância. Ou como papagaio, que repete e repete sem saber que aquilo é monótona repetição.
Se a urna falasse e, a cada toque de botão, o candidato ouvisse nossa pergunta ou observação, um conheceria o outro. Não haveria o distanciamento de agora em que, passada a eleição, ninguém se lembra do que foi dito e prometido na campanha eleitoral.
Se a urna desse também a oportunidade de falar (e não só marcar números), os candidatos iriam perceber que eles não são o objeto do voto, ainda que assim pareça. O objeto do voto somos nós, eleitores.
Nós é que iremos suportar nossos governantes durante quatro anos. Nós é que somos donos do mandato dado aos governantes. Eles apenas comandam e guiam o que nós lhes outorgamos como eleitores. Quanto teríamos a dizer se na urna houvesse espaço para, pelo menos, um recado verbal ou um bilhetinho!
Por exemplo: os que confiam em Sartori perguntariam por que (na entrevista ao Portal Terra, na internet) ele confundiu o piso salarial do magistério com o piso da loja Tumelero, com que decoramos banheiros, cozinhas e adjacências. E indagariam se o deboche foi uma sátira equivocada do “marqueteiro” ou um lapso espontâneo do candidato. A educação de todos nós nasce na casa paterna, mas toma rumo definido, vida afora, pelas mãos das professoras e professores, num trabalho abnegado, responsável e pessimamente remunerado.
Os que confiam em Tarso perguntariam por que o governador não cumpriu as exigências do piso salarial das professoras, instituído por ele próprio quando ministro da Educação, anos atrás. Pela inércia do setor educacional estadual? Por falta de recursos financeiros? Mas governar significa ser criativo, “tirar leite das pedras”, obter recursos sem aumentar impostos. Foi assim que, no século passado, o jovem Leonel Brizola, como prefeito da Capital e governador, dotou o Rio Grande do melhor sistema de ensino do país.
A Loteria Estadual, extinta no governo Rigotto, do PMDB, não poderia ter sido fonte de renda para o ensino e a remuneração digna das professoras?
Que cada qual pense o que perguntar a Dilma e a Aécio, que muito se exibiram mas pouco se mostraram. Eu me limitaria a indagar por que não abordaram dois temas fundamentais:
1. Defender a vida impedindo a devastação do meio ambiente, que começa a pôr em risco a agricultura e nos deixará um planeta faminto em 50 anos.
2. Combater a drogadição e (mais ainda) o narcotráfico que alimenta o crime e é sinônimo de morte em vida.
Enquanto a urna não fale, porém, os números 13, 15, 45 e outros, serão apenas bons palpites para o jogo do bicho ou a Mega Sena acumulada.
Jornalista e escritor
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