ZH 19 de outubro de 2014 | N° 17957
FLÁVIO TAVARES
O que é mais pesado? Um quilo de uvas ou um quilo de bananas? Um quilo de algodão ou um de chumbo?
Estas perguntas da idade infantil despontam nos “debates” entre os candidatos a nos governarem como presidente da República e governador estadual, como se o óbvio tomasse conta da vida e voltássemos a interpretar o mundo com a ingenuidade das crianças.
A uma semana da eleição que decidirá sobre nossos futuros governantes, a cada dia sabemos menos deles, do que foram ou são, do que pensam ou pretendem. Os debates cara a cara na TV deveriam servir para esclarecer posições e posturas e, assim, desvendar o passado e dissipar dúvidas sobre o futuro para que o voto fosse escolha consciente, não um simples apertar de botões na urna eletrônica, acompanhado de um suspiro de pesar do tipo “tudo dá no mesmo...”.
Não merecemos esse exibicionismo em que ambos os lados se proclamam “o melhor” e o “único honesto” para tentar encurralar o outro, como se debater fosse uma ferina troca de empurrões e tiros verbais. Desapareceram os compromissos com grandes projetos para enfrentar temas cruciais. O aquecimento global e a destruição da vida no planeta são o grande desafio do século 21, mas nenhum candidato fala nisso nem pia sobre o meio ambiente.
Ou, na visão infantil sobre “o que pesa mais” (um quilo disso ou um quilo daquilo?), os candidatos não sabem que o aquecimento global incide na saúde humana, na produção de alimentos e na vida em si?
Em compensação, Aécio e Dilma se deleitem em mútuas acusações, em tolas brigas infantis, cada qual buscando mostrar que o outro é pior. Quando indaga sobre a “lei seca”, Dilma não quer saber o que Aécio pensa da proteção no trânsito, mas insinuar que ele é afeito à bebida. Quando ele pergunta sobre o irmão da presidente, não quer saber da família, mas dizer que também ela cultiva o nepotismo. Tudo se reduz a um bate-boca, como o dos casais em crise, à beira da separação, em que cada lado vomita os defeitos do outro, não para salvar coisa alguma, mas para destruir o que ainda reste.
No Rio Grande, tudo é similar, embora menos desrespeitoso. Em vez de projetos e compromissos, Tarso e Sartori recitam migalhas, como se governar fosse distribuir esmolas à porta da igreja, deixando o resto nas mãos de Santo Antônio. Faltam propostas concretas, mas sobram apelos à emoção infantil e até as mães dos candidatos surgem recomendando o filho.
Nada é maior do que a figura materna, mas indago: pretender transformá-las em meloso artifício de propaganda não será um jeito de os candidatos continuarem a nos ocultar o que são de fato? Afinal, que mãe deixará de falar bem do filho?
Na caça ao voto (guiados pelos “marqueteiros”, não por ideias do mundo), os candidatos se autotransformam em “heróis supremos”. Ignoram que, na eleição, o fundamental é o eleitor, não o voto, pois sem eleitor não há voto nem eleição. Portanto, os candidatos devem respeito ao eleitor.
Nada é mais desrespeitoso, porém, que esse entrevero de maldades ditas à meia-luz, em que os candidatos inventam e fantasiam, como se o eleitor fosse um boneco de ventríloquo, que faz de conta que opina, quando nem sequer fala nem tem voz.
Nadamos sobre denúncias de falcatruas aceleradas. No escândalo mais recente, o da Petrobras e grandes empresas de obras, agora aparece envolvido também o PSDB de Aécio, e não só o PT, o PMDB e o PP, que apoiam Dilma. Tudo está à vista, tal qual o ebola na África Ocidental, que só começou a ser combatido, no entanto, ao se alastrar como perigo letal por todo o planeta.
Mas, aqui, a única medida do “debate” eleitoral é saber se um quilo de uva pesa mais do que um quilo de banana!
Jornalista e escritor
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