REVISTA ISTO É N° Edição: 2342 | 10.Out.14
PF apreende R$ 116 mil em aeronave cujos passageiros têm ligações com o PT. Os planos de voo fazem a polícia suspeitar que o recurso possa ser caixa 2 de campanha
Claudio Dantas Sequeira
No início da noite da terça-feira 7, o turboélice King Air prefixo PR-PEG que havia partido de Belo Horizonte alcançou a cabeceira do aeroporto internacional de Brasília. Ao abordar a aeronave, a Polícia Federal encontrou R$ 116 mil em cédulas de R$ 100 e R$ 50 distribuídos em sacolas e mochilas. Três passageiros foram detidos: o empresário Benedito Oliveira Neto, o Bené, conhecido operador do PT mineiro, o segurança Pedro Medeiros e o jornalista Marcier Trombiere, ex-assessor do Ministério das Cidades, indicado pelo PP. Em depoimentos marcados por lacunas e contradições, alegaram que o dinheiro seria pagamento por serviços à campanha de Fernando Pimentel, eleito governador de Minas Gerais. Mas não apresentaram qualquer recibo ou nota fiscal. A PF abriu inquérito para apurar o caso. Os elementos colhidos até agora indicam que quase nada do que disseram os três ocupantes da aeronave é verdade. E levantam a suspeita de que os valores seriam sobra de caixa 2 destinados à campanha de Dilma Rousseff.
PROCEDÊNCIA SUSPEITA
Donos de avião que levava pessoas ligadas ao PT seriam
laranjas de Bené, conhecido operador do partido
Os investigadores já têm uma pista importante: o King Air não foi fretado pelo grupo. Registrado na Anac na categoria de “serviço aéreo privado”, em nome da empresa Bridge Participações, teria como verdadeiro proprietário o próprio Bené. A Bridge tem como presidente Ricardo Santos Guedes, um advogado de 38 anos que se apresenta como “representante” da Gráfica e Editora Brasil, que pertence ao empresário mineiro. Guedes, seu irmão Alexandre e Cleusa Centeno dos Santos, possível parente de ambos, participam da composição acionária de mais sete empresas de diferentes ramos, como publicidade e propaganda, mineração, construção civil e consultorias.
Apesar do “sucesso empresarial”, nenhum dos dois irmãos possui sequer um veículo, nem mesmo um carro popular. Cleusa, que tem em seu nome um Gol 1999, um Fiat 2000 e outro Gol 2012, não possui habilitação. Além disso, ela viveria numa casa de baixa renda localizada em Canoas (RS). Alexandre e Ricardo, por sua vez, têm endereço nos bairros Asa Norte e Sudoeste, em Brasília. Mas não foram localizados pela reportagem. Para a PF, eles seriam “laranjas” de Bené. Na opinião de uma autoridade ligada à investigação, registrar a aeronave em nome de uma empresa integrada por pessoas interpostas pode significar tentativa de ocultação de patrimônio.
O caso fica ainda mais complexo quando se analisa o relatório dos planos de voo registrados no prefixo PR-PEG do King Air de Bené. Vê-se que o turboélice cumpriu uma intensa agenda de campanha entre 14 de julho e 7 de outubro, e que cobriu o trecho entre Brasília e Belo Horizonte diversas vezes. O avião também percorreu o interior de Minas, usando pequenas pistas de pouso. Diferentemente dos jatos, o turboélice é uma aeronave versátil por ser capaz de pousar até em estradas de terra.
Alguns voos coincidem com comícios de Pimentel. Em 1º de agosto, por exemplo, o então candidato ao governo de Minas participou de comício em Montes Claros com a presença de Dilma e Lula. Os planos de voo também registram em agosto visitas às cidades mineiras de Juiz de Fora, Uberaba, Tatuí e Divinópolis. A PF agora quer confirmar quais voos de fato ocorreram, se possível saber quem embarcou e se houve transporte de valores em outras oportunidades.
Fontes ligadas à campanha de Pimentel informaram à ISTOÉ que o candidato usou duas aeronaves na eleição, sendo uma delas a de Bené. A assessoria de imprensa de Fernando Pimentel disse que o candidato não contratou serviço de táxi-aéreo de Bené e não utilizou a aeronave citada para nenhum deslocamento. A mesma fonte disse que o King Air também transportou o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto. Por meio da assessoria de imprensa, Okamoto disse que nem ele nem o ex-presidente viajaram no referido avião. Afirmou ainda que nem sequer conhece Bené. O empresário também não foi localizado para comentar o caso.
Não será surpresa se a PF descobrir que a aeronave atendeu caciques do PT e da campanha de Dilma, uma vez que Bené tornou-se uma eminência parda na cúpula petista. Em 2010, o empresário envolveu-se na frustrada montagem de um dossiê contra o candidato tucano José Serra, que concorreu com a petista. Bené também foi quem pagou o aluguel da mansão que serviu como QG da campanha de Dilma no Lago Sul.
O empresário mineiro foi apresentado a Pimentel pelo ex-deputado Virgílio Guimarães, o mesmo que levou o publicitário Marcos Valério ao ex-ministro José Dirceu. Não por acaso, Bené ascendeu empresarialmente justamente após o escândalo do mensalão e a queda de Valério. Seu nome chegou a estar associado a 11 empresas simultaneamente, sendo a principal delas a Gráfica e Editora Brasil. Até 2004, seus rendimentos não superavam R$ 400 mil. Mas essa realidade mudou bastante. De 2005 até hoje, as empresas de Bené faturaram em contratos com o governo do PT cerca de R$ 300 milhões, 70% desse valor só com a gráfica. Para se defender no TCU, o empresário contratou o escritório de Erenice Guerra, ex-ministra da Casa Civil e braço direito de Dilma.
Para administrar tantas frentes de atuação, Bené costuma repassar o controle de suas empresas a terceiros. Isso foi feito com a Projects Brasil, que em 2011 assumiu a digitalização de documentos do Ministério das Cidades, então comandado por Mario Negromonte. Além de emplacar o contrato, Bené ainda conseguiu que Negromonte nomeasse um ex-funcionário seu na função estratégica de coordenador-geral de modernização e informática. Outro aliado nas Cidades era o então chefe da comunicação, Marcier Trombiere, que estava no avião. Trombiere deixou o cargo a convite de Bené. Trombiere, segundo a assessoria de Pimentel, atuou na comunicação da campanha. Já a Gráfica e Editora Brasil prestou serviços gráficos. “As despesas serão declaradas na prestação de contas final”, informou em nota. Seja como for, nada se falou sobre o empréstimo do avião. Convocados pela PF, piloto e copilotos foram orientados a permanecer em silêncio.
PF apreende R$ 116 mil em aeronave cujos passageiros têm ligações com o PT. Os planos de voo fazem a polícia suspeitar que o recurso possa ser caixa 2 de campanha
Claudio Dantas Sequeira
No início da noite da terça-feira 7, o turboélice King Air prefixo PR-PEG que havia partido de Belo Horizonte alcançou a cabeceira do aeroporto internacional de Brasília. Ao abordar a aeronave, a Polícia Federal encontrou R$ 116 mil em cédulas de R$ 100 e R$ 50 distribuídos em sacolas e mochilas. Três passageiros foram detidos: o empresário Benedito Oliveira Neto, o Bené, conhecido operador do PT mineiro, o segurança Pedro Medeiros e o jornalista Marcier Trombiere, ex-assessor do Ministério das Cidades, indicado pelo PP. Em depoimentos marcados por lacunas e contradições, alegaram que o dinheiro seria pagamento por serviços à campanha de Fernando Pimentel, eleito governador de Minas Gerais. Mas não apresentaram qualquer recibo ou nota fiscal. A PF abriu inquérito para apurar o caso. Os elementos colhidos até agora indicam que quase nada do que disseram os três ocupantes da aeronave é verdade. E levantam a suspeita de que os valores seriam sobra de caixa 2 destinados à campanha de Dilma Rousseff.
PROCEDÊNCIA SUSPEITA
Donos de avião que levava pessoas ligadas ao PT seriam
laranjas de Bené, conhecido operador do partido
Os investigadores já têm uma pista importante: o King Air não foi fretado pelo grupo. Registrado na Anac na categoria de “serviço aéreo privado”, em nome da empresa Bridge Participações, teria como verdadeiro proprietário o próprio Bené. A Bridge tem como presidente Ricardo Santos Guedes, um advogado de 38 anos que se apresenta como “representante” da Gráfica e Editora Brasil, que pertence ao empresário mineiro. Guedes, seu irmão Alexandre e Cleusa Centeno dos Santos, possível parente de ambos, participam da composição acionária de mais sete empresas de diferentes ramos, como publicidade e propaganda, mineração, construção civil e consultorias.
Apesar do “sucesso empresarial”, nenhum dos dois irmãos possui sequer um veículo, nem mesmo um carro popular. Cleusa, que tem em seu nome um Gol 1999, um Fiat 2000 e outro Gol 2012, não possui habilitação. Além disso, ela viveria numa casa de baixa renda localizada em Canoas (RS). Alexandre e Ricardo, por sua vez, têm endereço nos bairros Asa Norte e Sudoeste, em Brasília. Mas não foram localizados pela reportagem. Para a PF, eles seriam “laranjas” de Bené. Na opinião de uma autoridade ligada à investigação, registrar a aeronave em nome de uma empresa integrada por pessoas interpostas pode significar tentativa de ocultação de patrimônio.
O caso fica ainda mais complexo quando se analisa o relatório dos planos de voo registrados no prefixo PR-PEG do King Air de Bené. Vê-se que o turboélice cumpriu uma intensa agenda de campanha entre 14 de julho e 7 de outubro, e que cobriu o trecho entre Brasília e Belo Horizonte diversas vezes. O avião também percorreu o interior de Minas, usando pequenas pistas de pouso. Diferentemente dos jatos, o turboélice é uma aeronave versátil por ser capaz de pousar até em estradas de terra.
Alguns voos coincidem com comícios de Pimentel. Em 1º de agosto, por exemplo, o então candidato ao governo de Minas participou de comício em Montes Claros com a presença de Dilma e Lula. Os planos de voo também registram em agosto visitas às cidades mineiras de Juiz de Fora, Uberaba, Tatuí e Divinópolis. A PF agora quer confirmar quais voos de fato ocorreram, se possível saber quem embarcou e se houve transporte de valores em outras oportunidades.
Fontes ligadas à campanha de Pimentel informaram à ISTOÉ que o candidato usou duas aeronaves na eleição, sendo uma delas a de Bené. A assessoria de imprensa de Fernando Pimentel disse que o candidato não contratou serviço de táxi-aéreo de Bené e não utilizou a aeronave citada para nenhum deslocamento. A mesma fonte disse que o King Air também transportou o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamoto. Por meio da assessoria de imprensa, Okamoto disse que nem ele nem o ex-presidente viajaram no referido avião. Afirmou ainda que nem sequer conhece Bené. O empresário também não foi localizado para comentar o caso.
Não será surpresa se a PF descobrir que a aeronave atendeu caciques do PT e da campanha de Dilma, uma vez que Bené tornou-se uma eminência parda na cúpula petista. Em 2010, o empresário envolveu-se na frustrada montagem de um dossiê contra o candidato tucano José Serra, que concorreu com a petista. Bené também foi quem pagou o aluguel da mansão que serviu como QG da campanha de Dilma no Lago Sul.
O empresário mineiro foi apresentado a Pimentel pelo ex-deputado Virgílio Guimarães, o mesmo que levou o publicitário Marcos Valério ao ex-ministro José Dirceu. Não por acaso, Bené ascendeu empresarialmente justamente após o escândalo do mensalão e a queda de Valério. Seu nome chegou a estar associado a 11 empresas simultaneamente, sendo a principal delas a Gráfica e Editora Brasil. Até 2004, seus rendimentos não superavam R$ 400 mil. Mas essa realidade mudou bastante. De 2005 até hoje, as empresas de Bené faturaram em contratos com o governo do PT cerca de R$ 300 milhões, 70% desse valor só com a gráfica. Para se defender no TCU, o empresário contratou o escritório de Erenice Guerra, ex-ministra da Casa Civil e braço direito de Dilma.
Para administrar tantas frentes de atuação, Bené costuma repassar o controle de suas empresas a terceiros. Isso foi feito com a Projects Brasil, que em 2011 assumiu a digitalização de documentos do Ministério das Cidades, então comandado por Mario Negromonte. Além de emplacar o contrato, Bené ainda conseguiu que Negromonte nomeasse um ex-funcionário seu na função estratégica de coordenador-geral de modernização e informática. Outro aliado nas Cidades era o então chefe da comunicação, Marcier Trombiere, que estava no avião. Trombiere deixou o cargo a convite de Bené. Trombiere, segundo a assessoria de Pimentel, atuou na comunicação da campanha. Já a Gráfica e Editora Brasil prestou serviços gráficos. “As despesas serão declaradas na prestação de contas final”, informou em nota. Seja como for, nada se falou sobre o empréstimo do avião. Convocados pela PF, piloto e copilotos foram orientados a permanecer em silêncio.
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