País terá novo modelo de classes sociais a partir de janeiro de 2014. Pelo sistema de estratificação que será adotado, cresce o número de brasileiros mais ricos e mais pobres, as atuais classes A e E. Classificação leva em conta, por exemplo, localização geográfica e renda permanente da família
SÉRGIO VIEIRA
O GLOBO
Atualizado:12/08/13 - 8h55
Consumo: Aumento da renda inchou a classe média, que deve diminuir, pelo novo critério Pablo Jacob / Agência O Globo/2009
RIO - O ganho de renda da população nos últimos anos e a tão falada ascensão da classe C jogou luz sobre o modelo de estratificação social no Brasil. Em uma década, quase 30 milhões de pessoas foram incluídos num mesmo caldeirão chamado “classe média”. Em uma tentativa de se corrigir distorções criadas pela atual classificação, que é utilizada pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), os professores Wagner A. Kamakura (Rice University) e José Afonso Mazzon (FEA-USP) formularam um novo modelo.
A nova proposta, que será oficialmente adotada pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep) a partir de janeiro de 2014, aumenta o número de brasileiros no grupo considerado Pobre e Extremamente Pobre, parcela da população chamada atualmente de classe E. Há um salto de 13,94 milhões de brasileiros (7,3%) para 29,6 milhões (15,5%), enquanto a atual classe D recua de 62,6 milhões de pessoas (32,9%) para 42,9 milhões (22,5%).
Na outra ponta, no critério atual, as classes mais ricas (A1 e A2) representam apenas 1,8% da população brasileira e 8,7% do total dos gastos das famílias brasileiras. Pelo novo critério, o estrato mais rico (estrato 1) fica maior: com 2,8% dos brasileiros e 15,6% do total de gastos dos domicílios brasileiros. Entre as duas, a classe média, no critério atual, representa 58% da população (quase 110 milhões de pessoas). No novo critério, este grupo tem leve recuo, para 55,9% dos brasileiros (perto de 106 milhões).
Para desenvolver o novo modelo de estratificação, retratado com detalhes no livro “Estratificação Socioeconômica e Consumo no Brasil”, a ser lançado no dia 15 de agosto em São Paulo, os professores se valeram do conceito teórico da “renda permanente”. Segundo eles, a “renda permanente” é mais importante do que a “renda corrente” — que é flutuante —, porque a população tenta manter o mesmo padrão de consumo ao longo do tempo, mesmo que temporariamente sofra mudança drástica na renda corrente. Neste cenário, passa a utilizar a poupança, créditos ou outros investimentos para manter o mesmo padrão. Na atual classificação, utilizada pela SAE, o critério é o da “renda corrente”.
Outra mudança é a diferenciação das classes sociais no território brasileiro. É ajustado pela composição familiar (número de adultos e de crianças/adolescentes) e pela geografia (região geográfica e localização do domicílio). Vale dizer, o estrato socioeconômico pode ser diferente em função da localização do domicílio (geografia) e da quantidade de pessoas residentes no domicílio (composição familiar).
— Este sistema é inovador. Nenhum critério oficial de classificação socioeconômica no mundo utiliza região e local de residência (chamadas de covariáveis) e nem faz a correção por composição familiar. Uma família com renda de R$ 2.000 em São Paulo terá grandes desafios para se sustentar, enquanto este valor no interior da Amazônia já dá certo conforto — afirma Mazzon.
Ao todo, são consideradas 35 variáveis: de natureza geográfica, demográfica, cultural, além da aquisição de bens, itens e acesso a serviços essenciais de conforto doméstico e da rede pública. Os dados da Pesquisa Orçamento Familiar (POF) também foram utilizados no projeto.
No modelo atual, há uma grande dispersão quando o quesito analisado dentro da mesma classe social é a renda. No topo da pirâmide brasileira (A1), cuja renda média é de R$ 12 mil, há famílias com renda total de R$ 9.000 ao mês até quem recebe mais de R$ 1 milhão. Ressalva importante: quando um pesquisador pergunta a renda, é apenas para fins estatísticos. Na realidade, governos, empresas e outras instituições levam muito mais em consideração a quantidade de bens, grau de instrução e acesso a serviços para classificar um indivíduo em determinado estrato social pois conseguem mensurar indiretamente se o entrevistado declarou a renda de forma correta.
— Não tem muita saída quando se analisa do ponto de vista de renda. Estas distorções vão ocorrer. É por isso que a nova classe média, por exemplo, está classificada como classe média, mas sua renda efetiva é muito baixa – analisa Fernando de Holanda Barbosa Filho, professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).
— Qualquer estudo que proponha diminuir distorções entre a população é válido — afirma Waldir Quadros, professor do Instituto de Economia da Unicamp e especialista em estrutura social. — Quando a gente faz uma regressão de qualquer variável da POF, Pnad e Censo, o resultado sempre estará relacionado à renda. Incluir covariáveis como região, cultura e religião pode ser útil para analisar cenários e extrair outros resultados, que poderão, por exemplo, ser usados por publicitários.
O sistema foi premiado pelo Marketing Science Institute como o melhorpaper da edição especial sobre “Marketing em Mercados Emergentes”, durante a 42ª reunião da Associação Europeia de Marketing (EMAC), em junho, em Istambul (Turquia). Foi premiado por uma entidade de marketing porque, além de identificar novos estratos socioeconômicos, o material analisa o comportamento do consumidor em cada estrato, em termos de consumo e prioridades de consumo.
Atualizado:12/08/13 - 8h55
Consumo: Aumento da renda inchou a classe média, que deve diminuir, pelo novo critério Pablo Jacob / Agência O Globo/2009
RIO - O ganho de renda da população nos últimos anos e a tão falada ascensão da classe C jogou luz sobre o modelo de estratificação social no Brasil. Em uma década, quase 30 milhões de pessoas foram incluídos num mesmo caldeirão chamado “classe média”. Em uma tentativa de se corrigir distorções criadas pela atual classificação, que é utilizada pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), os professores Wagner A. Kamakura (Rice University) e José Afonso Mazzon (FEA-USP) formularam um novo modelo.
A nova proposta, que será oficialmente adotada pela Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep) a partir de janeiro de 2014, aumenta o número de brasileiros no grupo considerado Pobre e Extremamente Pobre, parcela da população chamada atualmente de classe E. Há um salto de 13,94 milhões de brasileiros (7,3%) para 29,6 milhões (15,5%), enquanto a atual classe D recua de 62,6 milhões de pessoas (32,9%) para 42,9 milhões (22,5%).
Na outra ponta, no critério atual, as classes mais ricas (A1 e A2) representam apenas 1,8% da população brasileira e 8,7% do total dos gastos das famílias brasileiras. Pelo novo critério, o estrato mais rico (estrato 1) fica maior: com 2,8% dos brasileiros e 15,6% do total de gastos dos domicílios brasileiros. Entre as duas, a classe média, no critério atual, representa 58% da população (quase 110 milhões de pessoas). No novo critério, este grupo tem leve recuo, para 55,9% dos brasileiros (perto de 106 milhões).
Para desenvolver o novo modelo de estratificação, retratado com detalhes no livro “Estratificação Socioeconômica e Consumo no Brasil”, a ser lançado no dia 15 de agosto em São Paulo, os professores se valeram do conceito teórico da “renda permanente”. Segundo eles, a “renda permanente” é mais importante do que a “renda corrente” — que é flutuante —, porque a população tenta manter o mesmo padrão de consumo ao longo do tempo, mesmo que temporariamente sofra mudança drástica na renda corrente. Neste cenário, passa a utilizar a poupança, créditos ou outros investimentos para manter o mesmo padrão. Na atual classificação, utilizada pela SAE, o critério é o da “renda corrente”.
Outra mudança é a diferenciação das classes sociais no território brasileiro. É ajustado pela composição familiar (número de adultos e de crianças/adolescentes) e pela geografia (região geográfica e localização do domicílio). Vale dizer, o estrato socioeconômico pode ser diferente em função da localização do domicílio (geografia) e da quantidade de pessoas residentes no domicílio (composição familiar).
— Este sistema é inovador. Nenhum critério oficial de classificação socioeconômica no mundo utiliza região e local de residência (chamadas de covariáveis) e nem faz a correção por composição familiar. Uma família com renda de R$ 2.000 em São Paulo terá grandes desafios para se sustentar, enquanto este valor no interior da Amazônia já dá certo conforto — afirma Mazzon.
Ao todo, são consideradas 35 variáveis: de natureza geográfica, demográfica, cultural, além da aquisição de bens, itens e acesso a serviços essenciais de conforto doméstico e da rede pública. Os dados da Pesquisa Orçamento Familiar (POF) também foram utilizados no projeto.
No modelo atual, há uma grande dispersão quando o quesito analisado dentro da mesma classe social é a renda. No topo da pirâmide brasileira (A1), cuja renda média é de R$ 12 mil, há famílias com renda total de R$ 9.000 ao mês até quem recebe mais de R$ 1 milhão. Ressalva importante: quando um pesquisador pergunta a renda, é apenas para fins estatísticos. Na realidade, governos, empresas e outras instituições levam muito mais em consideração a quantidade de bens, grau de instrução e acesso a serviços para classificar um indivíduo em determinado estrato social pois conseguem mensurar indiretamente se o entrevistado declarou a renda de forma correta.
— Não tem muita saída quando se analisa do ponto de vista de renda. Estas distorções vão ocorrer. É por isso que a nova classe média, por exemplo, está classificada como classe média, mas sua renda efetiva é muito baixa – analisa Fernando de Holanda Barbosa Filho, professor de economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).
— Qualquer estudo que proponha diminuir distorções entre a população é válido — afirma Waldir Quadros, professor do Instituto de Economia da Unicamp e especialista em estrutura social. — Quando a gente faz uma regressão de qualquer variável da POF, Pnad e Censo, o resultado sempre estará relacionado à renda. Incluir covariáveis como região, cultura e religião pode ser útil para analisar cenários e extrair outros resultados, que poderão, por exemplo, ser usados por publicitários.
O sistema foi premiado pelo Marketing Science Institute como o melhorpaper da edição especial sobre “Marketing em Mercados Emergentes”, durante a 42ª reunião da Associação Europeia de Marketing (EMAC), em junho, em Istambul (Turquia). Foi premiado por uma entidade de marketing porque, além de identificar novos estratos socioeconômicos, o material analisa o comportamento do consumidor em cada estrato, em termos de consumo e prioridades de consumo.
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