VOTO ZERO significa não votar em fichas-sujas; omissos; corruptos; corruptores; farristas com dinheiro público; demagogos; dissimulados; ímprobos; gazeteiros; submissos às lideranças; vendedores de votos; corporativistas; nepotistas; benevolentes com as ilicitudes; condescendentes com a bandidagem; promotores da insegurança jurídica e coniventes com o descalabro da justiça criminal, que desvalorizam os policiais, aceitam a morosidade da justiça, criam leis permissivas; enfraquecem as leis e a justiça, traem seus eleitores; não representam o povo e se lixam para a população.

domingo, 29 de março de 2015

FINANCIAMENTO ELEITORAL SEM SOMBRAS

 ZERO HORA 29 de março de 2015 | N° 18116


JULIANA BUBLITZ


POLÍTICA. NOVO RUMO ÀS CAMPANHAS

CORRUPÇÃO E LAVAGEM DE DINHEIRO, práticas escancaradas pela investigação de desvio de recursos na Petrobras, evidenciam a necessidade de renovar as normas do sistema eleitoral


O escândalo de corrupção na Petrobras reacendeu uma antiga discussão, que já não pode mais ser adiada: a necessidade de mudanças no sistema de financiamento de campanhas no Brasil. Procuradores e policiais federais envolvidos na investigação não têm dúvidas de que empresas distribuíram propina na forma de contribuição eleitoral, em troca de favorecimento em licitações. Seriam as “doações-camaleão”, nas palavras do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força- tarefa da Operação Lava-Jato.

Ou seja, a engrenagem desenhada para financiar a democracia no país dá margem a irregularidades (como a lavagem de dinheiro) e a distorções (como a influência de grandes corporações nas eleições).

Ao permitir depósitos privados sem fixar um teto nominal, o sistema estimula a competição desmedida por recursos. Candidatos acostumaram-se à lógica perversa do “se elege quem tem maior caixa”, e o resultado são campanhas com custos estratosféricos. Na avaliação do cientista político Wagner Mancuso, da Universidade de São Paulo (USP), o país vive um dilema. Se há consenso de que o atual modelo não serve mais, sobram dúvidas sobre qual seria a melhor opção.

– As pessoas querem coisas contraditórias: cortar o financiamento empresarial e, ao mesmo tempo, não colocar verba pública. É um diálogo de surdos. No fundo, não dá para mudar sem mexer no sistema eleitoral – diagnostica Mancuso.

Diferentes projetos e ideias estão em debate. Há quem defenda a adoção do financiamento exclusivamente público, quem admita a participação de pessoas físicas e quem assuma manter o formato atual, mas com a imposição de limites capazes de dissipar a interferência empresarial. Todos têm argumentos robustos, contra e a favor.

Um deles tem o endosso de mais de cem entidades, 600 mil assinaturas de apoio, é subscrito por dezenas de deputados e é iniciativa dos mesmos criadores da Lei da Ficha Limpa. Está no grupo dos adeptos do fim das doações de empresas.

– Na atual configuração, a relação do setor privado com o político não termina com a eleição. O tesoureiro não vai dizer para o empresário: “Olha, terminou o pleito, agora a gente não conversa mais”. É o contrário. E é por isso que defendemos mudanças – afirma Luciano Santos, cofundador e codiretor do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).

O sociólogo Wagner Romão, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), e o cientista político Bruno Speck, da USP, propõem algo parecido. Para eles, há duas saídas: estimular a participação dos cidadãos, permitindo o abatimento no Imposto de Renda, e criar um fundo complementar, em que o Estado cubra os valores doados. Em teoria, isso obrigaria as siglas a correr atrás dos eleitores não apenas na hora do voto. Forçaria uma reaproximação e, quem sabe, remediaria a crise de representação.

Mas não há qualquer garantia de que afastar as corporações extinguiria o caixa 2. E esse talvez seja o principal complicador da discussão, porque nenhum modelo está livre de desvios e de contradições.

– Não cabe ter ilusões de que poderemos chegar a um sistema 100% limpo e democrático. Política é luta. Não cabe esperar fair- play universal – sintetiza o cientista político Bruno Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais.





ENTREVISTA

“A corrupção está vinculada às doações de campanha”


MARCIA RIBEIRO DIAS, Cientista política


Professora da Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), Marcia Ribeiro Dias é uma defensora convicta do financiamento público de campanha, aliado a doações limitadas de pessoas físicas. Confira os argumentos.

Por que o financiamento público é a melhor opção?

A corrupção é um problema sério no Brasil e está o tempo todo, de alguma maneira, vinculada às doações de campanha. O financiamento público exclusivo é o mais recomendado. Poderia até haver doação de pessoa física também, desde que fosse vinculada ao CPF, declarada no Imposto de Renda e que tivesse um teto. Com o fim das doações empresariais, as campanhas deixariam de ser faraônicas.


As campanhas ficariam mais simples?

Sim. Se você olhar outros países com financiamento público, a maioria tem campanhas muito mais modestas, e os partidos fazem um trabalho de formiguinha, com gente na rua para conquistar votos. É assim que se faz política e que se convence as pessoas. A contribuição seria enorme para a qualidade da nossa democracia.


E o caixa 2?

Continuaria existindo, como existe no mundo inteiro, mas em escala reduzida. Hoje, com o financiamento misto, existem várias maneiras de mascarar o recebimento de recursos não contabilizados. Já a mudança no sistema tornaria público quanto cada partido ganha do Estado. Isso evitaria os excessos.


Novos partidos não teriam mais dificuldades para se estabelecer?

Já temos partidos suficientes. Não estamos carecendo disso. Se isso acontecesse, eu até diria “que bom”.


O custo das eleições não sairia mais alto para o contribuinte?

Gastaríamos muito menos com o financiamento público do que se gasta com corrupção. Mas é claro que teríamos de botar um limite. O custo das campanhas teria de ser reduzido, e os partidos teriam de parar de valorizar o espetáculo para começar a valorizar o conteúdo.




ENTREVISTA


“É errado jogar todo o peso da corrupção nos doadores”

RODOLFO VIANA PEREIRA, Especialista em Direito Eleitoral



Coordenador Grupo de Estudos sobre Constituição e Política da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Rodolfo Viana Pereira é um defensor da doação de empresas, desde que com limites claros. Confira os argumentos.


Por que as doações de empresas devem ser mantidas?

O Brasil está vivendo uma fase em que parece que todo problema é do doador eleitoral, o que é uma mentira. É errado jogar todo o peso da corrupção nos doadores e apontar o financiamento público como solução. O que precisamos é de ajuste, não de revolução.


Qual seria a saída?

O financiamento misto, tal como existe hoje, mas com uma alteração importantíssima. Hoje, a empresa pode doar até 2% do faturamento bruto, o que parece isonômico, mas não é. Empresas ricas influenciam demais. Deveríamos limitar essa doação a um teto com valor nominal, por CNPJ. Por exemplo: cada empresa poderia doar no máximo R$ 300 mil.

Isso não perpetuaria a influência do poder econômico?

Não. Eleição tem custo, as empresas têm interesses e é legítimo que tenham. A questão é haver controle e transparência. Esse ajuste teria o mérito de pulverizar a influência dessas grandes corporações e acabaria gerando um fluxo menor de recursos nas campanhas. A limitação deveria valer, também, para pessoas físicas.


E o caixa 2?

Na eleição que resultou no im- peachment de Fernando Collor, ainda era proibida a doação de empresas, e a resposta ao escândalo foi justamente a liberação do financiamento por pessoas jurídicas. O que houve, na época, foi o uso de recursos não contabilizados, de caixa 2. O problema é que a gente perde a memória.


Mas as campanhas não ficariam mais simples e baratas?

Não é bem assim. O volume global do caixa 1 pode até diminuir, mas o caixa 2 sairia do controle e surgiriam outros problemas, como perda de autonomia dos partidos. Eles tenderiam a ser equiparados a entes públicos



ENTREVISTA

“Financiamento público não foi suficiente na Espanha”

ANA CLAUDIA SANTANO, Especialistas em Ciências Jurídicas e Políticas


Autora do livro O Financiamento da Política - Teoria Geral e Experiências no Direito Comparado, Ana Claudia Santano fez mestrado e doutorado na Universidade de Salamanca, na Espanha, onde estudou o sistema de financiamento eleitoral e partidário do país.

O que o Brasil pode aprender com os espanhóis?

Muito. Eles debateram se as doações privadas seriam ou não saudáveis para os partidos e as campanhas, e terminaram por restringi-las ao máximo, por acreditar que assim combateriam a corrupção. Na prática, não funcionou. O financiamento público não foi suficiente para substituir as doações de empresas.


O que aconteceu?

Afundados em dívidas, os partidos seguiram buscando doações privadas. Só que o sistema passou a ser tão restrito que invariavelmente surgiram irregularidades. Além disso, os partidos se sentiram confortáveis dentro do Estado e pararam de abrir espaço para a sociedade. Houve um distanciamento gradual. Hoje, o desgaste político é enorme na Espanha.

Algum país conseguiu chegar a um modelo equilibrado?

A Alemanha, mas os alemães realmente acreditam que a política é necessária e deve ser fomentada. Lá, se o partido consegue convencer o militante a pagar uma cota anual, ele ganha uma contrapartida do Estado e tem a chance de ampliar seus recursos. Isso promove mobilização e aproxima os partidos das pessoas, que realmente se envolvem. A democracia gira. É isso que a gente não está pensando aqui.

Mas acabou a corrupção no país?

Claro que não. É por isso que mudar o sistema de financiamento não é a solução para a corrupção. Precisamos ir além e não podemos cair no discurso moralizador que querem transmitir com a reforma política, como ocorreu na Espanha, porque isso pode piorar as coisas.




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