EDITORIAL
CULTURA DA FRAUDE
A Constituição Federal determina, em seu Artigo 37, que o ingresso nos quadros do serviço público se dará por meio de concurso público, ressalvadas exceções como nomeação para cargo em comissão e contratação temporária por motivo de excepcional interesse público. Pretendeu assim o constituinte delimitar de forma peremptória a fronteira entre o público e o privado no provimento de cargos e funções de natureza estatal. Fechava-se, assim, a porta ao carnaval de nomeações, especialmente de parentes, apadrinhados e amigos, que caracterizou os inícios do Estado brasileiro e constitui prática arraigada e definidora da própria natureza de nossas relações políticas. O concurso de provas e títulos, franqueado a todos os cidadãos, sem distinção de meios, é um dos baluartes da impessoalidade no serviço público. Não é de estranhar, portanto, que contra essa instituição, liberal e moderna por excelência, continue se erguendo a parcela da sociedade brasileira voltada para o compadrismo, o patrimonialismo e a obscuridade.
Foi justamente esse segmento da sociedade o maior derrotado na recente operação da Polícia Federal que desbaratou um esquema de fraudes em concursos públicos que atingia, entre outros órgãos, a Receita Federal, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a própria PF. Um total de 282 pessoas foram indiciadas e 62 servidores foram afastados de suas funções ou impedidos de tomar posse em face das conclusões da investigação. A quadrilha foi identificada a partir da chamada Operação Tormenta, destinada a apurar fraudes em concursos públicos e em exames da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
É de se enfatizar que, ao refinamento dos métodos dos criminosos, corresponde um consequente avanço nos mecanismos de investigação das autoridades. Na Operação Tormenta, a Polícia Federal lançou mão de um software chamado Sistema de Prospecção e Análise de Desvios em Exames. O programa de computador permite rastrear desvios de respostas de candidatos em provas de concurso e apontar quais têm mais probabilidade de ter utilizado gabaritos obtidos de forma ilegal. As informações levantadas pelo software serviram de base para a investigação policial. Dados estatísticos resultantes do levantamento também foram analisados por peritos criminais.
Conclui-se que, entre tantos avanços democráticos ainda não assimilados pelas parcelas mais atrasadas da sociedade brasileira, o concurso público é um dos que passam a merecer atenção das autoridades. Recentemente, reportagem da RBS TV mostrou um esquema de fraudes em concursos de prefeituras no interior do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Não se pode admitir que organizações criminosas assumam o controle de um mecanismo de caráter cidadão como a seleção pública daqueles que têm por missão zelar pelo que é de todos. O antropólogo Roberto DaMatta escreveu: “Não há brasileiro que nunca tenha usado o ‘você sabe com quem está falando?’ diante de uma lei universal e do risco de uma universalização que acabaria transformando sua figura moral num mero número ou entidade anônima”. O concurso é dispositivo ao qual não compete, a bem do serviço público, saber com quem está falando. É por isso que as culturas da fraude e da impunidade se dão as mãos para solapá-lo.
CULTURA DA FRAUDE
A Constituição Federal determina, em seu Artigo 37, que o ingresso nos quadros do serviço público se dará por meio de concurso público, ressalvadas exceções como nomeação para cargo em comissão e contratação temporária por motivo de excepcional interesse público. Pretendeu assim o constituinte delimitar de forma peremptória a fronteira entre o público e o privado no provimento de cargos e funções de natureza estatal. Fechava-se, assim, a porta ao carnaval de nomeações, especialmente de parentes, apadrinhados e amigos, que caracterizou os inícios do Estado brasileiro e constitui prática arraigada e definidora da própria natureza de nossas relações políticas. O concurso de provas e títulos, franqueado a todos os cidadãos, sem distinção de meios, é um dos baluartes da impessoalidade no serviço público. Não é de estranhar, portanto, que contra essa instituição, liberal e moderna por excelência, continue se erguendo a parcela da sociedade brasileira voltada para o compadrismo, o patrimonialismo e a obscuridade.
Foi justamente esse segmento da sociedade o maior derrotado na recente operação da Polícia Federal que desbaratou um esquema de fraudes em concursos públicos que atingia, entre outros órgãos, a Receita Federal, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e a própria PF. Um total de 282 pessoas foram indiciadas e 62 servidores foram afastados de suas funções ou impedidos de tomar posse em face das conclusões da investigação. A quadrilha foi identificada a partir da chamada Operação Tormenta, destinada a apurar fraudes em concursos públicos e em exames da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
É de se enfatizar que, ao refinamento dos métodos dos criminosos, corresponde um consequente avanço nos mecanismos de investigação das autoridades. Na Operação Tormenta, a Polícia Federal lançou mão de um software chamado Sistema de Prospecção e Análise de Desvios em Exames. O programa de computador permite rastrear desvios de respostas de candidatos em provas de concurso e apontar quais têm mais probabilidade de ter utilizado gabaritos obtidos de forma ilegal. As informações levantadas pelo software serviram de base para a investigação policial. Dados estatísticos resultantes do levantamento também foram analisados por peritos criminais.
Conclui-se que, entre tantos avanços democráticos ainda não assimilados pelas parcelas mais atrasadas da sociedade brasileira, o concurso público é um dos que passam a merecer atenção das autoridades. Recentemente, reportagem da RBS TV mostrou um esquema de fraudes em concursos de prefeituras no interior do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Não se pode admitir que organizações criminosas assumam o controle de um mecanismo de caráter cidadão como a seleção pública daqueles que têm por missão zelar pelo que é de todos. O antropólogo Roberto DaMatta escreveu: “Não há brasileiro que nunca tenha usado o ‘você sabe com quem está falando?’ diante de uma lei universal e do risco de uma universalização que acabaria transformando sua figura moral num mero número ou entidade anônima”. O concurso é dispositivo ao qual não compete, a bem do serviço público, saber com quem está falando. É por isso que as culturas da fraude e da impunidade se dão as mãos para solapá-lo.
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