ZERO HORA 25 de julho de 2013 | N° 17502
UMA DÉCADA NA TELINHA
Cifra, que equivale ao que os cofres públicos deixaram de arrecadar em 10 anos, expõe um sistema que precisa ser aperfeiçoado
Nem todo mundo se dá conta, mas o horário eleitoral obrigatório só é gratuito para os candidatos e seus partidos. Nos últimos 10 anos, os cofres públicos abriram mão de recolher R$ 4 bilhões em função da propaganda partidária-eleitoral no país. O valor é maior do que o montante previsto para a saúde no orçamento do RS para 2013 (R$ 2,7 bilhões).
Em países como os Estados Unidos, as legendas precisam tirar dólares do próprio bolso para aparecer nos intervalos comerciais de rádios e TVs. Por aqui, a legislação proíbe a veiculação de propaganda paga. Só em 2012, a Receita deixou de arrecadar R$ 606 milhões com as isenções fiscais concedidas às emissoras pela cedência do espaço – compensação prevista em lei. Além disso, as legendas contam com o Fundo Partidário, que também é usado para cobrir os gastos com a produção midiática.
Especialistas classificam o sistema como fundamental para democratizar a informação e garantir que as legendas tenham acesso à mídia.
– Esse modelo surgiu para ajudar os partidos a terem meios de se comunicar com o eleitor, e isso é muito importante em uma democracia jovem – resume a cientista política Maria do Socorro Sousa Braga, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR).
Há quem veja a necessidade de mudanças mesmo que o tema não esteja na agenda da comissão que discute a reforma política na Câmara. O horário eleitoral acabou encarecendo as campanhas e dando margem a distorções.
– Temos de limitar os gastos e o uso de tecnologia, simplificar ao máximo para que os programas se equilibrem em termos de necessidade de investimento. É radical? É, mas é dinheiro público. E dinheiro público merece respeito – diz o cientista político Humberto Dantas, do Insper.
Outra fonte de críticas é a propaganda partidária.
– Ela foi criada para divulgar as posições dos partidos sobre grandes temas, não para antecipar as eleições. É preciso fiscalização – diz Vladimyr Lombardo Jorge, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).
JULIANA BUBLITZ
ENTREVISTA - “Democratiza a informação”
Professor de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Felipe Borba defende o horário eleitoral e acredita que o investimento público compensa.
Zero Hora – Como o senhor avalia o horário eleitoral?
Felipe Borba – É importante, porque democratiza a informação. Se o acesso tivesse de ser comprado pelos partidos, boa parte deles não teria condições de aparecer e de expor suas propostas. Acabar com o horário eleitoral seria um atentado contra a democracia brasileira. Seria acabar com o principal canal de comunicação com os eleitores. Acho inclusive que ele deveria existir também nos canais pagos.
ZH – E quanto aos custos para os cofres públicos?
Borba – Financiar os partidos é importante para a democracia, e o investimento público compensa. Esse dinheiro não é nada. É uma cifra pequena perto do que o país produz de riqueza e dá chance aos partidos pequenos de sobreviverem. Além disso, não se pode abrir mão do financiamento privado, porque os partidos têm ligações com a sociedade.
ZH – A qualidade da propaganda não teria de melhorar?
Borba – Por incrível que pareça, e medi isso na minha tese, os ataques são mínimos na propaganda brasileira e a maior parte dela é dedicada a debater temas importantes. Há um certo exagero entre aqueles que dizem que os candidatos foram transformados em produtos de marketing. Acho isso até pejorativo. O eleitor sabe medir as consequências. Ele sabe que, se ele errar, o custo terá uma duração de quatro anos.
ZH – Como o senhor avalia a divisão do tempo entre os partidos?
Borba – Concordo com a forma como se dá a divisão. Em última análise, quem decide o tempo de rádio e TV de cada partido é o eleitor. É ele que vota e diz em que partidos confia e são esses com maior representação que ganham mais tempo.
ENTREVISTA - “Um excesso desnecessário”
Secretário-geral da ONG Contas Abertas, o economista Gil Castello Branco defende o fim da propaganda partidária e a redução do horário eleitoral. Quinze dias, diz ele, seriam suficientes.
Zero Hora – Como o senhor avalia o horário eleitoral?
Gil Castello Branco – O horário eleitoral é pago, e bem pago, por nós. Pode até ser de graça para o político, mas não para a sociedade. Os veículos de comunicação ganham isenção fiscal pela cedência do espaço. É dinheiro que deixa de entrar nos cofres públicos.
ZH – E qual seria a solução?
Castello Branco – Os programas deveriam ficar restritos a 15 dias antes das eleições e só nos anos eleitorais. A propaganda partidária, que acontece em anos que não têm disputas, deveria ser eliminada. Não tem o menor sentido e chega a ser irritante. Muitas vezes é a mesma publicidade, exibida repetidas vezes no horário nobre, com diferença de minutos. Acaba sendo um desfile antecipado de candidatos e não acrescenta nada do ponto de vista de democracia.
ZH – Os defensores dizem que o modelo atual é democrático e permite que as propostas cheguem à população.
Castello Branco – O que menos aparecem são propostas. É algo absolutamente desprezível, caro e oneroso. Um excesso desnecessário. Acredito que duas semanas, nos anos eleitorais, é o suficiente. Nos demais períodos, os partidos têm de buscar outras formas de se comunicar com a sociedade, inclusive com recursos próprios, que eles tenham amealhado entre os seus próprios militantes.
ZH – Mas os partidos menores conseguiriam competir?
Castello Branco – No caso dos partidos menores, a propaganda é ínfima. Quem tem interesse na manutenção disso são os grandes. Um país com falta de recursos tem de fazer escolhas. E se algo tem de ser cortado é esse excesso de publicidade.
UMA DÉCADA NA TELINHA
Cifra, que equivale ao que os cofres públicos deixaram de arrecadar em 10 anos, expõe um sistema que precisa ser aperfeiçoado
Nem todo mundo se dá conta, mas o horário eleitoral obrigatório só é gratuito para os candidatos e seus partidos. Nos últimos 10 anos, os cofres públicos abriram mão de recolher R$ 4 bilhões em função da propaganda partidária-eleitoral no país. O valor é maior do que o montante previsto para a saúde no orçamento do RS para 2013 (R$ 2,7 bilhões).
Em países como os Estados Unidos, as legendas precisam tirar dólares do próprio bolso para aparecer nos intervalos comerciais de rádios e TVs. Por aqui, a legislação proíbe a veiculação de propaganda paga. Só em 2012, a Receita deixou de arrecadar R$ 606 milhões com as isenções fiscais concedidas às emissoras pela cedência do espaço – compensação prevista em lei. Além disso, as legendas contam com o Fundo Partidário, que também é usado para cobrir os gastos com a produção midiática.
Especialistas classificam o sistema como fundamental para democratizar a informação e garantir que as legendas tenham acesso à mídia.
– Esse modelo surgiu para ajudar os partidos a terem meios de se comunicar com o eleitor, e isso é muito importante em uma democracia jovem – resume a cientista política Maria do Socorro Sousa Braga, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR).
Há quem veja a necessidade de mudanças mesmo que o tema não esteja na agenda da comissão que discute a reforma política na Câmara. O horário eleitoral acabou encarecendo as campanhas e dando margem a distorções.
– Temos de limitar os gastos e o uso de tecnologia, simplificar ao máximo para que os programas se equilibrem em termos de necessidade de investimento. É radical? É, mas é dinheiro público. E dinheiro público merece respeito – diz o cientista político Humberto Dantas, do Insper.
Outra fonte de críticas é a propaganda partidária.
– Ela foi criada para divulgar as posições dos partidos sobre grandes temas, não para antecipar as eleições. É preciso fiscalização – diz Vladimyr Lombardo Jorge, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).
JULIANA BUBLITZ
ENTREVISTA - “Democratiza a informação”
Professor de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Felipe Borba defende o horário eleitoral e acredita que o investimento público compensa.
Zero Hora – Como o senhor avalia o horário eleitoral?
Felipe Borba – É importante, porque democratiza a informação. Se o acesso tivesse de ser comprado pelos partidos, boa parte deles não teria condições de aparecer e de expor suas propostas. Acabar com o horário eleitoral seria um atentado contra a democracia brasileira. Seria acabar com o principal canal de comunicação com os eleitores. Acho inclusive que ele deveria existir também nos canais pagos.
ZH – E quanto aos custos para os cofres públicos?
Borba – Financiar os partidos é importante para a democracia, e o investimento público compensa. Esse dinheiro não é nada. É uma cifra pequena perto do que o país produz de riqueza e dá chance aos partidos pequenos de sobreviverem. Além disso, não se pode abrir mão do financiamento privado, porque os partidos têm ligações com a sociedade.
ZH – A qualidade da propaganda não teria de melhorar?
Borba – Por incrível que pareça, e medi isso na minha tese, os ataques são mínimos na propaganda brasileira e a maior parte dela é dedicada a debater temas importantes. Há um certo exagero entre aqueles que dizem que os candidatos foram transformados em produtos de marketing. Acho isso até pejorativo. O eleitor sabe medir as consequências. Ele sabe que, se ele errar, o custo terá uma duração de quatro anos.
ZH – Como o senhor avalia a divisão do tempo entre os partidos?
Borba – Concordo com a forma como se dá a divisão. Em última análise, quem decide o tempo de rádio e TV de cada partido é o eleitor. É ele que vota e diz em que partidos confia e são esses com maior representação que ganham mais tempo.
ENTREVISTA - “Um excesso desnecessário”
Secretário-geral da ONG Contas Abertas, o economista Gil Castello Branco defende o fim da propaganda partidária e a redução do horário eleitoral. Quinze dias, diz ele, seriam suficientes.
Zero Hora – Como o senhor avalia o horário eleitoral?
Gil Castello Branco – O horário eleitoral é pago, e bem pago, por nós. Pode até ser de graça para o político, mas não para a sociedade. Os veículos de comunicação ganham isenção fiscal pela cedência do espaço. É dinheiro que deixa de entrar nos cofres públicos.
ZH – E qual seria a solução?
Castello Branco – Os programas deveriam ficar restritos a 15 dias antes das eleições e só nos anos eleitorais. A propaganda partidária, que acontece em anos que não têm disputas, deveria ser eliminada. Não tem o menor sentido e chega a ser irritante. Muitas vezes é a mesma publicidade, exibida repetidas vezes no horário nobre, com diferença de minutos. Acaba sendo um desfile antecipado de candidatos e não acrescenta nada do ponto de vista de democracia.
ZH – Os defensores dizem que o modelo atual é democrático e permite que as propostas cheguem à população.
Castello Branco – O que menos aparecem são propostas. É algo absolutamente desprezível, caro e oneroso. Um excesso desnecessário. Acredito que duas semanas, nos anos eleitorais, é o suficiente. Nos demais períodos, os partidos têm de buscar outras formas de se comunicar com a sociedade, inclusive com recursos próprios, que eles tenham amealhado entre os seus próprios militantes.
ZH – Mas os partidos menores conseguiriam competir?
Castello Branco – No caso dos partidos menores, a propaganda é ínfima. Quem tem interesse na manutenção disso são os grandes. Um país com falta de recursos tem de fazer escolhas. E se algo tem de ser cortado é esse excesso de publicidade.
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