EDITORIAL
Descontando-se os condenáveis excessos
verbais, será que não existe motivo para descontentamento com o governo?
Vaia faz parte do jogo, tanto do esportivo quanto do político. O general João Figueiredo, último mandatário do regime militar, foi vaiado por estudantes em Florianópolis. O próprio Lula recebeu forte apupo na abertura dos Jogos Pan-Americanos do Rio. Praticamente todos os presidentes brasileiros passaram por momentos de desconforto em cerimônias públicas, especialmente quando estavam com a popularidade em baixa. Mesmo neste contexto característico da vida nacional, soam injustificáveis as ofensas dirigidas à presidente Dilma Rousseff na última quinta-feira, na abertura da Copa do Mundo, em São Paulo.
Ela não foi apenas vaiada, o que se poderia entender como uma legítima manifestação democrática considerando-se o perfil socioeconômico do público presente no Itaquerão, a tradicional rejeição paulista ao petismo e o ambiente de irreverência de uma partida de futebol. Mas o insulto em coro não pode ser considerado representativo de classe social alguma ou de determinada tendência política. O que ocorreu foi mesmo falta de educação por parte das pessoas que gritaram palavrões contra a presidente da República e contra a Fifa.
Claro que nada ocorre por acaso. A Fifa conquista antipatias por onde passa, pela forma arrogante como impõe suas exigências e pelo desrespeito aos países onde acampa a cada quatro anos com seu circo futebolístico. Mas o que nos interessa, como brasileiros, é a reação indignada contra a presidente da República, que está no comando do país e é candidata à reeleição. Descontando-se os condenáveis excessos verbais, será que não existe motivo para descontentamento com o governo?
Basta desviar o olhar do campo de jogo e fixá-lo na realidade do país: a economia não cresce, a inflação é uma ameaça constante, o loteamento político da administração pública é escandaloso, os gastos públicos com a Copa continuam mal explicados e o combate à corrupção deixou de ser prioridade na antevéspera da disputa presidencial. Há, portanto, motivos suficientes para a insatisfação.
Os insultos, porém, tiram a razão dos reclamantes e criam constrangimento para o país, que acabou mostrando ao mundo uma festa pífia, sem a palavra dos promotores e dos anfitriões, como é hábito em eventos desta dimensão.
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