JORNAL DO COMÉRCIO 22/01/2015
Conselhos municipais têm atuação inconstante Presidente do fórum dos 26 colegiados da Capital admite que falta efetividade para influenciar nas políticas públicas
Lívia Araújo
ANTONIO PAZ/JC
‘Nem todos aceitam a democracia participativa’, diz Carlos Boanova
O município de Porto Alegre, que tem no Orçamento Participativo (OP) uma instância de participação popular há 25 anos e serviu de exemplo para outras cidades do mundo. Possui também 26 conselhos municipais que tratam de temas diversos, como saúde, ciência e tecnologia, direitos humanos e turismo.
Entretanto, nem todos eles conseguem efetivamente cumprir seu papel de proposição e fiscalização dos setores da administração municipal, enfrentando problemas como a falta de adesão dos integrantes e deficiências no processo organizacional dos colegiados, como a não realização de eleições ou a interferência de interesses externos à participação popular.
De acordo com Carlos Boanova, presidente do Fórum dos Conselhos Municipais, que funciona como uma interface para questões em comum entre os colegiados, somente nove áreas costumam ser mais efetivas na transmissão das demandas da sociedade ao poder público, existindo em boa parte das cidades brasileiras de médio e grande porte: assistência social, criança e adolescente, educação, habitação, meio ambiente, urbanismo, saúde, transporte e turismo.
Outros segmentos, que no caso de Porto Alegre não foram citados por Boanova “para não gerar mal-estar”, acabariam não exercendo influência decisiva sobre políticas de governo por serem apenas instâncias consultivas, e não deliberativas. Em alguns casos, segundo ele, também “sofrem manipulação”.
Na opinião de Boanova, em alguns conselhos, há “o apaziguamento às reinvindicações mais fortes, com medidas paliativas, na medida em que não pode haver uma decisão que atenda às questões levantadas pelo colegiado”, revela.
O presidente do fórum afirma também que existe uma resistência grande em secretarias às quais os conselhos são vinculados, pois, para alguns servidores, os conselhos provocam uma “intromissão na seara alheia”. “Temos de romper um paradigma, porque até alguns vereadores não aceitam essas reivindicações. Nem todos aceitam a democracia participativa”, queixa-se. No entanto, Boanova, que também integra o Conselho Municipal dos Direitos das Pessoas com Deficiência, em nome do Instituto Urbis Porto Alegre, presidido por ele, salienta que existe um esforço do governo municipal em intensificar a participação dos cidadãos.
Desde 2010, a mesma lei que criou o Fórum dos Conselhos também determinou uma divisão dos colegiados, dando maioria de 50% mais um a organizações da sociedade civil - ONGs e entidades de classe podem pleitear vaga no conselho. “Estamos no caminho certo, com a existência de 26 conselhos e o fórum dos conselhos, que faz a interface entre eles. O OP levou 25 anos para ser consolidado, e espero que cheguemos ao mesmo denominador”, anseia Boanova.
Dinâmica de funcionamento ainda carece de regularidade e sistematização
O presidente do Fórum dos Conselhos Municipais, Carlos Boanova, aponta que outro problema é a falta de conhecimento de membros de conselhos tanto sobre o funcionamento dos colegiados quanto da área de atuação. “Em alguns casos, é o governo que delega integrantes, e muitas vezes acabam entrando pessoas que não têm vivência nos temas abordados”, explica. “Não há um apelo para que o conselheiro permaneça no colegiado e tenha compromissos. Ele pode estar simplesmente se desincumbindo de uma tarefa. No caso em que os conselhos estão submetidos a conferências ou fóruns municipais que dão as diretrizes de funcionamento, às vezes, não há nem a realização desses eventos”, diz Boanova.
Segundo a presidente do Conselho Municipal de Direitos Humanos, Marcelly Malta, nas duas reuniões que o conselho realizou em 2014, cerca de quatro pessoas participaram. “Sinto que o conselho não teve efetividade”, diz. O secretário municipal de Direitos Humanos, Luciano Marcantônio (PDT), responsável por oferecer assistência administrativa e jurídica ao conselho, defende que o estímulo à participação, que não é obrigatória, venha da mesa diretora do colegiado, mas alega que a prefeitura tem diversas iniciativas para estimular uma maior movimentação nos conselhos municipais. “A própria construção da Casa dos Conselhos representa a intenção de investir na estruturação desses grupos, que estavam esvaziados até o início da gestão José Fortunati (PDT)”, argumenta.
No caso do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres (Comdim) o envolvimento da prefeitura com a realização da Copa motivou que a posse solene da diretoria do colegiado fosse postergada até 10 de dezembro do ano passado, nove meses depois das eleições. O adiamento aconteceu, segundo a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Direitos Humanos, por um acordo entre o conselho e a secretaria, responsável pelo chamamento oficial. De acordo com a presidente do Comdim, Vera Daisy Barcellos, o período permitiu que os integrantes do colegiado se inteirassem da organização interna do grupo, mas impediu o encaminhamento de questões ligadas à violência contra a mulher, trabalho e emprego. “Também não pudemos dar sequência a demandas internas do conselho, como um espaço que permita o acesso externo do público”, explica. Hoje, o Comdim ocupa uma sala emprestada no prédio da prefeitura, na avenida Siqueira Campos, no Centro da Capital.
Para o presidente do fórum, a falta de participação e de eficiência poderia ser sanada com a promoção de um conhecimento mais amplo sobre a própria função dos conselheiros. “Tudo se interliga, e o conselheiro precisa ter uma visão mais ampla.”
Conselhos municipais têm atuação inconstante Presidente do fórum dos 26 colegiados da Capital admite que falta efetividade para influenciar nas políticas públicas
Lívia Araújo
ANTONIO PAZ/JC
‘Nem todos aceitam a democracia participativa’, diz Carlos Boanova
O município de Porto Alegre, que tem no Orçamento Participativo (OP) uma instância de participação popular há 25 anos e serviu de exemplo para outras cidades do mundo. Possui também 26 conselhos municipais que tratam de temas diversos, como saúde, ciência e tecnologia, direitos humanos e turismo.
Entretanto, nem todos eles conseguem efetivamente cumprir seu papel de proposição e fiscalização dos setores da administração municipal, enfrentando problemas como a falta de adesão dos integrantes e deficiências no processo organizacional dos colegiados, como a não realização de eleições ou a interferência de interesses externos à participação popular.
De acordo com Carlos Boanova, presidente do Fórum dos Conselhos Municipais, que funciona como uma interface para questões em comum entre os colegiados, somente nove áreas costumam ser mais efetivas na transmissão das demandas da sociedade ao poder público, existindo em boa parte das cidades brasileiras de médio e grande porte: assistência social, criança e adolescente, educação, habitação, meio ambiente, urbanismo, saúde, transporte e turismo.
Outros segmentos, que no caso de Porto Alegre não foram citados por Boanova “para não gerar mal-estar”, acabariam não exercendo influência decisiva sobre políticas de governo por serem apenas instâncias consultivas, e não deliberativas. Em alguns casos, segundo ele, também “sofrem manipulação”.
Na opinião de Boanova, em alguns conselhos, há “o apaziguamento às reinvindicações mais fortes, com medidas paliativas, na medida em que não pode haver uma decisão que atenda às questões levantadas pelo colegiado”, revela.
O presidente do fórum afirma também que existe uma resistência grande em secretarias às quais os conselhos são vinculados, pois, para alguns servidores, os conselhos provocam uma “intromissão na seara alheia”. “Temos de romper um paradigma, porque até alguns vereadores não aceitam essas reivindicações. Nem todos aceitam a democracia participativa”, queixa-se. No entanto, Boanova, que também integra o Conselho Municipal dos Direitos das Pessoas com Deficiência, em nome do Instituto Urbis Porto Alegre, presidido por ele, salienta que existe um esforço do governo municipal em intensificar a participação dos cidadãos.
Desde 2010, a mesma lei que criou o Fórum dos Conselhos também determinou uma divisão dos colegiados, dando maioria de 50% mais um a organizações da sociedade civil - ONGs e entidades de classe podem pleitear vaga no conselho. “Estamos no caminho certo, com a existência de 26 conselhos e o fórum dos conselhos, que faz a interface entre eles. O OP levou 25 anos para ser consolidado, e espero que cheguemos ao mesmo denominador”, anseia Boanova.
Dinâmica de funcionamento ainda carece de regularidade e sistematização
O presidente do Fórum dos Conselhos Municipais, Carlos Boanova, aponta que outro problema é a falta de conhecimento de membros de conselhos tanto sobre o funcionamento dos colegiados quanto da área de atuação. “Em alguns casos, é o governo que delega integrantes, e muitas vezes acabam entrando pessoas que não têm vivência nos temas abordados”, explica. “Não há um apelo para que o conselheiro permaneça no colegiado e tenha compromissos. Ele pode estar simplesmente se desincumbindo de uma tarefa. No caso em que os conselhos estão submetidos a conferências ou fóruns municipais que dão as diretrizes de funcionamento, às vezes, não há nem a realização desses eventos”, diz Boanova.
Segundo a presidente do Conselho Municipal de Direitos Humanos, Marcelly Malta, nas duas reuniões que o conselho realizou em 2014, cerca de quatro pessoas participaram. “Sinto que o conselho não teve efetividade”, diz. O secretário municipal de Direitos Humanos, Luciano Marcantônio (PDT), responsável por oferecer assistência administrativa e jurídica ao conselho, defende que o estímulo à participação, que não é obrigatória, venha da mesa diretora do colegiado, mas alega que a prefeitura tem diversas iniciativas para estimular uma maior movimentação nos conselhos municipais. “A própria construção da Casa dos Conselhos representa a intenção de investir na estruturação desses grupos, que estavam esvaziados até o início da gestão José Fortunati (PDT)”, argumenta.
No caso do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres (Comdim) o envolvimento da prefeitura com a realização da Copa motivou que a posse solene da diretoria do colegiado fosse postergada até 10 de dezembro do ano passado, nove meses depois das eleições. O adiamento aconteceu, segundo a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal de Direitos Humanos, por um acordo entre o conselho e a secretaria, responsável pelo chamamento oficial. De acordo com a presidente do Comdim, Vera Daisy Barcellos, o período permitiu que os integrantes do colegiado se inteirassem da organização interna do grupo, mas impediu o encaminhamento de questões ligadas à violência contra a mulher, trabalho e emprego. “Também não pudemos dar sequência a demandas internas do conselho, como um espaço que permita o acesso externo do público”, explica. Hoje, o Comdim ocupa uma sala emprestada no prédio da prefeitura, na avenida Siqueira Campos, no Centro da Capital.
Para o presidente do fórum, a falta de participação e de eficiência poderia ser sanada com a promoção de um conhecimento mais amplo sobre a própria função dos conselheiros. “Tudo se interliga, e o conselheiro precisa ter uma visão mais ampla.”
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